main-banner

Jurisprudência


TRF5 0006375-97.2014.4.05.8100 00063759720144058100

Ementa
PENAL E PROCESSUAL PENAL. ESTELIONATO QUALIFICADO. ART. 171, PARÁGRAFO 3º, DO CÓDIGO PENAL. PERCEPÇÃO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL INDEVIDAMENTE APÓS FALECIMENTO DO TITULAR. TIPICIDADE DA CONDUTA. NÃO APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. RECEBIMENTO DO BENEFÍCIO POR QUASE 3 (TRÊS) ANOS. EXCLUDENTE DE ILICITUDE - ESTADO DE NECESSIDADE. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO NOS AUTOS. RECURSO IMPROVIDO. 1. Recurso interposto pela defesa contra sentença que julgou procedente a pretensão punitiva estatal, para condenar a ré, ora apelante, pela prática do crime previsto no art. 171, parágrafo 3º (estelionato previdenciário), c/c art. 71 (crime continuado), todos do Código Penal Brasileiro, fixando-se a pena definitiva em 02 (dois) anos, 02 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, a ser cumprida em regime inicial aberto, bem como à pena de multa no valor de 21 (vinte e um) dias-multa, correspondendo cada dia-multa a 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época da primeira conduta delitiva praticada (05.06.2007). 2. A decisão recorrida verificou que a parte ré recebeu indevidamente benefício de amparo social à pessoa portadora de deficiência, após o falecimento do titular (ocorrido em 06.05.2007), filho da acusada, no período de maio de 2007 a fevereiro de 2010, no valor total de R$ 19.013,85 (dezenove mil, treze reais e oitenta e cinco centavos). 3. Nas razões do recurso a parte ré não nega a autoria e materialidade do crime, mas apenas discute questões relativas à atipicidade, excludente de ilicitude e excludente de culpabilidade. 4. A recorrente percebeu indevidamente o benefício previdenciário por longo período, quase 03 (três) anos, tendo induzido e mantido em erro o INSS com o fim de continuar recebendo o benefício mesmo após o falecimento de seu filho portador de deficiência. "Pode o silêncio malicioso e intencional consistir em meio fraudulento, quando houver o dever de falar ou informar algo, como é o caso de quem, na condição de procurador ou de posse de cartão magnético e sabedor da senha, percebe benefício em nome de parente falecido". 5. É evidente que a apelante tinha o dever de comunicar ao INSS o óbito do seu filho, beneficiário da Previdência Social, para que essa autarquia suspendesse o pagamento do benefício, mas preferiu omitir-se a respeito e ainda realizou os saques do benefício por longo período, devendo ser ressaltado que a recorrente procedeu à renovação da senha utilizada para retirada dos valores, por 03 (três) vezes, após o falecimento do real beneficiário. 6. Não se aplica o princípio da insignificância ao caso, haja vista que o estelionato contra entidade de direito público atinge a moral, a fé pública e a coletividade, não sendo possível a sua aplicação. Precedentes do STJ: HC 180771/SP, HC 234694/SP. 7. Há precedente do STF, da Relatoria do Ministro Dias Toffoli, no HC nº 107041/SC, Primeira Turma, DJe: 07/10/11 e HC nº 111918, o qual entendeu que a conduta de um paciente que, após o falecimento de terceiro, recebeu valores indevidamente, por um período significativo, causando prejuízo ao INSS, não poder ser prestigiada com a insignificância. 8. Não merece acolhida a alegação de que não haveria crime, em razão de suposta presença de excludente de ilicitude, face o estado de necessidade. A jurisprudência tem se firmado no sentido de que o fato de o delito se protrair no tempo por período consideravelmente longo torna o fato típico incompatível com o reconhecimento da excludente de ilicitude do estado de necessidade. 9. Não há como se acolher a tese da defesa, ante o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a alegação de dificuldades financeiras, por si só, não é idônea a comprovar o estado de necessidade, principalmente se o crime foi praticado durante período significativo, o que representa situação fática incompatível com a tese de perigo atual ou iminente, que não se podia de outro modo evitar. Precedente: (STJ, AGARESP 832864, Min. Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, DJE: 05/09/2016). 10. Não merecem acolhimento as razões apresentadas pela recorrente no que tange a suposta inexigibilidade de conduta diversa. As meras alegações de dificuldades financeiras não são suficientes para caracterizar a inexigibilidade de conduta diversa, que pressupõe situação grave, atual, inevitável e não atribuída ao agente. 11. Na hipótese de ocorrência de estado de necessidade, como causa de inexigibilidade de conduta diversa, com fins de afastar a culpabilidade da acusada, nos termos do art. 156 do CPP, a prova da alegação incumbirá a quem o fizer. "Por essa razão, os Tribunais Superiores firmaram sua jurisprudência, a propósito dos crimes contra a ordem tributária, que o ônus da prova quanto à inexigibilidade de conduta diversa, causa supralegal de exclusão da culpabilidade, é da defesa". Precedente do STJ: AgRg no REsp 1264697/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, DJE 02/02/2016. Precedente do STF, APE 516/DF, Rel. Min. Ministro Ayres Britto, D20/09/2011. 12. No caso, não há prova suficiente da incidência da causa de inexigibilidade de conduta diversa, concernente ao estado de necessidade. Além disso, não seria razoável se entender que tal situação de inexigibilidade de conduta diversa teria se protraído por quase três anos. 13. Apelação da defesa não provida.
Decisão
UNÂNIME

Data do Julgamento : 24/01/2019
Data da Publicação : 04/02/2019
Classe/Assunto : ACR - Apelação Criminal - 13505
Órgão Julgador : Terceira Turma
Relator(a) : Desembargador Federal Carlos Rebêlo Júnior
Comarca : TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Tipo : Acórdão
Referência legislativa : LEG-FED SUM-444 (STJ) - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED LEI-12234 ANO-2010 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ***** CPP-41 Codigo de Processo Penal LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-41 ART-156 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ***** CP-40 Codigo Penal LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-171 PAR-3 ART-71 ART-24 ART-313-A ART-110 PAR-1 ART-59
Fonte da publicação : DJE - Data::04/02/2019 - Página::44 - Nº::24
Mostrar discussão