TRF5 0008994-11.2016.4.05.8300 00089941120164058300
Penal e Processual Penal. Recursos dos acusados condenados pela prática de delito alojado no art. 171, parágrafo 3º, do Código Penal, por ter um dele requerido e obtido benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, utilizando-se, como falso, o
tempo de serviço prestado a empresa Conservadora Santa Clara, a teor de carteira de trabalho assinado, a destempo, pelo outro acusado.
O fato está marcado por extrema simplicidade - o apelante Antônio Carlson de Carvalho, munido de anotação falsa, inserta em sua carteira de trabalho, a registrar ter ingressado na empresa Conservadora Santa Clara em 2 de janeiro de 1999, não se
registrando a data de saída, cf. cópia de f. 80, do inquérito em apenso, munido de outros documentos de tempo de serviço e contribuição, pediu e obteve o benefício de aposentadoria rural.
Justamente é o tempo de serviço prestado à Conservadora Santa Clara que se cerca do ranço da falsidade. Dito acusado, ora apelante, apesar de ter confirmado a veracidade do tempo de serviço prestado a aludida empresa, na fase policial, f. 236, terminou,
em juízo, confessando a mentira, com as justificações devidas que a mídia de seu interrogatório revela.
Necessário ressaltar que o fato em si não é só um, isoladamente, constituindo-se em um a mais, em meio a outros tantos registros, considerados inautênticos, nos quais a empresa Conservadora Santa Clara figura como empregadora, merecendo, nesse sentido,
algumas citações para se ter uma visão exata do ambiente, no qual o apelante Antônio Carlson de Carvalho se situa, dentro da temática de se proceder comunicações de registros de trabalho serodiamente, a despertar a atenção do ente previdenciário.
Nessa perspectiva, o registro fático:
1) Na hipótese de se admitir como autênticos os vínculos empregatícios em análise, admitir-se-ia a possibilidade de um trabalhador permanecer, por aproximadamente 5 ou mais anos, continuamente como empregado de uma sociedade, sem a formalização de seu
registro e o cumprimento das exigências legais contidas nos dispositivos das legislações Trabalhista e Previdenciária, f. 37.
2) Pelo exposto, da análise das informações contidas nos diversos sistemas consultados e, diante da ausência de informações de GFIP/FGTS e de RAIS e, considerando-se que os vínculos empregatícios foram inseridos no sistema CNIC bastante tempo após a
data em que teria havido o desligamento do trabalhador, conclui-se pela não confirmação dos vínculos empregatícios relacionados no tem 3, Quadro I, que teriam sido mantidos com a empresa Conservadora Santa Clara Ltda. e que foram inseridos
irregularmente no sistema CNIS por meio de entrega de documentos de GFIP e/ou RAIS, de forma extemporânea, f. 40, idem.
3) Relatório de Informação Fiscal nº 009/2010, fls. 26 à 34, realizado nesta Representação da APEGR/PE, motivado pela suspeita de inserção irregular de vínculos fictícios de diversas empresas, concluiu pela não confirmação do vínculo firmado com a
Empresa Conservadora Santa Clara Ltda. De acordo com o relatório, o vínculo teria sido inserido no sistema CNIS, após a data em que teria havido o desligamento do trabalhador, bem como o fato de compreender período laborativo em que a Empresa já teria
paralisado suas atividades, f. 43, idem.
O apelante Antônio Carlson de Carvalho, no pedido de aposentadoria, indicou, como inautêntico, o período de 1 de janeiro de 1999 a 31 de julho de 2008, f. 244v., idem, como exercido na Conservadora Santa Clara, tendo recebido o benefício de 13 de
novembro de 2008 a 30 de junho de 2012, f. 212, idem, quando foi, enfim, cancelado. Acrescente-se que, mesmo residindo em Recife, o pedido de benefício foi requerido na agência previdenciária de Ribeirão, f. 236, idem, mesma agência em que outros
benefícios, também inautênticos, foram requeridos, f. 324 e 325, além de outros, pleiteados na agência previdenciária de Carpina, f. 326-328. Por fim, o apelante recebeu, no período já aludido, a quantia de R$ 77.191,65, f. 221, idem.
Não há, assim, dúvida alguma sobre o fato objeto do presente feito.
