TRF5 200881000031696
PROCESSO PENAL. PENAL. APELAÇÃO. CRIME AMBIENTAL. LEI 9.605/98. ART. 40. REJEIÇÃO DA EMENDA AO LIBELO. NÃO COMPROVAÇÃO DA EXISTÊNCIA DE DANO A UNIDADE DE CONSERVAÇÃO.INEXISTÊNCIA DE MATERIALIDADE E DE DOLO DE CAUSAR DANO. RECEBIMENTO DE LICENÇAS DA SEMACE E DA PREFEITURA MUNICIPAL PARA CONSTRUÇÃO DO RESTAURANTE. APELO PROVIDO. DECRETAÇÃO DA ABSOLVIÇÃO.
1. Apelação interposta por HANSPETER HALLER, em face de sentença prolatada pelo juízo da 11ª Vara Federal- CE, que o condenou à pena de 1 (um) ano de reclusão, sendo esta substituída por pena restritiva de direito consistente em prestação pecuniária de 20 (vinte) salários mínimos a ser revertida à entidade pública ou privada com fim social indicada pelo juízo da execução.
2. Rejeitada a Emenda ao libelo. Mediante informação técnica do IBAMA, aduzindo que o referido terreno encontra-se inserido na Poligonal que define a Unidade de Conservação Estadual de Uso Sustentável Área de Proteção Ambiental (APA) do Rio Pacoti, caracterizado está que o solo em questão, onde foi construído o restaurante Alecrim, bem como muro de alvenaria, faz parte de Unidade de Conservação, descrito no art. 40 da Lei 9.605/98. Há de se respaldar também o entendimento do magistrado singular no sentido de que o tipo penal do art. 40 da Lei 9.605/98 configura norma especial em relação ao delito constante do art. 64 do mesmo estatuto legal, bem como que o princípio da consunção não autorriza a absorvição de crime mais grave pelo de menor gravidade.
3. A legitimidade para regulamentação formal de matéria concernente à proteção ao meio ambiente constitui-se como competência material concorrente da União, Estados e Distrito Federal legislar sobre questões referentes à proteção ao meio ambiente, reservando-se, contudo, ao legislador federal o estabelecimento de normas gerais, que, por si só, não afasta a competência suplementar dos outros entes políticos de direito público. Dos arts. 23, III, VI e VII, e art. 24 da CF, verifica-se que a proteção do meio ambiente, o combate à poluição, a preservação de florestas, da flora da fauna, a exploração de recursos hídricos são da competência comum da União, dos Estados e do DF e dos Municípios.
4. A SEMACE, consoante art. 6º, V, da Lei 6.938/81 integra o Sistema Nacional de Meio Ambiente na qualidade de órgão Seccional do Estado do Ceará, na qualidade de órgão seccional, tratando-se de órgão estadual responsável pela execução de programas e projetos e pelo controle e fiscalização de atividades capazes de provocar a degradação ambiental. Tais órgãos possuem fundamental importância para o SISNAMA, pois a eles é atribuída grande parcela de atividade no controle ambiental de acordo com suas realidades e com o seu interesse peculiar.
5. A materialidade da figura típica descrita no artigo 40 da Lei 9.605/98 - "causar dano direto ou indireto às Unidades de Conservação" - exige a demonstração da ocorrência de prejuízo ambiental, o qual, em determinadas situações, por não ser manifesto, impõe a necessidade de conhecimentos técnicos mais avançados, só obtidos a partir de prova pericial. Seu objeto consiste na preservação do meio ambiente.
6. O elemento subjetivo do tipo- dolo- consiste na vontade livre e consciente de causar dano, direto ou indireto às Unidades de Conservação. Trata-se e crime material, de efeitos permanentes, consumando-se com o efetivo dano causado à unidades de conservação.
