TRF5 2007.83.00.005113-0 200783000051130
PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. AGENTE QUE FALSIFICOU PROCURAÇÕES PARA TRANSFERIR DINHEIRO DA CONTA DE SEUS CLIENTES DA CAIXA PARA O BANCO DO BRASIL SEM SE APROPRIAR DO NUMERÁRIO ESTELIONATO EM DETRIMENTO DA CAIXA (ART. 171, PARÁGRAFO 3º, DO CP). DOLO
ESPECÍFICO NÃO COMPROVADO. AUSÊNCIA DA INTENÇÃO DE OBTER VANTAGEM INDEVIDA. ABSOLVIÇÃO. INOCORRÊNCIA DE PREJUÍZO. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTOS PARTICULARES. ART. 298, DO CP. CONDENAÇÃO MANTIDA. DOSIMETRIA DA PENA. REDUÇÃO DA PENA-BASE. CONTINUIDADE
DELITIVA.
1. Réu que falsificou procurações particulares de clientes do escritório de advocacia em que trabalhava para transferir dinheiro da conta de seus clientes da CAIXA para o Banco do Brasil S/A, sem se apropriar do numerário, no intuito de agilizar os
depósitos necessários para a continuidade de processos judiciais em curso. Absolvição do crime previsto no art. 171, parágrafo 3º, do CP (estelionato contra a CAIXA) e condenação pelo delito de falsificação de documento público (art. 298, do CP).
2. Os clientes do escritório, as supostas vítimas do delito de estelionato, confirmaram em seus depoimentos perante a Polícia Federal e também em Juízo que não tiveram prejuízo, apesar do saque com documentos falsificados, porque o Apelante lhes
entregou o dinheiro sacado, seja diretamente, seja depositando o numerário no Banco do Brasil, para pagar as despesas referentes a processos judiciais, ressaltando que o Réu ainda continua a representá-los nas ações.
3. O dolo específico avulta como o elemento caracterizador da prática do crime, perfectibilizando a norma insculpida no art. 171, do CP. Não há que se falar em estelionato, se o agente, apesar de usar de um ardil ou fraude (a falsificação da assinatura
de seus clientes em procurações particulares), não visava obter a vantagem - que sabe ilícita -, para si ou para outrem, mas sim agilizar processos judiciais. Absolvição pela prática do art. 171, parágrafo 3º, do CP mantida.
4. Prova da materialidade e da autoria delitiva do crime de falsificação de instrumentos particulares - art. 298, do CP. Réu/Apelante que de modo consciente e voluntário, falsificou documentos particulares, consistentes em 02 (duas) procurações, que
lhes outorgavam poderes para movimentar as contas bancárias de titularidade de 02 (dois) clientes, e os utilizou perante a CEF.
5. Confissão do Réu, devidamente comprovadas pelos documentos e pelos depoimentos prestados pelos clientes, O dolo também restou configurado na medida em que ele, voluntária e conscientemente, falsificou a procuração e depois fez uso do documento falso,
sendo este último "post factum" não punível. Precedente do col. STF (AP 530, Rel. Min. Rosa Weber, Rel. p/Acórdão: Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, julg. em 09/09/2014, publ. 17/11/2014). Condenação pelo crime do art. 298 do CP mantida.
6. Dosimetria da pena. Apelante condenado nas penas do art. 298, c/c o art. 71, do CP, por duas vezes, às penas privativa de liberdade de 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão, em regime aberto, e de multa de 200 (duzentos) dias-multa, cada um
deles no valor de 02 (dois) salários mínimos vigentes à época dos fatos.
7. A sentença considerou desfavoráveis a culpabilidade (por ter o Réu agido com muita destreza, ao providenciar a autenticação das procurações falsas em cartório para lhes conferir maior autenticidade e violar as normas éticas do escritório de advocacia
em que trabalhava), a conduta social e a personalidade (como voltadas ao crime, porque o Apelante tem contra si sentença condenatória por crime contra a Administração Pública), reconhecendo como favoráveis ao Réu todos os outros (motivos,
circunstâncias, consequências e comportamento da vítima), de forma que elevou a pena base em mais que o dobro, fixada em 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão.
8. A ação penal, ainda em curso, sem trânsito em julgado, não pode ser computada para desfavorecer a personalidade e a conduta social do agente, devendo no caso, ser prestigiada a Súmula nº 444, do STJ, pois, como a interpreta a jurisprudência os
"inquéritos policiais ou ações penais em andamento não podem, em razão do princípio constitucional do estado presumido de inocência, ser considerados para fins de exasperação da pena-base, seja a título de maus antecedentes, má conduta social ou
personalidade." - (HC 185.835/RS, Quinta Turma, Rel. Ministra Laurita Vaz, julg. 10/05/2011, publ. DJU 18/05/2011).
