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Jurisprudência


TRF5 200705000156823

Ementa
PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. CONTRATO DE MÚTUO HABITACIONAL. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO-SFH. MEDIDA CAUTELAR. MANEJO PERMITIDO. ART. 515, PARÁGRAFO 3O, DO CPC. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DA UNIÃO. LEGITIMIDADE PARA A CAUSA DA CEF E DO BRADESCO. PACIFICAÇÃO JURISPRUDENCIAL. REGULARIDADE DA PETIÇÃO INICIAL. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. PLANO DE ATUALIZAÇÃO MISTA-PAM. PLANO DE EQUIVALÊNCIA SALARIAL-PES. REAJUSTAMENTO DAS PRESTAÇÕES MENSAIS. SALDO DEVEDOR. CRITÉRIO DE ATUALIZAÇÃO. ESCOPO DO PROGRAMA. ONEROSIDADE EXCESSIVA. INADMISSIBILIDADE. PRESENÇA DA FUMAÇA DO BOM DIREITO. PERIGO DE DEMORA. EVIDENCIADO PELA COBRANÇA DAS PRESTAÇÕES EM DESCONFORMIDADE COM OS CRITÉRIOS REPUTADOS CORRETOS. 1. Reconhecida a competência da Justiça Federal para o processamento do feito principal, a tramitação da ação cautelar preparatória deve se efetivar na mesma esfera. Nos termos da sentença, a medida cautelar foi extinta sem julgamento do mérito, em razão do caráter satisfativo do provimento pleiteado, que não se coadunaria com os limites estreitos do instrumento processual eleito. 2. A possibilidade de manejo da ação cautelar para os objetivos pretendidos - suspensão de reajuste das prestações mensais e do saldo devedor de conformidade com o PAM, adotando-se, no cálculo correspondente, o PES - é reconhecida em precedentes do STJ e do TRF5: "O acórdão recorrido, afastando a cautelar sob o fundamento de não ser possível substituir a prestação jurisdicional pleiteada no processo de conhecimento, negou substância aos arts. 798 e 799 do CPC. O objetivo colimado pelos autores foi, exatamente, o de impedir o aumento fora dos limites contratados, o que só será possível deslindar com o reexame da prova, a partir mesmo da controvérsia sobre a natureza do plano, se o de equivalência salarial (PES) como argumentam os autores e reconhece a sentença, se o de atualização mista (PAM) como pretende o réu, ora recorrido./No caso, os autores não poderiam empregar outro meio típico, assim, por exemplo, a consignatória, eis que, de fato, o que ocorre, como demonstrou o despacho que admitiu o recurso, é que eles estavam sob a ameaça de execução, ademais de uma cobrança com aumento incompatível com o contrato, o que somente poderia ser obstado no âmbito do poder geral de cautela, garantindo a situação jurídica existente até o desate do processo principal, já ajuizado" (Trecho da ementa do RESP nº 60222/RJ, Terceira Turma do STJ, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. em 16.12.96); "Nas ações em que se discute os reajustes das prestações do contrato de financiamento de imóvel pelo SFH pelo plano de atualização mista de reajuste da prestação (PAM), a medida cautelar deve ser concedida para que seja autorizado o depósito dos valores que o autor entende devidos, se presentes os requisitos legais necessários, como forma de garantir o processo principal" (Trecho da ementa da AC nº 83377/CE, Primeira Turma do TRF5, Rel. Desembargador Federal Ubaldo Ataíde Cavalcante, j. em 26.03.98). Cabimento do ajuizamento da ação cautelar. 3. Incidência da regra do art. 515, parágrafo 3o, do CPC, já se encontrando o feito maduro para julgamento do mérito. 4. Para a ação revisional de forma de reajuste das prestações mensais e do saldo devedor, atinentes a contrato de mútuo habitacional, firmado no âmbito do sistema financeiro da habitação, e para os feitos que lhe sejam acessórios (medida cautelar), tem legitimidade passiva ad causam a CEF, mas não a União, a teor da jurisprudência pacificada do STJ: "A jurisprudência deste STJ é no sentido de que a CEF, e não a União, tem legitimidade para integrar o pólo passivo das ações movidas por mutuários do Sistema Financeiro de Habitação, nas quais se discute a revisão dos contratos de financiamento para aquisição da casa própria, porque a ela (CEF) foram transferidos os direitos e obrigações do extinto BNH. Precedentes: RESP 742325/BA, 1ª T., Min. Teori Albino Zavascki, DJ 27.06.2005; RESP 127914/GO; 2ª T., Min. João Otávio de Noronha, DJ de 20.06.2005" (Primeira Turma, RESP nº 605831/CE, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, j. em 23.08.2005). Legitimidade passiva da CEF e do BRADESCO. 