TJPA 0065980-77.2012.8.14.0301
EMENTA: REEXAME NECESSÁRIO - ICMS - COBRANÇA EM OPERAÇÕES COMERCIAIS INTERESTADUAIS REALIZADAS DE FORMA NÃO PRESENCIAL - PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA E DE IMPOSSIBILIDADE DE IMPETRAÇÃO DO MS CONTRA LEI EM TESE. REJEITADAS - MÉRITO - NAS COMPRAS NÃO PRESENCIAIS REALIZADAS ENTRE CONSUMIDORES DE ESTADOS DIFERENTES DA FEDERAÇÃO, OU SEJA, POR MEIO DA INTERNET, TELEMARKETING E SHOWROOM, POR AFRONTA AOS DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS QUE REGEM A MATÉRIA (VIGENTES AINTES DE IMPETRADAS AS MUDANÇAS PELA EC Nº 87/2015), NÃO PODERÁ HAVER NOVA INCIDÊNCIA DO ICMS EM FAVOPR DA UNIDADE FEDERADA DESTINATÁRIA DO BEM ADQUIRIDO E REMETIDO A CONSUMIDOR-FINAL NÃO CONTRIBUINTE DO IMPOSTO. PRECEDENTE DO STF - EM REEXAME NECESSÁRIO, SENTENÇA MANTIDA EM TODOS OS SEUS FUNDAMENTOS. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de REEXAME NECESSÁRIO da sentença prolatada pelo Juízo da 6ª Vara da Fazenda Pública da Capital, nos autos do Mandado de Segurança, com pedido liminar, proposta por SERCON INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE APARELHOS MÉDICOS E HOSPITALARES LTDA em face do Diretor de Fiscalização da Secretaria de Estado do Pará, do Coordenador Executivo da Administração Tributária e do Auditor Fiscal de Receitas Estaduais, que julgou procedente o pleito contido na inicial, afastando definitivamente os atos apontados como coatores, para assegurar o direito da empresa impetrante/ora sentenciada de não submeter as operações de vendas interestaduais a consumidores finais não contribuintes localizados nesse Estado às exigências impostas pelo Protocolo ICMS nº 21/2011. A empresa impetrante narra na exordial que trabalha com a exploração da indústria e do comércio de aparelhos médicos e hospitalares e com a prestação de serviços de manutenção e assistência técnica. E que a sua atividades comerciais são realizadas pela matriz, situada no Estado de São Paulo, com o fornecimento de equipamentos para diversos médicos e clínicas hospitalares localizadas nos Estados do Norte e do Nordeste, considerados como consumidores finais, entretanto está em vias de ser compelida a recolher o adicional de ICMS, que considera inconstitucional. Explica que no exercício de suas operações de vendas interestaduais diretamente a consumidores finais não-contribuintes do ICMS localizados em outros Estados, a impetrante já tributa regularmente essas operações pelo ICMS segundo a alíquota interna do Estado de São Paulo, onde se situa a fábrica de equipamentos da Impetrante, em cumprimento a regra do art. 155, VII, alínea ¿b¿, da CF. Entretanto, em 29 de abril de 2011, o Estado do Pará editou o Decreto Estadual nº 79/2011, que instituiu adicional de ICMS devido ao Estado do Pará incidentes nas operações interestaduais praticadas com não-contribuinte do imposto em quantidade, valor ou habitualidade que caracterize ato comercial. Foi instituído, na verdade, uma arrecadação suplementar do ICMS incidente nas operações realizadas com pessoas físicas ou jurídicas que não estejam inscritas no Cadastro Geral da Fazenda do Estado. Sustenta que a referida legislação não se encontra de acordo com a previsão constitucional, vez que tem por objetivo único tributar operação na qual o Estado do Pará não faz jus a qualquer valor de ICMS, pois o valor do ICMS devido pelo remetente da mercadoria foi recolhido ao Estado de origem nos exatos termos da CF por se tratar de operação interestadual realizada com destinatário final não-contribuinte de ICMS, além do que a previsão da cobrança adicional do ICMS está sendo realizada independentemente de haver intuito comercial nas operações subsequentes realizadas. Diz que, caso não seja recolhido o imposto, está sujeita a apreensão das mercadorias até que seja pago o adicional de ICMS, visto que o recolhimento do tributo é exigido quando do ingresso da mercadoria no