TRF3 0019679-19.2008.4.03.6100 00196791920084036100
CIVIL E PROCESSO CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO DE TÍTULO
EXTRAJUDICIAL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIA - CRÉDITO ROTATIVO. AUSÊNCIA
DE TÍTULO EXECUTIVO. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DOS
JUROS. SENTENÇA REFORMADA. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Inicialmente, verifico que a parte embargante, ora apelante, não
cumpriu o disposto no art. 736 do Código de Processo Civil/1973, com a
redação atribuída pela Lei nº 11.382/2006. Isso porque, desde a reforma
da execução promovida pela mencionada lei, deve o executado, ao opor
os embargos à execução, instrui-los com cópias das principais peças
da execução. E, por cópia das principais peças, entende-se, ao menos,
cópia da inicial da execução e do título executivo que a instruiu. Em
tempo, o C. Superior Tribunal de Justiça também consolidou o entendimento
no sentido de que, em razão da aludida reforma da execução, que visaram
garantir à célere satisfação do direito material, rechaçando condutas
temerárias e procrastinatórias, não é possível a emenda da petição
inicial dos embargados a fim de juntar os documentos comprobatórios do direito
alegado. Todavia, ao apelar da sentença, pode a parte embargante municiar as
suas razões com a juntada das peças essenciais à controvérsia, a fim de
possibilitar a análise de suas alegações. Ocorre que, no caso dos autos,
a parte embargante não juntou cópia do título executivo extrajudicial que
instruiu a execução embargada, seja no momento da oposição dos embargos
à execução, seja no momento da interposição do presente recurso de
apelação, razão pela qual, a rigor, os presentes embargos à execução
sequer mereceriam ser conhecidos. Todavia, a despeito da dupla negligência
da parte embargante, considerando que a execução de título extrajudicial
encontra-se apensada aos presentes autos, passo à apreciação dos recursos
interpostos.
2. A exequente ajuizou a execução de título extrajudicial nº
2008.61.00.013640-2, em apenso, com base na "Cédula de Crédito Bancário -
Cheque Empresa CAIXA - Operação 197", firmada entre as partes em 05/09/2005
(fls. 10/14). Conforme consta em sua cláusula primeira (fl. 10), o referido
contrato prevê a concessão, pela instituição financeira, de crédito
rotativo no limite de R$ 20.0000,00. Assim, a exequente disponibilizou um
limite de crédito na conta corrente da empresa ré AUTO POSTO CACHOEIRA
LTDA. para possibilitar tanto o pagamento de cheques apresentados com
insuficiência de fundos como qualquer valor que a ré tenha autorizado a
ser debitado na conta corrente nº 003000000010, mantida junto à agência
nº 1166. Com efeito, a cédula de crédito bancário é título executivo
extrajudicial, nos termos do disposto nos artigo 28 e 29 da Lei nº
10.931/2004, inclusive na hipótese de contrato de abertura de crédito em
conta corrente. Note-se, que o C. Superior Tribunal de Justiça já reconheceu,
não apenas a eficácia executiva da cédula de crédito bancário, como
também assentou que a esse título de crédito não se aplica o entendimento
cristalizado no enunciado da Súmula 233. No caso de concessão de crédito
rotativo, o valor constante na Cédula de Crédito Bancário corresponde ao
valor que foi colocado à disposição do mutuário, porém não há como se
aferir da Cédula o real valor que foi utilizado por ele. Por esta razão,
entende-se que tal situação é equiparada à Cédula de Crédito Bancário
vinculada a "contrato de abertura de crédito bancário em conta corrente",
caso em que para que a Cédula tenha liquidez é exigido a juntada extratos
da conta corrente que demonstrem o crédito efetivamente utilizado, conforme
disposto nos arts. 28, §2º, II, e 29, caput, da Lei nº 10.931/2004. É
diferente do caso de contrato de empréstimo, em que o valor constante na
Cédula de Crédito Bancário é exatamente o valor entregue ao mutuário,
razão pela qual a Cédula, por si só, já apresenta liquidez. No caso dos
autos, depreende dos autos da execução, em apenso, que a CEF instruiu a
inicial com: (i) a "Cédula de Crédito Bancário - Cheque Empresa CAIXA -
Operação 197" (fls. 10/14); (ii) extratos da conta corrente (fls. 15/240);
(iii) ficha cadastral da pessoa jurídica (fls. 241/243 e 269/272) e;
(iv) demonstrativo/discriminativo do débito (fls. 273/277). Desse modo, os
documentos que instruíram a inicial, sobretudo os extratos da conta corrente
de fls. 15/240, são suficientes para conferir liquidez à Cédula de Crédito
Bancário, porquanto demonstram o valor efetivamente utilizado pelos executados
e discriminam a composição do débito, cumprindo as exigências dos arts. 28,
§2º, II, e 29, caput, da Lei nº 10.931/2004. Presentes os pressupostos
de certeza, exigibilidade e liquidez do título executivo extrajudicial
denominado Cédula de Crédito Bancário, a ação executiva se apresenta
como o instrumento processual adequado e necessário para a satisfação do
crédito da apelante. Nestes termos, rejeito a preliminar arguida.