7. Conforme o Laudo Técnico elaborado pelo IBAMA, a propriedade do recorrido foi edificada sobre área de duna móvel, não havendo vegetação natural recobrindo a mesma. O referido documento relata que o imóvel está contido na Zona VII - Zona com edificações havendo, inclusive, proposta de organização e Planejamento. Especifica que a área construída caracteriza-se como área urbana, com malha viária, distribuição de energia elétrica e iluminação pública, como também recolhimento de resíduos sólidos. Aduz que a Proposição de Ordenamento Ambiental e Sustentabilidade tem como meta a melhoria da qualidade ambiental em consonância com a realidade instalada, sem ampliação da área construída.
8. Não restou comprovada a existência de prejuízo ambiental. O Laudo não apura existência de dano. Não se pode presumir que a construção do restaurante, em área de dunas móveis, que não possui vegetação, ocasiona dano ao meio ambiente. De se acrescer que a área em questão possui diversas outras construções, inclusive residenciais, sendo área urbana, possuidora de energia elétrica, iluminação e malha viária.
9. A Proposição de Ordenamento Ambiental e Sustentabilidade objetiva a melhoria da qualidade ambiental em consonância com a realidade instalada e não a vedação da utilização do terreno para futuras construções. O que se almeja é a melhoria da qualidade ambiental em face às construções já realizadas, enquadrando-se no caso, o Restaurante do Recorrente.
10. Inexistência do dolo de causar dano à Unidade de Conservação. O Acusado possui Licença de Instalação da SEMACE, relativa à construção do Restaurante, na Praia Porto das Dunas, Município de Aquiraz-CE, datada de 06.11.2006, com validade até 05.11.2008, bem como: Alvará de Construção- Licença nº 103, de 10.11.2006, da Prefeitura Municipal de Aquiraz-CE concedida para construção de Restaurante e Anuência Municipal para fins de licenciamento ambiental da Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente, que declara que a construção de um Restaurante na localidade de Porto das Dunas é compatível com o uso do solo de acordo com a Lei de Uso e Ocupação do Solo nº 18/05. Menciona, ainda que: "por se tratar de área de duna móvel é necessário a licença específica da SEMACE."
11. De posse das referidas documentações de licenciamentos, obtidas de forma válida e regular pelos órgãos que tem competência para deferi-las, impossível se falar em conduta ilícita do Acusado na construção do Restaurante.
12. Não se olvida, que as licenças foram obtidas poucos dias após o Embargo realizado pelo IBAMA. Contudo, tal intervalo de tempo, associado às circunstâncias do fato, como a inexistência de dolo, não comprovação do dano ambiental e até mesmo o deferimento das licenças para construção, não autorizam decreto ratificador da decisão singular, nem mesmo condenatório.
13. Apelação provida para decretar a absolvição do Réu.
(PROCESSO: 200881000031696, ACR7097/CE, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO BARROS DIAS, Segunda Turma, JULGAMENTO: 14/09/2010, PUBLICAÇÃO: DJE 23/09/2010 - Página 392)
Ementa
PROCESSO PENAL. PENAL. APELAÇÃO. CRIME AMBIENTAL. LEI 9.605/98. ART. 40. REJEIÇÃO DA EMENDA AO LIBELO. NÃO COMPROVAÇÃO DA EXISTÊNCIA DE DANO A UNIDADE DE CONSERVAÇÃO.INEXISTÊNCIA DE MATERIALIDADE E DE DOLO DE CAUSAR DANO. RECEBIMENTO DE LICENÇAS DA SEMACE E DA PREFEITURA MUNICIPAL PARA CONSTRUÇÃO DO RESTAURANTE. APELO PROVIDO. DECRETAÇÃO DA ABSOLVIÇÃO.
1. Apelação interposta por HANSPETER HALLER, em face de sentença prolatada pelo juízo da 11ª Vara Federal- CE, que o condenou à pena de 1 (um) ano de reclusão, sendo esta substituída por pena restritiva de direito consistente em prestação pecuniária de 20 (vinte) salários mínimos a ser revertida à entidade pública ou privada com fim social indicada pelo juízo da execução.
