TRF5 0005247-40.2013.4.05.8500 00052474020134058500
AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CONVÊNIO FIRMADO ENTRE A FUNASA E O MUNICÍPIO DE NOSSA SENHORA DO SOCORRO/SE. CONSTRUÇÃO DE MÓDULOS SANITÁRIOS. OBJETO DO CONVÊNIO EXECUTADO EM PERCENTUAL ÍNFIMO (2,27%). DANO AO ERÁRIO E OFENSA A PRINCÍPIOS DA
ADMINISTRAÇÃO. CONDUTA ÍMPROBA DO GESTOR COMPROVADA NOS AUTOS. APLICAÇÃO DAS PENALIDADES DE REPARAÇÃO DO DANO AO ERÁRIO (FIXADA EM VALOR MÍNIMO), MULTA CIVIL, SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS E PROIBIÇÃO DE CONTRATAR COM O PODER PÚBLICO. EXCLUSÃO DA
PENA DE PERDA DA FUNÇÃO PÚBLICA. REDUÇÃO DO TEMPO DA SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS E DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA. RECURSO DO RÉU PARCIALMENTE PROVIDO.
1. O objeto da presente ação de improbidade diz respeito à análise do efetivo cumprimento das cláusulas do Convênio 2471/2001, firmado entre a FUNASA e o Município de Nossa Senhora do Socorro - representado por seu prefeito, à época, o Sr. José do Prado
Franco Sobrinho, ora promovido - visando à execução de melhorias sanitárias domiciliares. O valor total do convênio foi de R$ 493.578,00 (quatrocentos e noventa e três mil, quinhentos e setenta e oito reais), sendo R$ 444.220,00 (quatrocentos e quarenta
e quatro mil reais) a cargo da FUNASA e R$ 49.358,00 (quarenta e nove mil, trezentos e cinquenta e oito reais) a título de contrapartida pelo município.
2. Para a consecução do objeto do convênio, competia à Concedente/FUNASA, dentre outras obrigações, garantir os recursos financeiros, na forma do cronograma de desembolso apresentado no plano de trabalho, observada a sua disponibilidade financeira, em
razão do que foi liberada em favor do município de Nossa Senhora do Socorro, em junho de 2002, uma primeira parcela, no montante de R$ 217.962,23 (duzentos e dezessete mil, novecentos e sessenta e dois reais e vinte e três centavos), 50% do valor que
cabia à FUNASA.
3. Da análise do Plano de Trabalho - Cronograma de Execução e Plano de Aplicação do Convênio 2471/2001, extraímos as ações e objetivos específicos a serem empreendidos, tudo com vistas à concretização do objeto do convênio, qual seja, execução de
melhorias sanitárias domiciliares. É claro o referido Plano de Trabalho (anexo V do Convênio), no tocante ao cronograma de execução, ao dispor no "campo" especificação, a CONSTRUÇÃO de melhorias sanitárias no quantitativo de 441 de módulos sanitários. É
também expresso no tocante ao plano de aplicação, no "campo" especificação, a ação relativa à "construção/nova", para a qual os R$ 444.220,00 (quatrocentos e quarenta e quatro mil reais) a cargo da FUNASA se destinava. Liberada a primeira parcela e
passados meses suficientes à realização das obras relativas ao montante proporcional do valor liberado, a FUNASA procedeu a visitas técnicas de fiscalização nos períodos de 02 a 30 de janeiro de 2004 e 01 a 16 de abril de 2004, consubstanciando em
Relatório Técnico (fls. 91/98) o resultado da vistoria, onde já então restaram constatadas diversas e graves irregularidades, que culminaram na não liberação dos demais valores e na imputação do débito de R$ 812.548,59 (oitocentos e doze mil, quinhentos
e quarenta e oito reais e cinquenta e nove centavos) ao gestor público, ora recorrente.
