TRF5 200580010032487
CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO - DPU. INSTALAÇÃO DE NÚCLEO NA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE ARAPIRACA/AL. DIREITO FUNDAMENTAL CONSTITUCIONAL À ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA INTEGRAL E GRATUITA. OPÇÃO DE LOTAÇÃO DE DPU'S EM MACEIÓ. NÃO CONSIDERAÇÃO DOS ELEMENTOS POPULACIONAIS E DE DEMANDA JUDICIAL. ILEGALIDADE DA ATUAÇÃO ADMINISTRATIVA. TEORIA DOS MOTIVOS DETERMINANTES. DISCRICIONARIEDADE. AFASTAMENTO. LIMITES ORÇAMENTÁRIOS E RESERVA DO POSSÍVEL. NÃO DEMONSTRAÇÃO. MULTA DIÁRIA. IMPOSIÇÃO À FAZENDA PÚBLICA. POSSIBILIDADE.
1. Conforme asseverado na sentença apelada (fl. 177), a Subseção Judiciária de Arapiraca/AL abrange 46% dos municípios alagoanos e em torno de 35% da população do Estado de Alagoas, além de compreender regiões mais pobres desse Estado, com a estimativa de que 70% da demanda previdenciária no JEF em Maceió seja oriunda de residentes dessa área, além de haver grande demanda processual no próprio JEF Adjunto à Vara Federal em Arapiraca (mais de cinco mil processos em menos de um ano, nos termos expressos na sentença apelada).
2. Esses dados demonstram a necessidade de atuação concreta da DPU na região sob jurisdição da Subseção Judiciária de Arapiraca/AL, bem como a desproporcionalidade e não razoabilidade da opção da Administração Pública de lotar 04 (quatro) defensores em Macéio/AL e nenhum em Arapiraca/AL, restando caracterizada a mora do Poder Executivo Federal em atender, de forma adequada, ao direito fundamental à assistência jurídica integral e gratuita previsto no art. 5.º, inciso LXXIV, de aplicabilidade imediata, mesmo após mais de quinze anos da promulgação da CF/88, isso, ao tempo da prolação da sentença apelada.
3. Aliás, a opção administrativa referida no parágrafo anterior, quanto à lotação de Defensores Públicos ali indicada, foi exercida quando já em curso a presente lide e deferida a tutela antecipada nesta ação, o que caracteriza não apenas a mora do Poder Executivo Federal, mas o desrespeito à tutela jurisdicional de urgência deferida nestes autos, além de ser suficiente para afastar as alegações da UNIÃO em relação aos limites orçamentários (reserva do possível), os quais, ademais, foram alegados, apenas, genericamente, sem indicação concreta de sua existência e reflexos sobre o objeto da lide, não estando, portanto, provados para fins de caracterização de obstáculo à pretensão inicial desta ação civil pública.
4. Do ponto de vista concreto, não há necessidade de examinar toda a necessidade nacional de Defensores Públicos Federais para verificar a legalidade ou ilegalidade da conduta omissiva da Administração neste caso, sendo suficiente, ao contrário, circunscrever esse exame ao âmbito do Estado de Alagoas para que reste verificada, pelos fundamentos acima, a conduta omissiva ilegal da administração pública, não sendo o simples critério do número de varas em Maceió em confronto com o de Arapiraca suficiente para justificar a escolha administrativa quando cotejado com os dados acima já referidos e examinados na sentença apelada relativos à questão populacional e à demanda judicial local, que são os elementos que devem guiar, à evidência, a ação administrativa no sentido de cumprir o dever constitucional de oferta estatal de assistência judiciária gratuita e integral.
5. Ademais, o quadro acima demonstra, também, que a margem de discricionariedade administrativa da qual gozava a UNIÃO na alocação do quadro de Defensores Públicos da União foi restringida pela própria motivação por ela alegada como critério para essa lotação e pela desconsideração concreta dos elementos fáticos acima examinados, o que, em aplicação da teoria dos motivos determinantes e pela constatação da ilegalidade destes em virtude de sua não razoabilidade e proporcionalidade, é suficiente para justificar a intervenção judicial no ato administrativo concreto, sem qualquer violação da independência dos Poderes e/ou do âmbito de discricionariedade da ação administrativa.
