TRF5 200682020002646
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. MEDIDA CAUTELAR DE INDISPONIBILIDADE DE BENS INCIDENTAL A AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ALEGAÇÃO DE INAPLICABILIDADE DA LEI Nº 8.429/92 AOS AGENTES POLÍTICOS. PRELIMINAR REJEITADA. INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA NÃO ACOLHIDA. NECESSIDADE DA PRÉVIA IMPRESCINDIBILIDADE DA INSTAURAÇÃO PRÉVIA DE INQUÉRITO NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL AFASTADA. OBJETIVO PRIMORDIAL DA CAUTELAR DE ASSEGURAR A EFICÁCIA DA DECISÃO A SER PROFERIDA NO PROCESSO PRINCIPAL. BEM SUFICIENTE PARA O ADIMPLEMENTO DE EVENTUAL CONDENAÇÃO. PRINCÍPIO FAVOR DEBITORIS. EXCESSO VERIFICADO. LIBERAÇÃO DOS DEMAIS. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
Apesar de o Supremo Tribunal Federal ter fixado, por ocasião do julgamento da Reclamação n.º 2.138/DF, o entendimento segundo o qual os agentes políticos não respondem por improbidade administrativa com base na Lei 8.429/92, mas apenas por crime de responsabilidade, entendo, com a devida venia à respeitável decisão do Pretório Excelso que a Lei de Improbidade Administrativa é perfeitamente aplicável aos agentes políticos, quer em exercício do mandato ou não.
As responsabilidades político-administrativas previstas na Carta Magna cumprem desideratos diversos e não são excludentes umas das outras, conquanto se saiba que os agentes políticos encontram-se, inclusive, regidos por normas especiais de responsabilidade. Tal, porém, não é fundamento para excluí-los da aplicação da LIA. Nesse sentido são os votos dos Ministros Joaquim Barbosa e Carlos Velloso naquela assentada.
Ademais, o julgamento da Reclamação n.º 2.138/DF reflete apenas uma tendência provisória da Corte, observada a sua composição de então, não vinculando o juízo de primeiro grau, tampouco gerando efeitos erga omnes, máxime quando em precedente mais recente (Pet. 3923/SP), o mesmo STF, agora com os votos de vários dos ministros por último nomeados, admitiu que os agentes políticos estão sujeitos ao processo por ato de improbidade administrativa e sem foro especial (assim votaram os ministros Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandowski, Carlos Ayres Brito e Carmen Lúcia Antunes Rocha).
Em relação à inconstitucionalidade da Lei nº 8.429/92, entendo ser falsa a premissa de que o texto constitucional não outorga à União "competência legislativa em termos de norma geral sobre o assunto improbidade administrativa". O mesmo se diga quanto à necessidade de as sanções a agentes municipais serem veiculadas em norma do ente menor. A uma, porque a Constituição Federal expressamente dispõe que os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos. Com efeito, se compete à União legislar, privativamente, sobre direito eleitoral (art. 22, I, CF/88), por dedução lógica, a lei a que se refere o art. 37, parágrafo 4º, CF/88, só pode ser a promulgada pelo legislativo federal. A duas, em razão de as leis federais (ou nacionais) terem presunção de constitucionalidade até que o Supremo Tribunal Federal delibere em sentido contrário. A três, pois o art. 30, II, da CF/88, estabelece que ao município compete suplementar a legislação federal e a estadual no que couber. Ou seja, se a legislação municipal suplementa a legislação federal e estadual, por óbvio que se aquela não existir (à parte incumbe a prova do direito municipal - art. 337, CPC - o que não ocorreu), prevalece a legislação federal, no caso, a Lei nº 8.429/92.
Não se pode permitir que o vácuo legislativo referende a prática de atos de improbidade sem qualquer sanção, notadamente porque incumbe também às edilidades, zelar pela guarda da Constituição, das leis e das instituições democráticas e conservar o patrimônio público (art. 23, I, CF/88).
Quanto à alegada ausência de procedimento administrativo prévio, a instauração de inquérito civil ou qualquer outro procedimento não é condição de procedibilidade para o ajuizamento de ação de improbidade administrativa, dado que o art. 7º, da Lei nº 8.429/92 não pressupõe obrigatoriamente a instauração de um inquérito, tampouco que este seja conduzido por autoridade administrativa. A par de não haver nenhuma pena ao agente que inobservar o preceito, a presente ACP se calca em acórdão do Tribunal de Contas da União, proferido em procedimento pautado no princípio do devido processo legal.
Malgrado esta Turma, ao apreciar a apelação referente ao Processo nº 2002.82.02.001351-2, tenha reformado parcialmente a sentença condenatória quanto ao apelante, aplicando ao mesmo tão somente as penas de perda dos direitos políticos por seis anos e de proibição de contratar com o Poder Público por cinco anos, a eficácia do provimento judicial definitivo somente restará garantida se houver bens dos réus suficientes ao adimplemento das condenações.
