TRF2 0014458-62.2014.4.02.5101 00144586220144025101
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ACUMULAÇÃO DE CARGOS PRIVATIVOS
DE PROFISSIONAL DE SAÚDE. ARTIGO 37, XVI, "C", CRFB. TÉCNICA DE
ENFERMAGEM. POSSIBILIDADE. COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS. 1. Estão presentes
os requisitos à impetração do mandado de segurança, uma vez que a Servidora
impetrante viu seu direito a ser empossada em novo cargo público ameaçado
por ato da FIOCRUZ, que condicionou a posse à desvinculação do cargo de
Técnica de Enfermagem já exercido no Hospital Universitário Pedro Ernesto
- HUPE, enquadrando-se a hipótese, portanto, no art. 5º, inciso LXIX da
CRFB/88. 2. Conforme se constata do Edital do concurso, o cargo, denominado
"Técnico em Saúde Pública" (ATC112), tem como pré-requisitos que o candidato
esteja inscrito no respectivo Conselho de Classe da profissão, estando quite
com todas as suas exigências legais (Anexo I do Edital), bem como que apresente
Ensino médio e curso de Técnico em Enfermagem (fl. 29), de modo que não pode
ser preenchido por qualquer diplomado, não se tratando o caso dos autos de
acumulação de um cargo de profissional de saúde com um cargo científico,
como faz crer a FIOCRUZ, mas sim de dois cargos de profissionais de saúde
(Técnico em Enfermagem no HUPE e Técnico em Saúde Pública na FIOCRUZ),
englobado, portanto, na hipótese do art. 37, XVI, "c", da CRFB/88. 3. A
garantia de acumulação de dois cargos privativos de profissionais de saúde
encontra previsão no artigo 37, inciso XVI, "c", da CRFB/88, com a redação
da Emenda Constitucional nº 34, de 13 de dezembro de 2001, desde que haja
compatibilidade de horários e seja respeitado o teto remuneratório previsto
no artigo 37, incisos XI e XVI, do mesmo dispositivo. 4. A CRFB/88 e a Lei
8.112/90 condicionam a acumulação de cargos à compatibilidade de horários,
não havendo qualquer previsão legal de carga horária semanal máxima. Daí
a necessidade da compatibilidade de horários ser aferida concretamente,
e não em um plano abstrato como deseja a Administração Pública, invadindo
a esfera de atuação do poder legislativo e, também indevidamente, criando
uma nova condição para a cumulatividade. 5. Tendo em vista que a temática
apresentada reveste-se de cunho constitucional, por estar contida expressamente
no texto da CRFB/88, depreende-se que cabe ao eg. Supremo Tribunal Federal
o entendimento final sobre o deslinde da controvérsia. 4. Nesse contexto,
frise-se que, no RE 351.905/RJ (Segunda Turma, DJ. 01.07.2005), de que foi
relatora a Min. ELLEN GRACIE, e de cujo voto extrai-se o seguinte trecho: "O
Tribunal a quo, ao afastar o limite de horas semanais estabelecido no citado
decreto, não ofendeu qualquer dispositivo constitucional...", o eg. STF já
entendia pelo critério da compatibilidade de horários 1 como condicionante à
acumulação de cargos, de modo que, restando comprovada a ausência de choque
ou simultaneidade de horários em ambas as ocupações do servidor, descaberia
à Administração, sob pretexto de regulamentar dispositivo constitucional,
criar regra não prevista, na pretensão de regular abstratamente tema de nítido
cunho casuístico. Precedentes do STF. 5. O eg. STF, em decisão proferida
pelo Ministro Roberto Barroso, nos autos do ARE 782170/PE, em 28/11/2014,
também salientou que o Executivo não pode, sob o pretexto de regulamentar
dispositivo constitucional, criar regra não prevista em lei, de modo que,
ainda que a carga horária semanal dos dois cargos seja superior ao limite
previsto no parecer da AGU, deve ser assegurado o exercício cumulativo de
ambos os cargos públicos. 6. Inicialmente, o tema recebeu orientação por
meio do Parecer nº GQ - 145 da AGU, de 16 de março de 1998, e Parecer nº AC -
054, de 27 de setembro de 2006, que estabeleceram o limite máximo de jornada
semanal de 60 (sessenta) horas aos servidores públicos. Os pareceres da AGU
trataram do critério da acumulabilidade, por meio da limitação de horas
da jornada de trabalho, e entenderam que este não é somente um critério
objetivo, tampouco suficiente para sustentar a acumulabilidade de cargos
públicos, uma vez que tal acumulação somente será auferida licitamente se,
além da compatibilidade de horários, puder ser comprovada a ausência de
prejuízos às atividades desenvolvidas. 7. O Tribunal de Contas da União -
TCU agasalhou, de início, a orientação trazida naqueles pareceres da AGU
(Acórdão 2133/2005, 1ª Câmara, TC - 013.780/2004-0). Contudo, analisando