No centro deste, então, três figuras se destacam: uma, o apelante Antônio Carlson de Carvalho; a outra, o apelante Múcio José de Abreu e Lima da Cunha, responsável pela empresa Conservadora Santa Clara Ltda., e a terceira, Francisco de Assis, que
trabalhava na referida empresa, apontado pelo primeiro apelante como a pessoa que combinou com ele resolver o problema da aposentadoria, recebendo dezenove mil reais, para recolher aos cofres da Previdência Social, e, assim, regularizar a sua
documentação, garantindo, desta forma, o benefício buscado pelo mencionado apelante.
Acrescente-se, agora, o ponto nevrálgico de tudo: o noticiado falecimento de Francisco de Assis, f. 138, em data que não consta dos autos, não tendo sido ouvido, de modo que restam os dois apelantes, a direcionar sua artilharia de argumentos para o
defunto Francisco de Assis. Antônio Carlson de Carvalho aponta o morto como responsável por tudo, embora, em juízo, admita que sabia que estava agindo erradamente, forçado pelas circunstâncias da necessidade, idade avançada - já tinha sessenta e um anos
-, enquanto o apelante Múcio José de Abreu e Lima da Cunha se justifica, no destaque a confiança que depositava no finado Francisco de Assis, que trabalhava na mencionada Conservadora Santa Clara, não sendo possível, pelo número de empregados que tinha
em sua empresa, conhecer um por um, de forma que assinou a carteira de trabalho de Antônio Carlson de Carvalho sem conhecer a falsidade operada.
Algo fica claro: os acusados Antônio Carlson de Carvalho e Múcio José de Abreu e Lima da Cunha somente se viram duas vezes, na casa de Francisco de Assis, enquanto o segundo deles assegura não conhecer o primeiro.
A busca, agora, à míngua da palavra de Francisco de Assis, é no sentido de aquilatar a responsabilidade dos dois apelantes. O primeiro, Antônio Carlson de Carvalho, não resta dúvida alguma, sobretudo ao revelar em juízo que estava conscientemente agindo
errado. O segundo, Múcio José de Abreu e Lima da Cunha, no fato de ter assinado a carteira de trabalho do primeiro sem saber da falsidade do vínculo empregatício que autenticava como verdadeiro, ressaltando que eram tantos os contratos de trabalho que
passavam por suas mãos que não era possível conhecer todos os empregados.
Se o primeiro acusado estava plenamente consciente de trilhar caminho indevido, não há como acatar a inexistência de dolo em sua conduta. O dolo repousa, justamente, na consciência da ilicitude praticada, traduzida no registro de ter trabalho na empresa
Conservadora Santa Clara, quando, em verdade, lá nunca trabalhou. Ao aceitar essa situação, o acusado em apreço a forrou de todo o dolo devido, no seu requerimento instruído com parte de tempo de serviço, ou seja, o relativo a Conservadora Santa Clara,
absolutamente falso.
No que tange ao outro apelante, Múcio José de Abreu e Lima da Cunha, os argumentos hospedados no tópico - da estrutura e funcionamento da empresa conservadora Santa Clara e da ausência de demonstração da existência de dolo, f. 165, não resistem a uma
análise, porque o volume de serviço - centenas de contrato de trabalho na CTPS dos trabalhadores, ou assinar centenas de rescisões de contrato de trabalho de pessoas que nunca viu e no curto espaço de tempo que não o permitia, antes de assinar, conferir
se todas as condições foram satisfeitas, f. 166, - porque tal circunstância não justifica a assinatura, em 2008, contrato de trabalho lavrado nove anos antes, isto é, em 1999. O fato de ter confiado em Francisco de Assis não exclui a sua
responsabilidade, não tendo a confiança, enquanto elemento interno da empresa, forças para exercer qualquer influência na esfera penal. Depois, se cuidava de contrato assinado nove anos após, circunstância, aliás, que, por si só, despertou a atenção do
ente previdenciário, que, nos relatórios citados anteriormente, se deixa bem assentada. A confiança em Francisco de Assis estende seus efeitos dentro da empresa, não se mantendo nenhuma eficácia perante o ente previdenciário, tampouco sem carregar força
suficiente para excluir do mundo o delito de estelionato previdenciário. O apelante em apreço, com a sua confiança, ao assinar, terminou se contaminando com o vírus do dolo.
