TRF2 0124538-59.2015.4.02.5101 01245385920154025101
PROCESSUAL CIVIL E CONSTITUCIONAL. DIREITO À SÁUDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO
PADRONIZADO PARA PATOLOGIA DIVERSA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES
FEDERATIVOS. LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO FEDERAL. IMPRESCINDIBILIDADE
DO MEDICAMENTO. COLISÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS. PREVALÊNCIA DO DIREITO
À VIDA. SENTENÇA PUBLICADA NA VIGÊNCIA DO NOVO CPC/2015. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. PRINCÍPIO TEMPUS REGIT ACTUM. PAGAMENTO EM FAVOR DA DEFENSORIA
PÚBLICA DA UNIÃO. NÃO CABIMENTO. CONFUSÃO. REMESSA NECESSARIA E APELAÇÕES
DESPROVIDAS. I - Trata-se de Remessa Necessária e de quatro Apelações Cíveis
interpostas em face de sentença que julgou procedente o pedido para determinar
aos Réus, o fornecimento do medicamento Micofenolato de sódio 360 MG, nas
posologias indicadas no receituário médico, mensal e continuamente. II -
A Constituição da República (CRFB/88) estabelece, em seu artigo 196, que
"a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas
sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros
agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a
sua promoção, proteção e recuperação". Nessa senda, cumpre ao legislador
ordinário dispor sobre a "regulamentação, fiscalização e controle" das
ações e serviços de saúde (CRFB, art. 197). III - Visa o Sistema Único de
Saúde, assim, à integralidade da assistência à saúde, seja individual ou
coletiva, devendo atender aos que dela necessitem. IV - Desta feita, no que
diz respeito à responsabilidade pelo fornecimento gratuito de medicamentos,
entende-se que a mesma é conjunta e solidária da União, Estado e Município,
consoante decidido pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso
Extraordinário nº 855.178 RG/SE, submetido à sistemática da repercussão geral
(tema 793). V- In casu, a Autora é portadora de Lupus Eritomatoso Sistêmico
(CID-10: M32.8), tendo sido relatado em laudo médico que "teve grave reação
ao uso do micofenolato de mofetila com transtorno gastrointestinal, não
tolerando seu uso" (fl. 20), o que demonstra que a requerente não obteve
resposta satisfatória com as opções terapêuticas disponibilizadas. VI -
Ademais, o profissional de saúde atesta que a patologia que atinge a Autora
"possui acometimento renal, que pode gerar insuficiência renal aguda e até
óbito se não tratado" (fls. 21/22), sendo certo que, consoante o Parecer
elaborado pelo Núcleo de Assessoria Técnica em Ações de Saúde, acostado às
fls. 80/84, "a mortalidade dos pacientes com LES é cerca de 3 a 5 vezes maior
do que a da população em geral e está relacionada a atividade inflamatória
da doença, especialmente quando há acometimento renal". VII - Registre-se
que a Autora recebeu o medicamento ora pleiteado durante um ano através da
1 rede municipal de saúde (fls. 23/26), mediante apresentação de receita
subscrita por médico do Hospital Federal dos Servidores do Estado, tendo
o fornecimento sido suspenso repentinamente. VIII - Assim, tendo em vista
que o uso do medicamento Micofenolato de sódio 360 mg está indicado para o
adequado tratamento da patologia que acomete a requerente, que o fármaco
pleiteado possui o devido registro na ANVISA, que é disponibilizado pelo
SUS e foi prescrito por profissional do Hospital Federal dos Servidores
do Estado, resta caracterizada a necessidade da excepcional intervenção
judicial em razão da negativa de seu fornecimento em sede administrativa,
eis que o não fornecimento do fármaco poderá acarretar danos irreparáveis à
saúde da Autora. IX - Cabe assinalar, ainda, que, em se tratando de fármaco
aprovado e utilizado legalmente, a não adoção pelo poder público do mesmo em
protocolo para determinada doença não significa que sua utilização constitua
tratamento experimental, de modo que o aparente uso off label de medicamentos
em tratamento de saúde não caracteriza por si só inadequação ou incorreção,
mormente se indicado por especialista médico vinculado ao SUS. X - Frise-se
que versa a presente causa sobre o direito constitucional à saúde e, via de
conseqüência, ao direito à vida, devendo, pois, em virtude, também do caráter
evolutivo da doença, ser garantido à Parte Autora adequado tratamento, com o
