TRF2 0114234-10.2015.4.02.5001 01142341020154025001
AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PLATAFORMAS MARINHAS. BACIA DO ESPÍRITO
SANTO. DESCARTE CONTÍNUO DE ÁGUAS. TEOR DE ÓLEOS E GRAXAS - TOG. LEI
9.986/00 E RESOLUÇÃO CONAMA 393/2007. MÉTODOS DE MEDIÇÃO. CONDUTA EM
CONFORMIDADE COM A LEGISLAÇÃO AMBIENTAL PERTINENTE. NÃO CARACTERIZAÇÃO
DE DANO PRESUMIDO. REMESSA DESPROVIDA. 1.O conceito de meio ambiente foi
trazido pela Lei 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio
Ambiente (PNMA) e cria o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA),
sendo inovador por estender a proteção jurídica a todos os elementos
da natureza de forma interativa e integral. Contudo, foi a Carta Magna
de 1988 que consagrou em definitivo o meio ambiente enquanto direito
difuso pertencente à categoria dos direitos fundamentais, atribuindo- lhe
configuração jurídica diferenciada ao classificá-lo, no artigo 225, caput,
como bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida. 2. É
certo que a Constituição Federal de 1988 dimensionou de forma significativa
o meio ambiente, ampliando sua conceituação ao trazer o ser humano ao
centro da questão ambiental e apontá-lo simultaneamente como destinatário
e implementador, quando impõe "ao Poder Público e à coletividade o dever de
defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações". 3. A autonomia
e elevada proteção ao meio ambiente garantida pela nova ordem constitucional
fizeram com que a responsabilidade civil nessa seara fosse instituída como
objetiva pelo ordenamento jurídico, sendo desnecessário aferir o elemento
subjetivo do agente poluidor, conforme se verifica do art. 14, §1º da Lei
6.938/81. 4. Especificamente quanto à prevenção, controle e fiscalização
da poluição causada por lançamento de óleo e outras substâncias nocivas ou
perigosas em águas sob jurisdição nacional, a Lei 9.966/2000 estabelece
os princípios básicos a serem obedecidos, dispondo, em seu art. 21, que
"as circunstâncias em que a descarga, em águas sob jurisdição nacional, de
óleo e substâncias nocivas ou perigosas, ou misturas que os contenham, de
água de lastro e de outros resíduos poluentes for autorizada não desobrigam
o responsável de reparar os danos causados ao meio ambiente e de indenizar
as atividades econômicas e o patrimônio público e privado pelos prejuízos
decorrentes dessa descarga", o que também denota a obrigação reparatória
independente da atuação em conformidade com a legislação ambiental. 4. Como
muito bem fundamentado pelo juízo, apesar do que restou apurado pelo MPF nos
Procedimentos Administrativos MPF/PR/ES n° 1.17.000.000313/2011-76 e MPF/PR/ES
n° 1.17.000.002548/2014-45, que embasaram o ajuizamento da presente ação civil
pública, não se 1 verifica descumprimento, pela parte ré, das obrigações
de medição e monitoramento constantes da Resolução CONAMA n. 393/2007,
que "dispõe sobre o descarte contínuo de água de processo ou de produção
em plataformas marítimas de petróleo e gás natural", nas Plataformas FPSO
(sigla para Floating Production Storage and Offloading) da Bacia do Espírito
Santo, no período de 2007 a dezembro/2009. 5. No tocante à obrigação de
medição dos quantitativos de óleos e graxas, tem-se claro que, apesar
da determinação pelo método gravimétrico (art. 6º, caput), o §1º do mesmo
dispositivo estipula a possibilidade de utilização de "outras metodologias de
análise, desde que apresentem correlação estatisticamente significativa com o
método gravimétrico". Assim, o próprio ato normativo ambiental possibilita
a utilização de outros métodos de medição que sejam correlacionados ao
gravimétrico, sendo um deles o método espectrofotométrico, utilizado pelo
empreendedor, como ratifica o laudo pericial complementar. 6. Especificamente
no que tange aos meses de agosto a outubro de 2007, a própria Coordenação
Geral de Petróleo e Gás - CGPG do IBAMA, órgão ambiental fiscalizador,
no Parecer Técnico do IBAMA nº 358/10, explicita que "apesar da Resolução
CONAMA nº 393/07 ter entrado em vigor na data de sua publicação, e de
ter havido ampla participação da Petrobras na elaboração desta Resolução,
a CGPEG irá considerar que os meses de agosto, setembro e outubro de 2007
corresponderam a um período de adequação à nova norma"(fl. 139). 7. Não se
desconhece que a hipótese dos autos, que trata de descarte de água e óleo e
graxa nela presentes, caracteriza espécie de dano ambiental autônomo, já que
causa perigo de dano a bens que intrinsecamente compõem o meio ambiente como,
por exemplo, a adequada condição da água a propiciar a reprodução de espécies
marinhas, motivo pelo qual não se mostra possível exigir demonstração de dano
palpável. 8. Nesses casos, premente ter por norte a observância das normas
ambientais expedidas pelas autoridades administrativas competentes, como
forma de aferir se a conduta do empreendedor se adequa à margem de prevenção