Estado. Aduz que a CF/88 (art. 155, VII, ¿b¿) é inequívoca ao determinar que os Estados de destino não possuem competência para arrecadar o ICMS na operação interestadual que envolve remessa de mercadoria a consumidores finais não-contribuintes, além do que é de competência exclusiva da Lei Complementar a criação de novas hipóteses de incidência tributárias. E que o Decreto acabou criando um novo fato gerador e um novo contribuinte, violando, ainda, o princípio da não-cumulatividade. Em seguida, sustenta a invasão da competência tributária outorgada pela CF e violação ao pacto federativo, pois obriga contribuinte que está em outro Estado a pagar-lhe o ICMS em relação a operações que não ensejam o recolhimento do imposto ao erário paraense. Assevera, ainda, que as barreiras fiscais estabelecidas na fronteira do Estado do Pará acabam se revelando como um meio de coerção do contribuinte para o pagamento de seus tributos. Arrola precedentes jurisprudenciais que entende aplicáveis ao caso concreto. No pedido, requereu a concessão da liminar, e, no mérito, a concessão da segurança para garantir o direito de a impetrante não submeter as operações de vendas interestaduais a consumidores finais não contribuintes às exigências impostas pelo Decreto nº 79/2011, especialmente no que se refere à operação concreta em exame descrita nos documentos juntados. Juntou documentos às fls. 23/53. Às fls. 63/64, o juízo de 1º grau concedeu a liminar pleiteada, determinando que as autoridades coatoras se abstenham de exigir da impetrante recolhimento de ICMS em razão do Protocolo nº 21/2011 e do Decreto Estadual nº 79/2011, bem como se abstenha da prática de qualquer ato tendente a obstar a livre circulação das mercadorias vendidas em operações interestaduais a consumidores finais não contribuintes localizados no Estado do Pará, em especial do equipamento descrito na Nota Fiscal nº 0019312, vendida por meio do pregão eletrônico para a SESPA. O Diretor de Fiscalização da Secretaria de Estado da Fazenda prestou informações às fls. 74/106, alegando, preliminarmente, a impossibilidade de admissão e continuação do mandado de segurança com nítida indicação de diversas pessoas apontadas como autoridade coatora, pelo que o mandamus deveria ser extinto sem julgamento do mérito, por demonstrar que a impetrante não sabe contra quem quer impetrar o writ; o não cabimento de mandado de segurança contra lei em tese - Súmula 266 do STF. No mérito sustenta que o pedido da impetrante impede o exercício de competências constitucionais atribuídas ao Estado do Pará, ofendendo ao princípio federativo e ao princípio da territorialidade. Pontua que o ICMS é um imposto sobre o consumo, possuindo papel importante na repartição da receita tributária da forma mais equânime possível com o objetivo de redução as desigualdades regionais, ressaltando que a legislação paraense não instituiu novo tributo, afastando-se eventual alegação de que o protocolo CONFAZ 21/11 (Decreto 79/11) ofenda o princípio da vedação ao tratamento tributário diferenciado em função da procedência ou destino de bens, previsto no artigo 152 da Constituição Federal. Afirma que a venda foi realizada fora do estabelecimento físico das autora, isto é, por meio da internet, assim, embora a saída do bem ainda se verifique no Estado fornecedor, a compra/aquisição do produto comercializado foi efetivada no Estado consumidor, diante disso entende inaplicável ao caso em tela o disposto no art. 155, § 2º, VII, ¿b¿, da Constituição Federal. Sustenta que não houve nenhuma inovação ou criação de novo fato gerador do ICMS ou de novo sujeito passivo, apenas regulamentou-se a tributação de operações de circulação de mercadoria através da internet, em contexto que envolve dois Estados da Federação. Ao final, requer o acolhimento das preliminares suscitadas, ou, caso assim não se entenda, que seja revogada a liminar e denegada a segurança. O