4. Já àquele tempo, restou verificado, in loco, que "algumas das localidades eleitas para a construção de Melhorias não correspondem ao estabelecido no Plano de Trabalho Original. Muito poucas benfeitorias apresentavam, na data da visita, condições
adequadas de uso, além de não oferecerem resistência ao tempo e intempéries. Outras, quando não demolidas, jaziam isoladas em terrenos onde não se sabe que casa existia na época. Muitas foram depredadas, não continham o reservatório, a porta e suas
ferragens, as louças ou qualquer vestígio de instalações hidráulicas e sanitárias que detectassem a sua efetiva aplicação". É bem verdade que em tal vistoria foram identificados 153 módulos sanitários, edificados, porém, em sua maciça maioria, nas
condições acima transcritas, sem mínimas condições de uso, construídas ao relento, algumas sequer próximas a qualquer residência, muitas outras em localidades diversas daqueles estabelecidas no plano de trabalho, sem tubulações, instalações hidráulicas
e condições de utilização, restando claro e evidente que a simples elevação de paredes não configura a edificação dos módulos sanitários preconizados pelo Convênio.
5. Conforme se extrai dos trabalhos de vistoria, "muitos dos trabalhos realizados, especialmente escavações de fossa, foram solicitados aos beneficiários, havendo casos em que eles próprios forneceram parte dos materiais aplicados, segundo informações
colhidas nos locais visitados". Sobre este ponto, a testemunha Augusto Cesar Temóteo de Oliveira, engenheiro consultor da FUNASA, que participou das vistorias em janeiro e abril de 2004, afirmou em juízo que "as poucas obras que estavam concluídas,
independente de estarem no lugar certo ou não, estavam em condições precárias", nenhuma delas estando em completas condições de utilização. A testemunha, que afirmou ter visitado todas as localidades a serem beneficiadas pelo Convênio, ocasião em que
moradores revelaram ter sido instados a escavar fossas e custear material para execução dos banheiros, sob a alegação do construtor de que não havia recursos para tal. Até mesmo as instalações visitadas em localidades não constantes na listagem oficial
do convênio não atendiam a critérios mínimos que pudessem ser consideradas concluídas.
6. O cumprimento do convênio, o atingimento do seu objetivo, era empreitada de fácil execução, eis que consistente na construção de simples banheiros em residências da população de baixa renda, e, consequentemente, acaso ocorrido (o cumprimento), seria
ele de fácil demonstração. Não se está a tratar da execução de obras de grande complexidade, grande feito da engenharia, a demandar projetos de utilização de tecnologia avançada, a atrair maior dificuldade para a sua concretização e ulterior prestação
de contas. Está-se a tratar da construção de 441 de banheiros simples, sem qualquer complexidade de projeto, execução e prestação de contas, para o que restou contratada uma empresa (Torre Empreendimento Rural e Construção Ltda) pelo valor de R$
578.370,36 (quinhentos e setenta e oito mil, trezentos e setenta reais e trinta e seis centavos), sendo grave a revelação de moradores e beneficiários no sentido de que lhes era solicitada a escavação de fossa séptica, bem como a compra de materiais de
construção sob a informação da construtora de que não havia dinheiro para a aquisição.
7. Como prova da construção e entrega de 270 banheiros, o município encaminhou à FUNASA, por Ofício de n. 115/05, de 13/07/2005, uma relação "devidamente assinada pelos beneficiários" (fls. 118/136). É singular a fragilidade probatória do referido
documento, intitulado de "Relação dos Banheiros Construídos" e o respectivo povoado, com a relação de nomes, rua, e espaço para aposição de RG/CPF e assinaturas, muitos deles em branco. Outros, preenchidos com número de RG e assinatura, onde, além de
assinaturas em duplicidade, vê-se que Jackson assina no nome de Antônio, Maria no nome de Manuel, Antônio Carlos no de Everton, e o mesmo Jackson no nome de Maria Iraci. À luz do Direito, a única prova que se extrai de tais documentos é a de que
assinaturas e RG¿s foram ali lançados. Nada mais.
