TRF5 200281000181102
CIVIL. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. CONTRATO DE MÚTUO HABITACIONAL. REVISÃO. POSICIONAMENTOS ASSENTADOS PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, INCLUSIVE SOB O REGIME DOS RECURSOS REPETITIVOS.
1. Recurso interposto contra sentença de improcedência do pedido, exarada em ação ordinária de revisão de contrato de mútuo habitacional, firmado no âmbito do SFH.
2. O SFH foi criado com vistas a estimular a construção de habitações de interesse social e a possibilitar a aquisição da casa própria pelas classes da população que percebiam menor renda e que, portanto, não tinham condições de recorrer à iniciativa privada. O SFH foi fundado no direito à moradia, agasalhado esse pela Constituição Federal como direito social, necessidade premente do trabalhador. Consoante se apreende da evolução normativa da matéria, ao SFH se confere conotação nitidamente social (decorrente de sua finalidade), sendo a ele inerente o equilíbrio que deve permear a relação entre a renda do mutuário e as prestações do financiamento.
3. O princípio do pacta sunt servanda deve ser interpretado de forma harmônica com as outras normas jurídicas que integram o ordenamento, impondo-se o seu sopeso, inclusive e especialmente, diante do escopo do negócio jurídico ajustado.
4. O CDC é aplicável aos contratos de mútuo celebrados sob o regramento do SFH.
5. Tendo, a instituição financeira, cumprido o critério contratual de reajustamento das prestações mensais do mútuo, segundo os reajustes salariais da categoria profissional da mutuária paradigma - servidora pública civil estadual - PES/CP, não há como se acolher pedido de condenação a efetuar correções nesse tocante.
6. Havendo cláusula contratual impositiva da correção do saldo devedor com observância da taxa básica de remuneração dos depósitos da caderneta de poupança, está conforme o ordenamento jurídico a aplicação da TR, para tal finalidade, afastando-se outros critérios (a exemplo do PES, do INPC, entre outros). "1. Para os efeitos do art. 543-C do CPC: 1.1. No âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, a partir da Lei 8.177/91, é permitida a utilização da Taxa Referencial (TR) como índice de correção monetária do saldo devedor. Ainda que o contrato tenha sido firmado antes da Lei n.º 8.177/91, também é cabível a aplicação da TR, desde que haja previsão contratual de correção monetária pela taxa básica de remuneração dos depósitos em poupança, sem nenhum outro índice específico" (STJ, REsp 969.129/MG, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 09/12/2009, DJe 15/12/2009). Ressalva do entendimento do Relator. Apelação não provida nesse ponto.
7. O anatocismo é vedado, salvo nas hipóteses expressamente permitidas em lei, o que não é o caso do SFH. Constatado o anatocismo, in casu (não pela amortização negativa, mas pelo fato de que as prestações vencidas não pagas são reincorporadas ao saldo devedor, para nova incidência de juros, quando já são constituídas de parcela de juros), impõe-se sua supressão, utilizando-se a sistemática da conta em apartado. "O Sistema Francês de Amortização, Tabela Price, não prevê, a priori, incidência de juros sobre juros. Todavia, na hipótese de o valor da prestação ser insuficiente para cobrir a parcela relativa aos juros, pode ocorrer de o resíduo não pago ser incorporado ao saldo devedor e sobre ele virem a incidir os juros da parcela subseqüente, configurando-se anatocismo, vedado em nosso sistema jurídico./Assim, para evitar a cobrança de juros sobre juros, os Tribunais pátrios passaram a determinar que o quantum devido a título de juros não amortizados fosse lançado em conta separada, sujeita somente à correção monetária. Tal providência não ofende o ordenamento jurídico brasileiro" (STJ, AgRg no REsp 1070224/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/03/2010, DJe 18/03/2010). Apelação provida nessa parte.