Considerando, portanto, que ainda não há decisão sob o manto de imutabilidade da coisa julgada - o que foi verificado pela consulta processual realizada nesta data - por medida de cautela, não pode ser descartada a potencialidade de reforma do julgado proferido por esta Turma no feito principal nas instâncias superiores.
Necessidade de manutenção da decisão de indisponibilidade dos bens do apelante até o trânsito em julgado da decisão no feito principal, limitada, porém, ao valor necessário para o integral ressarcimento dos danos, considerada a amplitude postulada na petição inicial.
Tendo em vista o disposto no art. 620, CPC, e levando-se em conta, em última análise, que os danos a serem suportados pelo recorrente não ultrapassam a soma histórica de R$ 23.639,90 (vinte e três mil, seiscentos e trinta e nove reais e noventa centavos), em regime de solidariedade com os demais corréus, com a multa civil individualizada correspondente ao valor da última remuneração na qualidade de Prefeito do Município de Pombal/PB, o bloqueio do veículo de placas MNE-9874/PB referido no documento de fl. 531 é, segundo a estimativa da FIPE, suficiente para fazer face a uma eventual condenação, incluindo os consectários legais de correção monetária e juros moratórios.
Apelação parcialmente provida.
(PROCESSO: 200682020002646, AC470786/PB, DESEMBARGADOR FEDERAL MAXIMILIANO CAVALCANTI (CONVOCADO), Primeira Turma, JULGAMENTO: 29/10/2009, PUBLICAÇÃO: DJE 23/04/2010 - Página 241)
Ementa
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. MEDIDA CAUTELAR DE INDISPONIBILIDADE DE BENS INCIDENTAL A AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ALEGAÇÃO DE INAPLICABILIDADE DA LEI Nº 8.429/92 AOS AGENTES POLÍTICOS. PRELIMINAR REJEITADA. INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA NÃO ACOLHIDA. NECESSIDADE DA PRÉVIA IMPRESCINDIBILIDADE DA INSTAURAÇÃO PRÉVIA DE INQUÉRITO NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL AFASTADA. OBJETIVO PRIMORDIAL DA CAUTELAR DE ASSEGURAR A EFICÁCIA DA DECISÃO A SER PROFERIDA NO PROCESSO PRINCIPAL. BEM SUFICIENTE PARA O ADIMPLEMENTO DE EVENTUAL CONDENAÇÃO. PRINCÍPIO FAVOR DEBITORIS. EXCESSO VERIFICADO. LIBERAÇÃO DOS DEMAIS. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
Apesar de o Supremo Tribunal Federal ter fixado, por ocasião do julgamento da Reclamação n.º 2.138/DF, o entendimento segundo o qual os agentes políticos não respondem por improbidade administrativa com base na Lei 8.429/92, mas apenas por crime de responsabilidade, entendo, com a devida venia à respeitável decisão do Pretório Excelso que a Lei de Improbidade Administrativa é perfeitamente aplicável aos agentes políticos, quer em exercício do mandato ou não.
As responsabilidades político-administrativas previstas na Carta Magna cumprem desideratos diversos e não são excludentes umas das outras, conquanto se saiba que os agentes políticos encontram-se, inclusive, regidos por normas especiais de responsabilidade. Tal, porém, não é fundamento para excluí-los da aplicação da LIA. Nesse sentido são os votos dos Ministros Joaquim Barbosa e Carlos Velloso naquela assentada.
Ademais, o julgamento da Reclamação n.º 2.138/DF reflete apenas uma tendência provisória da Corte, observada a sua composição de então, não vinculando o juízo de primeiro grau, tampouco gerando efeitos erga omnes, máxime quando em precedente mais recente (Pet. 3923/SP), o mesmo STF, agora com os votos de vários dos ministros por último nomeados, admitiu que os agentes políticos estão sujeitos ao processo por ato de improbidade administrativa e sem foro especial (assim votaram os ministros Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandowski, Carlos Ayres Brito e Carmen Lúcia Antunes Rocha).
Em relação à inconstitucionalidade da Lei nº 8.429/92, entendo ser falsa a premissa de que o texto constitucional não outorga à União "competência legislativa em termos de norma geral sobre o assunto improbidade administrativa". O mesmo se diga quanto à necessidade de as sanções a agentes municipais serem veiculadas em norma do ente menor. A uma, porque a Constituição Federal expressamente dispõe que os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos. Com efeito, se compete à União legislar, privativamente, sobre direito eleitoral (art. 22, I, CF/88), por dedução lógica, a lei a que se refere o art. 37, parágrafo 4º, CF/88, só pode ser a promulgada pelo legislativo federal. A duas, em razão de as leis federais (ou nacionais) terem presunção de constitucionalidade até que o Supremo Tribunal Federal delibere em sentido contrário. A três, pois o art. 30, II, da CF/88, estabelece que ao município compete suplementar a legislação federal e a estadual no que couber. Ou seja, se a legislação municipal suplementa a legislação federal e estadual, por óbvio que se aquela não existir (à parte incumbe a prova do direito municipal - art. 337, CPC - o que não ocorreu), prevalece a legislação federal, no caso, a Lei nº 8.429/92.