8. Por sua vez, a relação de fotos do anexo III das alegações de defesa evidencia que os inúmeros banheiros listados e com fotos são, em verdade, banheiros antigos - muitos deles em visível estado precário -, que, de acordo com a própria informação do
município, passou pelo melhoramento da "elevação do ponto da cruzeta e colocação de registro". O Convênio 2047/2001, firmado entre a FUNASA e o Município de Nossa Senhora do Socorro, conforme já registrado no item 6 supra, teve por objetivo a construção
de 441 banheiros (módulos sanitários) nas comunidades carentes previamente definidas no Plano de Trabalho, razão pela qual englobou, em 2001, a vultosa quantia de R$ 493.578,00 (quatrocentos e noventa e três mil, quinhentos e setenta e oito reais),
implicando na contratação de empresa para execução das obras no valor inclusive superior ao conveniado, qual seja, R$ 578.370,36 (quinhentos e setenta e oito mil, trezentos e setenta reais e trinta e seis centavos), não se podendo admitir para a
satisfação do objeto conveniado a simples instalação da peça de registro e a elevação do ponto da cruzeta.
9. Devidamente comprovados os fatos, bem como a responsabilidade do Sr. José do Prado Franco Sobrinho, Prefeito à frente da edilidade ao tempo da formalização do Convênio e de sua execução, é de se reconhecer, por consequência, a prática de atos de
improbidade administrativa, diante do descaso demonstrado com aplicação dos valores decorrentes do Convênio 2047/2001, provocando relevantes danos ao erário federal e afrontando princípios basilares da administração pública, incidindo nas condutas
previstas no art. 10, caput e incisos XI, e art. 11, caput e incisos II e VI, ambos, da Lei 8.429/1992, atraindo a aplicação das sanções previstas no art. 12, inciso II, do mesmo diploma legal.
10. Quanto à penalidade de perda da função pública, também aplicada na sentença, há de se ter presente o entendimento sufragado no âmbito do Colendo Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que "A sanção da perda do cargo público prevista entre
aquelas do art. 12 da Lei n. 8.429/1992 não está relacionada ao cargo ocupado pelo agente ímprobo ao tempo do trânsito em julgado da sentença condenatória, mas sim àquele (cargo) que serviu de instrumento para a prática da conduta ilícita" (AgRg
no AREsp 369.518/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 13/12/2016, DJe 28/03/2017).
11. Vê-se, portanto, que a perda da função pública como penalidade decorrente da prática de ato ímprobo deve guardar correlação com a função no exercício da qual tais atos restaram praticados, não sendo pertinente a postulação, e o seu consequente
acolhimento, no sentido da "perda da função pública que o mesmo possa eventualmente exercer", conforme postulado na inicial (fls. 19). No caso dos autos, a informação constante é a de que o recorrente não exerce mais o cargo de prefeito do Município de
Nossa Senhora do Socorro, razão pela qual se mostra, de um lado, inócua a decretação da perda do cargo de prefeito daquela edilidade e, de outro, inaplicável a decretação da perda de toda e qualquer função pública que o recorrente esteja a exercer,
razão pela qual, no ponto, merece provimento o recurso para afastar a penalidade de perda da função pública.
12. Após os trabalhos de fiscalização e vistorias, os agentes da FUNASA somente encontraram, dentro dos limites geográficos das comunidades abrangidas pelo Plano de Trabalho, 153 (cento e cinquenta e três) banheiros, restando um déficit de 67 unidades,
ao custo unitário, em valor histórico, de R$ 1.093,37 (um mil e noventa e três reais e trinta e sete centavos), totalizando assim, neste ponto, um prejuízo mínimo no montante de R$ 73.255,00 (setenta três mil duzentos e cinquenta e cinco reais), em
valores não atualizados.
13. Por sua vez, das 153 edificações verificadas, há inúmeros registros de que sua maciça maioria se deu de maneira irregular, ou mediante mão de obra e materiais dos próprios moradores, ou sem condições de funcionalidade, em relação às quais se alegou
a posterior correção, juntando-se fotografias que, por si sós, não comprovam com a segurança necessária os incrementos necessários a ter por supridas as irregularidades. Desse modo, entende-se possível remeter-se à fase de liquidação o dimensionamento
dos danos correspondentes às irregularidades verificadas pela FUNASA nos 153 módulos sanitários edificados nas comunidades abrangidas pelo Plano de Trabalho, permitindo-se ao apelante a comprovação do suprimento das irregularidades apontadas.
