TRF5 2005.81.00.001120-9 200581000011209
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DESVIO DE RECURSOS DO FINOR, SOB A GESTÃO DA SUDENE. FINANCIAMENTO PARA A CONSTRUÇÃO DE FÁBRICA TEXTIL. INDICAÇÃO DE NÃO APLICAÇÃO DA VERBA. IMPROBIDADE. INDEFERIMENTO, SEM SUFICIENTE MOTIVAÇÃO, DE PEDIDO DE PRODUÇÃO
DA PROVA TESTEMUNHAL BEM ESTRUTURADO. PROCESSO ANULADO, REABRINDO-SE A INSTRUÇÃO. PROVIMENTO DO AGRAVO RETIDO, A TÍTULO DE PRELIMINAR. PROVIMENTO PARCIAL DAS APELAÇÕES.
I - Apelações manejadas contra sentença proferida nos autos de uma ação civil pública deflagrada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL com o objetivo de responsabilizar os RECORRENTES por atos apontados como ímprobos, havidos no contexto da aplicação de
recursos originários do FUNDO DE DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE - FINOR, posto sob a gestão da SUPERINTENDÊNCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE - SUDENE, verba essa que teria sido malversada em projeto destinado à instalação e funcionamento da indústria
MARAMBAIA TEXTIL S.A., situada no Município de Horizonte/CE, para o qual foram aportados recursos que foram liberados de 29/03/1993 a 30/04/1998, da ordem de R$33.247.917,83 (trinta e três milhões, duzentos e quarenta e sete mil, novecentos e dezessete
reais, oitenta e três centavos), valores atualizados até 29.02.2004.
II - O processo foi instruído com os autos de um inquérito civil público, que houvera sido conduzido pelo MPF, o qual contém uma perícia administrativa levada a cabo pela CAIXA ECONÔMICA FEDERAL (que não é parte neste processo), levantamento técnico
esse que concluiu pela inexecução parcial da obra e pela quantificação do prejuízo ao erário.
III - Após manifestações por escrito, contestações e alegações finais, além de uma pletora de incidentes no corpo do processo, adveio a sentença, julgando improcedente a demanda em relação a alguns dos promovidos, mas impondo a outros o dever de
ressarcir solidariamente os cofres oficiais, no montante de R$33.247.917,83 (trinta e três milhões, duzentos e quarenta e sete mil, novecentos e dezessete reais, oitenta e três centavos), valores atualizados até 29.02.2004, "e individualmente, perda de
bens e valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio em decorrência das irregularidades praticadas e constatadas nesta ação; pagamento de multa civil de uma vez o valor do acréscimo patrimonial apurado na condenação do item anterior; suspensão dos
direitos políticos pelo prazo (cinco) anos; e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoas jurídicas da qual seja sócio majoritário,
pelo prazo de cinco anos, tudo pós o trânsito em julgado".
IV - Apelações pelos condenados, alegando, em suma: i) desproporcionalidade entre acusações e sanções; ii) falta de dolo ou culpa; iii) atipicidade das condutas, pois não foram responsáveis pela liberação das verbas; iv) deveria ter sido aplicado aos
maiores de setenta anos as regras do art. 115 do Código Penal, para fins prescricionais; v) a sentença é nula, pois não foram incluídos no polo passivo dois servidores da SUDENE que tiveram participação nos fatos apontados como ímprobos e por falta de
fundamentação e motivação; vi) prescrição quinquenal; vii) litispendência entre esta ação e uma ação monitória ajuizada pelo BANCO DO NORDESTE DO BRASIL; viii) falta de interesse de agir quanto ao ressarcimento, em razão do ajuizamento de execução
fiscal com idêntico fim pela FAZENDA NACIONAL; ix) foram condenados apenas com base em um inquérito civil público, para o qual nem todos os DEMANDADOS foram cientificados; x) a perícia realizada pela CAIXA não tomou em consideração diversos aspectos
relevantes à mensuração dos valores aplicados na obra; xi) não foram considerados os relatórios que atestaram a implantação do projeto; xii) as condutas dos RECORRENTES não foram individualizadas; xiii) atipicidade das condutas dos APELANTES; xiv)
tempestividade dos embargos declaratórios; xv) prescrição das sanções político-administrativas; xvi) ausência do elemento subjetivo do ato reputado como ímprobo; xvii) desproporcionalidade da condenação.