Estado do Pará se habilitou nos autos, ocasião em que aderiu às informações prestadas pela autoridade coatora. O juízo ¿a quo¿, às fls. 174/175, afastou as preliminares suscitadas e, no mérito, concedeu a segurança, tornando definitiva a liminar deferida, para afastar definitivamente os atos apontados como coatores, assegurando o direito da impetrante de não se submeter às operações de vendas interestaduais a consumidores finais não contribuintes localizados neste Estado às exigências impostas pelo Protocolo ICMS nº 21/2011. Diante da inexistência de interposição de recurso voluntário por ambas as partes, os presentes autos foram encaminhados a este Egrégio Tribunal de Justiça em forma de reexame necessário. Distribuídos os autos à minha relatoria em 25/11/2014 (fl. 185). Encaminhado os autos à Procuradoria de Justiça, na qualidade de custus legis, a mesma se manifestou no sentido de manter a sentença de 1º grau, devendo ser confirmada em sede de reexame. É o relatório. DECIDO. Presentes os pressupostos de admissibilidade, CONHEÇO DO REEXAME NECESSÁRIO e passo a julgá-lo monocraticamente, de acordo com a Súmula 253 do STJ. Havendo preliminares suscitadas em sede de contestação, passo a analisá-las em sede de reexame. Preliminar de Ilegitimidade Passiva A prestar informações, a autoridade coatora Diretora de Fiscalização da Secretaria de Estado da Fazenda sustenta a ilegitimidade passiva e a necessidade de extinção do processo sem julgamento do mérito, considerando que a impetrante teria indicado diversas autoridades coatoras, por não saber quem apontar, e, na dúvida, incluiu parte da Cúpula da Secretaria de Estado de Fazenda. Entendo, entretanto, que a referida preliminar não merece prosperar, visto que, como afirma a própria autoridade coatora, todos os impetrados estão ligados à Secretaria de Estado de Fazenda e, por se tratar de atividades interligadas, acabam sendo corresponsáveis pelo ato praticado, além do que, conforme reconhecida pela própria ré, a autoridade coatora correta seria o Diretor de Fiscalização da Secretaria de Estado da Fazenda, o qual foi indicado pelo impetrante em sua inicial. Portanto, rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva. Impossibilidade de impetração de mandado de segurança contra lei em tese Referida preliminar também não merece prosperar, vez que estamos diante de um caso de ato normativo de efeito concreto, considerando que incidiu e incide na cobrança de tributo nas relações em que a compra e venda é interestadual, e a mercadoria ou bem se destina a consumidor final. Assim, considerando que a legislação contestada possui efeitos concretos incidentes sobre situações fáticas existentes, é possível o seu ataque por meio do mandado de segurança, pelo que rejeito também esta preliminar. MÉRITO Pelo que se extrai do relatório acima, o objeto central do presente reexame necessário consiste em saber se é cabível ou não a cobrança de ICMS pelo Estado do Pará nas relações de consumo realizadas em operações interestaduais, em que a mercadoria é enviada de outro Estado da Federação a consumidores finais não contribuintes localizados no Estado do Pará. Cumpre esclarecer algumas questões sobre a matéria em exame. Diante da realidade atual e com o desenvolvimento e incremento da internet e, por consequência, do comércio eletrônico, barreiras físicas foram superadas, sendo possível, hoje, acesso aos mais variados itens disponíveis no mercado, mediante a aquisição de produtos de fornecedores dos mais diversos lugares, sem qualquer limite de fronteira estadual. Neste panorama, os Estados consumidores viam, cada vez mais, seus recursos diminuindo comparativamente com os Estados fornecedores, os quais sediam a maior parte das lojas virtuais, acarretando-se, com isso, uma gravíssima queda de arrecadação do ICMS para aqueles. Desse modo, no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária-CONFAZ, aprovou-se