TRF3 0000459-48.2007.4.03.6107 00004594820074036107
PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIARIA. ARTIGO
168-A, §1º, INCISO I, C/C O ARTIGO 71, AMBOS DO CÓDIGO PENAL. REVOGAÇÃO
DA SUSPENSÃO DO CURSO DA PRESCRIÇÃO E DO PROCESSO. NULIDADE DA SENTENÇA
NÃO VERIFICA. DECLARADA EM PARTE A PRESCRIÇÃO PARCIAL DA PRETENSÃO PUNITIVA
ESTATAL. RECONHECIMENTO DE OFÍCIO. DOLO GENÉRICO COMPROVADO. INEXIGIBILIDADE
DE CONDUTA DIVERSA. DIFICULDADES FINANCEIRAS NÃO COMPROVADAS. DOSIMETRIA
DA PENA. MANTIDA. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
- Ante a rescisão do parcelamento noticiado nos autos, revoga-se a suspensão
do curso do processo, bem como do decurso do lapso prescricional.
- Não há que se falar em nulidade da sentença considerando que ela foi
proferida e publicada em momento anterior à consolidação da dívida,
no qual ainda não haviam sido preenchidos os requisitos necessários à
suspensão do processo ou do curso prescricional.
- Importante ressaltar que o Código de Processo Penal, em seu art. 563, aduz
que nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo
para a acusação ou para a defesa, razão pela qual qualquer decretação
de nulidade passa pela perquirição da sobrevinda de prejuízo àquele que
foi prejudicado pelo ato impugnado sob o pálio do princípio pas de nullité
sans grief.
- O inciso I do § 1º do artigo 168-A do Código Penal trata-se de figura
assemelhada à disposta no caput, sendo certo que nas mesmas penas incorre
aquele que "deixar de recolher, no prazo legal, contribuição ou outra
importância destinada à Previdência Social que tenha sido descontada de
pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada do público".
- Caracteriza-se o crime com o não recolhimento aos cofres públicos
das contribuições previdenciárias, no prazo e forma legais, após a
retenção do desconto dos funcionários. É, pois, norma penal em branco,
a ser integrada pela legislação previdenciária.
-Trata-se de crime omissivo próprio, não se admitindo a tentativa.
- O objeto material é o valor recolhido e não repassado aos cofres públicos,
excluídos os juros de mora e a multa. Precedente do STJ.
- O crime é formal, não havendo a necessidade da constituição definitiva
do crédito tributário para que se possa dar início à persecução penal,
não sendo o caso de aplicação da Súmula Vinculante n.º 24 do STF, de modo
que o delito perfectibiliza-se com o vencimento do prazo para o recolhimento
(omissão do repasse).
- Ocorrência em parte da prescrição da pretensão punitiva estatal, com a
extinção da punibilidade do réu no que tange a determinadas competências,
nos termos dos artigos 107, inciso IV, 1ª parte, 109, inciso 109, inciso
V, artigo 110, §§ 1º e 2º, todos do Código Penal, c.c o artigo 61 do
Código de Processo Penal. Reconhecimento de ofício.
- Em que pese não tenha havido insurgência no que concerne à materialidade
delitiva, impende registrar que ela veio robustamente demonstrada pelas
Peças Informativas, e os documentos que a integram, cumprindo destacar
a Representação Fiscal, o Termo de Encerramento da Auditoria Fiscal, a
Notificação Fiscal de Lançamento de Débito, os Discriminativos Analíticos
do Débito, os Discriminativos Sintéticos de Débito, o Relatório de
Lançamentos, bem como as cópias das Folhas de Pagamentos efetuados pela
empresa autuada, Rescisões Trabalhistas e cópias do Livro Diário Geral,
referentes ao período descrito na denúncia.
- Tais elementos probatórios revelam eficazmente que as contribuições
sociais destinadas à Previdência Social foram descontadas dos salários dos
segurados empregados da empresa, todavia, não foram objeto de recolhimento,
no prazo legal, aos cofres públicos.
- A autoria delitiva, ao que se depreende do conjunto probatório, igualmente
restou comprovada, tendo sido demonstrado, por meio do Contrato Social,
do interrogatório do réu e pela prova testemunhal, que à época da
ocorrência dos fatos o increpado exercia a administração da empresa e,
portanto, detinha a responsabilidade pelo recolhimento das contribuições.
- O elemento subjetivo do tipo consubstanciado no dolo igualmente restou
evidenciado.
- Para o delito estampado no artigo 168-A do Código Penal não se exige
o dolo específico, sendo suficiente o dolo genérico, ou seja, a vontade
livre e consciente de deixar de recolher aos cofres públicos, no prazo
legal, contribuição descontada dos salários dos trabalhadores segurados,
dispensando-se a intenção de apropriar-se das importâncias descontadas. Não
há a exigência de que se comprove especial fim de agir - animus rem sibi
habendi. Basta o dolo genérico.
- Dolo suficientemente demonstrado, porquanto o réu como responsável
pela administração da empresa deixou de recolher as contribuições
previdenciárias descontadas dos empregados, aos cofres públicos, no prazo
devido.
