REsp 1602794 / TORECURSO ESPECIAL2016/0142376-4
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. PRESENÇA DO ELEMENTO SUBJETIVO. DANO AO ERÁRIO.
INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. SÚMULA 7/STJ.
OFENSA AO ART. 535 DO CPC/1973 NÃO CONFIGURADA. OMISSÃO.
INEXISTÊNCIA. HISTÓRICO DA DEMANDA 1. Caso em que o juízo de primeiro grau julgou parcialmente procedente a Ação de Improbidade Administrativa, com pedido de indisponibilidade de bens, condenando os ora recorrentes ao ressarcimento do dano causado ao erário no valor de R$ 342.232,66, cumulativamente às demais sanções do art. 12 da Lei 8.429/1992, por infração ao art. 10, caput e XI, e ao art.11 do mesmo diploma legal, porquanto, entre 2001 e 2004, o demandado Nilo Roberto Vieira, então prefeito do Município de Peixe, assinou cheques e autorizou transferências de dinheiro público de contas correntes da municipalidade diretamente para contas de sua esposa (Leide Vieira) e de seu filho (Adamo Vieira). A sentença foi mantida pelo Tribunal de Justiça do Estado de Tocantins.
OFENSA AOS ARTS. 458 E 535 DO CPC/1973 2 A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa aos arts. 458 e 535 do CPC/1973. 3. Sobre o argumento trazido em Aclaratórios, o Tribunal de origem consignou: "O Embargante aponta como omissão a ausência de provas dos depósitos supostamente feitos em sua conta bancária. No entanto, todas as alegações das partes foram analisadas, sendo que a questão nesta via levantada, sequer fora mencionada em sede de apelação". 4. Aliás, na Apelação dos ora recorrentes, foi dito que "os extratos bancários comprobatórios dos depósitos (...) não poderiam ser presumidos como prova de enriquecimento por parte dos Apelantes" (fl. 1.210), tendo sido confirmados, portanto, os depósitos apontados pelo Ministério Público.
OFENSA AO ART. 333 DO CPC/1973 5. O art. 333 do CPC/1973 (art. 373 do CPC/2015) distribui o ônus da prova de acordo com a natureza da alegação de fato a demonstrar. Ao autor cumpre provar a alegação que concerne ao fato constitutivo do direito por ele afirmado. Ao réu, a alegação de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito afirmado pelo autor. Dessa forma, quando o réu contesta apenas negando o fato em que se baseia a pretensão do autor, todo o ônus probatório é responsabilidade deste (autor). Porém, em casos em que o réu se defende alegando fato capaz de alterar ou eliminar as consequências jurídicas do fato invocado pelo autor, a regra se inverte, já que implicitamente admite como verídico o alegado na Petição Inicial - e ao réu cabe o ônus de provar os fatos trazidos em sua resposta.
6. Disso entende-se que não há mácula no mencionado dispositivo legal. Com efeito, a Corte de origem afirmou que, como "a prova dos depósitos irregulares foi feita pelo autor da ação, caberia aos apelantes, ao contestarem o feito, apresentarem fatos que impedissem, modificassem ou extinguissem o direito ao ressarcimento do dano pelo erário do Município de Peixe" (fl. 1.302). "Todavia, em todas as oportunidades que foi dado a se manifestar nos autos, os apelantes descuraram-se de produzir provas quanto ao destino dado às vultosas quantias depositadas em suas contas bancárias entre os anos de 2001 a 2004" (fl. 1.303). Disse ainda que a alegação de que tais "valores seriam uma reposição de um possível 'empréstimo' feito pelos mesmos ao Município de Peixe" não foi provado, concluindo que "é imprópria a alegação de que haveria inversão do ônus da prova"(fl. 1.302). 7. Acrescente-se que a jurisprudência do STJ entende que não há como aferir eventual ofensa ao art. 333 do CPC/1973 (art. 373 do CPC/2015) sem que se verifique o conjunto probatório dos presentes autos. A pretensão de simples reexame de provas, além de escapar da função constitucional deste Tribunal, encontra óbice na Súmula 7 do STJ, cuja incidência é induvidosa no caso sob exame. 8. A aplicação das sanções previstas na Lei de Improbidade, quando comprovada a conduta ilícita, independe da aprovação ou rejeição das contas do agente público, pelo órgão de controle interno ou pelo Tribunal ou Conselho de Contas. Assim, não há qualquer vinculação entre a decisão proferida pelo Tribunal de Contas da União e o ajuizamento de ação de improbidade perante o Poder Judiciário. Precedentes: AgRg no REsp 1407540/SE, Rel.
Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 19/12/2014; REsp 1504007/PI, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 01/06/2016.
PRESENÇA DO ELEMENTO SUBJETIVO 9. O entendimento do STJ é que, para que seja reconhecida a tipificação da conduta do réu como incurso nas prescrições da Lei de Improbidade Administrativa, é necessária a demonstração do elemento subjetivo, consubstanciado pelo dolo para os tipos previstos nos artigos 9º e 11 e, ao menos, pela culpa, nas hipóteses do artigo 10.
