TRF3 0003947-47.2017.4.03.0000 00039474720174030000
PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. DEFERIMENTO DE INTERCEPTAÇÕES
TELEFÔNICAS/TELEMÁTICAS. DECISÕES FUNDAMENTADAS. NULIDADE E FALTA
DE FUNDAMENTAÇÃO NÃO CONFIGURADAS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO
CONFIGURADO. ORDEM DENEGADA.
- O art. 5º, inciso X, da Constituição Federal, garante o dever de sigilo ao
dispor serem "invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem
das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou
moral decorrente de sua violação." De seu turno, o inciso XII deste artigo
traz uma ressalva, quando houver uma investigação criminal ou durante a
instrução processual penal, e em havendo ordem judicial, ao dispor sobre a
interceptação das comunicações telefônicas/telemáticas: "é inviolável
o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e
das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial,
nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação
criminal ou instrução processual penal." Trata-se de reserva legal de
modo que a autorização judicial para a intervenção condiciona-se à
existência de uma precedente investigação criminal ou para a instrução
processual penal.
- A Lei nº 9.296, de 24.07.1996, veio regulamentar as hipóteses do
cabimento da interceptação de comunicações telefônicas (captação
realizada por terceira pessoa sem o conhecimento daqueles contra os quais
estão sendo coletadas as provas), de qualquer natureza, e a interceptação
de comunicações em sistema de informática ou telemática, realizada por
terceiros.
- A interceptação telefônica, como visto, é a captação feita por outrem
sem que haja o conhecimento pelas pessoas em face das quais estão sendo
colhidas as provas. O procedimento previsto nesta Lei é um importante meio de
prova em investigação criminal, contudo, a fim de impedir intromissão na
esfera privada, a sua aplicação deve ser aferida a partir da invocação
dos princípios da intimidade e da privacidade, da proporcionalidade, da
legalidade, da presunção de inocência, do princípio do nemo tenetur se
detegere - princípio da não autoincriminação, da razoável duração
do processo, da inadmissibilidade de provas ilícitas e do princípio da
instrumentalidade constitucional do processo penal.
- Exatamente porque o crime organizado tem conseguido agir com elevado
poder de detecção de brechas no sistema repressivo estatal, o Estado deve
agir com rapidez e efetividade conjugando os direitos dos investigados com
os princípios da integridade estatal (art. 1º, caput, da Constituição
Federal), da promoção do bem de todos (art. 3º, inciso IV, da Constituição
Federal) e da segurança pública (art. 6º da Constituição Federal)
e adotando ações de inteligência para frear esta modalidade criminosa.
- A Constituição Federal determina no inciso IX do artigo 93 a
fundamentação das decisões judiciais ("todos os julgamentos dos órgãos
do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões,
sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados
atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em
casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no
sigilo não prejudique o interesse público à informação"). O artigo 5º
apresenta a mesma diretriz da norma constitucional, mormente por referir-se
à medida restritiva de privacidade e diante da proteção constitucional à
intimidade do indivíduo. Não se exige que a decisão seja pormenorizada,
com motivação exaustiva e minudente, porquanto se cuida de procedimento
cautelar em que o juiz realiza juízo sumário, analisando os fatos a ele
apresentados na representação policial. A decisão deve conter elementos
suficientes a demonstrar a pertinência do pedido, as razões empregadas na
motivação judicial e o suporte legal da medida, de modo a ser possível
eventual impugnação pelas partes.
- A demonstração do "fumus boni juris" e do "periculum in mora" deve
restar evidenciada na decisão, já que "a importância da fundamentação
ultrapassa a literalidade da lei, pois reflete a liberdade, um dos bens
mais sagrados de que o homem pode usufruir, principalmente em vista dos
princípios constitucionais da ampla defesa, do contraditório, do devido
processo legal, da presunção de inocência e da dignidade da pessoa humana"
(STJ, HC 248.263/SP - 2012/0142646-1, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze,
5ª Turma, v.u., DJe 02.10.2012).
- A fundamentação das decisões judiciais objetiva, ademais, demonstrar a
imprescindibilidade do meio de prova pretendido pela autoridade policial. Não
se trata de uma relativização do princípio da presunção de inocência,
porquanto não está sendo realizado um juízo sobre a culpa do investigado,
mas o juiz estará na ocasião pautado no exame de indícios concretos de
que a pessoa possa estar cometendo crime punível com pena de reclusão,
diante da existência de indícios de autoria e materialidade delitivas.
