TRF5 0005958-92.2015.4.05.8300 00059589220154058300
PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIMES DOS ARTS. 241-A E 241-B, AMBOS DA LEI Nº 8.069/1990 - ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. CRIME DO ART. 241-B (ARMAZENAR) COMO MEIO PARA A CONSUMAÇÃO DO CRIME DO ART. 241-A
(DIVULGAÇÃO/DISPONIBILIZAÇÃO). DOSIMETRIA DA PENA. PONDERAÇÃO EM DESFAVOR DO RÉU DE CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS QUE SE CONFUNDEM COM AS ELEMENTARES DO TIPO PENAL. NECESSIDADE DE REFORMA. ATENUANTE DA CONFISSÃO GENÉRICA. INCIDÊNCIA. POSSIBILIDADE. CONCURSO
FORMAL. CONTINUIDADE DELITIVA. ADOÇÃO CONJUNTA. OCORRÊNCIA DE BIS IN IDEM. PENA DE MULTA. PROPORCIONALIDADE À PRIVATIVA DE LIBERDADE. CONDENAÇÃO EM CUSTAS. HIPOSSUFICIÊNCIA DO RÉU. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO PENAL. APELAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
FEDERAL IMPROVIDA. APELAÇÃO DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDA.
I. Noticia a denúncia que Lucas Torres Araújo Barboza, no período compreendido entre os anos de 2012 e 2015, transmitiu em diversas ocasiões, por meio de endereços de e-mail, e armazenou arquivos digitais de fotos e vídeos com cenas de sexo explícito
envolvendo crianças e adolescentes, havendo sido flagrado no curso da denominada Operação Moikano, iniciada pela Delegacia de Polícia Federal em Sorocaba/SP, após destrinchamento de uma outra operação maior (Operação Glasnost), cujo objetivo era
identificar os responsáveis por uma grande rede de compartilhamento internacional de arquivos digitais com conteúdo pornográfico envolvendo crianças e adolescentes pela internet, sendo a ele imputada a prática dos crimes dos arts. 241-A e 241-B da Lei
nº 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), vendo a ser condenado, ao final, pelo cometimento do capitulado nos arts. 241-A daquele diploma legal às penas de 5 (cinco) anos de reclusão e de 200 (duzentos) dias-multa, valorados em 1/20 (um
vigésimo) do salário mínimo à época dos fatos.
II. O órgão acusador, em seu apelo, aduz ser a fixação da pena-base desproporcional às circunstâncias desfavoráveis valoradas na sentença e, ainda, restar configurada de forma autônoma e independente a conduta descrita no art. 241-B da Lei nº
8.069/1990, pugnando pela sua condenação e incidência do concurso material. A defesa, por seu turno, alega inexistirem elementos concretos para caracterizar como desfavoráveis as circunstâncias assim sopesadas, pretendendo, assim, a condução da
pena-base ao patamar mínimo cominado; ser omissa a sentença quanto ao pedido de incidência da atenuante da confissão genérica; por fim, a ocorrência de bis in idem na aplicação do concurso formal e da continuidade delitiva; e, por fim, a suspensão da
condenação em pagamento das custas processuais, em razão de ser pessoa pobre que se encontra sem renda desde junho de 2015.
III. O delito do art. 241-B da Lei nº 8.069/1990, referente ao armazenamento dos dados, no caso concreto, caracteriza-se como crime-meio ao cometimento do delito-fim, de disponibilização/divulgação dos arquivos de imagem e vídeo com cenas de sexo
explícito envolvendo crianças e adolescentes, do art. 241-A do mesmo diploma legal, não se percebendo autonomia das condutas, mas sim movidas tais condutas com o fim de compartilhar os aludidos arquivos, pelo que é de se aplicar, como indicado na
sentença, o princípio da consunção, com a absorção do primeiro pelo segundo. Precedentes do TRF5: ACR-14068/RN, rel. Des. Federal Manoel Erhardt, 1ª T., DJe 01.02.2017; ACR-13208/CE, rel. Des. Federal Manoel Maia (convocado), 1ªT., DJe 02.05.2016.