14. Desse modo, fixa-se como valor mínimo dos danos provocados pela inexecução do contrato, a ser ressarcido ao erário, sem prejuízo da sua complementação em liquidação, nos termos acima expostos, a quantia histórica/nominal de R$ 73.255,00 (setenta
três mil duzentos e cinquenta e cinco reais), em valores que devem ser atualizados nos termos constantes do Convênio.
15. Em relação à pena de multa civil, fixada na sentença no valor equivalente ao da reparação do dano ao erário, muito embora reconheça evidente nos autos o maciço descumprimento do objeto do convênio e o consequente relevante prejuízo ao erário,
entende-se que a medida deve obedecer aos ditames da razoabilidade em sua fixação, razão pela qual, levando-se em conta os elementos acima referidos, reputa-se atender à finalidade da medida a sua redução para o patamar de 50% (cinquenta por cento) do
valor da restituição ao erário, tal qual fixado na alínea "a" do item 3.1 da sentença. Por tal razão, também neste ponto, merece provimento o recurso. Por força dos mesmos critérios adotados acima, no tocante à penalidade aplicada na sentença de
suspensão dos direitos políticos por 8 (oito) anos, entende-se merecer provimento o recurso para reduzi-la ao patamar de 6 (seis) anos. Não há reparos à sentença quanto à fixação da pena de proibição de contratar com o Poder Público ou receber
benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos.
16. Conforme preconiza o parágrafo único do art. 12 LIA, na fixação das penas previstas nesta lei o juiz levará em conta a extensão do dano causado, o que, no caso dos autos, conforme cabalmente demonstrado, o dano ao erário foi grave e intenso, por
força do montante não aplicado na execução das obras públicas objeto do convênio. Porém, tão grave ou mais do que o dano ao erário foram os danos sociais decorrentes da inexecução de obras relativamente simples e extremamente necessárias para prover de
um mínimo de dignidade uma população extremamente sofrida, carente de cuidados básicos como aqueles inerentes ao saneamento e higiene.
17. Quanto à verba de honorários advocatícios, fixada na sentença em 10% do "valor da condenação", entende-se ela excessiva, com base nos mesmos critérios estabelecidos no art. 85 parágrafo 2º, CPC, levando-se em conta o disposto no parágrafo 3º, inciso
II do art. 85 do CPC, fixando os honorários advocatícios em 8% do valor da condenação, mantidos nesse patamar nesta esfera recursal, considerando o trabalho adicional nela realizado, consistente na apresentação de contrarrazões, em suma, reiterativas
dos fundamentos da inicial e alegações finais.
18. Recurso de apelação parcialmente provido para a) afastar a pena de perda da função pública; b) fixar como valor mínimo dos danos provocados pela inexecução do contrato, a ser ressarcido ao erário, a quantia histórica/nominal de R$ 73.255,00 (setenta
três mil duzentos e cinquenta e cinco reais), em valores que devem ser atualizados nos termos constantes do Convênio, sem prejuízo da sua complementação em liquidação, nos termos acima expostos; c) reduzir o valor da multa civil ao patamar de 50%
(cinquenta por cento) do valor a ser ressarcido ao erário; d) reduzir para 6 (seis) anos a pena de suspensão dos direitos políticos; e) reduzir o valor dos honorários advocatícios de sucumbência para 8% (oito por cento) do valor da condenação.
