TRF5 200081000160205
DIREITO AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA TUTELA DO MEIO AMBIENTE. OBRIGAÇÕES DE FAZER, DE NÃO FAZER E DE PAGAR QUANTIA. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE PEDIDOS ART. 3º DA LEI 7.347/85. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA. CONDENAÇÃO PARA RECOMPOR O DANO AMBIENTAL CAUSADO E AO PAGAMENTO DE UMA INDENIZAÇÃO PELOS DANOS ECOLÓGICOS .
1. Cuida-se de apelações interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e por JAIME VERAS SILVA FILHO, contra a sentença do Juízo da 18ª Vara da Seção Judiciária do Ceará, que, em ação civil pública, condenou o Réu a recompor o dano ambiental causado, inclusive mediante o replantio, às suas próprias expensas, de cinquenta coqueiros sadios e aferidos pelo IBAMA na área desta ação (art. 3º, Lei nº 7.347/85), no prazo de trinta dias, a contar da efetiva intimação para o cumprimento da obrigação de fazer, sob pena de pagamento de multa diária no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais). O Douto magistrado a quo impôs a condenação do replantio, mas afastou o outro pedido formulado pelo MPF no sentido de, cumulativamente à obrigação de recompor o dano ambiental, condenar o réu ao pagamento de uma indenização pelos danos ecológicos causados. Entendeu o juiz sentenciante que não seria possível, em sede de ação civil pública, cumular obrigação de fazer ou não fazer com a de pagar, diante da inteligência do art. 3º da Lei nº 7.347/85.
2. "A exegese do art. 3º da Lei 7.347/85 ("A ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer"), a conjunção "ou" deve ser considerada com o sentido de adição (permitindo, com a cumulação dos pedidos, a tutela integral do meio ambiente) e não o de alternativa excludente (o que tornaria a ação civil pública instrumento inadequado a seus fins)." (REsp 625.249/PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, DJ 31/08/2006).
3. É possível a condenação cumulativa em obrigação de fazer ou não fazer e de pagar, sobretudo porque, em matéria ambiental, tal cumulação mostra-se ainda mais premente, em virtude do dano moral provocado à coletividade atingida pela devastação ecológica, tendo esse tipo de dano natureza peculiar, sendo de difícil reparação e mensuração, pelo que a condenação em dinheiro, se não consegue corresponder exatamente aos recursos naturais destruídos, no mínimo, desempenha um caráter educativo de intimidação à prática de ações similares. Portanto, a exegese dada pelo juízo é limitativa e não merece prevalecer, sob pena de se deturpar até mesmo o instituto da ação civil pública, que comporta não apenas condenação em prestações pessoais, positivas e negativas (fazer e não fazer), como também de pagar quantia, através de indenização dos danos insuscetíveis de recomposição "in natura".
4. A natureza do dano ambiental, porque diz respeito a um interesse difuso intangível, exige, além da reparação material - se possível de restituição à situação anterior - a reparação moral coletiva, porque não se atinge uma única esfera jurídica, mas um direito compartilhado transindividualmente por todos os cidadãos. Por isso é que é plenamente possível a condenação em indenização por dano moral coletivo, até porque existe previsão normativa expressa sobre a possibilidade de dano extrapatrimonial em relação a coletividades, consoante se depreende da parte final do artigo 1º da Lei nº 7.347/85.
5. O fato de o Município de Barroquinha/CE haver obtido cessão, pela Secretaria do Patrimônio da União, para usufruir do domínio útil da área onde ocorreu o indevido desmatamento, por óbvio, não lhe permitia fazer intervenções desastrosas na vegetação da região, sem que os órgãos ambientais competentes fossem acionados para se manifestar, procedendo, antes, a estudos prévios de impacto ambiental, até porque a localidade está inserida na Área de Preservação Ambiental do Delta do Parnaíba, região em que são proibidas as atividades de implementação de projeto de urbanização. Além disso, não se admitiria que o próprio poder público, no caso representado pela Prefeitura de Barroquinha, na pessoa do seu Prefeito, ora réu, pudesse ignorar a lei e, sob essa alegação, descumpri-la. Tanto isso não seria admissível que o réu sequer invoca esse argumento. Em terceiro lugar, a simples "destinação social" do empreendimento que seria e não foi construído no local devastado, alegada pelo réu, já que a área seria usada para a construção de um Complexo Esportivo de uso comum da população local, de qualquer forma não teria o condão de desconstituir o dano ambiental causado, nem tampouco tornaria lícita a conduta praticada, porque imprescindíveis as licenças ambientais para a empreitada.