- Tem sido permitido que a decisão judicial de renovação faça menção
ao pedido de decretação da interceptação telefônica realizado pela
autoridade policial ou pelo Ministério Público, o qual passa a integrar
a fundamentação da decisão (fundamentação "per relationem"), uma vez
que propicia às partes conhecer os fundamentos encampados pela decisão
judicial, sendo reconhecida como válida pelos Tribunais Superiores (TRF3,
Habeas Corpus n.º 2007.03.00.103554-3/SP, 5ª Turma, Rel. Juiz Federal
Convocado Hélio Nogueira, v.u., DJU de 29.04.2008, p. 380). Este também
tem sido o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: "é assente
nesta Corte e no Supremo Tribunal Federal o entendimento de que não há
que se cogitar em nulidade da sentença por ausência de fundamentação
ou ofensa ao artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, se o juiz, ao
fundamentar sua decisão, reporta-se à sentença anteriormente prolatada,
ou mesmo ao parecer do Ministério Público, na denominada fundamentação
'per relationem'" (AgRg no AgRg no AREsp n.º 17.227/ES, Rel. Min. Maria
Thereza De Assis Moura, Sexta Turma, v.u., DJe de 08.02.2012.). Ainda em igual
sentido, decidiu o Supremo Tribunal Federal ao ser permitida a renovação
de autorização de interceptação telefônica a despeito de não terem
sido inseridos novos motivos: "este Tribunal firmou o entendimento de que
'as decisões que autorizam a prorrogação de interceptação telefônica
sem acrescentar novos motivos evidenciam que essa prorrogação foi autorizada
com base na mesma fundamentação exposta na primeira decisão que deferiu o
monitoramento' (HC 92.020/DF, Rel. Min. Joaquim Barbosa). O Plenário desta
Corte já decidiu que 'é possível a prorrogação do prazo de autorização
para a interceptação telefônica, mesmo que sucessivas, especialmente quando
o fato é complexo, a exigir investigação diferenciada e contínua. Não
configuração de desrespeito ao art. 5º, caput, da Lei 9.296/1996"(HC
83.515/RS, Rel. Min. Nelson Jobim).
- Não obstante a decisão impetrada não citar a conduta privativa do
paciente, ela se reporta às decisões anteriores, que assim o fazem.
- As interceptações telefônicas/telemáticas, como destacado pela
autoridade impetrada não restam isoladas, estando lastreadas em denso
conjunto probatório, que confirmam, até o momento, a linha investigativa
travada na polícia (fotos, vigílias policiais, depoimentos e comprovantes
de passagens aéreas), que ensejaram o recebimento da denúncia em face do
paciente, encontrando atualmente o feito em fase de alegações finais.
- Dessa forma, verifica-se que o decisum impugnado está devidamente
fundamentado, em observância do artigo 93, inciso IX, da Constituição
Federal, estando alicerçado em elementos concretos, os quais demonstraram a
necessidade de decretação da medida excepcional de decretação de quebra de
sigilo de comunicações telefônicas e de dados telefônicos/telemáticos do
paciente, da sua esposa e da sua genitora, bem como suas prorrogações, para
se apurar da forma mais completa os fatos e, assim, propiciar a persecução
penal de forma adequada.
- ORDEM DENEGADA.
Ementa
PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. DEFERIMENTO DE INTERCEPTAÇÕES
TELEFÔNICAS/TELEMÁTICAS. DECISÕES FUNDAMENTADAS. NULIDADE E FALTA
DE FUNDAMENTAÇÃO NÃO CONFIGURADAS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO
CONFIGURADO. ORDEM DENEGADA.
- O art. 5º, inciso X, da Constituição Federal, garante o dever de sigilo ao
dispor serem "invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem
das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou
moral decorrente de sua violação." De seu turno, o inciso XII deste artigo
traz uma ressalva, quando houver uma investigação criminal ou durante a
instrução pr...
Data do Julgamento
:
22/05/2018
Data da Publicação
:
04/06/2018
Classe/Assunto
:
HC - HABEAS CORPUS - 73549
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
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