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Jurisprudência


TRF5 200583000164470

Ementa
CIVIL. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO - SFH. CONTRATO DE MÚTUO HABITACIONAL. REVISÃO. 1. Apelações interpostas pelo mutuário e pela CEF contra sentença proferida nos autos de ação ordinária de revisão de contrato de mútuo habitacional, firmado no âmbito do SFH. 2. Sobre a legitimidade passiva ad causam da CEF/EMGEA: "1. A CEF é instituição financeira que sucedeu o BNH em direitos e obrigações, sendo a administração operacional do SFH atribuída a essa empresa pública, legitimada nos processos em andamento, mesmo com a transferência das operações de crédito imobiliário e seus acessórios à EMGEA./2. A EMGEA deve compor o pólo passivo da demanda, na condição de litisconsorte, em face da cessão dos créditos hipotecários relativos ao contrato sob exame" (TRF5, Primeira Turma, AC 402156/PB, Rel. Des. Federal Francisco Wildo, j. em 01.02.2007). Determinação de reintegração da CEF na lide. 3. O SFH foi criado com vistas a estimular a construção de habitações de interesse social e a possibilitar a aquisição da casa própria pelas classes da população que percebiam menor renda e que, portanto, não tinham condições de recorrer à iniciativa privada. 4. O SFH foi fundado no direito à moradia, agasalhado esse pela Constituição Federal como direito social, necessidade premente do trabalhador. Trata-se de reconhecer a habitação como direito inerente à condição humana, habitação como refúgio e como permissivo da inserção do indivíduo no convívio social. Consoante se apreende da evolução normativa da matéria, ao SFH se confere conotação nitidamente social (decorrente de sua finalidade), sendo a ele inerente o equilíbrio que deve permear a relação entre a renda do mutuário e as prestações do financiamento. 5. O princípio do pacta sunt servanda deve ser interpretado de forma harmônica com as outras normas jurídicas que integram o ordenamento, impondo-se o seu sopeso, inclusive e especialmente, diante do escopo do negócio jurídico ajustado. 6. Insiste o autor que a CEF está descumprindo o plano de equivalência salarial por categoria profissional no reajuste das prestações mensais do contrato. É ônus do autor a demonstração de que a CEF estaria descumprindo o PES/CP. Entretanto, dele não se desincumbiu, pois não trouxe elementos documentais aptos à demonstração de que os demais reajustes do financiamento se perfizeram em descompasso com os aumentos salariais da categoria. Apelação do mutuário a que se nega provimento, nessa parte. 7. O mutuário pediu a revisão do montante cobrado a título de seguros, que também deveria seguir os índices de reajuste salarial da categoria profissional do mutuário. No respeitante ao seguro, as parcelas a ele referentes, mercê de sua natureza acessória, devem obedecer aos mesmos critérios de reajuste das prestações. In casu, contudo, não se comprovou que as prestações estivessem sendo reajustadas em descompasso com a evolução salarial do mutuário (PES/CP), nem restou demonstrado o descumprimento do ajuste em relação ao seguro, nesse tocante. Apelação do mutuário não provida nessa parte. 8. O mutuário postulou a limitação dos juros contratuais. Juros nominais correspondem à taxa de juros contratada numa determinada operação financeira (encontrada, a sua expressão mensal, a partir da divisão do percentual por 12, ou seja, pelo número de meses do ano), e juros efetivos, à taxa de rendimento que a operação financeira proporciona efetivamente (já que a incidência de juros em cada mês acarreta percentual, no final do ano, não coincidente com a taxa nominal). A existência das taxas nominal e efetiva deriva da própria mecânica da matemática financeira. De se observar que a taxa nominal é fixada para um período de um ano, ao passo que a freqüência da amortização é mensal (períodos diferentes, portanto). A ré estaria a agir ilegitimamente se omitisse o percentual da taxa de juros efetiva, o que não ocorreu. As duas espécies restaram expressamente consignadas no instrumento contratual, sendo definidas em 10,5% (nominal) e 11,0203% (efetiva), acima, portanto, do limite de 10% estabelecido pela Lei nº 4.380/64, vigorante, quanto a esse limite, até o advento da Lei nº 8.692/93, que, em seu art. 25, estabeleceu o teto de 12% (o contrato é de 16.12.91), devendo os percentuais referidos serem reduzidos para 10%. Apelação do mutuário a que se dá provimento nessa parte. 