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Jurisprudência


TRF5 2004.82.00.010603-6 200482000106036

Ementa
PENAL E PROCESSUAL PENAL. ESTELIONATO MAJORADO (ART. 171, PARÁGRAFO 3º, DO CP). AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVAS. PROVAS TESTEMUNHAIS SUFICIENTES. PROVA DOCUMENTAL. PERÍCIA. PRESCINDIBILIDADE. MANUTENÇÃO DO ÉDITO CONDENATÓRIO. DOSIMETRIA. REDUÇÃO DA PENA-BASE. FUNDAMENTAÇÃO INSUFICIENTE. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. PARCIAL PROVIMENTO. 1. Apelação interposta por JBGC contra sentença que, julgando parcialmente procedente a pretensão punitiva estatal: a) condenou JBGC à pena privativa de liberdade de 2 (dois) anos e 10 (dez) dias de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por duas penas restritivas de direito, além de 91 (noventa e um) dias-multa no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do fato, pela prática do crime previsto no art. 171, parágrafo 3º, do CP; b) condenou RNO à pena privativa de liberdade de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por duas penas restritivas de direito, além de 32 (trinta e dois) dias-multa no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do fato, pela prática do crime previsto no art. 171, parágrafo 3º, do CP. 2. Razão não assiste à defesa quanto à alegada ausência de comprovação da materialidade do delito. A fruição do seguro-defeso por parte do corréu RNO (condenado na presente ação penal, mas com a punibilidade extinta pela prescrição, na modalidade retroativa - decisão de fls. 169/169v) é matéria incontroversa, visto que este último, interrogado em juízo, confessou ter recebido o benefício, não atuando profissionalmente, porém, como pescador, mas como condutor de transporte alternativo, fato corroborado pelas testemunhas Devanice Batista da Silva (07'04''), Antônio José Fernandes Filho (02'05'') e Erasmo Felinto Fidélis (00'35), entre outros (cf. mídia digital de fl. 116). 3. A prova testemunhal aponta que esse tipo de atitude era reiterada por parte do apelante. Nesse sentido, vale destacar passagem do depoimento da ex tesoureira da Colônia de Pescadores de Caaporã/PB, Devanice Batista da Silva, a qual asseverou que o ora recorrente auxiliou diretamente o corréu RNO para a obtenção indevida do seguro-defeso (mídia digital de fl. 116, tempo:05'00''; 9'21''). 4. No tocante ao argumento levantado pela defesa (de que a ausência de declaração, emitida pelo réu, em que constasse a falsa condição de pescador por parte de RNO, implicaria na não comprovação da materialidade delitiva), tenho comigo que a prova testemunhal, sobretudo quando robusta e concordante, como no caso dos autos, é bastante para suprir a impossibilidade de realização de exame de corpo de delito (art. 167 do CPP), tendo em vista, ademais, que o documento foi apenas o meio empregado para a concretização da fraude, não sendo imprescindível a sua presença nos autos para a demonstração da ocorrência do delito. Precedentes do STJ e deste TRF5 : HC 444.181/RJ, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, STJ - Quinta Turma, DJE: 12/06/2018; AGARESP 734182, Rel. Min. ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, STJ - Sexta Turma, DJE: 01/08/2016. 5. Além disso, como bem apontou a douta magistrada a quo, o tipo penal de estelionato não pressupõe, como elemento essencial para a caracterização do delito, a perícia sobre o documento falso utilizado para a obtenção do resultado ilícito, mormente quando o meio fraudulento é a falsidade ideológica, que exige, apenas, a demonstração do fim especial de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante (art. 299 do CP). No caso dos autos, verifica-se que o acusado agiu, comprovadamente, com o intuito de induzir a autarquia previdenciária em erro, ao auxiliar na obtenção do benefício indevido por parte do corréu RNO, consoante se depreende da oitiva das testemunhas em juízo. Portanto, da análise dos mencionados meios de prova, resta evidente que ambos os réus agiram em conjunto, mediante fraude, com o intuito de obter vantagem indevida do INSS, induzindo e mantendo esta Autarquia Federal em erro, razão pela qual a condenação pela prática do crime previsto no art. 171, parágrafo 3º, do CP deve ser mantida. 