o Protocolo nº 21, de 1º de abril de 2011. O Protocolo ICMS n° 21, de 1° de abril de 2011, do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ), buscou regular a exigência de ICMS nas operações interestaduais que destinem mercadoria ou bem ao consumidor final, cuja aquisição ocorrer de forma não presencial no estabelecimento remetente. O citado protocolo refere-se a compras feitas pela internet, telemarketing ou showroom, o qual foi assinado pelos Estados de Alagoas, Acre, Bahia, Amapá, Espírito Santo, Ceará, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Maranhão, Goiás, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Roraima, Rondônia, Rio Grande do Norte, Sergipe, Distrito Federal e, dentre eles, o Estado do Pará. Conforme o protocolo, os Estados de destino das mercadorias ou de bens passam a exigir parcela do ICMS, devida na operação interestadual em que o consumidor faz a compra de forma não presencial. In casu, portanto, a controvérsia cinge-se a analisar a legalidade na aplicação do Protocolo n.° 21/2011 pelo Estado do Pará nas operações interestaduais que destinem mercadoria ou bem ao consumidor final, cuja aquisição ocorrer de forma não presencial no estabelecimento remetente. A matéria já foi exaustivamente discutida e, em que pese os esforços envidados pelos Estados para a assinatura do referido Protocolo, o mesmo foi considerado inconstitucional pelo STF na ADI 4628. Vejamos a ementa: Ementa: ¿CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO E DE TRANSPORTE INTERESTADUAL E INTERMUNICIPAL (ICMS). PRELIMINAR. PERTINÊNCIA TEMÁTICA. PRESENÇA DE RELAÇÃO LÓGICA ENTRE OS FINS INSTITUCIONAIS DAS REQUERENTES E A QUESTÃO DE FUNDO VERSADA NOS AUTOS. PROTOCOLO ICMS Nº 21/2011. ATO NORMATIVO DOTADO DE GENERALIDADE, ABSTRAÇÃO E AUTONOMIA. MÉRITO. COBRANÇA NAS OPERAÇÕES INTERESTADUAIS PELO ESTADO DE DESTINO NAS HIPÓTESES EM QUE OS CONSUMIDORES FINAIS NÃO SE AFIGUREM COMO CONTRIBUINTES DO TRIBUTO. INCONSTITUCIONALIDADE. HIPÓTESE DE BITRIBUTAÇÃO (CRFB/88, ART. 155, § 2º, VII, B). OFENSA AO PRINCÍPIO DO NÃO CONFISCO (CRFB/88, ART. 150, IV). ULTRAJE À LIBERDADE DE TRÁFEGO DE BENS E PESSOAS (CRFB/88, ART. 150, V). VEDAÇÃO À COGNOMINADA GUERRA FISCAL (CRFB/88, ART. 155, § 2º, VI). AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA PROCEDENTE. MODULAÇÃO DOS EFEITOS A PARTIR DO DEFERIMENTO DA CONCESSÃO DA MEDIDA LIMINAR, RESSALVADAS AS AÇÕES JÁ AJUIZADAS. 1. A Confederação Nacional do Comércio - CNC e a Confederação Nacional da Indústria - CNI, à luz dos seus fins institucionais, são partes legítimas para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade que impugna o Protocolo ICMS nº 21, ex vi do art. 103, IX, da Lei Fundamental de 1988, posto representarem, em âmbito nacional, os direitos e interesses de seus associados. 2. A modificação da sistemática jurídico-constitucional relativa ao ICMS, inaugurando novo regime incidente sobre a esfera jurídica dos integrantes das classes representadas nacionalmente pelas entidades arguentes, faz exsurgir a relação lógica entre os fins institucionais a que se destinam a CNC/CNI e a questão de fundo versada no Protocolo adversado e a fortiori a denominada pertinência temática (Precedentes: ADI 4.364/SC, Plenário, Rel. Min. Dias Toffoli, DJ.: 16.05.2011; ADI 4.033/DF, Plenário, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ.: 07.02.2011; ADI 1.918/ES-MC, Plenário, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ.: 19.02.1999; ADI 1.003-DF, Plenário, Rel. Min. Celso de Mello, DJ.: 10.09.1999; ADI-MC 1.332/RJ, Plenário, Rel. Min. Sydney Sanches, DJ.: 06.12.1995). 3. O Protocolo ICMS nº 21/2011 revela-se apto para figurar como objeto do controle concentrado de constitucionalidade, porquanto dotado de generalidade, abstração e autonomia (Precedentes da Corte: ADI 3.691, Plenário, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ.: 09.05.2008; ADI 2.321, Plenário, Rel. Min. Celso de Mello, DJ.: 10.06.2005; ADI 1.372, Plenário, Rel. Min. Celso de Mello, DJ.: 03.04.2009). 