TRF3 0011626-54.2005.4.03.6100 00116265420054036100
TRIBUTÁRIO. PROCESSO CIVIL. IPI. INDUSTRIALIZAÇÃO MODALIDADE
RENOVAÇÃO OU RECONDICIONAMENTO. APARAS DE PAPEL E PAPELÃO. DIREITO AO
CRÉDITO. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA NÃO CUMULATIVIDADE. STF. RE Nº
398.365/RS. REPERCUSSÃO GERAL. REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO DA UNIÃO
DESPROVIDAS. CRÉDITOS ESCRITURAIS. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. DECRETO Nº
20.910/1932. APELAÇÃO DA AUTORA CONHECIDA EM PARTE E PROVIDA PARA AFASTAR
A INCIDÊNCIA DE MULTA EM SEDE DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.
1. Cerne da questão que reside em aferir qual a espécie de
industrialização a autora realiza com as aparas e o papelão no fabrico
de papel: transformação ou recondicionamento, a autorizar, neste caso,
a aplicação da norma do artigo 7º do Decreto-Lei nº 400, de 30/12/1968.
2. Perícia técnica aproveitada para fins de comprovação da
escrituração fiscal da autora em relação à efetiva aquisição das
aparas de papel e papelão, comprovando, ainda, que fabrica papel a partir
da industrialização da celulose, considerada transformação, bem assim
a partir do processamento das aparas de papel e papelão, que consiste na
matéria em julgamento. Utilização como prova indireta, em observância
ao artigo 465 do CPC (art. 421, § 2º, do CPC/1973).
3. O aspecto material da hipótese de incidência do IPI tem como núcleo
a operação de colocação do produto industrializado na cadeia de consumo,
cujo processo prevê que determinada matéria-prima seja submetida a processo
industrial e, após, siga até o consumidor final, conforme estabelece o
parágrafo único do artigo 46 do CTN.
4. O parágrafo único artigo 3º da Lei nº 4.502, de 30/11/1964, prevê
que a industrialização é entendida, basicamente, como um processo que
altera o produto inicial em sua natureza, funcionamento, utilização,
acabamento ou apresentação do produto.
5. O Regulamento do IPI (RIPI) vigente à época da propositura da ação fora
editado pelo Decreto nº 2.367, de 25/07/1998, que descreve em seu artigo 4º
(assim como o vigente) a partir das diretrizes previstas pelo parágrafo
único do artigo 3º da Lei nº 4.502, de 30/11/1964, as modalidades de
industrialização.
6. O elemento quantificativo do IPI é computado em determinados períodos
de tempo, mediante a aplicação do princípio da não cumulatividade, por
força do disposto pelo artigo 153, parágrafo 3º, inciso II, do Texto Magno,
e do artigo 49 do CTN.
7. A técnica não cumulativa aplica-se a toda a cadeia de produção e tem
como objetivo evitar a incidência em cascata e prevenir a verticalização,
afastando-se o direito ao creditamento do IPI se não ocorreu a incidência na
entrada e na saída, o que não implica o desprovimento do pedido inicial,
eis que a tese aqui discutida não cuida do creditamento fictício na
entrada, mas, apenas da consideração da possibilidade de cálculo da base
de cálculo do IPI na saída mediante o abatimento do valor pago a título
de matéria-prima na entrada.
8. Necessário considerar que a referência a papel e papelão usados deve
remeter, necessariamente, à fibra de celulose da qual a sucata de papel é
composta. Não se trata de renovação ou recondicionamento da mesma folha de
papel, nem tampouco do papel cartão ou do papelão descartado. O processo
industrial de reciclagem de papel (renovação ou recondicionamento) tem
por objetivo precípuo salvar a fibra de celulose contida no papel usado (e
não o papel propriamente dito). Nesse processo, a matéria prima é a fibra
de celulose contida na sucata de papel, que é triturada e retorna ao seu
formato de papel ou papelão. Ao contrário, quando se trata de fabricação
originária de papel, na modalidade transformação, parte-se da madeira das
árvores para dela extrair as fibras de celulose, de preferência longas,
para a produção de papel.
9. Existência de inúmeras campanhas realizadas para reciclagem, destinadas
a preservar a natureza, evitando-se a derrubada de árvores para uso da
matéria-prima: fibra de celulose, mediante a industrialização na modalidade
transformação. Insta-se todo o cidadão a conservar a natureza mediante o
descarte consciente do papel e papelão, pois estes podem ser reaproveitados,
não exatamente o papel que foi picado e descartado, mas a fibra de celulose
nele contida, por meio de industrialização do tipo reaproveitamento.
10. No caso dos autos se trata de industrialização na modalidade renovação
ou recondicionamento, por meio do qual se obtém, após o processo industrial,
o mesmo produto que ingressou, qual seja: a fibra de celulose.
11. A matéria-prima é, no presente caso, um produto usado ou parte
dele, o qual será renovado ou recondicionado (reciclado), mantida a sua
classificação na Tabela do IPI (TIPI), diferenciando-se da transformação,
porquanto nesta obtém-se um produto totalmente distinto da matéria-prima que
ingressou no processo, o qual foi transmutado num novo produto, classificado
em alínea diversa na TIPI. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
12. A diferenciação entre transformação e recondicionamento também
é definida a partir da classificação da matéria-prima e do produto
final. Neste caso, o uso da matéria-prima pasta de celulose das aparas de
papel e papelão do papel revela que tanto a matéria-prima como os produtos
finais possuem a mesma classificação e, portanto, ao serem submetidos
à reciclagem, sofrem processo de industrialização de renovação ou
recondicionamento, pois permanecem classificados no mesmo capítulo da TIPI.