6. As alternativas indicadas pela UNIÃO para a pretensão inicial do MPF não se mostram, ademais, razoáveis, pois ou já demonstradas como não realizáveis do ponto de vista fático, conforme indicado na sentença apelada (convênio com a Defensoria Pública Estadual), ou caracterizam-se como mais custosas e/ou ineficientes (auxílios provisórios de DPU's de outros Estados, com necessidade de pagamento de diárias; atendimento do interior pela DPU em Macéio; nomeação de defensores dativos pela Justiça Federal), como, inclusive, já comprovado pela própria experiência notória da Justiça Federal com essas duas últimas opções, bem como não foram elas implementadas de forma eficaz pela UNIÃO em qualquer momento anterior para demonstração de sua capacidade de atender ao direito fundamental protegido pela tutela jurisdicional deferida nestes autos.
7. Não há, por sua vez, qualquer óbice legal a que ação civil pública traga pretensão de concretização de obrigação de fazer específica pelo Poder Público, estando, ao contrário, a possibilidade desse pleito prevista no art. 3.º da Lei n.º 7.347/85.
8. A jurisprudência do STJ (STJ, 5.ª Turma, AgRg no Ag n.º 1.021.240/RJ, Relatora Ministra Laurita Vaz, DJe 23.06.2008) está, por fim, pacificada quanto à possibilidade de imputação de multa diária a entes públicos para o cumprimento de obrigação de fazer, sendo a necessidade dessa imputação decorrente, infelizmente, da recalcitrância concreta no cumprimento de ordens judiciais, inclusive, conforme demonstrado neste caso concreto.
9. Não provimento da apelação da UNIÃO e da remessa oficial.
(PROCESSO: 200580010032487, AC415774/AL, DESEMBARGADOR FEDERAL EMILIANO ZAPATA LEITÃO (CONVOCADO), Primeira Turma, JULGAMENTO: 14/01/2010, PUBLICAÇÃO: DJE 28/01/2010 - Página 95)
Ementa
CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO - DPU. INSTALAÇÃO DE NÚCLEO NA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE ARAPIRACA/AL. DIREITO FUNDAMENTAL CONSTITUCIONAL À ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA INTEGRAL E GRATUITA. OPÇÃO DE LOTAÇÃO DE DPU'S EM MACEIÓ. NÃO CONSIDERAÇÃO DOS ELEMENTOS POPULACIONAIS E DE DEMANDA JUDICIAL. ILEGALIDADE DA ATUAÇÃO ADMINISTRATIVA. TEORIA DOS MOTIVOS DETERMINANTES. DISCRICIONARIEDADE. AFASTAMENTO. LIMITES ORÇAMENTÁRIOS E RESERVA DO POSSÍVEL. NÃO DEMONSTRAÇÃO. MULTA DIÁRIA. IMPOSIÇÃO À FAZENDA PÚBLICA. POSSIBILIDADE.
1. Conforme asseverado na sentença apelada (fl. 177), a Subseção Judiciária de Arapiraca/AL abrange 46% dos municípios alagoanos e em torno de 35% da população do Estado de Alagoas, além de compreender regiões mais pobres desse Estado, com a estimativa de que 70% da demanda previdenciária no JEF em Maceió seja oriunda de residentes dessa área, além de haver grande demanda processual no próprio JEF Adjunto à Vara Federal em Arapiraca (mais de cinco mil processos em menos de um ano, nos termos expressos na sentença apelada).
2. Esses dados demonstram a necessidade de atuação concreta da DPU na região sob jurisdição da Subseção Judiciária de Arapiraca/AL, bem como a desproporcionalidade e não razoabilidade da opção da Administração Pública de lotar 04 (quatro) defensores em Macéio/AL e nenhum em Arapiraca/AL, restando caracterizada a mora do Poder Executivo Federal em atender, de forma adequada, ao direito fundamental à assistência jurídica integral e gratuita previsto no art. 5.º, inciso LXXIV, de aplicabilidade imediata, mesmo após mais de quinze anos da promulgação da CF/88, isso, ao tempo da prolação da sentença apelada.
3. Aliás, a opção administrativa referida no parágrafo anterior, quanto à lotação de Defensores Públicos ali indicada, foi exercida quando já em curso a presente lide e deferida a tutela antecipada nesta ação, o que caracteriza não apenas a mora do Poder Executivo Federal, mas o desrespeito à tutela jurisdicional de urgência deferida nestes autos, além de ser suficiente para afastar as alegações da UNIÃO em relação aos limites orçamentários (reserva do possível), os quais, ademais, foram alegados, apenas, genericamente, sem indicação concreta de sua existência e reflexos sobre o objeto da lide, não estando, portanto, provados para fins de caracterização de obstáculo à pretensão inicial desta ação civil pública.