4. Os Protocolos são adotados para regulamentar a prestação de assistência mútua no campo da fiscalização de tributos e permuta de informações, na forma do artigo 199 do Código Tributário Nacional, e explicitado pelo artigo 38 do Regimento Interno do CONFAZ (Convênio nº 138/1997). Aos Convênios atribuiu-se competência para delimitar hipóteses de concessões de isenções, benefícios e incentivos fiscais, nos moldes do artigo 155, § 2º, XII, g, da CRFB/1988 e da Lei Complementar nº 21/1975, hipóteses inaplicáveis in casu. 5. O ICMS incidente na aquisição decorrente de operação interestadual e por meio não presencial (internet, telemarketing, showroom) por consumidor final não contribuinte do tributo não pode ter regime jurídico fixado por Estados-membros não favorecidos, sob pena de contrariar o arquétipo constitucional delineado pelos arts. 155, § 2º, inciso VII, b, e 150, IV e V, da CRFB/88. 6. A alíquota interna, quando o destinatário não for contribuinte do ICMS, é devida à unidade federada de origem, e não à destinatária, máxime porque regime tributário diverso enseja odiosa hipótese de bitributação, em que os signatários do protocolo invadem competência própria daquelas unidades federadas (de origem da mercadoria ou bem) que constitucionalmente têm o direito de constar como sujeitos ativos da relação tributária quando da venda de bens ou serviços a consumidor final não contribuinte localizado em outra unidade da Federação. 7. O princípio do não confisco, que encerra direito fundamental do contribuinte, resta violado em seu núcleo essencial em face da sistemática adotada no cognominado Protocolo ICMS nº 21/2011, que legitima a aplicação da alíquota interna do ICMS na unidade federada de origem da mercadoria ou bem, procedimento correto e apropriado, bem como a exigência de novo percentual, a diferença entre a alíquota interestadual e a alíquota interna, a título também de ICMS, na unidade destinatária, quando o destinatário final não for contribuinte do respectivo tributo. 8. O tráfego de pessoas e bens, consagrado como princípio constitucional tributário (CRFB/88, art. 150, V), subjaz infringido pelo ônus tributário inaugurado pelo Protocolo ICMS nº 21/2011 nas denominadas operações não presenciais e interestaduais. 9. A substituição tributária, em geral, e, especificamente para frente, somente pode ser veiculada por meio de Lei Complementar, a teor do art. 155, § 2º, XII, alínea b, da CRFB/88. In casu, o protocolo hostilizado, ao determinar que o estabelecimento remetente é o responsável pela retenção e recolhimento do ICMS em favor da unidade federada destinatária vulnera a exigência de lei em sentido formal (CRFB/88, art. 150, § 7º) para instituir uma nova modalidade de substituição. 10. Os Estados membros, diante de um cenário que lhes seja desfavorável, não detém competência constitucional para instituir novas regras de cobrança de ICMS, em confronto com a repartição constitucional estabelecida. 11. A engenharia tributária do ICMS foi chancelada por esta Suprema Corte na ADI 4565/PI-MC, da qual foi relator o Ministro Joaquim Barbosa, assim sintetizada: a) Operações interestaduais cuja mercadoria é destinada a consumidor final contribuinte do imposto: o estado de origem aplica a alíquota interestadual, e o estado de destino aplica a diferença entre a alíquota interna e a alíquota interestadual, propiciando, portanto, tributação concomitante, ou partilha simultânea do tributo; Vale dizer: ambos os Estados cobram o tributo, nas proporções já indicadas; b) Operações interestaduais cuja mercadoria é destinada a consumidor final não-contribuinte: apenas o estado de origem cobra o tributo, com a aplicação da alíquota interna; c) Operações interestaduais cuja mercadoria é destinada a quem não é consumidor final: apenas o estado de origem cobra o tributo, com a aplicação da alíquota interestadual; d) Operação envolvendo combustíveis e lubrificantes, há inversão: a competência para cobrança é do estado de destino da mercadoria, e não do estado de origem. 