Por outro lado, os apontados erros do inquérito policial, f. 168, deveriam ter sido atroados na primeira manifestação do ora apelante, de modo que não alteram a verdade dos fatos, e, em assim sendo, o delito de estelionato permanece ativo. Não há,
assim, o que alterar, a propósito, na r. sentença.
Passa-se à revisão da dosimetria da pena.
Em relação ao acusado Antônio Carlson de Carvalho, a análise dos elementos alojados no art. 59, do Código Penal, deve ser parcialmente revista. No particular, em vista dos elementos contidos no caderno processual, não se sustenta a valoração negativa
das circunstâncias judiciais, na r. sentença, relativas à culpabilidade em grau intenso, circunstâncias e consequências (de elevada monta) do ilícito. Ora, na singularidade da conduta perpetrada por este corréu, não identifica o exame das mencionadas
circunstâncias uma maior expressão de censura, a motivar o aumento da pena na primeira fase, sendo as demais circunstâncias inerentes ou intrínsecas ao tipo penal, ou porque não justifica o aumento da pena. Portanto, reduz-se a pena-base, de dois anos,
para o mínimo legal previsto, de um ano de reclusão. Na segunda fase, inexiste circunstância agravante; por outra banda, não se abre espaço para a aplicação da atenuante de confissão do acusado, no caso, tendo em vista o óbice da Súmula 231, do Superior
Tribunal de Justiça, quanto à aplicação de circunstância que, nessa fase, possa reduzir a pena primária aquém do mínimo.
Por fim, acrescenta-se, na fração de um terço, a causa de aumento prevista no parágrafo 3º, do art. 171, para fixar a pena, em definitivo, em um ano e quatro meses de reclusão, a ser substituída por duas penas restritivas de direito, como, aliás, foi
aclamada na r. sentença.
Por outro lado, impende a revisão das reprimendas impostas ao réu Múcio José de Abreu e Lima da Cunha, por aplicar-se ao caso a hipótese de extensão do efeito devolutivo no processo penal, com o exame integral da matéria discutida na ação criminal.
Contra este corréu, a análise das circunstâncias judiciais comporta revisão, para se considerar a valoração negativa da culpabilidade em grau mediano, mantendo-se a análise contida na r. sentença quanto aos antecedentes, conduta social e personalidade.
As demais circunstâncias são inerentes ou intrínsecas ao tipo penal, ou porque não justificam o aumento da pena. Reduz-se, pois, a pena-base, para dois anos de reclusão. Inexiste circunstância agravante ou atenuante. Por fim, acrescentando-se a causa de
aumento, na fração de um terço, a teor do parágrafo 3º, do art. 171, fixa-se a pena, em definitivo, em dois anos e oito meses de reclusão, a ser cumprida inicialmente no regime aberto.
Quanto ao regime inicial para o cumprimento da pena corporal e a substituição desta, merece reparo o decisum esgrimido. O caso presente não destoa de outros, em que a situação factual dos acusados não desborda do convencional deslize no cometimento do
ilícito julgado. Não se colhe dos autos, do ponto de vista objetivo, elementos concretos a justificar, e a indicar, por si só, o óbice à aplicação de regime inicial de cumprimento da pena menos gravoso. Assim, em relação Múcio José de Abreu e Lima da
Cunha, fixa-se o regime inicialmente aberto para o cumprimento da pena privativa de liberdade, sendo cabível, por conseguinte, a substituição da pena corporal por duas restritivas de direitos, a serem definidas pelo juízo da execução.
Manutenção da sentença em seus demais termos, sobretudo, quanto à pena de multa aplicada, dentro dos parâmetros devidos da razoabilidade e de proporcionalidade, f. 150, e, inclusive, à míngua de qualquer inconformismo a respeito.
Parcial provimento aos apelos, nos termos já definidos.
Ementa
Penal e Processual Penal. Recursos dos acusados condenados pela prática de delito alojado no art. 171, parágrafo 3º, do Código Penal, por ter um dele requerido e obtido benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, utilizando-se, como falso, o
tempo de serviço prestado a empresa Conservadora Santa Clara, a teor de carteira de trabalho assinado, a destempo, pelo outro acusado.