8. Os juros contratuais (taxas nominal e efetiva) foram definidos com razoabilidade (a análise nesse tocante deve ser casuística), em 9,0% e 9,3807%, não havendo dispositivo legal limitador desse percentual. "Para efeito do art. 543-C: [...] 1.2. O art. 6º, alínea 'e', da Lei nº 4.380/64, não estabelece limitação dos juros remuneratórios" (STJ, REsp 1070297/PR, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 09/09/2009, DJe 18/09/2009). "O art. 6º, alínea 'e', da Lei 4.380/64 não estabelece limite de juros aos contratos imobiliários firmados sob sua égide. Constitui tão-somente uma das condições para aplicação da correção monetária prevista no art. 5º do referido diploma legal. Precedente da Corte Especial" (STJ, EREsp 954.628/SC, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, CORTE ESPECIAL, julgado em 28/05/2009, DJe 25/06/2009). Súmula 422, do STJ. Ressalva do entendimento do Relator. Desprovimento da apelação nesse tópico.
9. O montante pago a maior deve ser dirigido à quitação das prestações em atraso, se houver, e, se ainda assim houver sobra, ao pagamento das prestações vincendas e à amortização do saldo devedor, nessa ordem, não havendo que se falar em restituição.
10. Apelação parcialmente provida.
11. Sucumbência recíproca, com base no art. 21, do CPC.
(PROCESSO: 200281000181102, AC498135/CE, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO CAVALCANTI, Primeira Turma, JULGAMENTO: 17/06/2010, PUBLICAÇÃO: DJE 05/07/2010 - Página 35)
Ementa
CIVIL. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. CONTRATO DE MÚTUO HABITACIONAL. REVISÃO. POSICIONAMENTOS ASSENTADOS PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, INCLUSIVE SOB O REGIME DOS RECURSOS REPETITIVOS.
1. Recurso interposto contra sentença de improcedência do pedido, exarada em ação ordinária de revisão de contrato de mútuo habitacional, firmado no âmbito do SFH.
2. O SFH foi criado com vistas a estimular a construção de habitações de interesse social e a possibilitar a aquisição da casa própria pelas classes da população que percebiam menor renda e que, portanto, não tinham condições de recorrer à iniciativa privada. O SFH foi fundado no direito à moradia, agasalhado esse pela Constituição Federal como direito social, necessidade premente do trabalhador. Consoante se apreende da evolução normativa da matéria, ao SFH se confere conotação nitidamente social (decorrente de sua finalidade), sendo a ele inerente o equilíbrio que deve permear a relação entre a renda do mutuário e as prestações do financiamento.
3. O princípio do pacta sunt servanda deve ser interpretado de forma harmônica com as outras normas jurídicas que integram o ordenamento, impondo-se o seu sopeso, inclusive e especialmente, diante do escopo do negócio jurídico ajustado.
4. O CDC é aplicável aos contratos de mútuo celebrados sob o regramento do SFH.
5. Tendo, a instituição financeira, cumprido o critério contratual de reajustamento das prestações mensais do mútuo, segundo os reajustes salariais da categoria profissional da mutuária paradigma - servidora pública civil estadual - PES/CP, não há como se acolher pedido de condenação a efetuar correções nesse tocante.
6. Havendo cláusula contratual impositiva da correção do saldo devedor com observância da taxa básica de remuneração dos depósitos da caderneta de poupança, está conforme o ordenamento jurídico a aplicação da TR, para tal finalidade, afastando-se outros critérios (a exemplo do PES, do INPC, entre outros). "1. Para os efeitos do art. 543-C do CPC: 1.1. No âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, a partir da Lei 8.177/91, é permitida a utilização da Taxa Referencial (TR) como índice de correção monetária do saldo devedor. Ainda que o contrato tenha sido firmado antes da Lei n.º 8.177/91, também é cabível a aplicação da TR, desde que haja previsão contratual de correção monetária pela taxa básica de remuneração dos depósitos em poupança, sem nenhum outro índice específico" (STJ, REsp 969.129/MG, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 09/12/2009, DJe 15/12/2009). Ressalva do entendimento do Relator. Apelação não provida nesse ponto.
