TRF3 0001549-89.2006.4.03.6119 00015498920064036119
E M E N T A
DIREITO ADMINISTRATIVO: CONTRATO DE
ARRENDAMENTO. PAR. LEGITIMIDADE. SEGURO. SINISTRO. MORTE. DOENÇA
PREEXISTENTE. EXAME PRÉVIO. COBERTURA INTEGRAL. CDC. DEVOLUÇÃO EM
DOBRO. APELAÇÕES IMPROVIDAS E RECURSO ADESIVO PARCIALMENTE PROVIDO.
1 - Com relação à preliminar, arguida pela instituição financeira, de
ilegitimidade para figurar no polo passivo da demanda, deve ser rejeitada,
em razão da controvérsia versar sobre seguro obrigatório constante do
contrato de arrendamento habitacional em que a empresa é parte como credora
e estipulante do contrato de seguro.
2 - Destaque-se que, conforme o disposto nas cláusulas do contrato, é
estabelecida a obrigatoriedade da contratação do seguro de vida para a
cobertura de riscos de morte e invalidez permanente e a prova e processamento
da ocorrência do sinistro por intermédio da credora estipulante, assim como
as obrigações desta e da seguradora no que diz respeito à importância
segurada e sua atualização.
3 - Ressalte-se que o seguro garante o bem objeto da garantia e o contrato,
ou seja, a obrigação de pagamento do saldo devedor, de modo que, no caso
de danos físicos no imóvel, morte ou invalidez permanente do mutuário,
estará caracterizada a hipótese contratual de cobertura.
4 - Atento aos fatos narrados, facilmente verifica-se que toda e qualquer
indenização devida pela seguradora será paga diretamente ao estipulante
e que este, por sua vez, deverá outorgar o instrumento de quitação do
contrato de arrendamento firmado, havendo que se reconhecer a legitimidade
da credora estipulante para figurar no polo passivo da demanda proposta,
uma vez que seu interesse restou evidenciado.
5 - No que tange à alegação de doença preexistente, de acordo com
diligência médica realizada pela própria seguradora, o arrendatário era
portador de prótese biológica em posição aórtica, colocada aos 32 anos,
devido a insuficiência aórtica, sendo que, no momento da internação,
apresentava 'disfunção da prótese e insuficiência mitral', cujo diagnostico
foi feito em 2004, vindo a falecer em decorrência de 'complicações no
pós operatório' de cirurgia cardíaca, mais precisamente, como causa morte
principal, septicemia, e causa secundária broncopneumonia, sendo que estava
assintomático nas consultas realizadas antes dessa data.
6 - Com efeito, não há prova nos autos de que o segurado tinha ciência de
doença preexistente ao momento da contratação, e que lhe causaria o óbito
apos decorrido, aproximadamente, 2 (dois) anos da assinatura do contrato,
ou prova inequívoca de má-fé do mesmo, além do fato de nem a credora
estipulante nem a seguradora o ter submetido a prévios exames médicos para
aferir se era portador de alguma enfermidade capaz de impedir a celebração
do contrato de seguro, sendo, portanto, legítima a cobertura securitária
nos moldes do que foi contratado e pleiteado.
7 - Prevalece o entendimento no STJ de que a seguradora que, para eximir-se
do pagamento da indenização securitária sob a alegação de doença
preexistente à assinatura do contrato (risco este excludente da cobertura do
seguro), deve: (i) exigir a realização de exames prévios no segurado ou o
preenchimento de formulário, informando sobre suas condições de saúde ou,
(ii) não tendo se valido da prerrogativa de avaliar previamente o risco
e recusar a contratação, comprovar a má-fé do segurado. Em assim não
fazendo, não pode a seguradora negar a cobertura prevista no contrato, uma
vez que assume o risco, quando permite tacitamente a adesão do mutuário,
e, consequentemente, sua responsabilização por eventual sinistro, não
cabendo sua pretensão em transferir tal responsabilidade ao segurado.
