TRF5 0000579-88.2011.4.05.8308 00005798820114058308
PENAL. ESTELIONATO. CORRUPÇÃO PASSIVA. USO DE DOCUMENTO PARTICULAR FALSO. PRESENÇA DE ELEMENTOS À CONDENAÇÃO PELA PRÁTICA DELITUOSA. DISSONÂNCIA ENTRE A VALORAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS QUANDO DA FIXAÇÃO DA PENA BASE. ADVOGADA CREDENCIADA JUNTO A
NÚCLEO DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. AUSÊNCIA DE DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO NA LOCALIDADE, À ÉPOCA. EQUIPARAÇÃO A FUNCIONÁRIO PÚBLICO. ART. 327 DO CÓDIGO PENAL. PRECEDENTES. PETIÇÃO FIRMADA PELA ACUSADA ONDE REQUER JUNTADA A AUTOS PROCESSUAIS DE DOCUMENTO
PARTICULAR FALSO (INSTRUMENTO DE MANDATO E CONTRATO DE HONORÁRIOS). PERÍCIA POLICIAL FEDERAL CONCLUSIVA DA INAUTENTICIDADE. AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVA DEMONSTRADAS. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME QUE DEVEM SER VALORADAS EM DESFAVOR DA ACUSADA. NECESSÁRIA
EXASPERAÇÃO DA PENA BASE. CRIMES DE ESTELIONATO E DE CORRUPÇÃO PASSIVA. CONCURSO FORMAL IMPERFEITO. APLICAÇÃO DA PENA MAIS GRAVE MAJORADA. ART. 70 DO CÓDIGO PENAL. CRIMES NA MODALIDADE TENTADA E CONSUMADA E CRIME DE USO DE DOCUMENTO PARTICULAR FALSO.
CONCURSO MATERIAL. APELAÇÃO PROVIDA.
I. Noticia a denúncia que a acusada, à época dos fatos exercendo a função de advogada do Núcleo de Assistência Judiciária Gratuita da Justiça Federal de Petrolina/PE, solicitou e recebeu vantagem indevida para atuar em feitos em que as partes
interessadas procuravam aquele núcleo por não ter condições de arcar com custas processuais e honorários advocatícios, alegando destinar-se a "despesas processuais extras" necessárias ao ingressos das demandas; e que, mesmo recebendo tais valores,
constatou-se situações em que não restou ajuizada a ação ou, em um caso específico, não prosseguiu na defesa de um dos interessados, concorrendo para o trânsito em julgado, acrescentando que, após o magistrado ter ciência dos fatos a ela imputado, foi
tornada sem efeito a nomeação da ora acusada para atuar em feito como advogada do aludido núcleo de assistência judiciária, havendo ela peticionado nos autos requerendo a juntada de instrumento de procuração e de contrato de honorários advocatícios, no
que foi determinada a intimação pessoal da parte autora, tendo em vista anterior alegação de impossibilidade em arcar com custas processuais e honorários, pelo que recorrera à assistência judiciária, vindo aos autos notícia da inautenticidade da
assinatura naquelas peças.
II. Julgada parcialmente procedente a pretensão punitiva, com a condenação tão somente quanto às imputações de estelionato, fixando, ao final, as penas de 2 (dois) anos e 1 (um) mês de reclusão e de 20 (vinte) dias-multa, cada qual valorado em 1/30 (um
trigésimo) do salário mínimo à época dos fatos, e restando absolvida quanto aos crimes de corrupção passiva e de falso.
III. Em suas razões de apelo o órgão ministerial aduz presentes elementos de convicção propícios à condenação pela prática dos crimes previstos nos arts. 317 e 304 c/c 298, todos do Código Penal, bem como encontrar-se dissonante a dosimetria da
pena-base à correta valoração das circunstâncias judiciais.
IV. Ainda que na sentença recorrida se apresente não restar demonstrada nos autos a autoria delitiva quanto à falsificação de documento ou ao uso de documento falso, outro não pode ser o entendimento deste juízo recursal em dissentir daquela, eis que
através de petição atravessada nos autos do Proc. nº 2009.83.08.501276-5, a ora apelada requereu a juntada de instrumento de mandato/contrato de honorários advocatícios, que teriam sido firmado no dia 22 de julho de 2009, documento este que restou
comprovada sua inidoneidade não apenas por laudo pericial encartado no IPL em apenso, como por declaração do próprio suposto signatário dos mesmos, autor no aludido feito, de onde se mostra claro o uso do documento particular falso, a incidir as penas
do art. 304 c/c o art. 298, ambos do Código Penal.
V. Não há que se falar em desconhecimento por parte da ré, eis que de toda a narrativa dos autos resta evidenciada a consciência, e seu agir depois do descredenciamento e substituição na defesa do interesse de pessoas atendidas pelo núcleo de
assistência judiciária, bem como investir-se a conduta da tipicidade, antijuridicidade e reprovabilidade a concluir pela imputação do crime em referência.
VI. Diante da ausência, à época, da Defensoria Pública da União em Petrolina, o Núcleo de Assistência Judiciária da Justiça Federal de Petrolina, pelo advogados ali credenciados, exerceria, então, suas atribuições, pelo que se equiparariam a
funcionários públicos para fins penais, nos termos do art. 327 do Código Penal. Precedentes: STJ, RHC-33133/SC, rel. Min. Jorge Mussi, j. 21.05.2013, DJe 05.06.2013; TRF5, 3ªT., RSE-1844/PE, rel. Des. Federal Marcelo Navarro, j. 20.08.2013, DJe
26.08.2013.