10. É pacífico nesta Corte que o ato de improbidade administrativa previsto no art. 11 da Lei 8.429/1992 exige a demonstração de dolo, o qual, contudo, não precisa ser específico, sendo suficiente o dolo genérico. 11. Assim, para a correta fundamentação da condenação por improbidade administrativa, é imprescindível, além da subsunção do fato à norma, caracterizar a presença do elemento subjetivo. A razão para tanto é que a Lei de Improbidade Administrativa não visa punir o inábil, mas sim o desonesto, o corrupto, aquele desprovido de lealdade e boa-fé.
12. Precedentes: AgRg no REsp 1.500.812/SE, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 28/5/2015; REsp 1.512.047/PE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 30/6/2015; AgRg no REsp 1.397.590/CE, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 5/3/2015; e AgRg no AREsp 532.421/PE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 28/8/2014.
13. O Tribunal de origem foi categórico em afirmar a presença do elemento subjetivo. Vejamos: "Restou confessa, pelos apelantes, que efetivamente o apelante Nilo Roberto Vieira, então Prefeito do Município de Peixe, emitiu cheques da Prefeitura Municipal, para as contas bancárias da apelante Leide Martins Quixaba Vieira, sua esposa, e do apelante Ádamo Weber Vieira, seu filho, de valores significativos de R$ 215.701,66 (duzentos e quinze mil, setecentos e um reais e sessenta e seis centavos) e de R$ 126.531,00 (cento e vinte e seis mil, quinhentos e trinta e um reais), respectivamente, entre os anos de 2001 a 2004. (...) O desvio das verbas públicas restou evidente, sendo feito de uma forma primária, sem qualquer refino, com a certeza da impunidade. (...) Os extratos juntados pelo Ministério Público provaram a 'mistura' do dinheiro público com o privado, da família do Prefeito Municipal. A transferência do dinheiro é irrefutável, porque comprovada documentalmente (...). O dolo está configurado pela manifesta vontade de realizar conduta contrária ao dever de legalidade, admitida pelos próprios apelantes, além do locupletamento ilícito consubstanciado no depósito de dinheiro público em conta de familiares, sem qualquer justificativa legal" (e-STJ, fls. 1.304-1.311).
14. Modificar a conclusão a que chegou a Corte de origem, de modo a acolher a tese dos recorrentes, demanda reexame do acervo fático-probatório dos autos, o que é inviável em Recurso Especial, sob pena de violação da Súmula 7 do STJ. Nesse sentido: AgRg no AREsp 473.878/SP, Rel. Ministra Marga Tessler (Juíza convocada do TRF 4ª Região), Primeira Turma, DJe 9/3/2015, e REsp 1.285.160/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 12/6/2013.
QUANTO AO DANO AO ERÁRIO 15. O Tribunal a quo reconheceu que houve dano ao Erário, tendo constatado a "caracterização de prejuízo ao erário público, que, in casu, é evidente (fl. 1.308-1.309). E, ainda, confirmou o Parecer do Ministério Público: "O prejuízo aos cofres públicos não é presumível mas, sim, demonstrado por todo o contexto dos autos, na medida em que os cheques da Prefeitura Municipal foram depositados nas contas correntes particulares (entrada), sem a comprovação de pagamentos em valores idênticos (saída)" (fl. 1303).
16. É inviável analisar a tese defendida no Recurso Especial, a qual busca afastar as premissas fáticas estabelecidas pelo acórdão recorrido, pois inarredável a revisão do conjunto probatório dos autos. Aplica-se o óbice da Súmula 7/STJ.
CONCLUSÃO 17. Recurso Especial de Ádamo Weber Vieira parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido. Recurso Especial de Nilo Roberto Vieira e Leide Martins Quixaba Vieira não conhecido.
(REsp 1602794/TO, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/06/2017, DJe 30/06/2017)
Ementa
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. PRESENÇA DO ELEMENTO SUBJETIVO. DANO AO ERÁRIO.
INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. SÚMULA 7/STJ.
OFENSA AO ART. 535 DO CPC/1973 NÃO CONFIGURADA. OMISSÃO.
INEXISTÊNCIA. HISTÓRICO DA DEMANDA 1. Caso em que o juízo de primeiro grau julgou parcialmente procedente a Ação de Improbidade Administrativa, com pedido de indisponibilidade de bens, condenando os ora recorrentes ao ressarcimento do dano causado ao erário no valor de R$ 342.232,66,...
Data do Julgamento
:
13/06/2017
Data da Publicação
:
DJe 30/06/2017
Órgão Julgador
:
T2 - SEGUNDA TURMA
Relator(a)
:
Ministro HERMAN BENJAMIN (1132)
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