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Jurisprudência


TRF5 2008.80.00.005876-6 200880000058766

Ementa
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. APLICABILIDADE DA LEI Nº 8.429/92 AOS AGENTES POLÍTICOS. PROCEDIMENTO LICITATÓRIO. AQUISIÇÃO DE UNIDADE MÓVEL DE SAÚDE. "OPERAÇÃO SANGUESSUGA". SUPOSTO SUPERFATURAMENTO NA AQUISIÇÃO DO OBJETO CONVENIADO E ENRIQUECIMENTO ILÍCITO NÃO COMPROVADOS. MERAS IRREGULARIDADES ADMINISTRATIVAS. NÃO CONFIGURAÇÃO DE ATO ÍMPROBO. IMPROVIMENTO DA REMESSA OFICIAL E DOS APELOS DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL E DA UNIÃO. 1. Remessa oficial e apelações interpostas pelo Ministério Público Federal e pela União contra sentença que, em ação civil pública por ato de improbidade administrativa, julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial para rejeitar a imputação de ato de improbidade administrativa na modalidade de lesão ao erário feita aos réus (Prefeito e integrantes da Comissão Permanente de Licitação). 2. A presente ação de improbidade versa, especificamente, acerca das ilicitudes no processo licitatório para execução do Convênio nº 1061/2004, celebrado entre o Município de Teotônio Vilela/AL e o Ministério da Saúde, em 02/07/2004, por meio do qual foram liberados R$ 44.000,00 (quarenta e quatro mil reais), com contrapartida municipal de R$ 4.400,00 (quatro mil e quatrocentos reais), para a aquisição de uma ambulância. 3. As sanções da Lei nº 8.429/92 não podem deixar de ser aplicadas aos prefeitos apenas em razão dos fatos imputados serem também tipificados como crime de responsabilidade, inexistindo litispendência ou prejudicialidade entre tais ações, em face da independência das instâncias. Uma interpretação diversa implicaria em ignorar a redação clara do parágrafo 4º do art. 37 da Constituição Federal. Precedente: (TRF-5ª R. - AGTR 95664/PE - 2ª T. - Rel. Des. Francisco Wildo Lacerda Dantas - DJe 28.05.2010). 4. A apelante defende que o réu João José Pereira Filho,Prefeito de Teotônio Vilela/AL e ordenador de despesas, praticou conduta ímproba prevista no art. 10, V, VIII, XI e XII, da Lei nº 8.429/92, ao homologar e adjudicar o objeto do Convênio nº. 1.061/2004, adquirindo, por meio de uma daquelas empresas que venceu o suposto certame, uma ambulância por R$ 48.380,00 (quarenta e oito mil, trezentos e oitenta reais), com preço superior ao valor de mercado - R$ 28.585,12 -, como constatou a CGU,. 5. Com relação aos corréus, Juliana de Almeida Soares, Pedro Henrique de Jesus Pereira e Israel Ramires Saldanha Neto, integrantes da comissão de licitação, estes foram acusados de prática das condutas descritas no art. 10, V, VIII e XII, da Lei nº 8.429/92, porque "concorreram para que houvesse lesão ao patrimônio público, pois, como dito, a verba pública foi gasta de forma excessiva, decorrente do superfaturamento praticado no certame licitatório eivado de irregularidades por eles conduzido, favorecendo o enriquecimento ilícito de terceiros". 6. Não é todo ato que se adequa formalmente aos tipos previstos na Lei nº 8.429/92 que deve ser enquadrado como ato de improbidade, sendo importante, para tanto, observar as circunstâncias do caso específico. 7. Os elementos probatórios constantes nos autos, em especial aqueles produzidos no decorrer da instrução processual, não evidenciaram que os réus tenham efetivamente agido com desonestidade, elemento que seria essencial para a configuração de improbidade administrativa. 8. Irreprochável o posicionamento adotado pela sentença de primeiro grau, no sentido de que houve apenas meras irregularidades ou ilicitudes praticadas pelo gestor, sem a comprovação de dano ao erário e a existência de dolo ou culpa, consubstanciada na ausência de má-fé e desonestidade, que não tem o condão de constituir, por si só, ato de improbidade administrativa previsto no art. 10 da Lei 8.429/92. 9. Não obstante a inexistência de pesquisa de preços de mercado nos autos do procedimento administrativo, depreende-se que não é prova bastante o relatório da Controladoria Geral da União - CGU no ponto em que indica superfaturamento dos preços, na medida em que se limita a indicar variação a maior no preço, sem demonstrar as fontes de pesquisa e os critérios adotados nesta. Somente uma pesquisa de preços pormenorizada, onde sejam citadas as suas fontes e trazidas bases seguras para apontar a intenção desonesta dos gestores seria elemento probatório apto a caracterizar um ato ímprobo. 10. A ausência de atos de abertura do procedimento administrativo na deflagração do certame licitatório, bem como da portaria de designação da Comissão Permanente de Licitação, não se afigura irregularidade apta a se atingir o extremo de uma improbidade administrativa, uma vez que não indicam fraude na licitação, tampouco dano ao erário. 11. O fato de os comprovantes de retirada das cartas-convite estarem datados do mesmo dia, bem como da ausência de identificação/CPF dos responsáveis pela retirada dos comprovantes de entrega do Edital e da ausência do atesto do agente recebedor na Nota Fiscal, se caracterizam não mais que meras irregularidades formais, conforme assentado na sentença recorrida. 12. No que pese o poder de autotutela, a ausência de anulação pelo gestor público não pode servir de base para punição por ato de improbidade administrativa, até porque o ordenamento jurídico dispõe de mecanismos alternativos adequados a combater a referida omissão ao admitir a possibilidade de anular os atos administrativos pelos interessados perante do Poder Judiciário. 13. No tocante às declarações de renuncias idênticas, inclusive no que se refere ao erro de grafia da palavra "renucio", calha consignar que tal lapso mais parece se tratar de modelos preestabelecidos pela própria administração pública, como praxe, haja vista, faça-se presente a inscrição "Prefeitura Municipal de Teotônio Vilela" na parte superior do documento, acompanhada do logotipo da administração. 14. O STJ possui entendimento segundo o qual, para que seja reconhecida a tipificação da conduta do réu como incurso nas previsões da Lei de Improbidade Administrativa, é necessária a demonstração do elemento subjetivo, consubstanciado pelo dolo para os tipos previstos nos artigos 9º e 11 e, ao menos, pela culpa, nas hipóteses do artigo 10. Precedente: (STJ, Primeira Turma, Relator: Ministro Benedito Gonçalves, Data de Julg.: 10/04/2012). 15. Aacusação baseou-se em relatório elaborado pela Controladoria Geral da União - CGU, o qual aponta diversas irregularidades formais no procedimento licitatório em questão, mas não foi capaz de evidenciar a participação dolosa dos réus. 16. Não merece acolhida a pretensão da União para que sejam consideradas as afirmações trazidas à baila pelo réu Luiz Antônio Trevisan Vedoin, perante o Juízo da 2ª Vara Federal do Estado do Mato Grosso, no bojo do processo nº 2006.36.00.007594-5, que, em colaboração ("delação") premiada, demonstram como se dava o ajuste entre as empresas participantes da denominada "máfia das ambulâncias". Não obstante, a colaboração premiada, isoladamente, embora de inegável valor indiciário, não deve ter seu valor probatório visto de forma absoluta, sob pena de vulnerar os princípios da presunção de inocência, do contraditório e da ampla defesa. Do contexto dos autos, não é possível se concluir que os réus em questão participavam do esquema para fraudar procedimento licitatório, que é o fundamento da acusação. 17. Esta Corte já decidiu que "a particular gravidade das sanções estabelecidas para a falta de probidade administrativa recomenda especial cautela na exegese da Lei 8.429/92, para não tratar como ímprobas meras irregularidades puníveis por sanção disciplinar administrativa. A aplicação da Lei de Improbidade Administrativa somente se justifica para aquelas condutas cuja gravidade não encontra sanção adequada noutros meios punitivos de que o ordenamento jurídico dispõe". (TRF5 - Primeira Turma, AC 200985010004058, Des. Federal Manoel Erhardt, DJE: 20/05/2013). 18. Ausência de provas suficientes para ensejar uma condenação por ato de improbidade administrativa com relação aos fatos imputados aos réus no presente caso, impondo-se, assim, o improvimento dos recursos interpostos. 19. Remessa oficial e apelações improvidas.
Decisão
UNÂNIME