O fato está marcado por extrema simplicidade - o apelante Antônio Carlson de Carvalho, munido de anotação falsa, inserta em sua carteira de trabalho, a registrar ter ingressado na empresa Conservadora Santa Clara em 2 de janeiro de 1999, não se
registrando a data de saída, cf. cópia de f. 80, do inquérito em apenso, munido de outros documentos de tempo de serviço e contribuição, pediu e obteve o benefício de aposentadoria rural.
Justamente é o tempo de serviço prestado à Conservadora Santa Clara que se cerca do ranço da falsidade. Dito acusado, ora apelante, apesar de ter confirmado a veracidade do tempo de serviço prestado a aludida empresa, na fase policial, f. 236, terminou,
em juízo, confessando a mentira, com as justificações devidas que a mídia de seu interrogatório revela.
Necessário ressaltar que o fato em si não é só um, isoladamente, constituindo-se em um a mais, em meio a outros tantos registros, considerados inautênticos, nos quais a empresa Conservadora Santa Clara figura como empregadora, merecendo, nesse sentido,
algumas citações para se ter uma visão exata do ambiente, no qual o apelante Antônio Carlson de Carvalho se situa, dentro da temática de se proceder comunicações de registros de trabalho serodiamente, a despertar a atenção do ente previdenciário.
Nessa perspectiva, o registro fático:
1) Na hipótese de se admitir como autênticos os vínculos empregatícios em análise, admitir-se-ia a possibilidade de um trabalhador permanecer, por aproximadamente 5 ou mais anos, continuamente como empregado de uma sociedade, sem a formalização de seu
registro e o cumprimento das exigências legais contidas nos dispositivos das legislações Trabalhista e Previdenciária, f. 37.
2) Pelo exposto, da análise das informações contidas nos diversos sistemas consultados e, diante da ausência de informações de GFIP/FGTS e de RAIS e, considerando-se que os vínculos empregatícios foram inseridos no sistema CNIC bastante tempo após a
data em que teria havido o desligamento do trabalhador, conclui-se pela não confirmação dos vínculos empregatícios relacionados no tem 3, Quadro I, que teriam sido mantidos com a empresa Conservadora Santa Clara Ltda. e que foram inseridos
irregularmente no sistema CNIS por meio de entrega de documentos de GFIP e/ou RAIS, de forma extemporânea, f. 40, idem.
3) Relatório de Informação Fiscal nº 009/2010, fls. 26 à 34, realizado nesta Representação da APEGR/PE, motivado pela suspeita de inserção irregular de vínculos fictícios de diversas empresas, concluiu pela não confirmação do vínculo firmado com a
Empresa Conservadora Santa Clara Ltda. De acordo com o relatório, o vínculo teria sido inserido no sistema CNIS, após a data em que teria havido o desligamento do trabalhador, bem como o fato de compreender período laborativo em que a Empresa já teria
paralisado suas atividades, f. 43, idem.
O apelante Antônio Carlson de Carvalho, no pedido de aposentadoria, indicou, como inautêntico, o período de 1 de janeiro de 1999 a 31 de julho de 2008, f. 244v., idem, como exercido na Conservadora Santa Clara, tendo recebido o benefício de 13 de
novembro de 2008 a 30 de junho de 2012, f. 212, idem, quando foi, enfim, cancelado. Acrescente-se que, mesmo residindo em Recife, o pedido de benefício foi requerido na agência previdenciária de Ribeirão, f. 236, idem, mesma agência em que outros
benefícios, também inautênticos, foram requeridos, f. 324 e 325, além de outros, pleiteados na agência previdenciária de Carpina, f. 326-328. Por fim, o apelante recebeu, no período já aludido, a quantia de R$ 77.191,65, f. 221, idem.
Não há, assim, dúvida alguma sobre o fato objeto do presente feito.