3. O Banco Central do Brasil, com os poderes conferidos pelo Conselho
Monetário Nacional, por meio da Resolução nº 1.129/86, na forma do
artigo 9º da Lei 4.595/64, facultou às instituições financeiras a
cobrança da comissão de permanência, sendo legítima a sua exigência,
porquanto instituída por órgão competente e de acordo com previsão
legal. Além disso, a legitimidade da cobrança da comissão de permanência
nos contratos bancários encontra-se sufragada pela jurisprudência do
E. Superior Tribunal de Justiça, como se vê dos enunciados das Súmulas
30, 294 e 296. Anote-se, por outro lado, que na comissão de permanência
já estão inseridas todas as verbas decorrentes do inadimplemento, razão
pela qual não é possível sua cumulação com outros encargos como juros
moratórios, multa contratual, juros remuneratórios e correção monetária,
sob pena de configurar verdadeiro bis in idem. Nesse sentido, aliás, é o
entendimento do Superior Tribunal de Justiça, cristalizado no enunciado
da Súmula 472. Se a comissão de permanência não pode ser cobrada
conjuntamente com qualquer outro encargo, do mesmo modo não poderá ser
cumulada com a taxa de rentabilidade. No caso concreto, o aludido encargo foi
expressamente convencionado pelas partes, conforme consta à fl. 12 dos autos
da execução (cláusula décima segunda do contrato descrito na inicial),
todavia de forma cumulada com a taxa de rentabilidade de 10%. Assim sendo,
deve ser afastada a incidência da taxa de rentabilidade de 10%, pois tais
encargos encontram-se embutidos na comissão de permanência e é abusiva a
cumulação de encargos da mesma espécie. Nessa esteira, o débito deverá ser
acrescido dos juros remuneratórios segundo o critério previsto no contrato
até o seu vencimento e, após, a dívida será atualizada tão somente
pela incidência da comissão de permanência obtida pela composição
da taxa de CDI - Certificado de Depósito Interbancário, divulgada pelo
BACEN, afastada a cobrança cumulativa com a taxa de rentabilidade de 10%,
ou qualquer outro encargo moratório, nos termos da Súmula 472 do STJ.
4. No que diz respeito à capitalização de juros vale ressaltar que, diante
da vedação contida no artigo 4º do Decreto nº 22.626, de 07 de abril de
1.933, o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula nº 121. Com a edição
Medida Provisória nº 1963-17 de 31.03.00 (reeditada sob o nº 2.170-36,
de 23/082001), a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça,
acompanhando a evolução legislativa, assentou o entendimento no sentido
de que "é permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior
a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação
da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001),
desde que expressamente pactuada." (REsp 973827/RS, submetido ao rito dos
recursos repetitivos (artigo. 543-C do CPC) Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO,
Rel. p/ Acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em
08/08/2012, DJe 24/09/2012). Conquanto recentemente o E. Superior Tribunal de
Justiça, no julgamento do REsp nº 1.388.972/SC, tambem sob a sistemática
dos recursos representativos de controvérsia, tenha firmado a tese de que:
"A cobrança de juros capitalizados nos contratos de mútuo é permitida
quando houver expressa pactuação", persiste a restrição temporal firmada
no julgamento do REsp nº 973.827/RS e na Súmula nº 539 do STJ no sentido
de somente ser permitida a capitalização de juros nos contratos celebrados
após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000
(em vigor como MP 2.170-36/2001). A meu ver, a nova tese apenas reforça
o entendimento que já existia em relação à necessidade de pactuação
expressa. É importante destacar ainda que o E. Superior Tribunal de Justiça,
no julgamento do REsp nº 973.827, cuja ementa encontra-se supra transcrita,
consolidou que a pactuação da capitalização dos juros tem que ser realizada
de forma expressa e clara, bem como que basta a previsão no contrato bancário
de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal para que seja lícita
a cobrança da capitalização. Neste sentido, confiram-se as súmulas nºs
539 e 541 do Superior Tribunal de Justiça. No caso dos autos, admite-se a
capitalização mensal dos juros remuneratórios, desde que expressamente
pactuados (ou, nos termos da tese firmada pelo STJ, conste no contrato
que a taxa de juros anual seja superior ao duodécuplo da mensal), pois o
contrato foi celebrado em 05/07/2005, isto é, em data posterior à edição
da aludida medida provisória. Todavia, verifico da leitura do contrato de
abertura de crédito rotativo de fls. 10/14 que nenhuma de suas cláusulas
previu, expressamente, a capitalização dos juros remuneratórios, tampouco
consta no contrato que a taxa de juros anual ultrapassa o duodécuplo da taxa
mensal - aliás, no caso, sequer consta o percentual da taxa anual de juro
-, de modo que não é possível presumir a pactuação da capitalização,
nos termos da jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça. Em assim
sendo, inexistindo comprovação de que houve pactuação da capitalização
dos juros remuneratórios, é ilegal a sua cobrança.