4. Do ponto de vista concreto, não há necessidade de examinar toda a necessidade nacional de Defensores Públicos Federais para verificar a legalidade ou ilegalidade da conduta omissiva da Administração neste caso, sendo suficiente, ao contrário, circunscrever esse exame ao âmbito do Estado de Alagoas para que reste verificada, pelos fundamentos acima, a conduta omissiva ilegal da administração pública, não sendo o simples critério do número de varas em Maceió em confronto com o de Arapiraca suficiente para justificar a escolha administrativa quando cotejado com os dados acima já referidos e examinados na sentença apelada relativos à questão populacional e à demanda judicial local, que são os elementos que devem guiar, à evidência, a ação administrativa no sentido de cumprir o dever constitucional de oferta estatal de assistência judiciária gratuita e integral.
5. Ademais, o quadro acima demonstra, também, que a margem de discricionariedade administrativa da qual gozava a UNIÃO na alocação do quadro de Defensores Públicos da União foi restringida pela própria motivação por ela alegada como critério para essa lotação e pela desconsideração concreta dos elementos fáticos acima examinados, o que, em aplicação da teoria dos motivos determinantes e pela constatação da ilegalidade destes em virtude de sua não razoabilidade e proporcionalidade, é suficiente para justificar a intervenção judicial no ato administrativo concreto, sem qualquer violação da independência dos Poderes e/ou do âmbito de discricionariedade da ação administrativa.
6. As alternativas indicadas pela UNIÃO para a pretensão inicial do MPF não se mostram, ademais, razoáveis, pois ou já demonstradas como não realizáveis do ponto de vista fático, conforme indicado na sentença apelada (convênio com a Defensoria Pública Estadual), ou caracterizam-se como mais custosas e/ou ineficientes (auxílios provisórios de DPU's de outros Estados, com necessidade de pagamento de diárias; atendimento do interior pela DPU em Macéio; nomeação de defensores dativos pela Justiça Federal), como, inclusive, já comprovado pela própria experiência notória da Justiça Federal com essas duas últimas opções, bem como não foram elas implementadas de forma eficaz pela UNIÃO em qualquer momento anterior para demonstração de sua capacidade de atender ao direito fundamental protegido pela tutela jurisdicional deferida nestes autos.
7. Não há, por sua vez, qualquer óbice legal a que ação civil pública traga pretensão de concretização de obrigação de fazer específica pelo Poder Público, estando, ao contrário, a possibilidade desse pleito prevista no art. 3.º da Lei n.º 7.347/85.
8. A jurisprudência do STJ (STJ, 5.ª Turma, AgRg no Ag n.º 1.021.240/RJ, Relatora Ministra Laurita Vaz, DJe 23.06.2008) está, por fim, pacificada quanto à possibilidade de imputação de multa diária a entes públicos para o cumprimento de obrigação de fazer, sendo a necessidade dessa imputação decorrente, infelizmente, da recalcitrância concreta no cumprimento de ordens judiciais, inclusive, conforme demonstrado neste caso concreto.
9. Não provimento da apelação da UNIÃO e da remessa oficial.
(PROCESSO: 200580010032487, AC415774/AL, DESEMBARGADOR FEDERAL EMILIANO ZAPATA LEITÃO (CONVOCADO), Primeira Turma, JULGAMENTO: 14/01/2010, PUBLICAÇÃO: DJE 28/01/2010 - Página 95)
Data do Julgamento
:
14/01/2010
Classe/Assunto
:
Apelação Civel - AC415774/AL
Órgão Julgador
:
Primeira Turma
Relator(a)
:
Desembargador Federal Emiliano Zapata Leitão (Convocado)
Comarca
:
Tribunal Regional Federal - 5ª Região
Código do documento
:
212456
PublicaÇÕes
:
Diário da Justiça Eletrônico TRF5 (DJE) - 28/01/2010 - Página 95
DecisÃo
:
UNÂNIME
Veja tambÉm
:
AgRg no Ag 1021240/RJ (STJ)
ReferÊncias legislativas
:
LEG-FED PRT-205 ANO-2006 (DPU)
CF-88 Constituição Federal de 1988 ART-2 ART-5 INC-74
LEG-FED LEI-1060 ANO-1950
LEG-FED LEI-7347 ANO-1985 ART-3
Votantes
:
Desembargador Federal Francisco Cavalcanti
Desembargador Federal Rogério Fialho Moreira
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