V - Análise do gravo retido que se rebela contra o indeferimento da produção da prova pericial. Um pedido: "A perícia na área de Engenharia mostra-se relevante ao deslinde da causa, em razão da necessidade de dimensionar se houve efetivamente desvio de
recursos e o seu respectivo montante, o qual deverá ser apurado mediante a avaliação do empreendimento no estágio que se encontra atualmente, isto é, se faz necessário estabelecer a diferença entre o valor total corrigido monetariamente dos recursos
repassados pela SUDENE/FINOR em prol da empresa Marambaia e aquele que seria representativo da expressão econômica do empreendimento erguido para sediar a planta fabril amparada com os incentivos fiscais concedidos pelo ente Federal". O outro pedido:
"Por sua vez, a perícia financeira revela-se necessária para se aferir os valores aportados pela empresa Marambaia a título de recursos próprios, assim como analisar o período de maturação do projeto a fim de verificar se o ponto de nivelamento
estabelecido e as aplicações autorizadas eram suficientes para a efetiva implantação do Projeto".
VI - A decisão objeto do agravo retido: "Indefiro o pedido de prova pericial formulado pelo Réu Antônio Marcos de Oliveira Nunes, considerando que o acervo probatório já produzido é suficiente para resolver as questões apontadas pelo Réu". Ou seja: o
juiz indeferiu a prova pericial, a ser feita no interesse do DEMANDADO/RECORRENTE, "considerando que o acervo probatório já produzido é suficiente para resolver as questões apontadas pelo Réu".
VII - Não se desconhece que o juiz é o destinatário da prova; a ele serve a prova para convencer de que bons são os argumentos e os objetivos da parte que pretende produzi-la. Assim, se uma parte deseja conduzir ao processo certo elemento probante, é
dever do juiz viabilizar essa produção, salvo se claramente impertinente. CPC/1973, art. 130.
VIII - O deferimento da prova integra o espectro da ampla defesa e do contraditório (CF. art. 5º, LV), somente podendo ser excepcionado se as diligências probantes forem "inúteis ou meramente protelatórias". Na espécie, nem uma e nem outra. A leitura da
fundamentação do pedido da pericia de engenharia e de contabilidade demonstra que não havia leviandade ou má-fé no pleito; pelo inverso, havia necessidade, especialmente porque a perícia realizada pela CAIXA foi tomada fora do contraditório judicial,
por iniciativa e interesse do MINISTÉRIO PÚBLICO, razão pela qual exala esperada parcialidade.
IX - E tanto as perícias agora referidas eram úteis que a sentença se ressente de abordagem mais consistente nessas duas áreas. Deve, por isso mesmo, ser anulado parcialmente o processo, retomando-se a fase instrutória, de maneira que sejam realizadas
as provas técnicas mencionadas (de engenharia e de contabilidade).
X - Outra eiva de nulidade da sentença é a falta de individualização das condutas ímprobas atribuídas aos DEMANDADOS/APELANTES, advindo uma decisão desprovida de fundamentação específica para as sanções. Postou-se o decisum de forma linear, sancionando
igualmente todos os PROMOVIDOS, em desatenção ao espírito do comando passado no art. 93, IX, da Carta Política.
XI - Acolhimento do agravo retido, analisado como liminar, obtendo provimento para anular o processo ao nível da instrução, de sorte a viabilizar a realização das perícias requeridas. Provimento também às apelações, em preambular, para anular a sentença
por falta de fundamentação específica em relação a cada um dos APELANTES.