2. Rejeitada a Emenda ao libelo. Mediante informação técnica do IBAMA, aduzindo que o referido terreno encontra-se inserido na Poligonal que define a Unidade de Conservação Estadual de Uso Sustentável Área de Proteção Ambiental (APA) do Rio Pacoti, caracterizado está que o solo em questão, onde foi construído o restaurante Alecrim, bem como muro de alvenaria, faz parte de Unidade de Conservação, descrito no art. 40 da Lei 9.605/98. Há de se respaldar também o entendimento do magistrado singular no sentido de que o tipo penal do art. 40 da Lei 9.605/98 configura norma especial em relação ao delito constante do art. 64 do mesmo estatuto legal, bem como que o princípio da consunção não autorriza a absorvição de crime mais grave pelo de menor gravidade.
3. A legitimidade para regulamentação formal de matéria concernente à proteção ao meio ambiente constitui-se como competência material concorrente da União, Estados e Distrito Federal legislar sobre questões referentes à proteção ao meio ambiente, reservando-se, contudo, ao legislador federal o estabelecimento de normas gerais, que, por si só, não afasta a competência suplementar dos outros entes políticos de direito público. Dos arts. 23, III, VI e VII, e art. 24 da CF, verifica-se que a proteção do meio ambiente, o combate à poluição, a preservação de florestas, da flora da fauna, a exploração de recursos hídricos são da competência comum da União, dos Estados e do DF e dos Municípios.
4. A SEMACE, consoante art. 6º, V, da Lei 6.938/81 integra o Sistema Nacional de Meio Ambiente na qualidade de órgão Seccional do Estado do Ceará, na qualidade de órgão seccional, tratando-se de órgão estadual responsável pela execução de programas e projetos e pelo controle e fiscalização de atividades capazes de provocar a degradação ambiental. Tais órgãos possuem fundamental importância para o SISNAMA, pois a eles é atribuída grande parcela de atividade no controle ambiental de acordo com suas realidades e com o seu interesse peculiar.
5. A materialidade da figura típica descrita no artigo 40 da Lei 9.605/98 - "causar dano direto ou indireto às Unidades de Conservação" - exige a demonstração da ocorrência de prejuízo ambiental, o qual, em determinadas situações, por não ser manifesto, impõe a necessidade de conhecimentos técnicos mais avançados, só obtidos a partir de prova pericial. Seu objeto consiste na preservação do meio ambiente.
6. O elemento subjetivo do tipo- dolo- consiste na vontade livre e consciente de causar dano, direto ou indireto às Unidades de Conservação. Trata-se e crime material, de efeitos permanentes, consumando-se com o efetivo dano causado à unidades de conservação.
7. Conforme o Laudo Técnico elaborado pelo IBAMA, a propriedade do recorrido foi edificada sobre área de duna móvel, não havendo vegetação natural recobrindo a mesma. O referido documento relata que o imóvel está contido na Zona VII - Zona com edificações havendo, inclusive, proposta de organização e Planejamento. Especifica que a área construída caracteriza-se como área urbana, com malha viária, distribuição de energia elétrica e iluminação pública, como também recolhimento de resíduos sólidos. Aduz que a Proposição de Ordenamento Ambiental e Sustentabilidade tem como meta a melhoria da qualidade ambiental em consonância com a realidade instalada, sem ampliação da área construída.
8. Não restou comprovada a existência de prejuízo ambiental. O Laudo não apura existência de dano. Não se pode presumir que a construção do restaurante, em área de dunas móveis, que não possui vegetação, ocasiona dano ao meio ambiente. De se acrescer que a área em questão possui diversas outras construções, inclusive residenciais, sendo área urbana, possuidora de energia elétrica, iluminação e malha viária.
