TRF5 00247723519994058100
PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. APELAÇÃO. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. CONTRATO DE MÚTUO HABITACIONAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DE PEDIDOS, UM DOS QUAIS, CONTUDO, NÃO FORMULADO. JULGAMENTO ULTRA PETITA. DECOTE DO EXCESSO. REVISÃO. ANATOCISMO. CONFIGURAÇÃO. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO.
1. Recurso interposto contra sentença de invalidação de procedimento de execução extrajudicial de imóvel e de parcial procedência do pedido revisional, exarada em ação ordinária de revisão de contrato de mútuo habitacional, firmado no âmbito do SFH.
2. Procede a alegação da apelante de nulidade parcial da sentença. A parte autora não pediu o reconhecimento da invalidade de procedimento de execução extrajudicial - que, pelo que dos autos consta, em verdade, não ocorreu. Não poderia, a sentença, ter deferido pleito que inexistiu, sublinhando-se, inclusive, que o número constante do dispositivo sentencial não é o do contrato discutido. Provimento da apelação nesse ponto, para, ante sentença ultra petita, determinar o decote do excesso identificado.
3. Não merece conhecimento, por manifesta ausência de interesse processual, a parte da apelação na qual se investiu contra trechos da sentença que foram favoráveis à recorrente (o Juízo a quo declarou a inexistência de descumprimento ao PES/CP no reajuste das prestações, disse da legalidade da aplicação da TR para reajuste do saldo devedor e afirmou não haver nenhuma abusividade na aplicação das taxas de juros).
Também não merece conhecimento a apelação, em relação à sistemática temporal adotada para a amortização do saldo devedor, porquanto não foi formulado na inicial, nem examinado pela sentença, pedido relativo a tal procedimento. Não conhecimento da apelação nesses pontos.
4. O SFH foi criado com vistas a estimular a construção de habitações de interesse social e a possibilitar a aquisição da casa própria pelas classes da população que percebiam menor renda e que, portanto, não tinham condições de recorrer à iniciativa privada. O SFH foi fundado no direito à moradia, agasalhado esse pela Constituição Federal como direito social, necessidade premente do trabalhador. Consoante se apreende da evolução normativa da matéria, ao SFH se confere conotação nitidamente social (decorrente de sua finalidade), sendo a ele inerente o equilíbrio que deve permear a relação entre a renda do mutuário e as prestações do financiamento.
5. O princípio do pacta sunt servanda deve ser interpretado de forma harmônica com as outras normas jurídicas que integram o ordenamento, impondo-se o seu sopeso, inclusive e especialmente, diante do escopo do negócio jurídico ajustado.
6. O CDC é aplicável aos contratos de mútuo celebrados sob o regramento do SFH.
7. O anatocismo é vedado, salvo nas hipóteses expressamente permitidas por lei, o que não é o caso do SFH. Constatado o anatocismo, in casu, mormente pela existência de amortização negativa, impõe-se sua supressão. "O Sistema Francês de Amortização, Tabela Price, não prevê, a priori, incidência de juros sobre juros. Todavia, na hipótese de o valor da prestação ser insuficiente para cobrir a parcela relativa aos juros, pode ocorrer de o resíduo não pago ser incorporado ao saldo devedor e sobre ele virem a incidir os juros da parcela subseqüente, configurando-se anatocismo, vedado em nosso sistema jurídico./Assim, para evitar a cobrança de juros sobre juros, os Tribunais pátrios passaram a determinar que o quantum devido a título de juros não amortizados fosse lançado em conta separada, sujeita somente à correção monetária. Tal providência não ofende o ordenamento jurídico brasileiro" (STJ, AgRg no REsp 1070224/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/03/2010, DJe 18/03/2010). Apelação não provida nesse tocante.
8. O montante pago a maior deve ser dirigido à quitação das prestações em atraso, se houver, e, se ainda assim houver sobra, ao pagamento das prestações vincendas e à amortização do saldo devedor, nessa ordem, não havendo que se falar em restituição.
9. Sucumbência recíproca mantida, por estar configurada a hipótese do art. 21, do CPC.
10. Apelação parcialmente provida, na parte conhecida, apenas para afastar da condenação a declaração de nulidade de procedimento de execução extrajudicial.
(PROCESSO: 00247723519994058100, AC493738/CE, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO CAVALCANTI, Primeira Turma, JULGAMENTO: 17/06/2010, PUBLICAÇÃO: DJE 05/07/2010 - Página 21)
Ementa
PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. APELAÇÃO. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. CONTRATO DE MÚTUO HABITACIONAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DE PEDIDOS, UM DOS QUAIS, CONTUDO, NÃO FORMULADO. JULGAMENTO ULTRA PETITA. DECOTE DO EXCESSO. REVISÃO. ANATOCISMO. CONFIGURAÇÃO. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO.