qual a mesma não tem condições de custear por conta própria. XI - Portanto,
da ponderação do direito à saúde com os demais princípios constitucionais
que lhe são contrapostos, em virtude também do caráter evolutivo da doença,
bem como pela devida comprovação, no caso concreto, da indispensabilidade
do medicamento pretendido para a manutenção da vida e da saúde do paciente,
conclui-se que cabe ao poder público assegurar seu fornecimento. XII - Em
que pese a existência de limitações orçamentárias, esta não pode servir de
escudo para recusas de cumprimento de obrigações prioritárias decorrentes de
provimento judicial que dê efetividade a direitos fundamentais (AgRg no AREsp
649.229/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado
em 28/03/2017, DJe 06/04/2017). XIII - No que concerne à verba honorária,
cabe asseverar que, consoante a orientação do C. Superior Tribunal de justiça,
"na aplicação do direito intertemporal, as novas regras relativas a honorários
advocatícios de sucumbência, advindas da edição do CPC de 2015, devem ser
aplicadas imediatamente em qualquer grau de jurisdição, sempre que houver
julgamento da causa já na vigência do novo Código" (AgInt nos EDcl no REsp
1357561/MG, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em
04/04/2017, DJe 19/04/2017). XIV - Assim, em observância ao princípio tempus
regit actum, deve a sentença, ato processual que qualifica o nascedouro do
direito à percepção dos honorários advocatícios, ser considerada como marco
temporal para a aplicação da norma. XV - Nesse passo, tendo em vista que, no
caso em testilha, a sentença foi prolatada já na vigência do novo CPC/2015,
deve ser aplicado o disposto no art. 85 do referido código processual, cuja
incidência deve ser imediata aos processos em curso (RE 92259, Relator(a):
Min. MOREIRA ALVES, Segunda Turma, julgado em 16/05/1980, DJ 12-08-1980
PP-05789 EMENT VOL-01178-03 PP-00854 RTJ VOL-00098-01 PP-00394). XVI - Noutro
giro, importa asseverar que o Autor atribuiu valor à causa compatível com o
proveito econômico a ser obtido com o ajuizamento da demanda de tratamento
médico, não 2 merendo prosperar a alegação de que a causa em litígio é
de valor inestimável, razão pela qual se mostra inaplicável a apreciação
equitativa prevista no § 8º do art. 85 do CPC/2015. XVII - No tocante aos
honorários a serem pagos pela União Federal à Defensoria Pública da União,
impende destacar que, embora esta tenha autonomia administrativa, ela é
um órgão da União, sem personalidade jurídica, não lhe cabendo, portanto,
o recebimento de honorários de sucumbência, já que a União, em suma, seria
ao mesmo tempo credora e devedora de obrigação imposta na sentença. XVIII
- Além disso, o C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº
1.199.715/RJ (tema 433), sob a sistemática dos recursos repetitivos, firmou
entendimento no sentido de que não são devidos honorários advocatícios à
Defensoria Pública quando ela atua contra pessoa jurídica de direito público
que integra a mesma Fazenda Pública, prevalecendo esse entendimento mesmo após
o advento das Emendas Constitucionais 74/2013 e 80/2014 e da Lei Complementar
132/2009, que deu nova redação ao inciso XXI do art. 4º da Lei Complementar
80/94. XIX - Remessa Necessária e Apelações desprovidas.
Ementa
PROCESSUAL CIVIL E CONSTITUCIONAL. DIREITO À SÁUDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO
PADRONIZADO PARA PATOLOGIA DIVERSA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES
FEDERATIVOS. LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO FEDERAL. IMPRESCINDIBILIDADE
DO MEDICAMENTO. COLISÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS. PREVALÊNCIA DO DIREITO
À VIDA. SENTENÇA PUBLICADA NA VIGÊNCIA DO NOVO CPC/2015. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. PRINCÍPIO TEMPUS REGIT ACTUM. PAGAMENTO EM FAVOR DA DEFENSORIA
PÚBLICA DA UNIÃO. NÃO CABIMENTO. CONFUSÃO. REMESSA NECESSARIA E APELAÇÕES
DESPROVIDAS. I - Trata-se de Remessa Necessária e de quatro Apelações Cíveis
interp...
Data do Julgamento
:
01/12/2017
Data da Publicação
:
06/12/2017
Classe/Assunto
:
AC - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador
:
6ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
REIS FRIEDE
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
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