5. Não é inepta a petição inicial que traz o pedido e a causa de pedir, em que a narração dos fatos desemboca logicamente na conclusão posta, em que o pedido é juridicamente possível e quando não traz pedidos incompossíveis. O ordenamento jurídico não veda a pretensão formulada pelos requerentes. 6. O SFH foi criado com vistas a estimular a construção de habitações de interesse social e a possibilitar a aquisição da casa própria pelas classes da população que percebiam menor renda e que, portanto, não tinham condições de recorrer à iniciativa privada. 7. O SFH foi fundado no direito à moradia, agasalhado esse pela Constituição Federal como direito social, necessidade premente do trabalhador. Trata-se de reconhecer a habitação como direito inerente à condição humana, habitação como refúgio e como permissivo da inserção do indivíduo no convívio social. Consoante se apreende da evolução normativa da matéria, ao SFH se confere conotação nitidamente social (decorrente de sua finalidade), sendo a ele inerente o equilíbrio que deve permear a relação entre a renda do mutuário e as prestações do financiamento. 8. A jurisprudência tem mostrado sensibilidade em relação à temática em análise - substituição do PAM pelo PES como critério de reajustamento -, admitindo-a. "Ainda que o plano de atualização das parcelas estabelecido na avenca seja o misto ('PAM'), havendo lei federal disciplinando o aumento de salários, o reajustamento das parcelas mensais deve obedecer ao comando da equivalência salarial" (Trecho da ementa do RESP nº 101468/PR, Quarta Turma do STJ, Rel. Min. Barros Monteiro, j. em 15.08.2000). "A Resolução 1.446/88, cuja divulgação é de competência do BACEN, permitiu que o mutuário optasse por outro plano de reajuste das prestações que não o da equivalência salarial por categoria profissional, dando margem a que os agentes financeiros adotassem em seus contratos de adesão, critérios de reajustes da casa própria proibitivos ao mutuário assalariado./A competência normativa do Conselho Monetário Nacional, quanto ao SFH, ao suceder o BNH, conforme Decreto-Lei 2.291, art. 7o, inc. III, é meramente regulamentar, e, ao prever a possibilidade de outro critério de reajuste das prestações que não pelo PES, instituiu um dispositivo contra legem./Reconhecimento do direito de o mutuário fazer no certame disposto no parágrafo 5o, do art. 9o, do decreto-Lei 2.164/84, com a modificação dada pela Lei 8.004/90, de forma que a prestação mensal não poderá exceder a relação prestação-salário verificada na data da assinatura do contrato, podendo ser solicitada a revisão a qualquer tempo./Reconhecimento da existência, in casu, de vício de consentimento" (Trecho da ementa da AC nº 46.292/RN, citada na AC nº 50.549/CE, Primeira Turma do TRF5, Rel. Desembargador Federal Ubaldo Ataíde Cavalcante, j. em 18.11.99). 9. A instituição financeira (BRADESCO) confessa que está aplicando à TR, como índice de correção do saldo devedor, quando os contratos de mútuo em tela foram firmados antes da edição da MP nº 294/91, convertida na Lei nº 8.177/91, o que afronta o entendimento pacificado pelo Pretório Excelso, nos autos da ADIN nº 493-0/DF (j. em 25.06.92, publ. em DJ de 04.09.92, Rel. Min. Moreira Alves). 10. "Tem-se verificado os efeitos resultantes da previsão de distintas formas de correção das prestações mensais e do saldo devedor, de modo que, enquanto a evolução das prestações é contida, em muitos contratos, pela regra da equivalência salarial, o saldo devedor alcança patamares acerbos por ser guiado pelos índices de reajustamento das cadernetas de poupança. É patente que a garantia contratual da equivalência salarial não se realiza - restando a correspondente previsão normativa esvaziada - quando, a despeito de a correção das prestações se verificar pela variação salarial, o saldo devedor avança por critérios financeiros díspares e de acentuada oscilação, sobretudo em condições inflacionárias. Com