julgamentos mais recentes do TCU, principalmente a partir do ano de 2013,
percebe- se que o entendimento da Corte de Contas modificou-se, deixando
aquele da AGU para se aliar à parcela do Poder Judiciário, permitindo o
registro de aposentadorias ou admissões com carga horária semanal superior
a 60 horas de cargos acumuláveis, desde que comprovado, no caso concreto,
o requisito de compatibilidade de horários, tal como citado no Acórdão TCU
nº 1176/2014. 8. Assim, apesar de recente manifestação do eg. STJ em sentido
contrário ao do eg. STF (STJ, MS nº 22002/DF, 1ª Seção - Rel. Min. Mauro
Campbell Marques - DJe de 17/12/2015, reforçando posição já anteriormente
adotada por unanimidade no MS nº 19300/DF, 1ª Seção - Rel. Min. Mauro
Campbell Marques - DJe 18/12/2014), necessário frisar que cabe a observância
do entendimento do eg. STF, ante a constitucionalidade do tema, mormente
quando o eg. STJ limitou-se a ratificar sua posição valendo-se da mesma
ratio decidendi anterior, com respaldo no Parecer GQ-145/98 da AGU, que
trata da limitação da carga horária semanal a sessenta horas nas hipóteses
de acumulação de cargos públicos. 9. Nesse diapasão, o entendimento de que
a Constituição da República Federativa do Brasil não veda expressamente a
acumulação de cargos com jornada superior a 60 horas, exigindo-se apenas a
compatibilidade entre os horários, deve prevalecer. 10. Não se mostra razoável
aferir a compatibilidade de horários dos servidores públicos com base em um
critério tão genérico quanto o mero somatório de horas trabalhadas. Impor
a quantia inflexível de sessenta horas semanais como limite ao cumprimento
sadio da jornada de trabalho é estipular presunção desfavorável ao servidor
de que ir além comprometeria a eficiência do serviço prestado, bem como
desconsiderar as peculiaridades existentes em cada caso concreto. Precedentes
deste eg. TRF2. 11. Não se pode prejudicar a Autora por mera presunção de
que a realização de jornada de trabalho cumulada compromete a qualidade do
serviço prestado, salientando-se, ainda, que a Administração, ao longo dos
três primeiros anos em que a servidora se encontra investida no 2 cargo
público, faz, obrigatoriamente, avaliação especial de seu desempenho,
por se tratar de condição para que este venha a adquirir estabilidade no
serviço público. 12. No caso dos autos, impende-se ressaltar que a servidora
ocupa cargo público de Técnica de Enfermagem no Hospital Universitário Pedro
Ernesto - HUPE, desde 02/05/2012, com carga horária semanal de 30 horas, em
regime 12x60h (fl. 48). Já como Técnica em Saúde Pública, cargo cuja posse
a FIOCRUZ condicionou à desvinculação no HUPE, ela laboraria na Enfermagem
Neonatal e Pediátrica (fl. 43), com carga horária de 40 horas semanais
(fl. 14). 13. Como bem ressaltado pelo juízo a quo, de fato, "não há como
verificar objetivamente dos autos se há compatibilidade entre os cargos",
uma vez que "a distribuição da carga horária a ser exercida pela impetrante
na FIOCRUZ não fora confrontada com a de seu cargo anterior", de modo que
"não se pode presumir de antemão a existência ou não de compatibilidade entre
os cargos apenas pelo somatório das cargas horárias" (fl. 169). 14. Cumpre à
Administração Pública comprovar a existência de incompatibilidade de horários
em cada caso específico, não bastando tão somente cotejar o somatório de
horas trabalhadas, como visto. 15. Remessa necessária e recurso de apelação
desprovidos.
Ementa
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ACUMULAÇÃO DE CARGOS PRIVATIVOS
DE PROFISSIONAL DE SAÚDE. ARTIGO 37, XVI, "C", CRFB. TÉCNICA DE
ENFERMAGEM. POSSIBILIDADE. COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS. 1. Estão presentes
os requisitos à impetração do mandado de segurança, uma vez que a Servidora
impetrante viu seu direito a ser empossada em novo cargo público ameaçado
por ato da FIOCRUZ, que condicionou a posse à desvinculação do cargo de
Técnica de Enfermagem já exercido no Hospital Universitário Pedro Ernesto
- HUPE, enquadrando-se a hipótese, portanto, no art. 5º, inciso LXIX da
CRFB/88. 2. Conforme se...
Data do Julgamento
:
02/03/2016
Data da Publicação
:
07/03/2016
Classe/Assunto
:
APELREEX - Apelação / Reexame Necessário - Recursos - Processo Cível e
do Trabalho
Órgão Julgador
:
5ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
ALUISIO GONÇALVES DE CASTRO MENDES
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
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