TJPI 2010.0001.007869-9
PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA DE COMPLEMENTAÇÃO DE SEGURO OBRIGATÓRIO – DPVAT. PRELIMINAR DE FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL DA PARTE AUTORA, ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM, E INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL AFASTADAS. RECONHECIMENTO DO DIREITO DA AUTORA À COMPLEMENTAÇÃO DO VALOR DO SEGURO OBRIGATÓRIO – DPVAT, DE ACORDO COM O ART. 3º, INCISO II, DA LEI 6.194/74, ALTERADO PELA LEI 11.482/2007. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. DATA DO SINISTRO. JUROS DE MORA INCIDENTES A PARTIR DA CITAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.
1. O requerimento de encaminhamento do recurso de apelação cível, formulado pelo recorrente ao juiz da causa, para que a apelação seja encaminhada à Turma Recursal, que é o órgão revisional das decisões dos juizados especiais, e não ao Tribunal de Justiça, trata-se, como se sabe, de mera irregularidade processual, que não sofre nenhuma sanção, porquanto pertencente ao grupo das irregularidades processuais sem consequência (V. CINTRA/GRINOVER/DINAMARCO, Teoria Geral do Processo, 2012, p. 377), até porque, à luz do art. 514, III, do CPC, o que deve constar na petição do recurso é o “pedido de nova decisão”, não se constituindo em seu requisito o requerimento da parte para que o recurso seja encaminhado a esse ou aquele tribunal.
2. Além disso, na dicção do art. 250, primeira parte, do CPC, “o erro de forma do processo acarreta unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados”, determinando, porém, o parágrafo único deste dispositivo, “o aproveitamento dos atos praticados, desde que não resulte prejuízo à defesa”:
Art. 250 - O erro de forma do processo acarreta unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados, devendo praticar-se os que forem necessários, a fim de se observarem, quanto possível, as prescrições legais.
Parágrafo único - Dar-se-á o aproveitamento dos atos praticados, desde que não resulte prejuízo à defesa.
3. Não há que se falar em prejuízo à parte recorrida nas situações em que, inobstante a ocorrência de irregularidade processual, o recurso esteja sendo processado e julgado pelo Tribunal competente.
4. O recebimento, pelo segurado, de parte do valor do seguro obrigatório – DPVAT, não impede a cobrança da diferença entre o valor legalmente previsto e o indenizado, posto que o recebimento do valor indenizatório, bem como a quitação passada ao beneficiário, pela seguradora, referem-se apenas ao montante já recebido.
5. A propósito, a jurisprudência, tanto do Superior Tribunal de Justiça, quanto a deste Tribunal, já pacificaram o entendimento no sentido de que o recibo vale pela quantia nele contida, sem excluir pretensão futura por eventual saldo.
6. Assim, a quitação efetuada administrativamente, nos casos de seguros DPVAT, não tem o condão de extinguir a obrigação, nas hipóteses em que a seguradora descumpriu a lei ou o contrato, razão pela qual o pagamento realizado em valor inferior ao disposto na lei, ou no contrato, na esfera administrativa, não é obstáculo ao ajuizamento da ação judicial para pleitear a complementação da diferença do valor que a parte segurada entenda devido.
7. Nesta linha, o interesse de agir surge da necessidade de se obter a proteção de um direito ameaçado, através da via judicial, quando “não possa obter o mesmo resultado por outro meio extraprocessual” (V. VICENTE GRECO FILHO, Direito Processual Civil Brasileiro, 2008, p.85).
8. Como é corrente na doutrina, o exame do interesse de agir passa pela verificação de duas circunstâncias: i) necessidade da tutela judicial, e ii) via processual adequada.
9. Além da necessidade da provocação da tutela jurisdicional, deve haver a adequação do provimento. De acordo com HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, o interesse processual: “a um só tempo, haverá de traduzir-se numa relação de necessidade e também numa relação de adequação do provimento postulado, diante do conflito de direito material trazido à solução judicial”. (V. Curso de Direito Processual Civil, 1997, p.56).
10. Na medida em que a Autora sofreu um acidente de trânsito e obteve a indenização do seguro DPVAT por invalidez permanente, em valor inferior ao determinado por lei, restando, apenas, a via judicial para pleitear a complementação, resta patente o interesse processual.
11. Outrossim, há a adequação do provimento pleiteado, vez que a Autora valeu-se do meio processual apto à defesa dos seus direitos em juízo.
12. A seguradora BCS SEGUROS S/A possui legitimidade para figurar no polo passivo da demanda, pois, por força do art. 7º, caput, da Lei nº 6.194/74, qualquer seguradora integrante do consórcio responderá pelo pagamento da indenização decorrente do seguro obrigatório DPVAT.
13. O Superior Tribunal de Justiça, em diversas oportunidades, já se pronunciou sobre a responsabilidade solidária entre as seguradoras integrantes do consórcio, decidindo que “a jurisprudência é sólida em afirmar que as seguradoras integrantes do consórcio do Seguro DPVAT são solidariamente responsáveis pelo pagamento das indenizações securitárias, podendo o beneficiário cobrar o que é devido de qualquer uma delas.” (STJ, Recurso Especial nº 1108715/PR, Quarta Turma, Rel. Min. Luís Felipe Salomão, Julgamento em 15/05/2012).