ainda maior força se apresenta a situação de inadimplência necessária a que será levado o mutuário, em razão da previsão de reajuste das prestações mensais e do saldo devedor em percentuais superiores aos de sua evolução salarial (diga-se: reveladora do seu poder de compra). É público e notório que há grande diferença em relação aos percentuais de reajuste dos saldos devedores de empréstimos (e das prestações mensais, quando for o critério previsto) pelos índices das cadernetas de poupança e os reajustes de remuneração dos mutuários empregados. Cotejando-se qualquer índice financeiro com os reajustes salariais (quando ocorrentes) nos últimos anos, ver-se-á gritante disparidade. Até mesmo o modesto índice da caderneta de poupança torna-se elevado quando cotejado com os reajustes salariais. A unificação dos indexadores que corrigem as prestações e o saldo devedor permitiria uma evolução do débito de forma mais consentânea com a situação fática vivenciada pelos mutuários, fazendo desaparecer ou amenizar a figura do resíduo. Essa uniformização apenas pode se verificar com a prevalência da equivalência salarial, por ser o critério mais conforme com o escopo desse verdadeiro programa social"(entendimento vencido do Relator). Correção do saldo devedor pelo IPC/INPC (voto médio). 11. Os Tribunais têm reconhecido certas situações em que, por motivo de onerosidade excessiva para uma das partes contratantes, não se mostra razoável insistir na execução de contrato em sua feição originária. Analogia com as ações revisionais de contratos de aquisição de veículos fundadas nas crises cambiais de 1999. Atenção ao nível de relevância social dos bens envolvidos. 12. Onerosidade excessiva do contrato de mútuo, diante da irrealizabilidade da liquidação do débito, com a conseqüente perda do imóvel. 13. Laconismo contratual que não se coaduna com o direito à informação do mutuário. Insuficiência que se coliga à expectativa de aquisição da casa própria, esperança fundada na certeza de que o aumento das prestações apenas acontecerá em caso de acréscimo dos salários; na convicção de que a correção do débito acompanhará a realidade vivenciada pelo mutuário (equilíbrio contratual); na idéia de que, com o adimplemento periódico e contínuo das obrigações, não haverá saldo devedor ou será ele de menor monta ("saldo devedor eventual"). 14. O mutuário não pode ser penalizado por equívocos cometidos pela instituição financeira no planejamento do sistema habitacional, nem a ele podem ser imputados todos os riscos do negócio jurídico, enquanto a instituição financeira fica salvaguardada. 15. Dada a natureza jurídica do contrato de mútuo, o mutuário possui o direito subjetivo de ver extinta a sua dívida, uma vez adimplidas as prestações periódicas e contínuas ajustadas. Desvirtuamento do contrato de mútuo, convertido em ajuste de aluguel, pela insolvabilidade crescente imputada ao prestamista, resultando na perda do imóvel. 16. Face à responsabilidade social do Estado, saldos remanescentes ao final do contrato deverão ser por ele absorvidos. 17. Presença do fumus boni juris. 18. Perigo de demora manifesto, pelas cobranças a que estão sujeitos os requerentes, em valores não compatíveis com os critérios definidos no feito principal. 19. Pelo parcial provimento do recurso dos requerentes. (PROCESSO: 200705000156823, AC409009/CE, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO CAVALCANTI, Primeira Turma, JULGAMENTO: 09/08/2007, PUBLICAÇÃO: DJ 16/10/2007 - Página 885)

Data do Julgamento : 09/08/2007
Classe/Assunto : Apelação Civel - AC409009/CE
Órgão Julgador : Primeira Turma
Relator(a) : Desembargador Federal Francisco Cavalcanti
Comarca : Tribunal Regional Federal - 5ª Região
Código do documento : 145363
PublicaÇÕes : Diário da Justiça (DJ) - 16/10/2007 - Página 885
DecisÃo : POR MAIORIA
Veja tambÉm : RESP 60222/RJ (STJ)AC 83377/CE (TRF5)RESP 742325/BA (STJ)RESP 127914/GO (STJ)RESP 605831/CE (STJ)AC 46292/RN (TRF5)
Doutrinas : Obra: SFH - UMA ANÁLISE SÓCIO-JURÍDICA DA GÊNESE, DESENVOLVIMENTO E CRISE DO SISTEMA Autor: JOSÉ MARIA ARAGÃO
ObservaÇÕes : Ver julgamento do dia 15/12/2011, publicado no DJE 19/12/2011 - pág.374.