7. O anatocismo é vedado, salvo nas hipóteses expressamente permitidas em lei, o que não é o caso do SFH. Constatado o anatocismo, in casu (não pela amortização negativa, mas pelo fato de que as prestações vencidas não pagas são reincorporadas ao saldo devedor, para nova incidência de juros, quando já são constituídas de parcela de juros), impõe-se sua supressão, utilizando-se a sistemática da conta em apartado. "O Sistema Francês de Amortização, Tabela Price, não prevê, a priori, incidência de juros sobre juros. Todavia, na hipótese de o valor da prestação ser insuficiente para cobrir a parcela relativa aos juros, pode ocorrer de o resíduo não pago ser incorporado ao saldo devedor e sobre ele virem a incidir os juros da parcela subseqüente, configurando-se anatocismo, vedado em nosso sistema jurídico./Assim, para evitar a cobrança de juros sobre juros, os Tribunais pátrios passaram a determinar que o quantum devido a título de juros não amortizados fosse lançado em conta separada, sujeita somente à correção monetária. Tal providência não ofende o ordenamento jurídico brasileiro" (STJ, AgRg no REsp 1070224/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/03/2010, DJe 18/03/2010). Apelação provida nessa parte.
8. Os juros contratuais (taxas nominal e efetiva) foram definidos com razoabilidade (a análise nesse tocante deve ser casuística), em 9,0% e 9,3807%, não havendo dispositivo legal limitador desse percentual. "Para efeito do art. 543-C: [...] 1.2. O art. 6º, alínea 'e', da Lei nº 4.380/64, não estabelece limitação dos juros remuneratórios" (STJ, REsp 1070297/PR, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 09/09/2009, DJe 18/09/2009). "O art. 6º, alínea 'e', da Lei 4.380/64 não estabelece limite de juros aos contratos imobiliários firmados sob sua égide. Constitui tão-somente uma das condições para aplicação da correção monetária prevista no art. 5º do referido diploma legal. Precedente da Corte Especial" (STJ, EREsp 954.628/SC, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, CORTE ESPECIAL, julgado em 28/05/2009, DJe 25/06/2009). Súmula 422, do STJ. Ressalva do entendimento do Relator. Desprovimento da apelação nesse tópico.
9. O montante pago a maior deve ser dirigido à quitação das prestações em atraso, se houver, e, se ainda assim houver sobra, ao pagamento das prestações vincendas e à amortização do saldo devedor, nessa ordem, não havendo que se falar em restituição.
10. Apelação parcialmente provida.
11. Sucumbência recíproca, com base no art. 21, do CPC.
(PROCESSO: 200281000181102, AC498135/CE, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO CAVALCANTI, Primeira Turma, JULGAMENTO: 17/06/2010, PUBLICAÇÃO: DJE 05/07/2010 - Página 35)
Data do Julgamento
:
17/06/2010
Classe/Assunto
:
Apelação Civel - AC498135/CE
Órgão Julgador
:
Primeira Turma
Relator(a)
:
Desembargador Federal Francisco Cavalcanti
Comarca
:
Tribunal Regional Federal - 5ª Região
Código do documento
:
231546
PublicaÇÕes
:
Diário da Justiça Eletrônico TRF5 (DJE) - 05/07/2010 - Página 35
DecisÃo
:
UNÂNIME
Veja tambÉm
:
RESP 969129/MG (STJ)AgRg no RESP 1070224/RS (STJ)RESP 1070297/PR (STJ)ERESP 954628/SC (STJ)RESP 838372/RS (STJ)RESP 969129/MG (STJ)
ReferÊncias legislativas
:
CPC-73 Código de Processo Civil LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-20 PAR-4 ART-543-C ART-21
LEG-FED LEI-8177 ANO-1991
LEG-FED LEI-4380 ANO-1964 ART-6 LET-E ART-5
LEG-FED SUM-422 (STJ)
CDC-90 Código de Defesa do Consumidor LEG-FED LEI-8078 ANO-1990 ART-39 INC-1
LEG-FED SUM-5 (STJ)
LEG-FED SUM-7 (STJ)
Votantes
:
Desembargador Federal José Maria Lucena
Desembargador Federal Francisco Cavalcanti
Desembargador Federal Rogério Fialho Moreira
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