9. O mutuário alegou a ocorrência de anatocismo. Caracterizada, in casu, a injurídica incidência de juros sobre juros em razão da amortização negativa. "A jurisprudência dos tribunais pátrios vem firmando o entendimento de que há capitalização dos juros na forma utilizada pela Tabela Price para amortização das prestações. 'A capitalização dos juros é proibida (Súmula 121/STJ), somente aceitável quando expressamente permitida em lei (Súmula 93/STJ), o que não acontece no SFH'. Precedente do STJ" (TRF5, Primeira Turma, AC nº 400982/CE, Rel. Des. Federal Francisco Wildo, j. em 14.12.2006). Provimento da apelação do mutuário nesse aspecto. 10. O mutuário entendeu que a cobrança da CES seria ilegal. O CES - Coeficiente de Equiparação Salarial, instituído pela Resolução nº 36/69, do extinto BNH, e referido no art. 8o, da Lei nº 8.692/93, deve ter a sua aplicação mantida, in casu, por estar expressamente previsto no contrato. Precedente do STJ: "Não havendo previsão contratual não há como determinar aplicação do CES - Coeficiente de Equiparação Salarial, presente a circunstância de ser o contrato anterior à lei que o criou" (Terceira Turma, RESP 703907/SP, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. em 15.08.2006). Não provimento da apelação do mutuário nesse ponto. 11. O mutuário se insurgiu contra a correção do saldo devedor pela TR. "Tem-se verificado os efeitos resultantes da previsão de distintas formas de correção das prestações mensais e do saldo devedor, de modo que, enquanto a evolução das prestações é contida, em muitos contratos, pela regra da equivalência salarial, o saldo devedor alcança patamares acerbos por ser guiado pelos índices de reajustamento das cadernetas de poupança. É patente que a garantia contratual da equivalência salarial não se realiza - restando a correspondente previsão normativa esvaziada - quando, a despeito de a correção das prestações se verificar pela variação salarial, o saldo devedor avança por critérios financeiros díspares e de acentuada oscilação, sobretudo em condições inflacionárias. É público e notório que há grande diferença em relação aos percentuais de reajuste dos saldos devedores de empréstimos pelos índices das cadernetas de poupança e os reajustes de remuneração dos mutuários empregados. Cotejando-se qualquer índice financeiro com os reajustes salariais (quando ocorrentes) nos últimos anos, ver-se-á gritante disparidade. Até mesmo o modesto índice da caderneta de poupança torna-se elevado quando comparado com os reajustes salariais. A unificação dos indexadores que corrigem as prestações e o saldo devedor permitiria uma evolução do débito de forma mais consentânea com a situação fática vivenciada pelos mutuários, fazendo desaparecer ou amenizar a figura do resíduo. Essa uniformização apenas pode se verificar com a prevalência da equivalência salarial, por ser o critério mais conforme com o escopo desse verdadeiro programa social" (entendimento vencido do Relator). Manutenção da TR (entendimento majoritário da Turma). Apelação do mutuário improvida nesse ponto. 