No centro deste, então, três figuras se destacam: uma, o apelante Antônio Carlson de Carvalho; a outra, o apelante Múcio José de Abreu e Lima da Cunha, responsável pela empresa Conservadora Santa Clara Ltda., e a terceira, Francisco de Assis, que
trabalhava na referida empresa, apontado pelo primeiro apelante como a pessoa que combinou com ele resolver o problema da aposentadoria, recebendo dezenove mil reais, para recolher aos cofres da Previdência Social, e, assim, regularizar a sua
documentação, garantindo, desta forma, o benefício buscado pelo mencionado apelante.
Acrescente-se, agora, o ponto nevrálgico de tudo: o noticiado falecimento de Francisco de Assis, f. 138, em data que não consta dos autos, não tendo sido ouvido, de modo que restam os dois apelantes, a direcionar sua artilharia de argumentos para o
defunto Francisco de Assis. Antônio Carlson de Carvalho aponta o morto como responsável por tudo, embora, em juízo, admita que sabia que estava agindo erradamente, forçado pelas circunstâncias da necessidade, idade avançada - já tinha sessenta e um anos
-, enquanto o apelante Múcio José de Abreu e Lima da Cunha se justifica, no destaque a confiança que depositava no finado Francisco de Assis, que trabalhava na mencionada Conservadora Santa Clara, não sendo possível, pelo número de empregados que tinha
em sua empresa, conhecer um por um, de forma que assinou a carteira de trabalho de Antônio Carlson de Carvalho sem conhecer a falsidade operada.
Algo fica claro: os acusados Antônio Carlson de Carvalho e Múcio José de Abreu e Lima da Cunha somente se viram duas vezes, na casa de Francisco de Assis, enquanto o segundo deles assegura não conhecer o primeiro.
A busca, agora, à míngua da palavra de Francisco de Assis, é no sentido de aquilatar a responsabilidade dos dois apelantes. O primeiro, Antônio Carlson de Carvalho, não resta dúvida alguma, sobretudo ao revelar em juízo que estava conscientemente agindo
errado. O segundo, Múcio José de Abreu e Lima da Cunha, no fato de ter assinado a carteira de trabalho do primeiro sem saber da falsidade do vínculo empregatício que autenticava como verdadeiro, ressaltando que eram tantos os contratos de trabalho que
passavam por suas mãos que não era possível conhecer todos os empregados.
Se o primeiro acusado estava plenamente consciente de trilhar caminho indevido, não há como acatar a inexistência de dolo em sua conduta. O dolo repousa, justamente, na consciência da ilicitude praticada, traduzida no registro de ter trabalho na empresa
Conservadora Santa Clara, quando, em verdade, lá nunca trabalhou. Ao aceitar essa situação, o acusado em apreço a forrou de todo o dolo devido, no seu requerimento instruído com parte de tempo de serviço, ou seja, o relativo a Conservadora Santa Clara,
absolutamente falso.
No que tange ao outro apelante, Múcio José de Abreu e Lima da Cunha, os argumentos hospedados no tópico - da estrutura e funcionamento da empresa conservadora Santa Clara e da ausência de demonstração da existência de dolo, f. 165, não resistem a uma
análise, porque o volume de serviço - centenas de contrato de trabalho na CTPS dos trabalhadores, ou assinar centenas de rescisões de contrato de trabalho de pessoas que nunca viu e no curto espaço de tempo que não o permitia, antes de assinar, conferir
se todas as condições foram satisfeitas, f. 166, - porque tal circunstância não justifica a assinatura, em 2008, contrato de trabalho lavrado nove anos antes, isto é, em 1999. O fato de ter confiado em Francisco de Assis não exclui a sua
responsabilidade, não tendo a confiança, enquanto elemento interno da empresa, forças para exercer qualquer influência na esfera penal. Depois, se cuidava de contrato assinado nove anos após, circunstância, aliás, que, por si só, despertou a atenção do
ente previdenciário, que, nos relatórios citados anteriormente, se deixa bem assentada. A confiança em Francisco de Assis estende seus efeitos dentro da empresa, não se mantendo nenhuma eficácia perante o ente previdenciário, tampouco sem carregar força
suficiente para excluir do mundo o delito de estelionato previdenciário. O apelante em apreço, com a sua confiança, ao assinar, terminou se contaminando com o vírus do dolo.
