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Jurisprudência


TRF5 2008.83.05.000105-9 200883050001059

Ementa
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÕES CRIMINAIS. PECULATO. ART. 312 DO CÓDIGO PENAL. DESVIO DE VERBAS DO PNATE. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. TRANSPORTE ESCOLAR NO MUNICÍPIO DE GARANHUNS. REALIZAÇÃO DE PAGAMENTOS EM VALORES SUPERIORES AOS CONTRATADOS. DEVOLUÇÃO DA VERBA PAGA EM EXCESSO A SERVIDOR DA PREFEITURA. CRIME DE QUADRILHA NÃO APERFEIÇOADO. DOSIMETRIA. - A transferência de recursos do PNATE (Programa Nacional de Transporte Escolar) é uma operação vinculada, que prevê a prestação de contas ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE, com a fiscalização do TCU. Hipótese em que aplicável a Súmula 208 do Col. STJ, assim redigida: "Compete à Justiça Federal processar e julgar prefeito municipal por desvio de verba sujeita à prestação de contas perante órgão federal". - "Súmula 330 do STJ. É desnecessária a resposta preliminar de que trata o art. 514 do Código de Processo Penal, na ação penal instruída por inquérito policial". Hipótese, ademais, que cuida de nulidade relativa, a qual só foi suscitada nas razões de apelação. Precedente citado: "(...) se a finalidade da defesa preliminar está relacionada ao interesse público de evitar persecução criminal temerária contra funcionário público, a superveniência de sentença condenatória, que decorre do amplo debate da lide penal, prejudica a preliminar de nulidade processual, sobretudo se considerado que essa insurgência só foi veiculada nas razões de apelação." (STF, HC 128.109, Rel. Min. Teori Zavascki, Segunda Turma, DJe 23/09/2015). - O deferimento de diligências é ato que se inclui na esfera de discricionariedade regrada do magistrado, que poderá indeferi-las de forma motivada, quando as julgar desnecessárias ou protelatórias. - Restou evidenciado pela prova testemunhal que o recorrente servidor público era o gestor de fato dos contratos de prestação de serviço de transporte escolar no Município de Garanhuns. Os documentos e testemunhos colhidos na instrução comprovam, ainda, que parte dos prestadores de serviço contratados pela Prefeitura para a realização do transporte escolar recebiam pagamentos a maior do que o estabelecido em contrato e, ato contínuo, devolviam as diferenças ao Ouvidor do Município. - Há prova nos autos de que, no ano de 2006, na Administração do Município de Garanhuns, cabia ao Ouvidor do Município, o recorrente servidor público, ao menos no plano fático, a gestão de tudo o que relacionado ao transporte escolar. Presença, no caso concreto, da relação de causa e efeito entre a detenção dos recursos oriundos do PNATE e o cargo ocupado pelo recorrido. - Hipótese, ademais, em que caso prevalecesse o entendimento da defesa, no sentido de que o Ouvidor do Município de Garanhuns não tinha a posse ou detenção das verbas do PNATE, simplesmente por não ser ele o ordenador de despesas da edilidade, de qualquer modo restaria configurado o peculato. É que excluída a posse em razão do cargo, os fatos descritos na denúncia teriam adequação típica no parágrafo 1º do art. 312 do Código Penal, modalidade de peculato denominada de peculato furto, a qual não exige que o agente tenha a posse ou detenção da coisa móvel, mas apenas que a sua condição de funcionário público lhe proporcione posição favorável para a subtração. - Os valores pagos a maior, no ano de 2006, superaram a cifra de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), montante a que se chegou após o confronto dos contratos administrativos, notas fiscais, empenhos, depósitos bancários e termos de declarações. - A argumentação da defesa no sentido de que os valores pagos a maior e devolvidos eram utilizados no pagamento de outros motoristas que ainda não haviam formalizado as suas pessoas jurídicas cai por terra ante a constatação de que pessoas físicas prestadoras de serviço também podem emitir nota fiscal, bem assim porque as despesas do PNATE podem ser comprovadas também por recibos ou qualquer outro documento idôneo. - Manutenção da sentença no ponto em que condenou o réu Ouvidor do Município de Garanhuns, pela prática do crime de peculato (CP, art. 312). - Os testemunhos colhidos nas fases inquisitorial e judicial evidenciaram a atuação do contador recorrido para que houvesse o desvio de