1. Recurso interposto contra sentença de invalidação de procedimento de execução extrajudicial de imóvel e de parcial procedência do pedido revisional, exarada em ação ordinária de revisão de contrato de mútuo habitacional, firmado no âmbito do SFH.
2. Procede a alegação da apelante de nulidade parcial da sentença. A parte autora não pediu o reconhecimento da invalidade de procedimento de execução extrajudicial - que, pelo que dos autos consta, em verdade, não ocorreu. Não poderia, a sentença, ter deferido pleito que inexistiu, sublinhando-se, inclusive, que o número constante do dispositivo sentencial não é o do contrato discutido. Provimento da apelação nesse ponto, para, ante sentença ultra petita, determinar o decote do excesso identificado.
3. Não merece conhecimento, por manifesta ausência de interesse processual, a parte da apelação na qual se investiu contra trechos da sentença que foram favoráveis à recorrente (o Juízo a quo declarou a inexistência de descumprimento ao PES/CP no reajuste das prestações, disse da legalidade da aplicação da TR para reajuste do saldo devedor e afirmou não haver nenhuma abusividade na aplicação das taxas de juros).
Também não merece conhecimento a apelação, em relação à sistemática temporal adotada para a amortização do saldo devedor, porquanto não foi formulado na inicial, nem examinado pela sentença, pedido relativo a tal procedimento. Não conhecimento da apelação nesses pontos.
4. O SFH foi criado com vistas a estimular a construção de habitações de interesse social e a possibilitar a aquisição da casa própria pelas classes da população que percebiam menor renda e que, portanto, não tinham condições de recorrer à iniciativa privada. O SFH foi fundado no direito à moradia, agasalhado esse pela Constituição Federal como direito social, necessidade premente do trabalhador. Consoante se apreende da evolução normativa da matéria, ao SFH se confere conotação nitidamente social (decorrente de sua finalidade), sendo a ele inerente o equilíbrio que deve permear a relação entre a renda do mutuário e as prestações do financiamento.
5. O princípio do pacta sunt servanda deve ser interpretado de forma harmônica com as outras normas jurídicas que integram o ordenamento, impondo-se o seu sopeso, inclusive e especialmente, diante do escopo do negócio jurídico ajustado.
6. O CDC é aplicável aos contratos de mútuo celebrados sob o regramento do SFH.
7. O anatocismo é vedado, salvo nas hipóteses expressamente permitidas por lei, o que não é o caso do SFH. Constatado o anatocismo, in casu, mormente pela existência de amortização negativa, impõe-se sua supressão. "O Sistema Francês de Amortização, Tabela Price, não prevê, a priori, incidência de juros sobre juros. Todavia, na hipótese de o valor da prestação ser insuficiente para cobrir a parcela relativa aos juros, pode ocorrer de o resíduo não pago ser incorporado ao saldo devedor e sobre ele virem a incidir os juros da parcela subseqüente, configurando-se anatocismo, vedado em nosso sistema jurídico./Assim, para evitar a cobrança de juros sobre juros, os Tribunais pátrios passaram a determinar que o quantum devido a título de juros não amortizados fosse lançado em conta separada, sujeita somente à correção monetária. Tal providência não ofende o ordenamento jurídico brasileiro" (STJ, AgRg no REsp 1070224/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/03/2010, DJe 18/03/2010). Apelação não provida nesse tocante.
8. O montante pago a maior deve ser dirigido à quitação das prestações em atraso, se houver, e, se ainda assim houver sobra, ao pagamento das prestações vincendas e à amortização do saldo devedor, nessa ordem, não havendo que se falar em restituição.
9. Sucumbência recíproca mantida, por estar configurada a hipótese do art. 21, do CPC.
10. Apelação parcialmente provida, na parte conhecida, apenas para afastar da condenação a declaração de nulidade de procedimento de execução extrajudicial.
(PROCESSO: 00247723519994058100, AC493738/CE, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO CAVALCANTI, Primeira Turma, JULGAMENTO: 17/06/2010, PUBLICAÇÃO: DJE 05/07/2010 - Página 21)
Data do Julgamento
:
17/06/2010
Classe/Assunto
:
Apelação Civel - AC493738/CE
Órgão Julgador
:
Primeira Turma
Relator(a)
:
Desembargador Federal Francisco Cavalcanti
Comarca
:
Tribunal Regional Federal - 5ª Região
Código do documento
:
231549
PublicaÇÕes
:
Diário da Justiça Eletrônico TRF5 (DJE) - 05/07/2010 - Página 21
DecisÃo
:
UNÂNIME
Veja tambÉm
:
AgRg no REsp 1070224/RS (STJ)RESP 838372/RS (STJ)
ReferÊncias legislativas
:
CPC-73 Código de Processo Civil LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-21
LEG-FED SUM-5 (STJ)
LEG-FED SUM-7 (STJ)
Votantes
:
Desembargador Federal José Maria Lucena
Desembargador Federal Francisco Cavalcanti
Desembargador Federal Rogério Fialho Moreira