Obraautor: : CONTRATOS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR CLÁUDIA LIMA MARQUES
ReferÊncias legislativas : CPC-73 Código de Processo Civil LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-515 PAR-3 ART-798 ART-799 ART-460 ART-585 PAR-1 ART-297 ART-396 LEG-FED DEL-2164 ANO-1984 ART-9 PAR-5 PAR-1 PAR-2 PAR-3 PAR-4 PAR-6 PAR-7 PAR-8 PAR-9 LEG-FED LEI-8004 ANO-1990 ART-9 LEG-FED SUM-282 (STF) LEG-FED LEI-4380 ANO-1964 ART-5 PAR-5 ART-1 ART-4 INC-1 INC-2 INC-3 INC-4 ART-8 ART-9 ART-61 LET-C ART-16 ART-60 INC-1 INC-2 INC-3 ART-66 ART-6 LET-C CF-88 Constituição Federal de 1988 ART-109 INC-1 LICC-42 Lei de Introdução ao Codigo Civil LEG-FED DEL-4657 ANO-1942 ART-6 PAR-1 ART-5 LEG-FED DEL-2349 ANO-1987 ART-1 LEG-FED LEI-8692 ANO-1993 ART-29 ART-1 ART-2 PAR-ÚNICO ART-3 PAR-ÚNICO ART-4 PAR-1 PAR-2 PAR-3 PAR-4 PAR-5 ART-5 ART-6 ART-7 ART-8 ART-9 ART-10 ART-11 ART-12 ART-13 ART-14 ART-15 LET-D LET-E LET-F LET-G LET-H CC-02 Código Civil LEG-FED LEI-10406 ANO-2002 ART-334 ART-993 LEG-FED LEI-5762 ANO-1971 LEG-FED DEC-72512 ANO-1973 LEG-FED DEC-88293 ANO-1983 LEG-FED LEI-4595 ANO-1964 LEG-FED DEC-59163 ANO-1966 LEG-FED DEC-58377 ANO-1966 LEG-FED LEI-5107 ANO-1966 LEG-FED DEC-63182 ANO-1968 ART-1 PAR-1 ART-5 PAR-2 LEG-FED LEI-4864 ANO-1965 LEG-FED DEL-19 ANO-1966 ART-1 PAR-1 LEG-FED RES-36 ANO-1969 (CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DO BNH) LEG-FED LEI-6205 ANO-1975 ART-2 PAR-ÚNICO LEG-FED RES-1 ANO-1977 (CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DO BNH) LEG-FED LEI-6423 ANO-1977 ART-1 PAR-1 LET-C LEG-FED DEC-88371 ANO-1977 ART-1 PAR-1 LET-C LEG-FED DEL-2045 ANO-1983 LEG-FED DEL-2065 ANO-1983 ART-23 PAR-2 PAR-3 PAR-4 PAR-6 PAR-7 PAR-8 LEG-FED LEI-6147 ANO-1974 ART-1 ART-2 LEG-FED DEC-2284 ANO-1986 LEG-FED LEI-8100 ANO-1990 ART-1 INC-1 INC-2 PAR-1 PAR-2 PAR-3 ART-2 LEG-FED RES-81 ANO-1980 (BNH) LEG-FED SUM-121 (STF) CC-16 Codigo Civil LEG-FED LEI-3071 ANO-1916 ART-102 INC-1 ART-145 INC-2 ART-85 ART-586 ART-993 CDC-90 Código de Defesa do Consumidor LEG-FED LEI-8078 ANO-1990 ART-6 INC-5 INC-3 ART-10 ART-31 ART-52 LEG-FED LEI-8880 ANO-1994 ART-6 LEG-FED DEL-2164 ANO-1984 ART-9 PAR-5 LEG-FED LEI-4380 ANO-1964 LEG-FED DEL-2283 ANO-1986 LEG-FED MPR-294 ANO-1991 LEG-FED LEI-8177 ANO-1991 ART-24 PAR-1 ART-18 PAR-1 PAR-2 PAR-3 PAR-4 ART-23 ART-24 PAR-1 PAR-2 PAR-3 LEG-FED DEL-2291 ANO-1986 ART-7 INC-3
Votantes : Desembargador Federal Ubaldo Ataíde Cavalcante Desembargador Federal Francisco Cavalcanti
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