6. Relativamente à alegação subsidiária formulada pela defesa (desproporcionalidade na fixação da pena-base em 1 ano e 7 meses de reclusão, tendo em vista que apenas uma circunstância judicial foi valorada negativamente), razão assiste ao recorrente. É bem verdade que, consoante entendimento predominante no STJ, "a ponderação das circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal não é uma operação aritmética em que se dá pesos absolutos a cada uma delas" (AgRg no HC 188.873/AC, Rel. Ministro JORGE MUSSI, Quinta Turma do STJ, DJe 16/10/2013). Todavia, o órgão julgador não se pode desincumbir do ônus de fundamentar o critério utilizado para estabelecer a pena-base acima de um patamar razoavelmente esperado, porque, apenas dessa forma, torna-se possível assegurar o respeito a princípios extremamente caros ao processo penal e à ordem constitucional, como o da proporcionalidade, da discricionariedade vinculada e o princípio da individualização da pena. Portanto, a menção expressa ao critério utilizado para exasperar a pena acima do padrão normal, de 1/8 (um oitavo), é imprescindível, não bastando, para tanto, a mera valoração negativa da circunstância judicial. 7. Compulsando os autos, verifica-se que, apesar de o douto juízo de origem ter fundamentado de modo satisfatório a valoração negativa da circunstância judicial da culpabilidade, não houve qualquer menção acerca do critério utilizado para estabelecer a quantidade de exasperação decorrente da única circunstância considerada desfavorável ao réu, incorrendo, portanto, em excesso na fixação da pena-base em 1 (um) ano e 7 (sete) meses de reclusão. 8. Levando em consideração o parâmetro supramencionado, o patamar de exasperação ideal é o de 6 (seis) meses, vez que este valor se refere a 1/8 (um oitavo) da pena intermediária (4 anos ou 48 meses). Desse modo, a pena-base deverá ser fixada em 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão. Após a incidência da causa de aumento de 1/3 (um terço), prevista no parágrafo 3º do art. 171 do CP, a pena definitiva deve perfazer 2 (dois) anos de reclusão, a ser cumprida inicialmente em regime aberto (art. 33, parágrafo 1º, c e parágrafo 2º, c, do CP), mantendo-se a substituição por penas restritivas de direitos (art. 44 do CP). 9. Embora não tenha sido formulado pedido expresso da defesa nesse sentido, impende reconhecer a necessidade da redução do valor da multa imposto na sentença, a fim torná-la proporcional à pena privativa de liberdade ora aplicada. Desse modo, utilizando o mesmo critério estabelecido para a exasperação da pena-base, reduz-se a pena pecuniária para 54 (cinquenta e quatro) dias-multa, mantendo-se o valor unitário de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente à época dos fatos. 10. Apelação parcialmente provida, para reduzir a pena privativa de liberdade para 2 (dois) anos de reclusão, a ser cumprida inicialmente em regime aberto (art. 33, parágrafo 1º, c e parágrafo 2º, c, do CP), mantendo-se a substituição por penas restritivas de direitos (art. 44 do CP), bem como para diminuir a pena de multa para 54 (cinquenta e quatro) dias-multa, à razão de 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos.
Decisão
UNÂNIME

Data do Julgamento : 08/11/2018
Data da Publicação : 05/12/2018
Classe/Assunto : ACR - Apelação Criminal - 14798
Órgão Julgador : Primeira Turma
Relator(a) : Desembargador Federal Roberto Machado
Comarca : TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Tipo : Acórdão
Referência legislativa : LEG-FED LEI-7492 ANO-1986 ART-19 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ***** CPP-41 Codigo de Processo Penal LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-386 INC-5 ART-167 ART-158 ART-564 INC-3 LET-B ART-299 ART-59 ART-33 PAR-1 PAR-2 LET-C ART-44 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ***** CP-40 Codigo Penal LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-171 PAR-3 ART-158 ART-71
Fonte da publicação : DJE - Data::05/12/2018 - Página::72
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