Ementa
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DESVIO DE RECURSOS DO FINOR, SOB A GESTÃO DA SUDENE. FINANCIAMENTO PARA A CONSTRUÇÃO DE FÁBRICA TEXTIL. INDICAÇÃO DE NÃO APLICAÇÃO DA VERBA. IMPROBIDADE. INDEFERIMENTO, SEM SUFICIENTE MOTIVAÇÃO, DE PEDIDO DE PRODUÇÃO
DA PROVA TESTEMUNHAL BEM ESTRUTURADO. PROCESSO ANULADO, REABRINDO-SE A INSTRUÇÃO. PROVIMENTO DO AGRAVO RETIDO, A TÍTULO DE PRELIMINAR. PROVIMENTO PARCIAL DAS APELAÇÕES.
I - Apelações manejadas contra sentença proferida nos autos de uma ação civil pública deflagrada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL com o objetivo de responsabilizar os RECORRENTES por atos apontados como ímprobos, havidos no contexto da aplicação de
recursos originários do FUNDO DE DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE - FINOR, posto sob a gestão da SUPERINTENDÊNCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE - SUDENE, verba essa que teria sido malversada em projeto destinado à instalação e funcionamento da indústria
MARAMBAIA TEXTIL S.A., situada no Município de Horizonte/CE, para o qual foram aportados recursos que foram liberados de 29/03/1993 a 30/04/1998, da ordem de R$33.247.917,83 (trinta e três milhões, duzentos e quarenta e sete mil, novecentos e dezessete
reais, oitenta e três centavos), valores atualizados até 29.02.2004.
II - O processo foi instruído com os autos de um inquérito civil público, que houvera sido conduzido pelo MPF, o qual contém uma perícia administrativa levada a cabo pela CAIXA ECONÔMICA FEDERAL (que não é parte neste processo), levantamento técnico
esse que concluiu pela inexecução parcial da obra e pela quantificação do prejuízo ao erário.
III - Após manifestações por escrito, contestações e alegações finais, além de uma pletora de incidentes no corpo do processo, adveio a sentença, julgando improcedente a demanda em relação a alguns dos promovidos, mas impondo a outros o dever de
ressarcir solidariamente os cofres oficiais, no montante de R$33.247.917,83 (trinta e três milhões, duzentos e quarenta e sete mil, novecentos e dezessete reais, oitenta e três centavos), valores atualizados até 29.02.2004, "e individualmente, perda de
bens e valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio em decorrência das irregularidades praticadas e constatadas nesta ação; pagamento de multa civil de uma vez o valor do acréscimo patrimonial apurado na condenação do item anterior; suspensão dos
direitos políticos pelo prazo (cinco) anos; e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoas jurídicas da qual seja sócio majoritário,
pelo prazo de cinco anos, tudo pós o trânsito em julgado".
IV - Apelações pelos condenados, alegando, em suma: i) desproporcionalidade entre acusações e sanções; ii) falta de dolo ou culpa; iii) atipicidade das condutas, pois não foram responsáveis pela liberação das verbas; iv) deveria ter sido aplicado aos
maiores de setenta anos as regras do art. 115 do Código Penal, para fins prescricionais; v) a sentença é nula, pois não foram incluídos no polo passivo dois servidores da SUDENE que tiveram participação nos fatos apontados como ímprobos e por falta de
fundamentação e motivação; vi) prescrição quinquenal; vii) litispendência entre esta ação e uma ação monitória ajuizada pelo BANCO DO NORDESTE DO BRASIL; viii) falta de interesse de agir quanto ao ressarcimento, em razão do ajuizamento de execução
fiscal com idêntico fim pela FAZENDA NACIONAL; ix) foram condenados apenas com base em um inquérito civil público, para o qual nem todos os DEMANDADOS foram cientificados; x) a perícia realizada pela CAIXA não tomou em consideração diversos aspectos
relevantes à mensuração dos valores aplicados na obra; xi) não foram considerados os relatórios que atestaram a implantação do projeto; xii) as condutas dos RECORRENTES não foram individualizadas; xiii) atipicidade das condutas dos APELANTES; xiv)
tempestividade dos embargos declaratórios; xv) prescrição das sanções político-administrativas; xvi) ausência do elemento subjetivo do ato reputado como ímprobo; xvii) desproporcionalidade da condenação.