Ementa
AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CONVÊNIO FIRMADO ENTRE A FUNASA E O MUNICÍPIO DE NOSSA SENHORA DO SOCORRO/SE. CONSTRUÇÃO DE MÓDULOS SANITÁRIOS. OBJETO DO CONVÊNIO EXECUTADO EM PERCENTUAL ÍNFIMO (2,27%). DANO AO ERÁRIO E OFENSA A PRINCÍPIOS DA
ADMINISTRAÇÃO. CONDUTA ÍMPROBA DO GESTOR COMPROVADA NOS AUTOS. APLICAÇÃO DAS PENALIDADES DE REPARAÇÃO DO DANO AO ERÁRIO (FIXADA EM VALOR MÍNIMO), MULTA CIVIL, SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS E PROIBIÇÃO DE CONTRATAR COM O PODER PÚBLICO. EXCLUSÃO DA
PENA DE PERDA DA FUNÇÃO PÚBLICA. REDUÇÃO DO TEMPO DA SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS E DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA. RECURSO DO RÉU PARCIALMENTE PROVIDO.
1. O objeto da presente ação de improbidade diz respeito à análise do efetivo cumprimento das cláusulas do Convênio 2471/2001, firmado entre a FUNASA e o Município de Nossa Senhora do Socorro - representado por seu prefeito, à época, o Sr. José do Prado
Franco Sobrinho, ora promovido - visando à execução de melhorias sanitárias domiciliares. O valor total do convênio foi de R$ 493.578,00 (quatrocentos e noventa e três mil, quinhentos e setenta e oito reais), sendo R$ 444.220,00 (quatrocentos e quarenta
e quatro mil reais) a cargo da FUNASA e R$ 49.358,00 (quarenta e nove mil, trezentos e cinquenta e oito reais) a título de contrapartida pelo município.
2. Para a consecução do objeto do convênio, competia à Concedente/FUNASA, dentre outras obrigações, garantir os recursos financeiros, na forma do cronograma de desembolso apresentado no plano de trabalho, observada a sua disponibilidade financeira, em
razão do que foi liberada em favor do município de Nossa Senhora do Socorro, em junho de 2002, uma primeira parcela, no montante de R$ 217.962,23 (duzentos e dezessete mil, novecentos e sessenta e dois reais e vinte e três centavos), 50% do valor que
cabia à FUNASA.
3. Da análise do Plano de Trabalho - Cronograma de Execução e Plano de Aplicação do Convênio 2471/2001, extraímos as ações e objetivos específicos a serem empreendidos, tudo com vistas à concretização do objeto do convênio, qual seja, execução de
melhorias sanitárias domiciliares. É claro o referido Plano de Trabalho (anexo V do Convênio), no tocante ao cronograma de execução, ao dispor no "campo" especificação, a CONSTRUÇÃO de melhorias sanitárias no quantitativo de 441 de módulos sanitários. É
também expresso no tocante ao plano de aplicação, no "campo" especificação, a ação relativa à "construção/nova", para a qual os R$ 444.220,00 (quatrocentos e quarenta e quatro mil reais) a cargo da FUNASA se destinava. Liberada a primeira parcela e
passados meses suficientes à realização das obras relativas ao montante proporcional do valor liberado, a FUNASA procedeu a visitas técnicas de fiscalização nos períodos de 02 a 30 de janeiro de 2004 e 01 a 16 de abril de 2004, consubstanciando em
Relatório Técnico (fls. 91/98) o resultado da vistoria, onde já então restaram constatadas diversas e graves irregularidades, que culminaram na não liberação dos demais valores e na imputação do débito de R$ 812.548,59 (oitocentos e doze mil, quinhentos
e quarenta e oito reais e cinquenta e nove centavos) ao gestor público, ora recorrente.
4. Já àquele tempo, restou verificado, in loco, que "algumas das localidades eleitas para a construção de Melhorias não correspondem ao estabelecido no Plano de Trabalho Original. Muito poucas benfeitorias apresentavam, na data da visita, condições
adequadas de uso, além de não oferecerem resistência ao tempo e intempéries. Outras, quando não demolidas, jaziam isoladas em terrenos onde não se sabe que casa existia na época. Muitas foram depredadas, não continham o reservatório, a porta e suas
ferragens, as louças ou qualquer vestígio de instalações hidráulicas e sanitárias que detectassem a sua efetiva aplicação". É bem verdade que em tal vistoria foram identificados 153 módulos sanitários, edificados, porém, em sua maciça maioria, nas
condições acima transcritas, sem mínimas condições de uso, construídas ao relento, algumas sequer próximas a qualquer residência, muitas outras em localidades diversas daqueles estabelecidas no plano de trabalho, sem tubulações, instalações hidráulicas
e condições de utilização, restando claro e evidente que a simples elevação de paredes não configura a edificação dos módulos sanitários preconizados pelo Convênio.
