main-banner

Jurisprudência


TRF5 200280000093090

Ementa
CIVIL. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO - SFH. CONTRATO DE MÚTUO HABITACIONAL. REVISÃO. 1. Apelação interposta pelo mutuário contra sentença de improcedência proferida nos autos de ação ordinária de revisão de contrato de mútuo habitacional, firmado no âmbito do SFH. 2. Não merece conhecimento o agravo retido, interposto contra decisão de indeferimento de tutela antecipada, quando o recorrente não pede o seu conhecimento nas razões de apelação. Não conhecimento do agravo retido. 3. O SFH foi criado com vistas a estimular a construção de habitações de interesse social e a possibilitar a aquisição da casa própria pelas classes da população que percebiam menor renda e que, portanto, não tinham condições de recorrer à iniciativa privada. 4. O SFH foi fundado no direito à moradia, agasalhado esse pela Constituição Federal como direito social, necessidade premente do trabalhador. Trata-se de reconhecer a habitação como direito inerente à condição humana, habitação como refúgio e como permissivo da inserção do indivíduo no convívio social. Consoante se apreende da evolução normativa da matéria, ao SFH se confere conotação nitidamente social (decorrente de sua finalidade), sendo a ele inerente o equilíbrio que deve permear a relação entre a renda do mutuário e as prestações do financiamento. 5. O princípio do pacta sunt servanda deve ser interpretado de forma harmônica com as outras normas jurídicas que integram o ordenamento, impondo-se o seu sopeso, inclusive e especialmente, diante do escopo do negócio jurídico ajustado. 6. "Consoante entendimento jurisprudencial é aplicável o CDC aos contratos de mútuo hipotecário pelo SFH" (STJ, Quarta Turma, RESP 838372/RS, Rel. Min. Fernando Gonçalves, j. em 06.12.2007). 7. A sentença entendeu pela inexistência do descumprimento do PES/CP pactuado. O mutuário insiste que a CEF não respeitou os índices de reajuste da categoria profissional, afirmando que, para o fim em questão, não se poderiam considerar as vantagens pessoais de que ele seria titular. Conforme se depreende dos autos, a primeira perícia realizada concluiu, contra a CEF, pelo descompasso entre os percentuais de correção das prestações e os de reajustamento da categoria profissional do mutuário, mas, posteriormente, com a juntada dos contra-cheques do mutuário paradigma, ficou dito, em nova perícia, que a instituição financeira não teria ultrapassado os limites contratualmente impostos, em vista das vantagens pessoais de titularidade do mutuário (valor bruto dos contra-cheques). O PES/CP traça os limites a serem observados para efeito de promoção de reajustes das prestações nos contratos do SFH, não admitindo que tais prestações sejam majoradas em percentual superior ao fixado para a categoria profissional. Admitir que a incorporação de vantagens pessoais aos contra-cheques dos mutuários implique em majoração das prestações seria equivalente a atribuir efeitos de imposto de renda ao critério de reajustamento, com o que não se pode concordar. Provimento da apelação, nesse ponto. 8. O mutuário insiste que o valor do seguro está em descompasso com os reajustes percebidos pela categoria profissional, o que não foi aceito na sentença. No respeitante ao seguro, as parcelas a ele referentes, mercê de sua natureza acessória, devem obedecer aos mesmos critérios de reajuste das prestações. In casu, comprovando-se que as prestações foram reajustadas em descompasso com o PES/CP, impondo-se sua revisão, a parcela relativa ao seguro também tem que ser revista. Apelação provida, nessa parte. 9. O mutuário assevera a ilegalidade da cobrança do CES, que não foi afastado na sentença. O CES - Coeficiente de Equiparação Salarial, instituído pela Resolução nº 36/69, do extinto BNH, e referido no art. 8o, da Lei nº 8.692/93, não deve ter a sua aplicação mantida, in casu, por não estar expressamente previsto no contrato. Precedente do STJ: "Não havendo previsão contratual não há como determinar aplicação do CES - Coeficiente de Equiparação Salarial, presente a circunstância de ser o contrato anterior à lei que o criou" (Terceira Turma, RESP 703907/SP, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. em 15.08.2006). Apelação a que se dá provimento, nesse ponto. 10. O mutuário quer a substituição da Tabela Price pelo Sistema de Amortização Constante, o que não foi autorizado na sentença. Não é viável a modificação pretendida, não apenas porque a sistemática Price foi ajustada livremente (não se alegando corrupção da vontade), mas também porque essa alteração implicaria na necessidade de o mutuário pagar à CEF a diferença, devidamente corrigida, em relação às prestações inicialmente adimplidas, tendo em conta que, no SAC, as amortizações periódicas são todas iguais ou constantes, o que implica em que as prestações iniciais do SAC são maiores. Não provimento da apelação, nesse aspecto. 11. A sentença entendeu pela inocorrência de anatocismo, contra o que se insurge o mutuário. Caracterizada, in casu, a injurídica incidência de juros sobre juros, tanto em razão da amortização negativa, quanto pelo fato de que as prestações vencidas, não pagas, serão incorporadas ao saldo devedor, para nova incidência de juros, quando já são constituídas de uma parte de juros e outra de amortização. "A jurisprudência dos tribunais pátrios vem firmando o entendimento de que há capitalização dos juros na forma utilizada pela Tabela Price para amortização das prestações. 'A capitalização dos juros é proibida (Súmula 121/STJ), somente aceitável quando expressamente permitida em lei (Súmula 93/STJ), o que não acontece no SFH'. Precedente do STJ" (TRF5, Primeira Turma, AC nº 400982/CE, Rel. Des. Federal Francisco Wildo, j. em 14.12.2006). Apelação provida, nessa parte. 12. O mutuário pediu a modificação da sistemática de amortização/reajuste do saldo devedor, pedido não acolhido na sentença. "A fórmula, segundo a qual corrige-se o saldo devedor majorando-o, para, após avultá-lo, deduzir a prestação devidamente quitada pelo mutuário, apresenta-se imprópria por não permitir zerar o saldo devedor e por transgredir ao escopo perseguido pelo Sistema Financeiro de Habitação, sob cuja égide se acha o contrato em tela. A operação razoável deve ser expressa inicialmente abatendo-se a prestação quitada, para depois corrigir o saldo devedor, conforme art. 6º, c, da lei 4380/64" (TRF5, Primeira Turma, AC 402054/PE, Rel. Des. Federal Francisco Wildo, j. em 01.03.2007, por maioria). Apelação provida também nessa parte. 13. O mutuário requer a limitação dos juros contratuais em 10%, conforme determina a Lei 4.380/64, expurgando-se os juros efetivos. Juros nominais correspondem à taxa de juros contratada numa determinada operação financeira (encontrada, a sua expressão mensal, a partir da divisão do percentual por 12, ou seja, pelo número de meses do ano), e juros efetivos, à taxa de rendimento que a operação financeira proporciona efetivamente (já que a incidência de juros em cada mês acarreta percentual, no final do ano, não coincidente com a taxa nominal). A existência das taxas nominal e efetiva deriva da própria mecânica da matemática financeira. De se observar que a taxa nominal é fixada para um período de um ano, ao passo que a freqüência da amortização é mensal (períodos diferentes, portanto). A ré estaria a agir ilegitimamente se omitisse o percentual da taxa de juros efetiva, o que não ocorreu. As duas espécies restaram expressamente consignadas no instrumento contratual, sendo definidas em 10,50% (nominal) e 11,0203% (efetiva), estando, ambas, acima do limite de 10% estabelecido pela Lei nº 4.380/64, vigorante, quanto a esse limite, até o advento da Lei nº 8.692/93, que, em seu art. 25, estabeleceu o teto de 12% (o contrato é de 12.02.1990), impondo-se, destarte, o respeito ao limite legal. Apelação a que se dá provimento, nesse tocante. 14. Propugnou, o mutuário, pela devolução dos valores atinentes ao pagamento do FUNDHAB - Fundo de Assistência Habitacional. A sentença indeferiu o pedido, ante a falta de comprovação de pagamento. Nos termos da redação conferida pelo Decreto-Lei nº 2.240, de 31.01.1985, constituem recursos do FUNDHAB "as contribuições ao FUNDHAB, a partir do mês de fevereiro de 1984, dos vendedores, pessoas físicas ou jurídicas, de imóveis objeto de financiamento concedido por sua Carteira de Habitação a mutuário final" (inciso II, do art. 7o, do Decreto-Lei nº 2.164/84). Por conseguinte, trata-se de parcela cujo ônus não pode ser imputado ao devedor (mutuário), mas sim ao vendedor (construtora), do que decorre a ilegalidade da cláusula contratual em sentido inverso. In casu, constando na planilha do financiamento, apresentada pela própria CEF, o ônus imputado ao mutuário a título de FUNDHAB, é de se determinar a restituição pela instituição financeira do montante correspondente pago. Apelação provida, quanto a esse ponto. 15. Busca, o mutuário, a repetição do que teria pago a maior à instituição financeira, com dobre. Em verdade, na petição inicial, o autor se limitou a pedir a restituição simples (não na forma dobrada definida no CDC), de modo que esse pedido, como inovação, não pode ser conhecido. De todo modo, é certo que não há que se falar em repetição de quantias pagas a maior, se não houve a extinção do contrato de mútuo, devendo, o montante pago a maior, ser dirigido à quitação das prestações em atraso, se houver, e, se ainda assim houver sobra, ao pagamento das prestações vincendas e à amortização do saldo devedor, nessa ordem. Apelação não provida, nesse aspecto. 16. Inversão dos ônus de sucumbência. 17. Agravo retido não conhecido. 18. Apelação parcialmente provida. (PROCESSO: 200280000093090, AC438632/AL, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO CAVALCANTI, Primeira Turma, JULGAMENTO: 29/05/2008, PUBLICAÇÃO: DJ 14/07/2008 - Página 316)