verbas públicas destinadas ao custeio do transporte escolar. O apelado exercia atribuições que excediam em muito o que se poderia esperar de um contabilista, eis que acompanhava prestadores de serviço ao banco para efetuar o desconto dos cheques e, posteriormente, conduzia-os até o gabinete do Ouvidor, onde era realizado o repasse do valor desviado. - Reforma da sentença para condenar o contador pelo crime de peculato, tendo em vista a prova carreada aos autos. - Restou provado que o administrador de fato de duas sociedades empresariais recebeu valores superiores aos contratados com a Prefeitura de Garanhuns para a prestação do serviço de transporte escolar, não os tendo devolvido ao Ouvidor. Isso é o que basta para a caracterização do crime previsto no art. 312 do Código Penal. - Reforma da sentença para condenar o réu empresário pelo crime de peculato, mantendo-se, todavia, o decreto absolutório quanto ao seu irmão, empregado da empresa Ferreira Costa, ante o reconhecimento de que foi utilizado como interposta pessoa no contrato social de uma das sociedades empresariais. - Manutenção do decreto absolutório quanto ao crime de quadrilha, tendo em vista o número de pessoas (3) que comprovadamente integraram o esquema criminoso. - Dosimetria da pena. O réu servidor público exerceu inegável papel de liderança na execução da prática criminosa, organizando e dirigindo a atividade dos demais agentes, fato que atrai uma maior censura social sobre a sua conduta, justificando, pois, a elevação da pena. Hipótese, ademais, em que o servidor exercia o cargo de Ouvidor Geral do Município, sendo responsável pelo exercício de função de controle, o que torna mais censuráveis os seus atos, do que se praticados por um outro servidor sem essa atribuição. Aumenta-se a reprimenda, ainda, tendo em vista a utilização de meios fraudulentos para ocultar a prática criminosa, os quais, se isoladamente considerados, poderiam configurar um crime de falso (prorrogação dos contratos de prestação de serviços, mediante a assinatura de termos aditivos com data retroativa). Aumento da pena de quatro anos de reclusão para quatro anos e seis meses de reclusão. - A conduta social do réu contador justifica a elevação da pena-base, na medida em que cooptou clientes seus, em regra indivíduos com baixa instrução que atuavam como prestadores de serviço de transporte escolar, para que emitissem notas fiscais superfaturadas, sacassem os valores correspondentes no banco e os devolvessem ao ouvidor do município, portando-se, dessa maneira, de forma reprovável em suas relações de trabalho. Fixação da pena definitiva de três anos de reclusão. Substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos. - Considerando a inexistência de circunstâncias judiciais em prejuízo do recorrente empresário, a ele deve ser aplicada a pena mínima prevista para o tipo do art. 312 do Código Penal, de dois anos de reclusão. Extinção da punibilidade do réu, ante o reconhecimento da prescrição retroativa da pretensão punitiva estatal, uma vez que entre a data do fato (2006) e o recebimento da denúncia (14/12/2011), decorreram mais de quatro anos (CP, art. 109, inciso V). - Não provimento do apelo interposto pelo réu servidor público e provimento, em parte, do apelo interposto pelo MPF.
Decisão
UNÂNIME

Data do Julgamento : 18/10/2016
Data da Publicação : 27/10/2016
Classe/Assunto : ACR - Apelação Criminal - 11518
Órgão Julgador : Quarta Turma
Relator(a) : Desembargador Federal Rubens de Mendonça Canuto
Comarca : TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Tipo : Acórdão
Revisor : Desembargador Federal Lazaro Guimarães
Referência legislativa : LEG-FED LEI-12850 ANO-2013 ART-288 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED LEI-8666 ANO-1993 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ***** CPP-41 Codigo de Processo Penal LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-514 ART-59 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ***** CP-40 Codigo Penal LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-312 (CAPUT) ART-288 (CAPUT) ART-59 ART-327 PAR-1 ART-44 INC-1 ART-110 PAR-1 ART-109 INC-5 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ***** CF-88 Constituição Federal de 1988 ART-5 INC-11
Fonte da publicação : DJE - Data::27/10/2016 - Página::138
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