5. Conforme se extrai dos trabalhos de vistoria, "muitos dos trabalhos realizados, especialmente escavações de fossa, foram solicitados aos beneficiários, havendo casos em que eles próprios forneceram parte dos materiais aplicados, segundo informações
colhidas nos locais visitados". Sobre este ponto, a testemunha Augusto Cesar Temóteo de Oliveira, engenheiro consultor da FUNASA, que participou das vistorias em janeiro e abril de 2004, afirmou em juízo que "as poucas obras que estavam concluídas,
independente de estarem no lugar certo ou não, estavam em condições precárias", nenhuma delas estando em completas condições de utilização. A testemunha, que afirmou ter visitado todas as localidades a serem beneficiadas pelo Convênio, ocasião em que
moradores revelaram ter sido instados a escavar fossas e custear material para execução dos banheiros, sob a alegação do construtor de que não havia recursos para tal. Até mesmo as instalações visitadas em localidades não constantes na listagem oficial
do convênio não atendiam a critérios mínimos que pudessem ser consideradas concluídas.
6. O cumprimento do convênio, o atingimento do seu objetivo, era empreitada de fácil execução, eis que consistente na construção de simples banheiros em residências da população de baixa renda, e, consequentemente, acaso ocorrido (o cumprimento), seria
ele de fácil demonstração. Não se está a tratar da execução de obras de grande complexidade, grande feito da engenharia, a demandar projetos de utilização de tecnologia avançada, a atrair maior dificuldade para a sua concretização e ulterior prestação
de contas. Está-se a tratar da construção de 441 de banheiros simples, sem qualquer complexidade de projeto, execução e prestação de contas, para o que restou contratada uma empresa (Torre Empreendimento Rural e Construção Ltda) pelo valor de R$
578.370,36 (quinhentos e setenta e oito mil, trezentos e setenta reais e trinta e seis centavos), sendo grave a revelação de moradores e beneficiários no sentido de que lhes era solicitada a escavação de fossa séptica, bem como a compra de materiais de
construção sob a informação da construtora de que não havia dinheiro para a aquisição.
7. Como prova da construção e entrega de 270 banheiros, o município encaminhou à FUNASA, por Ofício de n. 115/05, de 13/07/2005, uma relação "devidamente assinada pelos beneficiários" (fls. 118/136). É singular a fragilidade probatória do referido
documento, intitulado de "Relação dos Banheiros Construídos" e o respectivo povoado, com a relação de nomes, rua, e espaço para aposição de RG/CPF e assinaturas, muitos deles em branco. Outros, preenchidos com número de RG e assinatura, onde, além de
assinaturas em duplicidade, vê-se que Jackson assina no nome de Antônio, Maria no nome de Manuel, Antônio Carlos no de Everton, e o mesmo Jackson no nome de Maria Iraci. À luz do Direito, a única prova que se extrai de tais documentos é a de que
assinaturas e RG¿s foram ali lançados. Nada mais.
8. Por sua vez, a relação de fotos do anexo III das alegações de defesa evidencia que os inúmeros banheiros listados e com fotos são, em verdade, banheiros antigos - muitos deles em visível estado precário -, que, de acordo com a própria informação do
município, passou pelo melhoramento da "elevação do ponto da cruzeta e colocação de registro". O Convênio 2047/2001, firmado entre a FUNASA e o Município de Nossa Senhora do Socorro, conforme já registrado no item 6 supra, teve por objetivo a construção
de 441 banheiros (módulos sanitários) nas comunidades carentes previamente definidas no Plano de Trabalho, razão pela qual englobou, em 2001, a vultosa quantia de R$ 493.578,00 (quatrocentos e noventa e três mil, quinhentos e setenta e oito reais),
implicando na contratação de empresa para execução das obras no valor inclusive superior ao conveniado, qual seja, R$ 578.370,36 (quinhentos e setenta e oito mil, trezentos e setenta reais e trinta e seis centavos), não se podendo admitir para a
satisfação do objeto conveniado a simples instalação da peça de registro e a elevação do ponto da cruzeta.