Por outro lado, os apontados erros do inquérito policial, f. 168, deveriam ter sido atroados na primeira manifestação do ora apelante, de modo que não alteram a verdade dos fatos, e, em assim sendo, o delito de estelionato permanece ativo. Não há,
assim, o que alterar, a propósito, na r. sentença.
Passa-se à revisão da dosimetria da pena.
Em relação ao acusado Antônio Carlson de Carvalho, a análise dos elementos alojados no art. 59, do Código Penal, deve ser parcialmente revista. No particular, em vista dos elementos contidos no caderno processual, não se sustenta a valoração negativa
das circunstâncias judiciais, na r. sentença, relativas à culpabilidade em grau intenso, circunstâncias e consequências (de elevada monta) do ilícito. Ora, na singularidade da conduta perpetrada por este corréu, não identifica o exame das mencionadas
circunstâncias uma maior expressão de censura, a motivar o aumento da pena na primeira fase, sendo as demais circunstâncias inerentes ou intrínsecas ao tipo penal, ou porque não justifica o aumento da pena. Portanto, reduz-se a pena-base, de dois anos,
para o mínimo legal previsto, de um ano de reclusão. Na segunda fase, inexiste circunstância agravante; por outra banda, não se abre espaço para a aplicação da atenuante de confissão do acusado, no caso, tendo em vista o óbice da Súmula 231, do Superior
Tribunal de Justiça, quanto à aplicação de circunstância que, nessa fase, possa reduzir a pena primária aquém do mínimo.
Por fim, acrescenta-se, na fração de um terço, a causa de aumento prevista no parágrafo 3º, do art. 171, para fixar a pena, em definitivo, em um ano e quatro meses de reclusão, a ser substituída por duas penas restritivas de direito, como, aliás, foi
aclamada na r. sentença.
Por outro lado, impende a revisão das reprimendas impostas ao réu Múcio José de Abreu e Lima da Cunha, por aplicar-se ao caso a hipótese de extensão do efeito devolutivo no processo penal, com o exame integral da matéria discutida na ação criminal.
Contra este corréu, a análise das circunstâncias judiciais comporta revisão, para se considerar a valoração negativa da culpabilidade em grau mediano, mantendo-se a análise contida na r. sentença quanto aos antecedentes, conduta social e personalidade.
As demais circunstâncias são inerentes ou intrínsecas ao tipo penal, ou porque não justificam o aumento da pena. Reduz-se, pois, a pena-base, para dois anos de reclusão. Inexiste circunstância agravante ou atenuante. Por fim, acrescentando-se a causa de
aumento, na fração de um terço, a teor do parágrafo 3º, do art. 171, fixa-se a pena, em definitivo, em dois anos e oito meses de reclusão, a ser cumprida inicialmente no regime aberto.
Quanto ao regime inicial para o cumprimento da pena corporal e a substituição desta, merece reparo o decisum esgrimido. O caso presente não destoa de outros, em que a situação factual dos acusados não desborda do convencional deslize no cometimento do
ilícito julgado. Não se colhe dos autos, do ponto de vista objetivo, elementos concretos a justificar, e a indicar, por si só, o óbice à aplicação de regime inicial de cumprimento da pena menos gravoso. Assim, em relação Múcio José de Abreu e Lima da
Cunha, fixa-se o regime inicialmente aberto para o cumprimento da pena privativa de liberdade, sendo cabível, por conseguinte, a substituição da pena corporal por duas restritivas de direitos, a serem definidas pelo juízo da execução.
Manutenção da sentença em seus demais termos, sobretudo, quanto à pena de multa aplicada, dentro dos parâmetros devidos da razoabilidade e de proporcionalidade, f. 150, e, inclusive, à míngua de qualquer inconformismo a respeito.
Parcial provimento aos apelos, nos termos já definidos.Decisão
UNÂNIME
Data do Julgamento
:
08/01/2019
Data da Publicação
:
14/01/2019
Classe/Assunto
:
ACR - Apelação Criminal - 14984
Órgão Julgador
:
Segunda Turma
Relator(a)
:
Desembargador Federal Vladimir Carvalho
Comarca
:
TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
LEG-FED SUM-231 (STJ)
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
***** CP-40 Codigo Penal
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-171 PAR-3 ART-59
Fonte da publicação
:
DJE - Data::14/01/2019 - Página::51 - Nº::9
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