Data do Julgamento : 30/06/2016
Data da Publicação : 19/07/2016
Classe/Assunto : APELREEX - Apelação / Reexame Necessário - 31002
Órgão Julgador : Terceira Turma
Relator(a) : Desembargador Federal Carlos Rebêlo Júnior
Comarca : TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Tipo : Acórdão
Doutrina : AUTOR:José Afonso da Silva. OBRA:Curso de Direito Constitucional Positivo, 24 ed.,São Paulo, Malheiros Editores, 2005, p-669. AUTOR:Luigi Ferrajoli. OBRA:Direito e Razão: Teoria do Garantismo Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 441.
Referência legislativa : ***** CP-40 Codigo Penal LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-297 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED LEI-13019 ANO-2014 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED DEL-201 ANO-1967 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED LEI-7347 ANO-1985 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED EMC-19 ANO-1998 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED LEI-4320 ANO-1964 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED LEI-8666 ANO-1993 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED LEI-8429 ANO-1992 ART-10 ART-11 ART-2 INC-5 INC-8 INC-11 INC-12 ART-1 ART-12 INC-1 INC-2 INC-3 ART-9 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ***** CF-88 Constituição Federal de 1988 ART-37 PAR-4
Fonte da publicação : DJE - Data::19/07/2016 - Página::97
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