12. A Constituição, diversamente do que fora estabelecido no Protocolo ICMS nº 21/2011, dispõe categoricamente que a aplicação da alíquota interestadual só tem lugar quando o consumidor final localizado em outro Estado for contribuinte do imposto, a teor do art. 155, § 2º, inciso VII, alínea g, da CRFB/88. É dizer: outorga-se ao Estado de origem, via de regra, a cobrança da exação nas operações interestaduais, excetuando os casos em que as operações envolverem combustíveis e lubrificantes que ficarão a cargo do Estado de destino. 13. Os imperativos constitucionais relativos ao ICMS se impõem como instrumentos de preservação da higidez do pacto federativo, et pour cause, o fato de tratar-se de imposto estadual não confere aos Estados membros a prerrogativa de instituir, sponte sua, novas regras para a cobrança do imposto, desconsiderando o altiplano constitucional. 14. O Pacto Federativo e a Separação de Poderes, erigidos como limites materiais pelo constituinte originário, restam ultrajados pelo Protocolo nº 21/2011, tanto sob o ângulo formal quanto material, ao criar um cenário de guerra fiscal difícil de ser equacionado, impondo ao Plenário desta Suprema Corte o dever de expungi-lo do ordenamento jurídico pátrio. 15. Ação direta de inconstitucionalidade julgada PROCEDENTE. Modulação dos efeitos a partir do deferimento da concessão da medida liminar, ressalvadas as ações já ajuizadas.¿ (ADI 4628, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 17/09/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-230 DIVULG 21-11-2014 PUBLIC 24-11-2014) (grifo nosso). Percebe-se, então, que, na concepção do STF, a aplicação do Protocolo n.° 21/2011 viola não só o pacto federativo, mas também a reserva de resolução do Senado Federal para a fixação das alíquotas interestaduais de ICMS e a proibição do tratamento discriminatório entre entes federados, entendendo o STF que, aplicando-se o referido protocolo, estar-se-ia praticando a bitributação, ofendendo o princípio do não-confisco, e a liberdade de tráfego de bens e pessoas. Em outros termos, o Protocolo do CONFAZ não seria o meio adequado para imprimir as alterações almejadas, ficando bastante claro qual deveria ser a norma capaz de alterar a sistemática então vigente: uma Emenda Constitucional. Nesse sentido, foi publicada no 2dia 17/04/2015 a Emenda Constitucional nº 87, alterando o inciso VII, do §2º, do art. 155 da norma constitucional que previa: Art. 155, §2º (...) VII - em relação às operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final localizado em outro Estado, adotar-se-á: a) a alíquota interestadual, quando o destinatário for contribuinte do imposto; b) a alíquota interna, quando o destinatário não for contribuinte dele; VIII - na hipótese da alínea "a" do inciso anterior, caberá ao Estado da localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual; Da leitura do referido artigo extrai-se a conclusão exatamente de acordo com o explicitado no item 11 do acórdão acima, de que nas operações interestaduais cuja mercadoria é destinada a consumidor final não-contribuinte apenas o estado de origem cobra o tributo, com a aplicação da alíquota interna. A EC 87/2015 veio modificar o fato de que, em relação ao consumidor final, quando o mesmo não for contribuinte do imposto, o ICMS será dividido entre o Estado de origem e o Estado de destino. Ou seja, o Estado produtor deixará de receber a alíquota completa, dividindo-a com o Estado consumidor. Assim, ao Estado de origem será devida a alíquota interestadual e ao Estado de destino será devida a diferença entre a alíquota interestadual e a alíquota interna. Passando o texto constitucional a vigorar o seguinte sentido: Art. 