TRF5 2005.81.00.002857-0 200581000028570
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA PARA ANULAÇÃO DE REGISTRO IMOBILIÁRIO DE BEM DITO PERTENCENTE À UNIÃO, AJUIZADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. ILEGITIMIDADE ATIVA. ANULAÇÃO PARCIAL DO PROCESSO. PROVIMENTO DA APELAÇÃO.
I - O tema que enlaça a demanda é de cariz nitidamente patrimonial: a DIOCESE DE SOBRAL e o PATRIMÔNIO DE SÃO FRANCISCO DA CAPELA DE CAIÇARA (ente despersonalizado) venderam a MANOEL AROLDO BRANDÃO e sua esposa FRANCISCA DAS CHAGAS VASCONCELOS BRANDÃO
uma porção de terra situada na Praia do Preá, Município de Cruz/CE, tendo o ato sido levado a assentamento no Cartório de Registro de Imóveis de Cruz, no livro n.º 01-A, fl. 112. À luz desse fato, insurgiu-se o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ,
buscando a nulidade do registro, através de uma ação apresentada ao juízo daquela Comarca, posteriormente transposta à cura da JUSTIÇA FEDERAL, 11ª Vara, sediada em Sobral/CE.
II - Contestada, em sede de preâmbulo, a legitimidade do MPF para estar no lado ativo de uma liça deste jaez, com a consequente incompetência da JUSTIÇA FEDERAL, advindo uma interlocutória de cujo texto destaco: "Quanto à competência da Justiça Federal,
há de se reconhecer que parcela da jurisprudência mais recente vem admitindo a competência da Justiça Federal pelo simples fato de o MPF figurar no pólo ativo da lide, pois, por ser órgão da União, configuraria a hipótese do art. 109, I, da CF/88 (STJ.
CC 200601435361. 1ª Seção. DJE 0/07/2009; STJ. CC 201000897487. 2ª Seção. DJE 01/12/2010; TRF 5ª Região. AG 89324. 3ª Turma. J. 8/04/2010). Ademais, a União apontou seu interesse em integrar a lide, na qualidade de assistente simples (f. 603-604). Tal
fato já denota a competência da Justiça Federal para processar a causa, nos termos do art. 109, I, da CF/88. // A legitimidade ativa do Ministério Público Federal, por sua vez, funda-se na salutar e vigilante fiscalização da manutenção da ordem
jurídica, através da proteção do interesse público de grande relevância social, com previsão no art. 127 da Constituição Federal, visando coibir suposta simulação de negócio jurídico".
III - Quanto à definição da competência da JUSTIÇA FEDERAL, ao menos provisoriamente, andou certo o magistrado de primeiro grau. Já quanto à legitimidade do MPF, há equívoco. A decisão está posta em elementos vagos, tais como "salutar e vigilante
fiscalização da manutenção da ordem jurídica" e "proteção do interesse público de grande relevância social". Sequer a invocação genérica do disposto no art. 127 da CF, "visando coibir suposta simulação de negócio jurídico" tem o condão de demarcar
atribuições ao MPF para iniciar uma ação como a presente.
IV - Como já dito, o fato que se põe em discussão é de índole patrimonial: o bem vendido pertence a quem o vendeu (a DIOCESE) ou à UNIÃO, como bem dominial cuja propriedade é assegurada pela CF, art. 20, VII? Ora, sendo uma discussão de cunho
patrimonial, envolvendo direitos ou interesses da UNIÃO, ela se apresenta em juízo com roupagem similar à dos particulares, sendo defendida ou presentada pela ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO, a teor do que está na Carta Magna, art. 131: "A Advocacia-Geral da
União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e
assessoramento jurídico do Poder Executivo".
V - Rememore-se que o presente feito não é uma ação civil pública, mas sim uma ação ordinária, o que torna ainda mais inadequada a presença do Parquet como titular do lado ativo. Se uma ACP fosse, a temática versada teria que encontrar encaixe no que
dispõe o art. 1º da Lei 7.347/85, de sorte a contemplar o MPF, por força do art. 5º, I da mesma lei específica. Mas não é o que ocorre. O que se tem aqui é uma pendenga de perfil patrimonial, econômico, na qual a UNIÃO preferiu a posição mais retraída
de assistente.
VII - Não se controverte que o MINISTÉRIO PÚBLICO consiga encaixe na vaga de custo legis, com espeque no disposto no art. 82 do CPC/1972, aplicável à época da deflagração deste feito. Mas não como titular da demanda.
VIII - E qual a solução que se apresenta para o embate, na presente quadra recursal? A seguinte: a) anular o processo, desde o recebimento do feito pela Justiça Federal, vindo da Comarca de Cruz/CE; b) excluir o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL da qualidade
de autor; c) determinar o regresso dos autos à 11ª Vara Federal do Ceará, para que lá seja intimada a UNIÃO para, querendo, titularizar a ação na condição de autora, seguindo-se os trâmites processuais ordinários, inclusive a possível participação do
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL como custo legis, se houver necessidade de tanto.
IX - Provimento da apelação.
Ementa
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA PARA ANULAÇÃO DE REGISTRO IMOBILIÁRIO DE BEM DITO PERTENCENTE À UNIÃO, AJUIZADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. ILEGITIMIDADE ATIVA. ANULAÇÃO PARCIAL DO PROCESSO. PROVIMENTO DA APELAÇÃO.