Data do Julgamento : 29/05/2008
Classe/Assunto : Apelação Civel - AC438632/AL
Órgão Julgador : Primeira Turma
Relator(a) : Desembargador Federal Francisco Cavalcanti
Comarca : Tribunal Regional Federal - 5ª Região
Código do documento : 162070
PublicaÇÕes : Diário da Justiça (DJ) - 14/07/2008 - Página 316
DecisÃo : UNÂNIME
Veja tambÉm : RESP 838372/RS (STJ)RESP 703907/SP (STJ)AC 400982/CE (TRF5)AC 402054/PE (TRF5)AC 332415/RN (TRF5)
ReferÊncias legislativas : CPC-73 Código de Processo Civil LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-20 PAR-4 ART-21 LEG-FED RES-36 ANO-1969 (BNH) LEG-FED LEI-8692 ANO-1993 ART-8 ART-25 LEG-FED SUM-121 (STJ) LEG-FED SUM-93 (STJ) LEG-FED LEI-4380 ANO-1964 ART-4 ART-5 ART-6 LET-C LEG-FED DEL-2240 ANO-1985 LEG-FED DEL-2164 ANO-1984 ART-7 INC-2 LEG-FED LEI-8177 ANO-1991 ART-18 PAR-1 PAR-2 PAR-3 PAR-4 LEG-FED SUM-295 LEG-FED DEL-19 ANO-1966 ART-1
Votantes : Desembargador Federal José Maria Lucena Desembargador Federal Francisco Cavalcanti
Mostrar discussão