IV. A culpabilidade, os motivos e as consequências do crime, no caso concreto, não se dissociam das elementares do tipo penal, pelo que não podem ser sopesadas em desfavor do réu. De igual sorte quanto ao comportamento da vítima, ela pode ser favorável
ao réu, mas nunca contrária, incidindo a norma em mão única.
V. Restando presentes em desfavor do réu não mais seis dentre oito circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, mas tão somente de duas delas - personalidade e circunstâncias do crime, e adotando-se critérios objetivos para a fixação da
pena-base, é de ser a mesma conduzida a patamar abaixo do médio cominado em lei para o crime em análise, no caso concreto a 4 (quatro) anos de reclusão.
VI. Na sua insurgência, aduz a defesa que em audiência de instrução foi confessada a prática da conduta do art. 241-A da Lei nº 8.069/1990, afirmando "que compartilhou com outros usuários a senha de algumas contas de e-mail onde estavam armazenados os
conteúdos de pornografia infantil" com reiteração, inclusive quando perguntado pelo representante do Ministério Público Federal ali presente, não se omitindo, assim, o réu, nos autos, de confessar a prática do previsto no art. 241-A da Lei nº 8.069/1990
e, mesmo que houvesse confessado alegando em sua defesa a ausência de dolo, ainda assim veio ela a contribuir para a condenação, com a exasperação da pena-base diante das circunstâncias do crime, situação essa que se adéqua a uma linha jurisprudencial
mais moderna traçada pelo Superior Tribunal de Justiça (HC-294088/MS, rel. Min. Gurgel de Farias, 5ª T., DJe 27.11.2014; HC-288930/SP, rel. Min. Laurita Vaz, 5ª T., DJe 28.08.2014).
VII. Em relação à apontada ocorrência de bis in idem, ao se adotar os instituto do crime formal (art. 70, CP) e da continuidade delitiva (art. 71, CP), sendo o primeiro diante da quantidade de imagens divulgadas e o outro por se observar a conduta
durante o tempo, no decorrer dos anos 2012 a 2015, vejo assistir razão à defesa, devendo prevalecer tão somente um deles, no caso concreto o último, mantido o patamar fixado na sentença, em 1/3 (um terço) para não incidir em reformatio in pejus e,
assim, obter, ao final por concreta e definitiva, uma pena de 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão.
VIII. A pena de multa, para guardar proporcionalidade à privativa de liberdade, é de ser fixada, ao final, em 160 (cento e sessenta) dias-multa, cada qual valorado em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos e com a devida
atualização quando da efetiva execução.
IX. No que diz respeito à condenação em custas processuais, entendo ser competência do Juízo da Execução Penal a apreciação dos termos do cumprimento da pena imposta, cabendo a ele avaliar a miserabilidade jurídica do sentenciado, examinando as
condições socioeconômicas para viabilizar a execução de pena pecuniária, de custas e despesas processuais sem prejuízo para o sustento do condenado e de sua família.
X. Apelação do Ministério Público Federal improvida.
XI. Apelação manejada pela defesa parcialmente provida para, reformando a sentença quanto à dosimetria da pena, fixá-la ao final, por concreta e definitiva, as penas em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão e em 160 (cento e sessenta) dias-multa,
cada qual valorado em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos e com a devida atualização quando da efetiva execução, mantidos os demais termos da sentença.