I - O tema que enlaça a demanda é de cariz nitidamente patrimonial: a DIOCESE DE SOBRAL e o PATRIMÔNIO DE SÃO FRANCISCO DA CAPELA DE CAIÇARA (ente despersonalizado) venderam a MANOEL AROLDO BRANDÃO e sua esposa FRANCISCA DAS CHAGAS VASCONCELOS BRANDÃO
uma porção de terra situada na Praia do Preá, Município de Cruz/CE, tendo o ato sido levado a assentamento no Cartório de Registro de Imóveis de Cruz, no livro n.º 01-A, fl. 112. À luz desse fato, insurgiu-se o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ,
buscando a nulidade do registro, através de uma ação apresentada ao juízo daquela Comarca, posteriormente transposta à cura da JUSTIÇA FEDERAL, 11ª Vara, sediada em Sobral/CE.
II - Contestada, em sede de preâmbulo, a legitimidade do MPF para estar no lado ativo de uma liça deste jaez, com a consequente incompetência da JUSTIÇA FEDERAL, advindo uma interlocutória de cujo texto destaco: "Quanto à competência da Justiça Federal,
há de se reconhecer que parcela da jurisprudência mais recente vem admitindo a competência da Justiça Federal pelo simples fato de o MPF figurar no pólo ativo da lide, pois, por ser órgão da União, configuraria a hipótese do art. 109, I, da CF/88 (STJ.
CC 200601435361. 1ª Seção. DJE 0/07/2009; STJ. CC 201000897487. 2ª Seção. DJE 01/12/2010; TRF 5ª Região. AG 89324. 3ª Turma. J. 8/04/2010). Ademais, a União apontou seu interesse em integrar a lide, na qualidade de assistente simples (f. 603-604). Tal
fato já denota a competência da Justiça Federal para processar a causa, nos termos do art. 109, I, da CF/88. // A legitimidade ativa do Ministério Público Federal, por sua vez, funda-se na salutar e vigilante fiscalização da manutenção da ordem
jurídica, através da proteção do interesse público de grande relevância social, com previsão no art. 127 da Constituição Federal, visando coibir suposta simulação de negócio jurídico".
III - Quanto à definição da competência da JUSTIÇA FEDERAL, ao menos provisoriamente, andou certo o magistrado de primeiro grau. Já quanto à legitimidade do MPF, há equívoco. A decisão está posta em elementos vagos, tais como "salutar e vigilante
fiscalização da manutenção da ordem jurídica" e "proteção do interesse público de grande relevância social". Sequer a invocação genérica do disposto no art. 127 da CF, "visando coibir suposta simulação de negócio jurídico" tem o condão de demarcar
atribuições ao MPF para iniciar uma ação como a presente.
IV - Como já dito, o fato que se põe em discussão é de índole patrimonial: o bem vendido pertence a quem o vendeu (a DIOCESE) ou à UNIÃO, como bem dominial cuja propriedade é assegurada pela CF, art. 20, VII? Ora, sendo uma discussão de cunho
patrimonial, envolvendo direitos ou interesses da UNIÃO, ela se apresenta em juízo com roupagem similar à dos particulares, sendo defendida ou presentada pela ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO, a teor do que está na Carta Magna, art. 131: "A Advocacia-Geral da
União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e
assessoramento jurídico do Poder Executivo".
V - Rememore-se que o presente feito não é uma ação civil pública, mas sim uma ação ordinária, o que torna ainda mais inadequada a presença do Parquet como titular do lado ativo. Se uma ACP fosse, a temática versada teria que encontrar encaixe no que
dispõe o art. 1º da Lei 7.347/85, de sorte a contemplar o MPF, por força do art. 5º, I da mesma lei específica. Mas não é o que ocorre. O que se tem aqui é uma pendenga de perfil patrimonial, econômico, na qual a UNIÃO preferiu a posição mais retraída
de assistente.
VII - Não se controverte que o MINISTÉRIO PÚBLICO consiga encaixe na vaga de custo legis, com espeque no disposto no art. 82 do CPC/1972, aplicável à época da deflagração deste feito. Mas não como titular da demanda.
VIII - E qual a solução que se apresenta para o embate, na presente quadra recursal? A seguinte: a) anular o processo, desde o recebimento do feito pela Justiça Federal, vindo da Comarca de Cruz/CE; b) excluir o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL da qualidade
de autor; c) determinar o regresso dos autos à 11ª Vara Federal do Ceará, para que lá seja intimada a UNIÃO para, querendo, titularizar a ação na condição de autora, seguindo-se os trâmites processuais ordinários, inclusive a possível participação do
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL como custo legis, se houver necessidade de tanto.
IX - Provimento da apelação.Decisão
UNÂNIME
Data do Julgamento
:
27/03/2018
Data da Publicação
:
06/04/2018
Classe/Assunto
:
AC - Apelação Civel - 596057
Órgão Julgador
:
Quarta Turma
Relator(a)
:
Desembargador Federal Ivan Lira de Carvalho
Comarca
:
TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** CPC-73 Código de Processo Civil
LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-82
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LEG-FED LEI-7347 ANO-1985 ART-1 ART-5 INC-1
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***** CPC-15 Código de Processo Civil
LEG-FED LEI-13105 ANO-2015 ART-487 INC-1
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***** CF-88 Constituição Federal de 1988
ART-109 INC-1 ART-127 ART-131 ART-20 INC-7
Fonte da publicação
:
DJE - Data::06/04/2018 - Página::191
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