13. Admitida a possibilidade de aproveitamento dos créditos do IPI, na forma
preconizada pelo artigo 7º do Decreto-Lei nº 400, de 30/12/1968, que prevê
a possibilidade de reduzir a base de cálculo do IPI, de modo que o montante
a ser submetido à alíquota incidente sobre o produto final, na saída do
estabelecimento produtor, deve ser reduzido do valor de sua aquisição. A
mesma previsão foi inserida nos diversos RIPIs editados, a saber: artigo
67 do Decreto nº 87.981/1982; artigo 122 do Decreto nº 2.637/1998; artigo
135 do Decreto nº 4.544/2002; artigo 194 do Decreto nº 7.212/2010, o atual.
14. Comprovação pela perícia que as aparas e papelão adquiridos
são contabilizados como matérias-primas utilizadas no processo de
industrialização das caixas de papelão, bem como que a tributação é
calculada pelo preço total da saída, desconsiderando-se o diferencial de
preço entre aquisição e revenda.
15. Não existe direito ao crédito do IPI decorrente da utilização de
matéria-prima (aparas de papel ou papelão) desonerada, pois o princípio da
não cumulatividade, na forma do artigo 153, § 3º, II, da Constituição da
República, prestigia a compensação do que "for devido em cada operação
com o montante cobrado nas anteriores", de forma a evitar a incidência em
cascata.
16. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº
1.134.903/SP (2009/0067536-9), submetido ao regime do artigo 543-C, do CPC,
e o Supremo Tribunal Federal no REX nº 398.365/RS, com Repercussão Geral
pacificaram a questão.
17. Direito do contribuinte que consiste na redução da base de cálculo
do IPI, decorrente da subtração dos valores pagos a título de aparas
de papel e papelão a cada competência mensal, conforme o artigo 7º do
Decreto-Lei nº 400, de 30/12/1968. Precedente desta Egrégia Sexta Turma.
18. Cabe à UNIÃO a aferição de cada uma das notas fiscais referidas
na relação apresentada com o laudo pericial, no sentido de perscrutar,
todos os dados indicados na relação do laudo pericial, especialmente,
considerados para efeito de cálculo dos créditos pretendidos.
19. Afastamento da anulação do crédito do IPI, na forma do § 3º do
artigo 25, da Lei nº 4.502, de 30/11/1964, requerida pela UNIÃO, pois não
se cuida de saída desonerada, eis que, conforme mostrou o laudo judicial,
a autora subsome-se à norma do caput do artigo 25 da referida lei.
20. Afastamento das normas do artigo 150, § 6º, da Constituição da
República, eis que não se trata de caso de concessão de crédito presumido.
21. Incidência da prescrição quinquenal na forma do artigo 1º do Decreto
nº 20.910, de 1932. Afastada a aplicação da prescrição prevista no Código
Tributário Nacional, pois se cuidam de créditos escriturais. Precedente
do Superior Tribunal de Justiça.
22. A correção monetária dos créditos escriturais de IPI incide na
forma preconizada pela Súmula nº 411 do Superior Tribunal de Justiça: "É
devida a correção monetária ao creditamento do IPI quando há oposição
ao seu aproveitamento decorrente de resistência ilegítima do Fisco", que
foi extraída de julgamento sob a sistemática dos recursos repetitivos,
REsp. nº 1.035.847/RS, Primeira Seção, Rel. Min. Luiz Fux, j. 24/06/2009.
23. Compensação que deve observar a legislação vigente na data da
propositura da ação, em razão da pacificação da questão pelo Superior
Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº 1.137.738/SP,
submetido ao regime do artigo 543-C, a ser realizada com quaisquer tributos
e contribuições administrados pela Secretaria da Receita Federal,
independentemente do destino de suas respectivas arrecadações.
24. Observância, ainda, dos artigos 73 e 74 da Lei nº 9.430/96, bem assim
do artigo 170-A do CTN para a realização da compensação.
25. Afastamento da incidência de multa de 1% (um por cento) em sede
de embargos de declaração, em razão de restar configurada omissão na
sentença por não haver referência expressa à base normativa aplicável
à fixação do prazo prescricional.
26. Remessa oficial e apelação da UNIÃO desprovidas.
27. Apelação da autora conhecida em parte, e na parte conhecida, provida
para fins de afastar a incidência da multa aplicada em sede de embargos
declaratórios.
Ementa
TRIBUTÁRIO. PROCESSO CIVIL. IPI. INDUSTRIALIZAÇÃO MODALIDADE
RENOVAÇÃO OU RECONDICIONAMENTO. APARAS DE PAPEL E PAPELÃO. DIREITO AO
CRÉDITO. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA NÃO CUMULATIVIDADE. STF. RE Nº
398.365/RS. REPERCUSSÃO GERAL. REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO DA UNIÃO
DESPROVIDAS. CRÉDITOS ESCRITURAIS. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. DECRETO Nº
20.910/1932. APELAÇÃO DA AUTORA CONHECIDA EM PARTE E PROVIDA PARA AFASTAR
A INCIDÊNCIA DE MULTA EM SEDE DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.
1. Cerne da questão que reside em aferir qual a espécie de
industrialização a autora realiza com as aparas e o papelão no fabrico...
Data do Julgamento
:
31/01/2019
Data da Publicação
:
08/02/2019
Classe/Assunto
:
ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1624915
Órgão Julgador
:
SEXTA TURMA
Relator(a)
:
JUIZA CONVOCADA LEILA PAIVA
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
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