5. No caso dos autos, verifico que foram juntadas cópias da cédula de
crédito bancário às fls. 10/14, devidamente assinado pelas partes. Em
suma, é lícita a cobrança da comissão de permanência, desde que
expressamente pactuada, porém não é possível sua cumulação com
outros encargos decorrentes da mora. No caso, a cláusula décima segunda
da Cédula de Crédito Bancário estipulou a incidência de comissão de
permanência de forma cumulada com a taxa de rentabilidade de 10%, o que
não é admissível. Todavia, considerando que o MM. Magistrado a quo
já determinou a cobrança da comissão de permanência com a exclusão
da taxa de rentabilidade de 10%, não há o que se reformar quanto a tal
tópico. Admite-se a capitalização mensal dos juros remuneratórios,
pois o contrato foi celebrado em 05/07/2005, isto é, em data posterior
à edição da aludida medida provisória. Todavia, verifico da leitura do
contrato de abertura de crédito rotativo de fls. 10/14 que nenhuma de suas
cláusulas previu, expressamente, a capitalização dos juros remuneratórios,
tampouco consta no contrato que a taxa de juros anual ultrapassa o duodécuplo
da taxa mensal, de modo que não é possível presumir a pactuação da
capitalização, nos termos da jurisprudência do C. Superior Tribunal de
Justiça. Em assim sendo, inexistindo comprovação de que houve pactuação
da capitalização dos juros remuneratórios, é ilegal a sua cobrança. Por
todas as razões expostas, a sentença deve ser reformada apenas para
afastar a capitalização dos juros remuneratórios. Consigno ainda que
eventuais ilegalidades verificadas no contrato não ensejam a nulidade total
deste. Impõe-se, em verdade, que a CEF proceda ao recálculo do valor devido
de acordo com os critérios ora estabelecidos, abatendo-se dele os valores
que a autora tenha pagado a título de encargos ilegais.
6. Por fim, com relação ao ônus sucumbencial, ambas as partes decaíram em
parcelas significativas de suas pretensões. Assim, tratando-se de sucumbência
recíproca, determino o rateio das custas e despesas processuais e a cada
parte arcar com os honorários advocatícios de seu patrono.
7. Recurso de apelação da parte embargante parcialmente provido, apenas para
afastar a capitalização dos juros remuneratórios, bem como determinar
o rateio das custas e despesas processuais e compensar os honorários
advocatícios, nos termos do voto.
Ementa
CIVIL E PROCESSO CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO DE TÍTULO
EXTRAJUDICIAL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIA - CRÉDITO ROTATIVO. AUSÊNCIA
DE TÍTULO EXECUTIVO. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DOS
JUROS. SENTENÇA REFORMADA. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Inicialmente, verifico que a parte embargante, ora apelante, não
cumpriu o disposto no art. 736 do Código de Processo Civil/1973, com a
redação atribuída pela Lei nº 11.382/2006. Isso porque, desde a reforma
da execução promovida pela mencionada lei, deve o executado, ao opor
os embargos à execução, instrui-los com cópias das principais peça...
Data do Julgamento
:
20/09/2017
Data da Publicação
:
28/09/2017
Classe/Assunto
:
AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1605027
Órgão Julgador
:
QUINTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
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