9. A Proposição de Ordenamento Ambiental e Sustentabilidade objetiva a melhoria da qualidade ambiental em consonância com a realidade instalada e não a vedação da utilização do terreno para futuras construções. O que se almeja é a melhoria da qualidade ambiental em face às construções já realizadas, enquadrando-se no caso, o Restaurante do Recorrente.
10. Inexistência do dolo de causar dano à Unidade de Conservação. O Acusado possui Licença de Instalação da SEMACE, relativa à construção do Restaurante, na Praia Porto das Dunas, Município de Aquiraz-CE, datada de 06.11.2006, com validade até 05.11.2008, bem como: Alvará de Construção- Licença nº 103, de 10.11.2006, da Prefeitura Municipal de Aquiraz-CE concedida para construção de Restaurante e Anuência Municipal para fins de licenciamento ambiental da Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente, que declara que a construção de um Restaurante na localidade de Porto das Dunas é compatível com o uso do solo de acordo com a Lei de Uso e Ocupação do Solo nº 18/05. Menciona, ainda que: "por se tratar de área de duna móvel é necessário a licença específica da SEMACE."
11. De posse das referidas documentações de licenciamentos, obtidas de forma válida e regular pelos órgãos que tem competência para deferi-las, impossível se falar em conduta ilícita do Acusado na construção do Restaurante.
12. Não se olvida, que as licenças foram obtidas poucos dias após o Embargo realizado pelo IBAMA. Contudo, tal intervalo de tempo, associado às circunstâncias do fato, como a inexistência de dolo, não comprovação do dano ambiental e até mesmo o deferimento das licenças para construção, não autorizam decreto ratificador da decisão singular, nem mesmo condenatório.
13. Apelação provida para decretar a absolvição do Réu.
(PROCESSO: 200881000031696, ACR7097/CE, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO BARROS DIAS, Segunda Turma, JULGAMENTO: 14/09/2010, PUBLICAÇÃO: DJE 23/09/2010 - Página 392)
Data do Julgamento
:
14/09/2010
Classe/Assunto
:
Apelação Criminal - ACR7097/CE
Órgão Julgador
:
Segunda Turma
Relator(a)
:
Desembargador Federal Francisco Barros Dias
Comarca
:
Tribunal Regional Federal - 5ª Região
Código do documento
:
239329
PublicaÇÕes
:
Diário da Justiça Eletrônico TRF5 (DJE) - 23/09/2010 - Página 392
DecisÃo
:
UNÂNIME
Revisor
:
Desembargador Federal Paulo Gadelha
ReferÊncias legislativas
:
LEG-FED LEI-9605 ANO-1998 ART-40 ART-64 ART-70
LEG-FED RES-303 ANO-2002 (CONAMA)
LEG-FED DEC-99274 ANO-1990 ART-17 ART-27
CPP-41 Codigo de Processo Penal LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-386 INC-6 INC-7
LEG-FED LEI-9985 ANO-2000
LEG-FED LEI-11719 ANO-2008 ART-383 PAR-1 PAR-2
LEG-FED LEI-4771 ANO-1965 ART-2 LET-F ART-3 LET-B
LEG-FED DEC-25778 ANO-2000
CF-88 Constituição Federal de 1988 ART-24 INC-1 INC-2 INC-3 INC-4 INC-5 INC-6 INC-7 INC-8 INC-9 INC-10 INC-11 INC-12 INC-13 INC-14 INC-15 INC-16 PAR-1 PAR-2 PAR-3 PAR-4 ART-23 INC-3 INC-6 INC-7
LEG-FED LEI-6938 ANO-1981 ART-6 INC-1 INC-5
LEG-FED RES-237 ANO-1997 ART-1 INC-1
CP-40 Codigo Penal LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-59
Votantes
:
Desembargador Federal Francisco Barros Dias
Desembargador Federal Paulo Gadelha
Desembargador Federal Francisco Wildo