9. Devidamente comprovados os fatos, bem como a responsabilidade do Sr. José do Prado Franco Sobrinho, Prefeito à frente da edilidade ao tempo da formalização do Convênio e de sua execução, é de se reconhecer, por consequência, a prática de atos de
improbidade administrativa, diante do descaso demonstrado com aplicação dos valores decorrentes do Convênio 2047/2001, provocando relevantes danos ao erário federal e afrontando princípios basilares da administração pública, incidindo nas condutas
previstas no art. 10, caput e incisos XI, e art. 11, caput e incisos II e VI, ambos, da Lei 8.429/1992, atraindo a aplicação das sanções previstas no art. 12, inciso II, do mesmo diploma legal.
10. Quanto à penalidade de perda da função pública, também aplicada na sentença, há de se ter presente o entendimento sufragado no âmbito do Colendo Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que "A sanção da perda do cargo público prevista entre
aquelas do art. 12 da Lei n. 8.429/1992 não está relacionada ao cargo ocupado pelo agente ímprobo ao tempo do trânsito em julgado da sentença condenatória, mas sim àquele (cargo) que serviu de instrumento para a prática da conduta ilícita" (AgRg
no AREsp 369.518/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 13/12/2016, DJe 28/03/2017).
11. Vê-se, portanto, que a perda da função pública como penalidade decorrente da prática de ato ímprobo deve guardar correlação com a função no exercício da qual tais atos restaram praticados, não sendo pertinente a postulação, e o seu consequente
acolhimento, no sentido da "perda da função pública que o mesmo possa eventualmente exercer", conforme postulado na inicial (fls. 19). No caso dos autos, a informação constante é a de que o recorrente não exerce mais o cargo de prefeito do Município de
Nossa Senhora do Socorro, razão pela qual se mostra, de um lado, inócua a decretação da perda do cargo de prefeito daquela edilidade e, de outro, inaplicável a decretação da perda de toda e qualquer função pública que o recorrente esteja a exercer,
razão pela qual, no ponto, merece provimento o recurso para afastar a penalidade de perda da função pública.
12. Após os trabalhos de fiscalização e vistorias, os agentes da FUNASA somente encontraram, dentro dos limites geográficos das comunidades abrangidas pelo Plano de Trabalho, 153 (cento e cinquenta e três) banheiros, restando um déficit de 67 unidades,
ao custo unitário, em valor histórico, de R$ 1.093,37 (um mil e noventa e três reais e trinta e sete centavos), totalizando assim, neste ponto, um prejuízo mínimo no montante de R$ 73.255,00 (setenta três mil duzentos e cinquenta e cinco reais), em
valores não atualizados.
13. Por sua vez, das 153 edificações verificadas, há inúmeros registros de que sua maciça maioria se deu de maneira irregular, ou mediante mão de obra e materiais dos próprios moradores, ou sem condições de funcionalidade, em relação às quais se alegou
a posterior correção, juntando-se fotografias que, por si sós, não comprovam com a segurança necessária os incrementos necessários a ter por supridas as irregularidades. Desse modo, entende-se possível remeter-se à fase de liquidação o dimensionamento
dos danos correspondentes às irregularidades verificadas pela FUNASA nos 153 módulos sanitários edificados nas comunidades abrangidas pelo Plano de Trabalho, permitindo-se ao apelante a comprovação do suprimento das irregularidades apontadas.
14. Desse modo, fixa-se como valor mínimo dos danos provocados pela inexecução do contrato, a ser ressarcido ao erário, sem prejuízo da sua complementação em liquidação, nos termos acima expostos, a quantia histórica/nominal de R$ 73.255,00 (setenta
três mil duzentos e cinquenta e cinco reais), em valores que devem ser atualizados nos termos constantes do Convênio.