Ementa
PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIMES DOS ARTS. 241-A E 241-B, AMBOS DA LEI Nº 8.069/1990 - ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. CRIME DO ART. 241-B (ARMAZENAR) COMO MEIO PARA A CONSUMAÇÃO DO CRIME DO ART. 241-A
(DIVULGAÇÃO/DISPONIBILIZAÇÃO). DOSIMETRIA DA PENA. PONDERAÇÃO EM DESFAVOR DO RÉU DE CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS QUE SE CONFUNDEM COM AS ELEMENTARES DO TIPO PENAL. NECESSIDADE DE REFORMA. ATENUANTE DA CONFISSÃO GENÉRICA. INCIDÊNCIA. POSSIBILIDADE. CONCURSO
FORMAL. CONTINUIDADE DELITIVA. ADOÇÃO CONJUNTA. OCORRÊNCIA DE BIS IN IDEM. PENA DE MULTA. PROPORCIONALIDADE À PRIVATIVA DE LIBERDADE. CONDENAÇÃO EM CUSTAS. HIPOSSUFICIÊNCIA DO RÉU. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO PENAL. APELAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
FEDERAL IMPROVIDA. APELAÇÃO DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDA.
I. Noticia a denúncia que Lucas Torres Araújo Barboza, no período compreendido entre os anos de 2012 e 2015, transmitiu em diversas ocasiões, por meio de endereços de e-mail, e armazenou arquivos digitais de fotos e vídeos com cenas de sexo explícito
envolvendo crianças e adolescentes, havendo sido flagrado no curso da denominada Operação Moikano, iniciada pela Delegacia de Polícia Federal em Sorocaba/SP, após destrinchamento de uma outra operação maior (Operação Glasnost), cujo objetivo era
identificar os responsáveis por uma grande rede de compartilhamento internacional de arquivos digitais com conteúdo pornográfico envolvendo crianças e adolescentes pela internet, sendo a ele imputada a prática dos crimes dos arts. 241-A e 241-B da Lei
nº 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), vendo a ser condenado, ao final, pelo cometimento do capitulado nos arts. 241-A daquele diploma legal às penas de 5 (cinco) anos de reclusão e de 200 (duzentos) dias-multa, valorados em 1/20 (um
vigésimo) do salário mínimo à época dos fatos.
II. O órgão acusador, em seu apelo, aduz ser a fixação da pena-base desproporcional às circunstâncias desfavoráveis valoradas na sentença e, ainda, restar configurada de forma autônoma e independente a conduta descrita no art. 241-B da Lei nº
8.069/1990, pugnando pela sua condenação e incidência do concurso material. A defesa, por seu turno, alega inexistirem elementos concretos para caracterizar como desfavoráveis as circunstâncias assim sopesadas, pretendendo, assim, a condução da
pena-base ao patamar mínimo cominado; ser omissa a sentença quanto ao pedido de incidência da atenuante da confissão genérica; por fim, a ocorrência de bis in idem na aplicação do concurso formal e da continuidade delitiva; e, por fim, a suspensão da
condenação em pagamento das custas processuais, em razão de ser pessoa pobre que se encontra sem renda desde junho de 2015.
III. O delito do art. 241-B da Lei nº 8.069/1990, referente ao armazenamento dos dados, no caso concreto, caracteriza-se como crime-meio ao cometimento do delito-fim, de disponibilização/divulgação dos arquivos de imagem e vídeo com cenas de sexo
explícito envolvendo crianças e adolescentes, do art. 241-A do mesmo diploma legal, não se percebendo autonomia das condutas, mas sim movidas tais condutas com o fim de compartilhar os aludidos arquivos, pelo que é de se aplicar, como indicado na
sentença, o princípio da consunção, com a absorção do primeiro pelo segundo. Precedentes do TRF5: ACR-14068/RN, rel. Des. Federal Manoel Erhardt, 1ª T., DJe 01.02.2017; ACR-13208/CE, rel. Des. Federal Manoel Maia (convocado), 1ªT., DJe 02.05.2016.
IV. A culpabilidade, os motivos e as consequências do crime, no caso concreto, não se dissociam das elementares do tipo penal, pelo que não podem ser sopesadas em desfavor do réu. De igual sorte quanto ao comportamento da vítima, ela pode ser favorável
ao réu, mas nunca contrária, incidindo a norma em mão única.