V - Análise do gravo retido que se rebela contra o indeferimento da produção da prova pericial. Um pedido: "A perícia na área de Engenharia mostra-se relevante ao deslinde da causa, em razão da necessidade de dimensionar se houve efetivamente desvio de
recursos e o seu respectivo montante, o qual deverá ser apurado mediante a avaliação do empreendimento no estágio que se encontra atualmente, isto é, se faz necessário estabelecer a diferença entre o valor total corrigido monetariamente dos recursos
repassados pela SUDENE/FINOR em prol da empresa Marambaia e aquele que seria representativo da expressão econômica do empreendimento erguido para sediar a planta fabril amparada com os incentivos fiscais concedidos pelo ente Federal". O outro pedido:
"Por sua vez, a perícia financeira revela-se necessária para se aferir os valores aportados pela empresa Marambaia a título de recursos próprios, assim como analisar o período de maturação do projeto a fim de verificar se o ponto de nivelamento
estabelecido e as aplicações autorizadas eram suficientes para a efetiva implantação do Projeto".
VI - A decisão objeto do agravo retido: "Indefiro o pedido de prova pericial formulado pelo Réu Antônio Marcos de Oliveira Nunes, considerando que o acervo probatório já produzido é suficiente para resolver as questões apontadas pelo Réu". Ou seja: o
juiz indeferiu a prova pericial, a ser feita no interesse do DEMANDADO/RECORRENTE, "considerando que o acervo probatório já produzido é suficiente para resolver as questões apontadas pelo Réu".
VII - Não se desconhece que o juiz é o destinatário da prova; a ele serve a prova para convencer de que bons são os argumentos e os objetivos da parte que pretende produzi-la. Assim, se uma parte deseja conduzir ao processo certo elemento probante, é
dever do juiz viabilizar essa produção, salvo se claramente impertinente. CPC/1973, art. 130.
VIII - O deferimento da prova integra o espectro da ampla defesa e do contraditório (CF. art. 5º, LV), somente podendo ser excepcionado se as diligências probantes forem "inúteis ou meramente protelatórias". Na espécie, nem uma e nem outra. A leitura da
fundamentação do pedido da pericia de engenharia e de contabilidade demonstra que não havia leviandade ou má-fé no pleito; pelo inverso, havia necessidade, especialmente porque a perícia realizada pela CAIXA foi tomada fora do contraditório judicial,
por iniciativa e interesse do MINISTÉRIO PÚBLICO, razão pela qual exala esperada parcialidade.
IX - E tanto as perícias agora referidas eram úteis que a sentença se ressente de abordagem mais consistente nessas duas áreas. Deve, por isso mesmo, ser anulado parcialmente o processo, retomando-se a fase instrutória, de maneira que sejam realizadas
as provas técnicas mencionadas (de engenharia e de contabilidade).
X - Outra eiva de nulidade da sentença é a falta de individualização das condutas ímprobas atribuídas aos DEMANDADOS/APELANTES, advindo uma decisão desprovida de fundamentação específica para as sanções. Postou-se o decisum de forma linear, sancionando
igualmente todos os PROMOVIDOS, em desatenção ao espírito do comando passado no art. 93, IX, da Carta Política.
XI - Acolhimento do agravo retido, analisado como liminar, obtendo provimento para anular o processo ao nível da instrução, de sorte a viabilizar a realização das perícias requeridas. Provimento também às apelações, em preambular, para anular a sentença
por falta de fundamentação específica em relação a cada um dos APELANTES.Decisão
UNÂNIME
Data do Julgamento
:
31/10/2017
Data da Publicação
:
13/11/2017
Classe/Assunto
:
AC - Apelação Civel - 580961
Órgão Julgador
:
Quarta Turma
Relator(a)
:
Desembargador Federal Ivan Lira de Carvalho
Comarca
:
TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** CPC-73 Código de Processo Civil
LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-130
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
***** CP-40 Codigo Penal
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-115
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
***** CF-88 Constituição Federal de 1988
ART-5 INC-55 ART-93 INC-9
Fonte da publicação
:
DJE - Data::13/11/2017 - Página::82
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