9. Havendo apenas 01 (um) requisito desfavorável entre os 08 (oito) previstos no art. 59, do CP (a culpabilidade), pode a sanção ficar próxima ao mínimo legal, reduzindo-se a pena-base para 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão. Em face da presença
da atenuante da confissão espontânea, (art. 65, III, "d", do CP), a pena é reduzida em 04 (quatro) meses, fixando-a em 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de reclusão.
10. Inaplicabilidade da agravante contida no art. 61, II, "b", do CP, incidente quando um delito é praticado "para facilitar ou assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime", porque o Apelante foi absolvido do crime de
estelionato. Presença da majorante correspondente à continuidade delitiva, na medida em que o Apelante, por duas vezes, falsificou documentos particulares em condições semelhantes de tempo, lugar e maneira de execução, devendo incidir a regra prevista
no art. 71 do Código Penal.majorando-se a pena em 1/6 (um sexto), totalizando a pena em 02 (dois) anos, 08 (oito) meses e 20 dias de reclusão, tornada definitiva, a ser cumprida em regime inicialmente aberto.
11. Manutenção da substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes na prestação de serviços à comunidade e no pagamento de R$ 500,00 (quinhentos reais), por mês de condenação, a entidade assistencial a ser
indicada pelo Juízo das Execuções Penais.
12. Redução da pena de multa, para que ela guarde consonância com a pena privativa de liberdade, aplicada próxima ao mínimo legal, diminuindo-a de 200 (duzentos ) para 75 (setenta e cinco) dias-multa, e reduzindo o valor de cada um deles de 02 (dois)
salários mínimos para 01 (salário mínimo) vigente à época dos fatos. Apelação do Ministério Público Federal improvida. Apelação do Réu provida, em parte, apenas para reduzir as penas privativa de liberdade e de multa.
Ementa
PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. AGENTE QUE FALSIFICOU PROCURAÇÕES PARA TRANSFERIR DINHEIRO DA CONTA DE SEUS CLIENTES DA CAIXA PARA O BANCO DO BRASIL SEM SE APROPRIAR DO NUMERÁRIO ESTELIONATO EM DETRIMENTO DA CAIXA (ART. 171, PARÁGRAFO 3º, DO CP). DOLO
ESPECÍFICO NÃO COMPROVADO. AUSÊNCIA DA INTENÇÃO DE OBTER VANTAGEM INDEVIDA. ABSOLVIÇÃO. INOCORRÊNCIA DE PREJUÍZO. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTOS PARTICULARES. ART. 298, DO CP. CONDENAÇÃO MANTIDA. DOSIMETRIA DA PENA. REDUÇÃO DA PENA-BASE. CONTINUIDADE
DELITIVA.
1. Réu que falsificou procurações particulares de clientes do escritório de advocacia em que trabalhava para transferir dinheiro da conta de seus clientes da CAIXA para o Banco do Brasil S/A, sem se apropriar do numerário, no intuito de agilizar os
depósitos necessários para a continuidade de processos judiciais em curso. Absolvição do crime previsto no art. 171, parágrafo 3º, do CP (estelionato contra a CAIXA) e condenação pelo delito de falsificação de documento público (art. 298, do CP).
2. Os clientes do escritório, as supostas vítimas do delito de estelionato, confirmaram em seus depoimentos perante a Polícia Federal e também em Juízo que não tiveram prejuízo, apesar do saque com documentos falsificados, porque o Apelante lhes
entregou o dinheiro sacado, seja diretamente, seja depositando o numerário no Banco do Brasil, para pagar as despesas referentes a processos judiciais, ressaltando que o Réu ainda continua a representá-los nas ações.
3. O dolo específico avulta como o elemento caracterizador da prática do crime, perfectibilizando a norma insculpida no art. 171, do CP. Não há que se falar em estelionato, se o agente, apesar de usar de um ardil ou fraude (a falsificação da assinatura
de seus clientes em procurações particulares), não visava obter a vantagem - que sabe ilícita -, para si ou para outrem, mas sim agilizar processos judiciais. Absolvição pela prática do art. 171, parágrafo 3º, do CP mantida.
4. Prova da materialidade e da autoria delitiva do crime de falsificação de instrumentos particulares - art. 298, do CP. Réu/Apelante que de modo consciente e voluntário, falsificou documentos particulares, consistentes em 02 (duas) procurações, que
lhes outorgavam poderes para movimentar as contas bancárias de titularidade de 02 (dois) clientes, e os utilizou perante a CEF.