155, §2º (...) VII - nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, adotar-se-á a alíquota interestadual e caberá ao Estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual; a) (revogada); b) (revogada); VIII - a responsabilidade pelo recolhimento do imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual de que trata o inciso VII será atribuída: a) ao destinatário, quando este for contribuinte do imposto; b) ao remetente, quando o destinatário não for contribuinte do imposto; Pela nova regra constitucional, igualou-se a situação do consumidor final, seja contribuinte ou não. Em ambos os casos, aplicar-se-á a alíquota interestadual para o Estado de origem e a diferença da mesma com a alíquota interna para o Estado de destino. Trata-se de norma que vem adequar o texto constitucional e o pacto federativo com a nova realidade da nossa sociedade. Importante destacar que a EC 87/2015 criou uma regra de transição entre o antigo regime e o novo, inserindo o art. 99 no ADCT: Art. 99. Para efeito do disposto no inciso VII do § 2º do art. 155, no caso de operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte localizado em outro Estado, o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual será partilhado entre os Estados de origem e de destino, na seguinte proporção: I - para o ano de 2015: 20% (vinte por cento) para o Estado de destino e 80% (oitenta por cento) para o Estado de origem; II - para o ano de 2016: 40% (quarenta por cento) para o Estado de destino e 60% (sessenta por cento) para o Estado de origem; III - para o ano de 2017: 60% (sessenta por cento) para o Estado de destino e 40% (quarenta por cento) para o Estado de origem; IV - para o ano de 2018: 80% (oitenta por cento) para o Estado de destino e 20% (vinte por cento) para o Estado de origem; V - a partir do ano de 2019: 100% (cem por cento) para o Estado de destino. Finalmente, o art. 3º da referida emenda prevê que a mesma ¿entra em vigor na data da sua publicação, produzindo efeitos no ano subsequente e após 90 dias, ou seja, as modificações trazidas pela emenda constitucional nº 87/2015 somente surtirão efeitos a partir do ano de 2016. Portanto, com base no art. 144 do CTN, considerando que o presente mandamus foi impetrado no ano de 2012, aplica-se, ao caso, nas relações comerciais já realizadas, a regra antiga prevista no art. 155, §2º, inciso VII, da Constituição Federal, de que o ICMS é devido ao Estado em que se localiza o fornecedor do produto. Em relação aos casos futuros, aplicar-se-á as regras trazidas pela Emenda Constitucional nº 87/2015, devendo ser observada as normas de transição prevista no art. 99 do ADCT. Posto isto, em sede de reexame necessário, mantenho a sentença em todos os seus fundamentos. À Secretaria para providências. Belém, 18 de agosto de 2015. Desembargador ROBERTO GONÇALVES DE MOURA, Relator
(2015.03083937-61, Não Informado, Rel. ROBERTO GONCALVES DE MOURA, Órgão Julgador 2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2015-08-24, Publicado em 2015-08-24)
Ementa
REEXAME NECESSÁRIO - ICMS - COBRANÇA EM OPERAÇÕES COMERCIAIS INTERESTADUAIS REALIZADAS DE FORMA NÃO PRESENCIAL - PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA E DE IMPOSSIBILIDADE DE IMPETRAÇÃO DO MS CONTRA LEI EM TESE. REJEITADAS - MÉRITO - NAS COMPRAS NÃO PRESENCIAIS REALIZADAS ENTRE CONSUMIDORES DE ESTADOS DIFERENTES DA FEDERAÇÃO, OU SEJA, POR MEIO DA INTERNET, TELEMARKETING E SHOWROOM, POR AFRONTA AOS DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS QUE REGEM A MATÉRIA (VIGENTES AINTES DE IMPETRADAS AS MUDANÇAS PELA EC Nº 87/2015), NÃO PODERÁ HAVER NOVA INCIDÊNCIA DO ICMS EM FAVOPR DA UNIDADE FEDERADA DESTINATÁRIA D...
Data do Julgamento
:
24/08/2015
Data da Publicação
:
24/08/2015
Órgão Julgador
:
2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
Relator(a)
:
ROBERTO GONCALVES DE MOURA
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