VII. Ainda que possa entender, como na sentença, a possibilidade das consequências do crime serem as inerentes do tipo penal, há que se concordar com o expendido no apelo ao se reconhecer uma maior amplitude, ou seja, não apenas atingindo patamares
patrimoniais dos indivíduos que procuraram a assistência judiciária e a eles foi exigida alguma vantagem indevida para atuar, situação essa que poderia até vir a ser reparada quando da fixação do valor mínimo de reparação pelos danos causados, mas é de
se ressaltar maior prejuízo àqueles ao não ajuizar ações ou mesmo deixar de exercer a defesa, conduzindo ao trânsito em julgado em decisão condenatória, cujo prejuízo não é de fácil mensuração, e muito menos objeto da sentença ao condenar a ora apelada
na reparação aos danos causados, culminando com o próprio descrédito daquele órgão ao qual se credenciara junto à sociedade como um todo e, em especial, à população alvo, sendo necessária uma maior exasperação da pena base.
VIII. Fazendo-se necessária a exasperação da pena base fixada na sentença, é de se adotar um critério objetivo, como o definido por Guilherme de Souza Nucci (Código Penal comentado, 11.ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 438/440), a partir
da cominação prevista, no caso concreto para os crimes do art. 171, caput, do Código Penal, sejam os consumados ou o tentado, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e encontrando-se valorações negativas, positivas e neutras, tendo-se por pertinente conduzir a pena
base aos patamares de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão e de 18 (dezoito) dias-multa, pelo que, mantidos os demais elementos da dosimetria da pena expendidos na sentença, tais como a inexistência de atenuantes ou agravantes e, na terceira fase, a
incidência tão somente da causa de diminuição para o delito tentado, com o reconhecimento da continuidade delitiva em relação ao consumado, obtém-se, ao final, as penas de 1 (um) ano meses de reclusão e de 12 (doze) dias-multa para o crime tentado, e de
2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão e de 30 (trinta) dias-multa para o crime consumado e em continuidade delitiva.
IX. Em vista do acatamento do apelo formulado para a condenação nos demais crimes, no caso o de corrupção passiva e o de uso de documento falso, adotando-se, para o primeiro, idêntica ponderação das circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, e
em vista da cominação prevista no art. 317 do Código Penal, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, tem-se por pertinente a fixação da pena base nos patamares de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão e de 24 (vinte e quatro) dias-multa, pelo que, mantidos os
demais elementos da dosimetria da pena aplicada para o crime de estelionato na sentença, tais como a inexistência de atenuantes ou agravantes e, na terceira fase, a incidência tão somente da causa de diminuição para o delito tentado, com o
reconhecimento da continuidade delitiva em relação ao consumado, obtém-se, ao final, as penas de 1 (um) anos e 8 (oito) meses de reclusão e de 18 (dezoito) dias-multa para o crime tentado, e de 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de reclusão e de 45
(quarenta e cinco) dias-multa para o crime consumado e em continuidade delitiva.
X. No que diz respeito ao crime de uso de documento particular falso, adotando a ponderação das circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal como a expendida na sentença, e em vista da cominação da pena no art. 298 do Código Penal, de 1 (um) a 5
(cinco) anos, é de se fixar a pena base em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão e de 12 (doze) dias-multa.
XI. No que diz respeito aos crimes do art. 171, caput, e do art. 317, ambos do Código Penal, seja na modalidade tentada como na consumada, não resta presente o concurso material, mas sim a ocorrência de concurso formal imperfeito, pelo que se faz
aplicável a regra do art. 70 do Código Penal, aplicando a pena mais grave fixada, no caso concreto da corrupção passiva, aumentada de 1/6 (sexto), a conduzir, para o delito na forma tentada às penas de 1 (um) ano, 11 (onze) meses e 10 (dez) dias de
reclusão e de 21 (vinte e um) dias-multa e, para o delito na forma consumada, de 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão e de 48 (quarenta e oito) dias-multa.
XII. Diante do concurso material entre os crimes nas suas modalidades tentada e consumada e, ainda no que concerne ao crime do art. 304 c/c o art. 298, do Código Penal, a este fixada a pena em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão e de 12 (doze)
dias-multa, conclui-se pela fixação da pena final e em definitivo em 7 (sete) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime de cumprimento inicialmente semiaberto, inviabilizada a substituição por penas restritivas de direitos por
contrariado requisito do art. 44 do Código Penal, e de 81 (oitenta e um) dias-multa, mantida a valoração de cada um em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do descredenciamento, em 8 de julho de 2009).
XIII. Apelação do Ministério Público Federal provida.
Ementa
PENAL. ESTELIONATO. CORRUPÇÃO PASSIVA. USO DE DOCUMENTO PARTICULAR FALSO. PRESENÇA DE ELEMENTOS À CONDENAÇÃO PELA PRÁTICA DELITUOSA. DISSONÂNCIA ENTRE A VALORAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS QUANDO DA FIXAÇÃO DA PENA BASE. ADVOGADA CREDENCIADA JUNTO A
NÚCLEO DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. AUSÊNCIA DE DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO NA LOCALIDADE, À ÉPOCA. EQUIPARAÇÃO A FUNCIONÁRIO PÚBLICO. ART. 327 DO CÓDIGO PENAL. PRECEDENTES. PETIÇÃO FIRMADA PELA ACUSADA ONDE REQUER JUNTADA A AUTOS PROCESSUAIS DE DOCUMENTO
PARTICULAR FALSO (INSTRUMENTO DE MANDATO E CONTRATO DE HONORÁRIOS). PERÍCIA POLICIAL FEDERAL...
Data do Julgamento
:
04/10/2016
Data da Publicação
:
20/10/2016
Classe/Assunto
:
ACR - Apelação Criminal - 10651
Órgão Julgador
:
Segunda Turma
Relator(a)
:
Desembargador Federal Ivan Lira de Carvalho
Comarca
:
TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
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