14. Os documentos essenciais à propositura da ação não se confundem com os necessários ao deslinde da causa, que dizem respeito à prova dos fatos alegados pelo autor, e não à admissibilidade da ação inicial. (Precedente do STJ)
15. Não há que se falar em inépcia da inicial, se preenchidos os requisitos contidos no art. 295, parágrafo único, do CPC.
16. Há que se reconhecer o direito da Autora, ora Apelada, ao recebimento da complementação do valor do seguro DPVAT, não havendo que se falar em ausência de comprovação da alegada invalidez permanente.
17. O reconhecimento da debilidade permanente de membro ou função da Autora, ora Apelada, já se deu quando houve o pagamento parcial do seguro pela Apelante, fato inconteste nos autos.
18. Isto porque, “o pagamento realizado na esfera administrativa, ainda que parcial, torna incontroversa a existência de invalidez permanente, não havendo se falar em ausência de prova acerca da mesma” (TJSC, Apelação Cível n. 2009.062121-0, Rel. Des. Henry Petry Junior, Julgado em 03/11/2009).
19. Ressalte-se que o sinistro ocorreu na data de 18/05/2008, sob a égide da Lei nº 6.194/74, com as alterações feitas pela Lei nº 11.482/07, que estipula que o valor da indenização, no caso de invalidez permanente, é de até R$ 13.500,00 (treze mil e quinhentos reais).
20. Quanto à pretensão da Apelante, de que seja a indenização fixada em valor proporcional ao grau de invalidez, de acordo com a tabela estabelecida na Medida Provisória nº 451, de 15/12/2008, convertida na Lei nº 11.945/09, não merece prosperar.
21. Com efeito, tendo o sinistro ocorrido antes da edição da mencionada medida provisória e sua posterior conversão em lei, não há que se falar em aplicá-la ao presente caso.
22. O dispositivo legal aplicável, qual seja, o art. 3º, II, da Lei 6.194/74, com a redação dada pela Lei 11.482/2007, prevê o pagamento de até R$ 13.500,00 em caso de invalidez permanente, não havendo diferença se a moléstia foi parcial ou total, devendo a parte Autora, ora Apelada, por isso, receber o valor máximo requerido.
23. Ademais, a jurisprudência tem decidido, de forma maciça, que a elaboração de regulamentações securitárias pelo Conselho Nacional de Seguros Privados – CNSP não têm o condão de revogar ou tornar ineficaz o disposto em lei federal.
24. Como é cediço, o referido Conselho tem competência para a regulamentação do comando legal, mas as normas expedidas no exercício desse poder regulamentar, não podem, em nenhuma hipótese, contrariar a lei, porquanto esta é hierarquicamente superior a qualquer resolução ou deliberação advinda do CNSP.
25. Portanto, no que tange à aplicação da tabela com valores proporcionais ao grau de debilidade, é certo que as Resoluções do CNSP não têm o condão de limitar a verba indenizatória a ser paga aos beneficiários do seguro DPVAT.
26. Assim sendo, uma vez comprovada a debilidade permanente do segurado, a indenização deve ser estabelecida em seu teto legal, R$ 13.500,00 (treze mil e quinhentos reais), consoante disposto no artigo 3.º da Lei n.º 6.194/74, com as alterações advindas da Lei n.º 11.482/2007, com plena incidência à época do sinistro.
27. Nas ações em que se pretende o complemento da indenização decorrente do seguro DPVAT, por se tratar se um ilícito contratual, os juros de mora devem incidir a partir da citação.
28. A correção monetária, no entanto, no caso de indenização de seguro DPVAT, deve “ser atualizada monetariamente a partir da data em que ocorrera o fato gerador do direito ao recebimento da indenização securitária advinda de acidente de trânsito, ou seja, a partir da data da ocorrência do sinistro (...), e não da data em que o apelado promovera a ação visando a complementação da indenização que lhe fora destinada ou da data do pagamento parcial. É que a obrigação se tornara exigível no momento em que se verificara seu fato gerador, devendo a partir de então ser atualizada de forma a ser preservada sua atualidade.” (TJDFT, Apelação Cível 20080111077868, 1ª Turma Cível, Rel. Des. Teófilo Caetano, Julgado em 13/06/2012).
29. Honorários Advocatícios fixados no percentual de 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, já que referido percentual se mostra razoável e adequado em relação aos parâmetros traçados pelo CPC, sopesando os elementos indicados no art. 20, §3º, do CPC.
29. Apelação Cível conhecida e improvida.
(TJPI | Apelação Cível Nº 2010.0001.007869-9 | Relator: Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 18/07/2012 )
Ementa
PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA DE COMPLEMENTAÇÃO DE SEGURO OBRIGATÓRIO – DPVAT. PRELIMINAR DE FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL DA PARTE AUTORA, ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM, E INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL AFASTADAS. RECONHECIMENTO DO DIREITO DA AUTORA À COMPLEMENTAÇÃO DO VALOR DO SEGURO OBRIGATÓRIO – DPVAT, DE ACORDO COM O ART. 3º, INCISO II, DA LEI 6.194/74, ALTERADO PELA LEI 11.482/2007. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. DATA DO SINISTRO. JUROS DE MORA INCIDENTES A PARTIR DA CITAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.
1. O requerimento de encaminhamento do recurso de apelação cí...
Data do Julgamento
:
18/07/2012
Classe/Assunto
:
Apelação Cível
Órgão Julgador
:
3ª Câmara Especializada Cível
Relator(a)
:
Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho
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