12. O mutuário pediu a modificação da sistemática de amortização/reajuste do saldo devedor. "A fórmula, segundo a qual corrige-se o saldo devedor majorando-o, para, após avultá-lo, deduzir a prestação devidamente quitada pelo mutuário, apresenta-se imprópria por não permitir zerar o saldo devedor e por transgredir ao escopo perseguido pelo Sistema Financeiro de Habitação, sob cuja égide se acha o contrato em tela. A operação razoável deve ser expressa inicialmente abatendo-se a prestação quitada, para depois corrigir o saldo devedor, conforme art. 6º, c, da lei 4380/64" (TRF5, Primeira Turma, AC 402054/PE, Rel. Des. Federal Francisco Wildo, j. em 01.03.2007, por maioria). Provimento da apelação do mutuário nesse tocante. 13. Buscou, o mutuário, a repetição do que teria pago a maior à instituição financeira, com dobre, de acordo com a regra encartada no parágrafo único, do art. 42, do CDC (Lei nº 8.078/90). Se é certo que aos contratos de financiamento firmados no âmbito do SFH se aplicam as regras do Código de Defesa do Consumidor (no STJ, ver o RESP 591110/BA, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, j. em 04.05.2004; e o RESP 756973/RS, Rel. Min. Castro Filho, j. em 27.03.2007), por outro lado, no caso em apreciação não estão configurados motivos suficientes à imposição do dobre, porquanto os procedimentos aplicados pela CEF são controversos na esfera judicial, não estando demonstradas má-fé ou intenção de fraude. O montante pago a maior deve ser dirigido à quitação das prestações em atraso, se houver, e, se ainda assim houver sobra, à amortização do saldo devedor, não havendo que se falar em restituição. Apelação que a se nega provimento nesse tocante. 14. Não há que se falar em inconstitucionalidade do Decreto-Lei nº 70/66. O Supremo Tribunal Federal já se manifestou, por diversas vezes, no sentido de que o Decreto-lei 70/66 é compatível com a atual Constituição. 15. "É nula a obrigação cambial assumida por procurador do mutuário vinculado ao mutuante, no exclusivo interesse deste" (Súmula nº 60 do STJ). Nula, portanto, a cláusula trigésima quinta do contrato. Precedente (TRF5, Terceira Turma, AC 402541/PE, Rel. Des. Federal Ridalvo Costa, j. em 12.04.2007). Não provimento da apelação da CEF. 16. Custas e honorários advocatícios esses fixados em R$1.000,00, a cargo da CEF. 17. Apelação da CEF não provida. 18. Apelação do mutuário parcialmente provida. (PROCESSO: 200583000164470, AC406017/PE, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO CAVALCANTI, Primeira Turma, JULGAMENTO: 29/05/2008, PUBLICAÇÃO: DJ 18/08/2008 - Página 802)

Data do Julgamento : 29/05/2008
Classe/Assunto : Apelação Civel - AC406017/PE
Órgão Julgador : Primeira Turma
Relator(a) : Desembargador Federal Francisco Cavalcanti
Comarca : Tribunal Regional Federal - 5ª Região
Código do documento : 164056
PublicaÇÕes : Diário da Justiça (DJ) - 18/08/2008 - Página 802
DecisÃo : POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA CEF E, POR MAIORIA, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DOS MUTUÁRIO, NOS TERMOS DO RELATÓRIO E VOTO ANEXOS, QUE PASSAM A INTEGRAR O PRESENTE JULGAMENTO. VENCIDO O RELATOR APENAS NA PARTE EM QUE ACATAVA A CORREÇÃO DO SALDO DEVEDOR PELO PES/CP E NÃO PELA TR.
Veja tambÉm : AC 402156/PB (TRF5)AC 400982/CE (TRF5)RESP 703907/SP (STJ)AC 402054/PE (TRF5)
ReferÊncias legislativas : LEG-FED LEI-1060 ANO-1950 ART-12 LEG-FED LEI-4380 ANO-1964 ART-6 LET-C ART-5 PAR-4 PAR-3 LEG-FED DEL-70 ANO-1966 LEG-FED LEI-8692 ANO-1993 ART-25 ART-8 LEG-FED SUM-121 (STJ) LEG-FED SUM-93 (STJ) LEG-FED RES-36 ANO-1969 (BNH) CDC-90 Código de Defesa do Consumidor LEG-FED LEI-8078 ANO-1990 ART-42 PAR-ÚNICO LEG-FED SUM-60 (STJ) LEG-FED LEI-8177 ANO-1991 ART-18 PAR-1 PAR-2 PAR-3 PAR-4 LEG-FED DEL-2164 ANO-1984 LEG-FED SUM-295 (STJ) CPC-73 Código de Processo Civil LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-21 ART-557 LEG-FED DEL-19 ANO-1966 ART-1 CF-88 Constituição Federal de 1988 ART-102 INC-3 LET-B ART-5 INC-55 LEG-FED RGI-000000 ART-21 PAR-1 (STF) LEG-FED LEI-8038 ANO-1990 ART-38 LEG-FED LEI-9756 ANO-1998 LEG-FED SUM-297 (STJ)
Votantes : Desembargador Federal José Maria Lucena Desembargador Federal Francisco Cavalcanti
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