V. Restando presentes em desfavor do réu não mais seis dentre oito circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, mas tão somente de duas delas - personalidade e circunstâncias do crime, e adotando-se critérios objetivos para a fixação da
pena-base, é de ser a mesma conduzida a patamar abaixo do médio cominado em lei para o crime em análise, no caso concreto a 4 (quatro) anos de reclusão.
VI. Na sua insurgência, aduz a defesa que em audiência de instrução foi confessada a prática da conduta do art. 241-A da Lei nº 8.069/1990, afirmando "que compartilhou com outros usuários a senha de algumas contas de e-mail onde estavam armazenados os
conteúdos de pornografia infantil" com reiteração, inclusive quando perguntado pelo representante do Ministério Público Federal ali presente, não se omitindo, assim, o réu, nos autos, de confessar a prática do previsto no art. 241-A da Lei nº 8.069/1990
e, mesmo que houvesse confessado alegando em sua defesa a ausência de dolo, ainda assim veio ela a contribuir para a condenação, com a exasperação da pena-base diante das circunstâncias do crime, situação essa que se adéqua a uma linha jurisprudencial
mais moderna traçada pelo Superior Tribunal de Justiça (HC-294088/MS, rel. Min. Gurgel de Farias, 5ª T., DJe 27.11.2014; HC-288930/SP, rel. Min. Laurita Vaz, 5ª T., DJe 28.08.2014).
VII. Em relação à apontada ocorrência de bis in idem, ao se adotar os instituto do crime formal (art. 70, CP) e da continuidade delitiva (art. 71, CP), sendo o primeiro diante da quantidade de imagens divulgadas e o outro por se observar a conduta
durante o tempo, no decorrer dos anos 2012 a 2015, vejo assistir razão à defesa, devendo prevalecer tão somente um deles, no caso concreto o último, mantido o patamar fixado na sentença, em 1/3 (um terço) para não incidir em reformatio in pejus e,
assim, obter, ao final por concreta e definitiva, uma pena de 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão.
VIII. A pena de multa, para guardar proporcionalidade à privativa de liberdade, é de ser fixada, ao final, em 160 (cento e sessenta) dias-multa, cada qual valorado em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos e com a devida
atualização quando da efetiva execução.
IX. No que diz respeito à condenação em custas processuais, entendo ser competência do Juízo da Execução Penal a apreciação dos termos do cumprimento da pena imposta, cabendo a ele avaliar a miserabilidade jurídica do sentenciado, examinando as
condições socioeconômicas para viabilizar a execução de pena pecuniária, de custas e despesas processuais sem prejuízo para o sustento do condenado e de sua família.
X. Apelação do Ministério Público Federal improvida.
XI. Apelação manejada pela defesa parcialmente provida para, reformando a sentença quanto à dosimetria da pena, fixá-la ao final, por concreta e definitiva, as penas em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão e em 160 (cento e sessenta) dias-multa,
cada qual valorado em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos e com a devida atualização quando da efetiva execução, mantidos os demais termos da sentença.Decisão
UNÂNIME
Data do Julgamento
:
18/04/2017
Data da Publicação
:
25/04/2017
Classe/Assunto
:
ACR - Apelação Criminal - 14321
Órgão Julgador
:
Segunda Turma
Relator(a)
:
Desembargador Federal Ivan Lira de Carvalho
Comarca
:
TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Tipo
:
Acórdão
Revisor
:
Desembargador Federal Paulo Roberto de Oliveira Lima
Referência
legislativa
:
***** CP-40 Codigo Penal
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-59 ART-70 ART-71
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
***** CDC-90 Código de Defesa do Consumidor
LEG-FED LEI-8078 ANO-1990 ART-241-A ART-241-B
Fonte da publicação
:
DJE - Data::25/04/2017 - Página::54
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