15. Em relação à pena de multa civil, fixada na sentença no valor equivalente ao da reparação do dano ao erário, muito embora reconheça evidente nos autos o maciço descumprimento do objeto do convênio e o consequente relevante prejuízo ao erário,
entende-se que a medida deve obedecer aos ditames da razoabilidade em sua fixação, razão pela qual, levando-se em conta os elementos acima referidos, reputa-se atender à finalidade da medida a sua redução para o patamar de 50% (cinquenta por cento) do
valor da restituição ao erário, tal qual fixado na alínea "a" do item 3.1 da sentença. Por tal razão, também neste ponto, merece provimento o recurso. Por força dos mesmos critérios adotados acima, no tocante à penalidade aplicada na sentença de
suspensão dos direitos políticos por 8 (oito) anos, entende-se merecer provimento o recurso para reduzi-la ao patamar de 6 (seis) anos. Não há reparos à sentença quanto à fixação da pena de proibição de contratar com o Poder Público ou receber
benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos.
16. Conforme preconiza o parágrafo único do art. 12 LIA, na fixação das penas previstas nesta lei o juiz levará em conta a extensão do dano causado, o que, no caso dos autos, conforme cabalmente demonstrado, o dano ao erário foi grave e intenso, por
força do montante não aplicado na execução das obras públicas objeto do convênio. Porém, tão grave ou mais do que o dano ao erário foram os danos sociais decorrentes da inexecução de obras relativamente simples e extremamente necessárias para prover de
um mínimo de dignidade uma população extremamente sofrida, carente de cuidados básicos como aqueles inerentes ao saneamento e higiene.
17. Quanto à verba de honorários advocatícios, fixada na sentença em 10% do "valor da condenação", entende-se ela excessiva, com base nos mesmos critérios estabelecidos no art. 85 parágrafo 2º, CPC, levando-se em conta o disposto no parágrafo 3º, inciso
II do art. 85 do CPC, fixando os honorários advocatícios em 8% do valor da condenação, mantidos nesse patamar nesta esfera recursal, considerando o trabalho adicional nela realizado, consistente na apresentação de contrarrazões, em suma, reiterativas
dos fundamentos da inicial e alegações finais.
18. Recurso de apelação parcialmente provido para a) afastar a pena de perda da função pública; b) fixar como valor mínimo dos danos provocados pela inexecução do contrato, a ser ressarcido ao erário, a quantia histórica/nominal de R$ 73.255,00 (setenta
três mil duzentos e cinquenta e cinco reais), em valores que devem ser atualizados nos termos constantes do Convênio, sem prejuízo da sua complementação em liquidação, nos termos acima expostos; c) reduzir o valor da multa civil ao patamar de 50%
(cinquenta por cento) do valor a ser ressarcido ao erário; d) reduzir para 6 (seis) anos a pena de suspensão dos direitos políticos; e) reduzir o valor dos honorários advocatícios de sucumbência para 8% (oito por cento) do valor da condenação.Decisão
Decide a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, em JULGAMENTO APLIADO, por maioria, dar parcial provimento à apelação, nos termos do voto do relator.
Data do Julgamento
:
19/07/2017
Data da Publicação
:
03/08/2017
Classe/Assunto
:
AC - Apelação Civel - 594447
Órgão Julgador
:
Terceira Turma
Relator(a)
:
Desembargador Federal Sérgio Murilo Wanderley Queiroga
Comarca
:
TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** CPC-15 Código de Processo Civil
LEG-FED LEI-13105 ANO-2015 ART-85 PAR-3 INC-2 PAR-2
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LEG-FED LEI-8429 ANO-1992 ART-10 (CAPUT) INC-11 INC-6 INC-2 ART-17 PAR-6 PAR-8 ART-12 INC-2 INC-3 INC-8
Fonte da publicação
:
DJE - Data::03/08/2017 - Página::70
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