6. Afigura-se razoável se fixar uma multa no valor de 500 (quinhentas) UFIR's - Unidades Fiscais de Referência, com fulcro no art. 14, I, da Lei nº 6.938/1981, tento em vista que o Réu ainda foi condenado a reparar o dano ambiental provocado. Precedente deste Tribunal: (TRF-5ª R. - AC 411197/CE - 1ª T. - Rel. Des. Fed. José Maria de Oliveira Lucena - DJe 29.05.2009)
7. Apelação do MPF provida, para o fim de ser o Réu condenado a pagar uma indenização pelo dano ambiental causado, no valor de 500 (quinhentas) UFIR's. Apelação do Réu improvida. Mantida a sentença recorrida em todos os seus demais termos.
(PROCESSO: 200081000160205, AC431925/CE, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO BARROS DIAS, Segunda Turma, JULGAMENTO: 25/08/2009, PUBLICAÇÃO: DJE 15/09/2009 - Página 180)
Ementa
DIREITO AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA TUTELA DO MEIO AMBIENTE. OBRIGAÇÕES DE FAZER, DE NÃO FAZER E DE PAGAR QUANTIA. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE PEDIDOS ART. 3º DA LEI 7.347/85. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA. CONDENAÇÃO PARA RECOMPOR O DANO AMBIENTAL CAUSADO E AO PAGAMENTO DE UMA INDENIZAÇÃO PELOS DANOS ECOLÓGICOS .
1. Cuida-se de apelações interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e por JAIME VERAS SILVA FILHO, contra a sentença do Juízo da 18ª Vara da Seção Judiciária do Ceará, que, em ação civil pública, condenou o Réu a recompor o dano ambiental causado, inclusive mediante o replantio, às suas próprias expensas, de cinquenta coqueiros sadios e aferidos pelo IBAMA na área desta ação (art. 3º, Lei nº 7.347/85), no prazo de trinta dias, a contar da efetiva intimação para o cumprimento da obrigação de fazer, sob pena de pagamento de multa diária no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais). O Douto magistrado a quo impôs a condenação do replantio, mas afastou o outro pedido formulado pelo MPF no sentido de, cumulativamente à obrigação de recompor o dano ambiental, condenar o réu ao pagamento de uma indenização pelos danos ecológicos causados. Entendeu o juiz sentenciante que não seria possível, em sede de ação civil pública, cumular obrigação de fazer ou não fazer com a de pagar, diante da inteligência do art. 3º da Lei nº 7.347/85.
2. "A exegese do art. 3º da Lei 7.347/85 ("A ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer"), a conjunção "ou" deve ser considerada com o sentido de adição (permitindo, com a cumulação dos pedidos, a tutela integral do meio ambiente) e não o de alternativa excludente (o que tornaria a ação civil pública instrumento inadequado a seus fins)." (REsp 625.249/PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, DJ 31/08/2006).
3. É possível a condenação cumulativa em obrigação de fazer ou não fazer e de pagar, sobretudo porque, em matéria ambiental, tal cumulação mostra-se ainda mais premente, em virtude do dano moral provocado à coletividade atingida pela devastação ecológica, tendo esse tipo de dano natureza peculiar, sendo de difícil reparação e mensuração, pelo que a condenação em dinheiro, se não consegue corresponder exatamente aos recursos naturais destruídos, no mínimo, desempenha um caráter educativo de intimidação à prática de ações similares. Portanto, a exegese dada pelo juízo é limitativa e não merece prevalecer, sob pena de se deturpar até mesmo o instituto da ação civil pública, que comporta não apenas condenação em prestações pessoais, positivas e negativas (fazer e não fazer), como também de pagar quantia, através de indenização dos danos insuscetíveis de recomposição "in natura".