8 - Ainda conforme o entendimento do STJ, a alegada impossibilidade de
realização de exames prévios não pode pesar em desfavor do contratante, por
tratar-se de ônus a que se submete a seguradora, assim como é questionável
a validade de cláusula contratual que prevê a não cobertura securitária
por morte ou invalidez permanente resultante de doença preexistente à
assinatura da avença, pois se trata de um contrato de adesão, obrigatório
e acessório ao contrato principal de financiamento celebrado, sendo notório
que o arrendatário não tem, quando da sua celebração, liberdade para
negociar as cláusulas já predispostas, e de fundamental importância,
tratando-se de seguro compulsório, a 'obrigatoriedade de uma negociação
transparente, corolário', nos dizeres do Exmo. Ministro MASSAMI UYEDA, 'da
boa-fé objetiva inerente a qualquer relação contratual, em especial aquelas
que caracterizam uma relação de consumo' (REsp 1074546/RJ, Rel. Ministro
MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/09/2009, DJe 04/12/2009).
9 - Sobreleva-se que o agente financeiro e a seguradora aceitaram o
recebimento dos prêmios de seguro embutidos nas prestações durante o
período contratual, não invocando a preexistência da doença, somente
o fazendo quando do falecimento do arrendatário e respectivo pedido de
cobertura do seguro.
10 - Nesse passo, é descabido reputar válido o contrato naquilo que o agente
financeiro e a seguradora aproveitam, ou seja, o recebimento das prestações
e das parcelas destinadas ao seguro, respectivamente, e inválido naquilo que
em hipótese lhes prejudica, ou seja, o pagamento da indenização devida,
em face da ocorrência do sinistro, impondo ao arrendatário a perda do
direito de quitação da dívida.
11 - Destaque-se que não pode a seguradora, unilateralmente, após ter
aceitado o arrendatário como segurado e recebido as parcelas do seguro,
posteriormente ao seu falecimento, recusar a quitação com base na tese de
que a doença era preexistente, uma vez que cria insegurança jurídica para
o mutuário e sua família e viola o direito de defesa da parte interessada,
ao atingir o segurado quando já se encontra morto.
12 - Consoante se depreende dos autos, não houve a realização de qualquer
exame prévio que constatasse, à época da assinatura do contrato, o real
estado de saúde do segurado, e, muito embora seja indiscutível o caráter
preexistente da doença que, indiretamente, levou à morte o contratante e
segurado na avença posta em exame, e a despeito da cláusula de exclusão
de cobertura em tal situação, competia, sem dúvida alguma, à seguradora
apelante a verificação prévia quanto à possibilidade de adesão de cada
um dos segurados no contrato de seguro imobiliário estipulado pelo agente
financeiro.
13 - Ademais, a alegada impossibilidade de realização de exames prévios
não pode pesar em desfavor do contratante, sendo ônus da seguradora,
somando-se ainda o fato de não haver nos autos absolutamente nenhuma
prova de que o contratante e segurado tenha agido de má-fé, omitindo
intencionalmente a sua condição de saúde na época da contratação,
ou que tenha sido alertado sobre a excludente de cobertura ora discutida,
merecendo guarida o pedido formulado na inicial.
14 - Assim, não havendo prova inequívoca nos autos de má-fé do segurado
quando da assinatura do contrato de seguro, além do fato de nem a Caixa
Econômica Federal nem a seguradora o terem submetido a prévios exames
médicos para aferir se era portador de alguma enfermidade capaz de impedir
a celebração do contrato de seguro, tendo contribuído regularmente para o
mesmo e, uma vez ocorrido o falecimento do segurado em 2004, é, portanto,
legítima a cobertura securitária nos moldes do que foi contratado e
pleiteado.
15 - Outrossim, a seguradora assume o risco de ter que pagar, em favor do
agente financeiro, a dívida que ainda existir, na hipótese de falecimento
ou invalidez dos arrendatários. Nada obstante a obrigação do pagamento do
seguro incumbir à seguradora, a CEF está, em consequência, obrigada a dar
quitação do contrato de arrendamento relativo ao imóvel dado em garantia.
16 - Portanto, sem reparos à decisão recorrida que corretamente não excluiu
a CEF do polo passivo da lide e condenou as rés aos ônus da sucumbência.
17 - Conforme documentos anexados aos autos pelo agente credor, que trata
da documentação do sinistro, com os dados do dossiê para a seguradora,
o relatório com os dados do arrendatário é explícito com relação à
renda comprovada, ou seja, o percentual de 100% pactuado, e tratar-se de
pensionista. Já nos dados da esposa do segurado não consta valor algum de
percentual pactuado.
18 - A parte autora comprovou a vinculação do cônjuge ao contrato de
arrendamento bem como a ocorrência do sinistro após a contratação (CPC,
art. 333, I), sendo legítima a cobertura securitária, na forma pleiteada
na inicial, ou seja, a cobertura de 100% (cem por cento) do contrato firmado
junto ao PAR, ante a não comprovação de que o percentual de participação
do contratante falecido era inferior a 100% (cem por cento) na composição
da renda, ao contrário, ou de que ele nunca trabalhou.