estipulada em momento anterior ao desenvolvimento da atividade. Isso porque
o dano poderia advir exatamente do acúmulo dos constantes descumprimentos
das balizas estabelecidas pelos órgãos ambientais e que a degradação ao meio
ambiente pode acabar decorrendo do somatório de condutas irregulares. 9. Ante
a dificuldade de aferir o dano em certas hipóteses, exatamente por não ser
palpável em incidências pontuais, mostra-se imprescindível o estabelecimento
de parâmetros e limites da atividade de descarte de óleo e misturas oleosas
em águas nacionais pelas autoridades administrativas competentes, a quem
a própria lei atribui tal mister. Nesse contexto, a própria Resolução do
CONAMA 393/2007 autoriza descartes com parâmetros mensal e diário, porque
somente o efeito cumulativo excessivo e substancialmente desproporcional
geraria a presunção de danos ambientais. 10. Nesse ponto conclui-se que "o
descumprimento dessas condições por quem exerce a atividade ambientalmente
perigosa acarreta dano ambiental, ipso facto, sendo indevido, portanto,
colocar em dúvida se o dano ambiental ocorreu ou não concretamente, mesmo
porque este, além de presumido, deve ser evitado. Ademais, o pressuposto
lógico do qual se parte é que, tendo a lei remetido aos órgãos ambientais
especializados a edição de normas administrativas voltadas a balizar os limites
dos descartes dos resíduos, estes o fizeram com respaldo técnico o suficiente
para que se conclua que, uma vez ultrapassados os limites fixados, se tenha
presente o dano ambiental, ainda que este só venha a ocorrer concretamente no
futuro, com ou sem o concurso de concausas"(TRF2, AC 0000961-77.2011.4.02.5103,
Sétima 2 Turma Especializada, Rel. Juiz Federal Convocado FLAVIO OLIVEIRA
LUCAS, DJe 06/07/2018). 11. No caso, não se verifica o descumprimento das
balizas administrativamente fixadas, uma vez que a parte ré procedeu à
medição nos moldes prescritos no ato normativo aventado, havendo excesso do
limite de 42 mg/L em apenas um dia (04/05/2010) na Plataforma Petrobras FPSO
Cidade de Vitória, dentro do lapso temporal sob análise. Ademais, resta clara
a possibilidade real de contaminação das amostras atinentes a 04/05/2010,
o que reforça a ausência de comportamento contrário à norma ambiental pela ré
na hipótese, mormente tendo se tratado de apenas um dia dentro do amplo lapso
temporal analisado. 12. No tocante ao descarte de 03/09/2011 da Plataforma
FPSO Cidade de São Mateus, extrai- se, do laudo pericial, em resposta ao
quesito 12 do MPF (fl. 1089), que o relatório apresentado pela parte ré
indica análise de TOG por espectrofotometria, um dos possíveis métodos da
medição regulamentada no ato normativo ambiental, não havendo que se falar
igualmente em descumprimento da obrigação. 13. Ao contrário do exarado em
parecer técnico do IBAMA, houve o efetivo monitoramento semestral exigido
pela norma (art. 10 da Res. 393/07), conforme resposta do perito aos quesitos
do MPF (laudo complementar - fls. 1081/1112). O próprio MPF, em parecer
técnico do setor responsável (fls. 1128/1155), ratifica tais respostas do
expert. 14. A própria norma induz à necessidade de análise das "condições
de descarte" da água, ou seja, das "condições e padrões de lançamento da
água produzida no mar" (art. 2º, III da Res. CONAMA 373/07) quando ela é
efetivamente objeto de descarte contínuo, caracterizado como "lançamento
no mar da água produzida durante um processo ou uma atividade desenvolvida,
de maneira permanente ou intermitente" (art. 2º, IV da Res. CONAMA 373/07),
o que não se aplica ao chamado "descarte fechado". 15. Conclui-se não ter
havido, no caso, desrespeito às normas administrativas ou legais pertinentes
que possibilitem imputar à parte ré a ocorrência de dano presumido, a ensejar
qualquer condenação reparatória ou compensatória ambiental. 16. Remessa
necessária desprovida.
Ementa
AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PLATAFORMAS MARINHAS. BACIA DO ESPÍRITO
SANTO. DESCARTE CONTÍNUO DE ÁGUAS. TEOR DE ÓLEOS E GRAXAS - TOG. LEI
9.986/00 E RESOLUÇÃO CONAMA 393/2007. MÉTODOS DE MEDIÇÃO. CONDUTA EM
CONFORMIDADE COM A LEGISLAÇÃO AMBIENTAL PERTINENTE. NÃO CARACTERIZAÇÃO
DE DANO PRESUMIDO. REMESSA DESPROVIDA. 1.O conceito de meio ambiente foi
trazido pela Lei 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio
Ambiente (PNMA) e cria o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA),
sendo inovador por estender a proteção jurídica a todos os elementos
da natureza de forma interativa e in...
Data do Julgamento
:
09/08/2018
Data da Publicação
:
14/08/2018
Classe/Assunto
:
REOAC - Reexame Necessário - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador
:
5ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
VIGDOR TEITEL
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
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