4. A natureza do dano ambiental, porque diz respeito a um interesse difuso intangível, exige, além da reparação material - se possível de restituição à situação anterior - a reparação moral coletiva, porque não se atinge uma única esfera jurídica, mas um direito compartilhado transindividualmente por todos os cidadãos. Por isso é que é plenamente possível a condenação em indenização por dano moral coletivo, até porque existe previsão normativa expressa sobre a possibilidade de dano extrapatrimonial em relação a coletividades, consoante se depreende da parte final do artigo 1º da Lei nº 7.347/85.
5. O fato de o Município de Barroquinha/CE haver obtido cessão, pela Secretaria do Patrimônio da União, para usufruir do domínio útil da área onde ocorreu o indevido desmatamento, por óbvio, não lhe permitia fazer intervenções desastrosas na vegetação da região, sem que os órgãos ambientais competentes fossem acionados para se manifestar, procedendo, antes, a estudos prévios de impacto ambiental, até porque a localidade está inserida na Área de Preservação Ambiental do Delta do Parnaíba, região em que são proibidas as atividades de implementação de projeto de urbanização. Além disso, não se admitiria que o próprio poder público, no caso representado pela Prefeitura de Barroquinha, na pessoa do seu Prefeito, ora réu, pudesse ignorar a lei e, sob essa alegação, descumpri-la. Tanto isso não seria admissível que o réu sequer invoca esse argumento. Em terceiro lugar, a simples "destinação social" do empreendimento que seria e não foi construído no local devastado, alegada pelo réu, já que a área seria usada para a construção de um Complexo Esportivo de uso comum da população local, de qualquer forma não teria o condão de desconstituir o dano ambiental causado, nem tampouco tornaria lícita a conduta praticada, porque imprescindíveis as licenças ambientais para a empreitada.
6. Afigura-se razoável se fixar uma multa no valor de 500 (quinhentas) UFIR's - Unidades Fiscais de Referência, com fulcro no art. 14, I, da Lei nº 6.938/1981, tento em vista que o Réu ainda foi condenado a reparar o dano ambiental provocado. Precedente deste Tribunal: (TRF-5ª R. - AC 411197/CE - 1ª T. - Rel. Des. Fed. José Maria de Oliveira Lucena - DJe 29.05.2009)
7. Apelação do MPF provida, para o fim de ser o Réu condenado a pagar uma indenização pelo dano ambiental causado, no valor de 500 (quinhentas) UFIR's. Apelação do Réu improvida. Mantida a sentença recorrida em todos os seus demais termos.
(PROCESSO: 200081000160205, AC431925/CE, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO BARROS DIAS, Segunda Turma, JULGAMENTO: 25/08/2009, PUBLICAÇÃO: DJE 15/09/2009 - Página 180)
Data do Julgamento
:
25/08/2009
Classe/Assunto
:
Apelação Civel - AC431925/CE
Órgão Julgador
:
Segunda Turma
Relator(a)
:
Desembargador Federal Francisco Barros Dias
Comarca
:
Tribunal Regional Federal - 5ª Região
Código do documento
:
198230
PublicaÇÕes
:
Diário da Justiça Eletrônico TRF5 (DJE) - 15/09/2009 - Página 180
DecisÃo
:
UNÂNIME
Veja tambÉm
:
REsp 625249/PR (STJ)REsp 605323/MG (STJ)AC 411197/CE (TRF5)
Doutrinas
:
Obra: Ação civil pública e o dano moral coletivo, Revista de Direito do Consumidor, v. 25, p. 81. São Paulo: RT Editora, 1998.
Autor: André de Carvalho Ramos
Obraautor:
:
Do dano moral coletivo no atual contexto jurídico brasileiro. Revista de Direito do Consumidor. v.12, p. 50. São Paulo: RT Editora, 1994.
Carlos Alberto Bittar Filho
ReferÊncias legislativas
:
LEG-FED LEI-7347 ANO-1985 ART-3 ART-5 ART-1 INC-1
CF-88 Constituição Federal de 1988 ART-225 PAR-3 ART-129 INC-3
LEG-FED LEI-6938 ANO-1981 ART-2 ART-4 ART-14 INC-1
LEG-FED LEI-8625 ANO-1993 ART-25 INC-4
CDC-90 Código de Defesa do Consumidor LEG-FED LEI-8078 ANO-1990 ART-83
LEG-FED LEI-8884 ANO-1994
Votantes
:
Desembargador Federal Francisco Barros Dias
Desembargador Federal Paulo Gadelha
Desembargador Federal Francisco Wildo
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