Não se pode permitir que o vácuo legislativo referende a prática de atos de improbidade sem qualquer sanção, notadamente porque incumbe também às edilidades, zelar pela guarda da Constituição, das leis e das instituições democráticas e conservar o patrimônio público (art. 23, I, CF/88).
Quanto à alegada ausência de procedimento administrativo prévio, a instauração de inquérito civil ou qualquer outro procedimento não é condição de procedibilidade para o ajuizamento de ação de improbidade administrativa, dado que o art. 7º, da Lei nº 8.429/92 não pressupõe obrigatoriamente a instauração de um inquérito, tampouco que este seja conduzido por autoridade administrativa. A par de não haver nenhuma pena ao agente que inobservar o preceito, a presente ACP se calca em acórdão do Tribunal de Contas da União, proferido em procedimento pautado no princípio do devido processo legal.
Malgrado esta Turma, ao apreciar a apelação referente ao Processo nº 2002.82.02.001351-2, tenha reformado parcialmente a sentença condenatória quanto ao apelante, aplicando ao mesmo tão somente as penas de perda dos direitos políticos por seis anos e de proibição de contratar com o Poder Público por cinco anos, a eficácia do provimento judicial definitivo somente restará garantida se houver bens dos réus suficientes ao adimplemento das condenações.
Considerando, portanto, que ainda não há decisão sob o manto de imutabilidade da coisa julgada - o que foi verificado pela consulta processual realizada nesta data - por medida de cautela, não pode ser descartada a potencialidade de reforma do julgado proferido por esta Turma no feito principal nas instâncias superiores.
Necessidade de manutenção da decisão de indisponibilidade dos bens do apelante até o trânsito em julgado da decisão no feito principal, limitada, porém, ao valor necessário para o integral ressarcimento dos danos, considerada a amplitude postulada na petição inicial.
Tendo em vista o disposto no art. 620, CPC, e levando-se em conta, em última análise, que os danos a serem suportados pelo recorrente não ultrapassam a soma histórica de R$ 23.639,90 (vinte e três mil, seiscentos e trinta e nove reais e noventa centavos), em regime de solidariedade com os demais corréus, com a multa civil individualizada correspondente ao valor da última remuneração na qualidade de Prefeito do Município de Pombal/PB, o bloqueio do veículo de placas MNE-9874/PB referido no documento de fl. 531 é, segundo a estimativa da FIPE, suficiente para fazer face a uma eventual condenação, incluindo os consectários legais de correção monetária e juros moratórios.
Apelação parcialmente provida.
(PROCESSO: 200682020002646, AC470786/PB, DESEMBARGADOR FEDERAL MAXIMILIANO CAVALCANTI (CONVOCADO), Primeira Turma, JULGAMENTO: 29/10/2009, PUBLICAÇÃO: DJE 23/04/2010 - Página 241)
Data do Julgamento
:
29/10/2009
Classe/Assunto
:
Apelação Civel - AC470786/PB
Órgão Julgador
:
Primeira Turma
Relator(a)
:
Desembargador Federal Maximiliano Cavalcanti (Convocado)
Comarca
:
Tribunal Regional Federal - 5ª Região
Código do documento
:
222654
PublicaÇÕes
:
Diário da Justiça Eletrônico TRF5 (DJE) - 23/04/2010 - Página 241
DecisÃo
:
UNÂNIME
Veja tambÉm
:
RCL 2138/DF (STF)Pet 3923/SP (STF)
ReferÊncias legislativas
:
LEG-FED LEI-8429 ANO-1992 ART-7 ART-15 ART-16 ART-12 ART-10
CF-88 Constituição Federal de 1988 ART-22 INC-1 ART-37 (CAPUT) PAR-4 ART-30 INC-2 ART-23 INC-1 ART-5 INC-54 ART-102 INC-1 LET-C ART-85 INC-5
CPC-73 Código de Processo Civil LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-337 ART-620
LEG-FED CNV-35 ANO-2000
LEG-FED LEI-1079 ANO-1950 ART-9
Votantes
:
Desembargador Federal Francisco Cavalcanti
Desembargador Federal Rogério Fialho Moreira
Desembargador Federal Maximiliano Cavalcanti
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