5. Confissão do Réu, devidamente comprovadas pelos documentos e pelos depoimentos prestados pelos clientes, O dolo também restou configurado na medida em que ele, voluntária e conscientemente, falsificou a procuração e depois fez uso do documento falso,
sendo este último "post factum" não punível. Precedente do col. STF (AP 530, Rel. Min. Rosa Weber, Rel. p/Acórdão: Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, julg. em 09/09/2014, publ. 17/11/2014). Condenação pelo crime do art. 298 do CP mantida.
6. Dosimetria da pena. Apelante condenado nas penas do art. 298, c/c o art. 71, do CP, por duas vezes, às penas privativa de liberdade de 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão, em regime aberto, e de multa de 200 (duzentos) dias-multa, cada um
deles no valor de 02 (dois) salários mínimos vigentes à época dos fatos.
7. A sentença considerou desfavoráveis a culpabilidade (por ter o Réu agido com muita destreza, ao providenciar a autenticação das procurações falsas em cartório para lhes conferir maior autenticidade e violar as normas éticas do escritório de advocacia
em que trabalhava), a conduta social e a personalidade (como voltadas ao crime, porque o Apelante tem contra si sentença condenatória por crime contra a Administração Pública), reconhecendo como favoráveis ao Réu todos os outros (motivos,
circunstâncias, consequências e comportamento da vítima), de forma que elevou a pena base em mais que o dobro, fixada em 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão.
8. A ação penal, ainda em curso, sem trânsito em julgado, não pode ser computada para desfavorecer a personalidade e a conduta social do agente, devendo no caso, ser prestigiada a Súmula nº 444, do STJ, pois, como a interpreta a jurisprudência os
"inquéritos policiais ou ações penais em andamento não podem, em razão do princípio constitucional do estado presumido de inocência, ser considerados para fins de exasperação da pena-base, seja a título de maus antecedentes, má conduta social ou
personalidade." - (HC 185.835/RS, Quinta Turma, Rel. Ministra Laurita Vaz, julg. 10/05/2011, publ. DJU 18/05/2011).
9. Havendo apenas 01 (um) requisito desfavorável entre os 08 (oito) previstos no art. 59, do CP (a culpabilidade), pode a sanção ficar próxima ao mínimo legal, reduzindo-se a pena-base para 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão. Em face da presença
da atenuante da confissão espontânea, (art. 65, III, "d", do CP), a pena é reduzida em 04 (quatro) meses, fixando-a em 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de reclusão.
10. Inaplicabilidade da agravante contida no art. 61, II, "b", do CP, incidente quando um delito é praticado "para facilitar ou assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime", porque o Apelante foi absolvido do crime de
estelionato. Presença da majorante correspondente à continuidade delitiva, na medida em que o Apelante, por duas vezes, falsificou documentos particulares em condições semelhantes de tempo, lugar e maneira de execução, devendo incidir a regra prevista
no art. 71 do Código Penal.majorando-se a pena em 1/6 (um sexto), totalizando a pena em 02 (dois) anos, 08 (oito) meses e 20 dias de reclusão, tornada definitiva, a ser cumprida em regime inicialmente aberto.
11. Manutenção da substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes na prestação de serviços à comunidade e no pagamento de R$ 500,00 (quinhentos reais), por mês de condenação, a entidade assistencial a ser
indicada pelo Juízo das Execuções Penais.
12. Redução da pena de multa, para que ela guarde consonância com a pena privativa de liberdade, aplicada próxima ao mínimo legal, diminuindo-a de 200 (duzentos ) para 75 (setenta e cinco) dias-multa, e reduzindo o valor de cada um deles de 02 (dois)
salários mínimos para 01 (salário mínimo) vigente à época dos fatos. Apelação do Ministério Público Federal improvida. Apelação do Réu provida, em parte, apenas para reduzir as penas privativa de liberdade e de multa.Decisão
UNÂNIME
Data do Julgamento
:
21/07/2016
Data da Publicação
:
26/07/2016
Classe/Assunto
:
ACR - Apelação Criminal - 13157
Órgão Julgador
:
Terceira Turma
Relator(a)
:
Desembargador Federal Alcides Saldanha
Comarca
:
TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
LEG-FED SUM-444 (STJ)
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
LEG-FED LEI-7117 ANO-1962 ART-38 PAR-1
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
***** CP-40 Codigo Penal
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-171 PAR-3 ART-298 ART-71 ART-59 ART-61 INC-2 LET-B ART-70 ART-304 ART-65 INC-3 LET-D ART-33 PAR-2
Fonte da publicação
:
DJE - Data::26/07/2016 - Página::58
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