19 - Ressalte-se que o parágrafo segundo da cláusula sétima é explícito
ao afirmar que: "em caso de sinistro, a continuidade do pagamento das taxas de
arrendamento, mensalmente, e do saldo residual, se for o caso, pela Seguradora,
de forma a permitir à família do arrendatário a permanência no imóvel
até completar o prazo contratado e pagamento de eventual valor residual."
20 - Sem contar que a cópia do contrato de seguro anexado aos autos pela
seguradora é de 26/10/2000, mais de 2 (dois) anos antes do contrato ora em
debate (28/02/2003) e sem qualquer informação sobre a que arrendatários
se refere, nem as respectivas assinaturas, mas somente as assinaturas da
SASSE e da CEF, ou seja, não há cópia do contrato de seguro firmado pelos
arrendatários que comprove a disposição da responsabilidade e respectiva
proporcionalidade indicada para cada um em declaração específica assinada
com esse fim, entregue à seguradora ou qualquer expressão no contrato
firmado de que a indenização será proporcional à participação de cada
adquirente da mesma unidade habitacional, inclusive marido e mulher, como
expresso na cópia do seguro anteriormente citado.
21 - Têm, portanto, a parte autora, direito à restituição, pelo agente
financeiro, dos valores pagos, atualizados, a partir do sinistro do qual
foi vítima seu esposo, reconhecendo, assim, seu direito à quitação do
contrato de arrendamento celebrado e a devolução, pela seguradora ao agente
financeiro do contrato, da parte que diz respeito especificamente ao seguro,
desde que tenham sido repassados tais valores de contribuição à seguradora.
22 - Muito embora o STJ venha admitindo a aplicabilidade do Código de
Defesa do Consumidor, é necessário que as irregularidades que tenham sido
praticadas estejam amparadas por provas inequívocas, sendo insuficiente a
alegação genérica.
23 - Assim, não havendo prova nos autos que a entidade financeira tenha
praticado violação contratual, resta afastada a aplicação do art. 42 do
Código de Defesa do Consumidor.
24 - Dessa forma, os valores anteriormente especificados serão restituídos
à autora não em dobro, uma vez que não restou caracterizada má-fé na
conduta das rés, não se amoldando o presente caso ao disposto no art. 42,
parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, pois os valores
discutidos somente se tornaram indevidos após o reconhecimento judicial da
ocorrência do sinistro, de modo que, até então, o pagamento, efetivamente,
competia à demandante.
25 - Cabe aos agentes financeiros a prática de todos os atos necessários
para que referida quitação do contrato de arrendamento aconteça, sendo a
forma e o prazo da cobertura do seguro objeto de execução na 1ª instância.
26 - Diante de tal quadro, não foram apresentadas quaisquer argumentações
que modifiquem o entendimento expresso na sentença recorrida, revelando-se
perfeitamente aplicável ao caso concreto o reconhecimento do direito da
parte autora à quitação do arrendamento contratado, através da cobertura
pelo seguro, bem como a respectiva restituição dos valores pagos a partir
do óbito do segurado (29/11/2004).
27 - Preliminar rejeitada. Apelações improvidas e recurso adesivo
parcialmente provido.
Ementa
E M E N T A
DIREITO ADMINISTRATIVO: CONTRATO DE
ARRENDAMENTO. PAR. LEGITIMIDADE. SEGURO. SINISTRO. MORTE. DOENÇA
PREEXISTENTE. EXAME PRÉVIO. COBERTURA INTEGRAL. CDC. DEVOLUÇÃO EM
DOBRO. APELAÇÕES IMPROVIDAS E RECURSO ADESIVO PARCIALMENTE PROVIDO.
1 - Com relação à preliminar, arguida pela instituição financeira, de
ilegitimidade para figurar no polo passivo da demanda, deve ser rejeitada,
em razão da controvérsia versar sobre seguro obrigatório constante do
contrato de arrendamento habitacional em que a empresa é parte como credora
e estipulante do contrato de seguro.
2 - Destaque-se que, con...
Data do Julgamento
:
14/03/2017
Data da Publicação
:
28/03/2017
Classe/Assunto
:
AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1621129
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADORA FEDERAL CECILIA MELLO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
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