- A exclusão da culpabilidade pelo reconhecimento de inexigibilidade de
conduta diversa exige prova robusta, mediante a apresentação de documentos
contundentes acerca das dificuldades financeiras, bem como a demonstração de
que se tratava de situação pontual (esporádica) e excepcionalmente grave,
o que não ocorreu nos autos.
- In casu, verifica-se a fragilidade da prova oral bem como da prova
documental, as quais revelam a existência de dificuldades enfrentadas pela
empresa, inerentes à atividade empresarial, mas não são capazes de infirmar
a absoluta impossibilidade de recolher as contribuições previdenciárias ao
INSS, seja no período abrangido pela denúncia, seja em período subsequente.
- Registre-se que o concurso de crimes não integra o sistema trifásico
da pena, devendo a eventual majoração pela sua ocorrência dar-se após o
encerramento da última fase da dosimetria, notadamente porque só há que
se falar em sua aplicação após conhecidos todos os delitos sancionados
pelo julgador. À míngua de causas de aumento ou diminuição, a reprimenda
permaneceu fixada até a terceira fase em 02 (dois) anos de reclusão.
- Considerando que a conduta delitiva foi perpetrada de forma reiterada e
tendo em vista a ocorrência de crimes de mesma espécie, além da semelhança
das condições de tempo, lugar e maneira de execução, revela-se imperioso
o reconhecimento do crime continuado (artigo 71 do Código Penal).
- Em acórdão relatado pelo Des. Fed. Nelton dos Santos, a Segunda Turma
deste E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região adotou o critério de
aumento decorrente da continuidade delitiva segundo o número de parcelas
não recolhidas, nos seguintes termos: de dois meses a um ano de omissão
no recolhimento das contribuições previdenciárias, o acréscimo é de
1/6 (um sexto); de um a dois anos de omissão, aumenta-se 1/5 (um quinto);
de dois a três anos de omissão, ¼ (um quarto); de três a quatro anos de
omissão, 1/3 (um terço); de quatro a cinco anos de omissão, ½ (um meio);
e acima de cinco anos de omissão, 2/3 (dois terços) de aumento. (TRF 3ª
Região, Segunda Turma, ACR n.º 11780, Rel. Des. Fed. Nelton dos Santos).
- Excluídas as competências reconhecidamente prescritas (abril de 2003
a janeiro de 2004), remanesceram as competências de fevereiro de 2004 a
abril de 2004, novembro de 2004 a junho de 2005 e outubro de 2005 ao décimo
terceiro salário de 2005, de modo que a prática ilícita reiterada perdurou
por mais de um ano, o que ensejaria o aumento em 1/5 (um quinto), segundo o
entendimento acima. Não obstante, à míngua de recurso da acusação e sob
pena de reformatio in pejus, deve ser mantida a majoração da pena em 1/6
(um sexto), perfazendo 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão.
- A fixação da pena de multa deve levar em consideração seus limites
mínimo e máximo com adoção de proporcionalidade em face da pena privativa
de liberdade, atendendo, pois, aos preceitos constitucionais (da legalidade,
da proporcionalidade e da individualidade) e legais (Exposição de Motivos
da Reforma da Parte Geral do Código Penal).
- No caso concreto, considerando que a pena privativa de liberdade estabelecida
foi de 02 (dois) anos de reclusão, conclui-se, que, proporcionalmente, a
pena de multa deve ser fixada em 10 (dez) dias-multa. Aplicado o aumento em
1/6 (um sexto) pela continuidade delitiva, a pena de multa resta definitiva
em 11 (doze) dias-multa, conforme corretamente fixado pelo juízo a quo. À
míngua de elementos constantes nos autos o valor do dia-multa foi corretamente
fixado em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data dos fatos.
- Mantido o regime inicial ABERTO para cumprimento de pena, em consonância
com o disposto no art. 33, § 2º, alínea "c", do Código Penal.
- Presentes os requisitos dos incisos I e II do art. 44 do Código Penal e à
míngua de recurso da defesa nesse sentido, mantém-se a substituição da
pena privativa de liberdade aplicada por duas penas restritivas de direitos
(art. 44, § 2º, do Código Penal), consistentes em prestação pecuniária
equivalente a 05 (cinco) salários mínimos a ser paga pelo réu a entidade
assistencial, e prestação de serviços à comunidade, ficando a destinação
da multa e a indicação da entidade recebedora dos serviços a critério
do Juízo da Execução Penal.
- Revogação da suspensão do prazo prescricional e do curso do processo.
- Apelação não provida.
- Reconhecimento, de ofício, da prescrição parcial da pretensão punitiva
estatal.
Ementa
PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIARIA. ARTIGO
168-A, §1º, INCISO I, C/C O ARTIGO 71, AMBOS DO CÓDIGO PENAL. REVOGAÇÃO
DA SUSPENSÃO DO CURSO DA PRESCRIÇÃO E DO PROCESSO. NULIDADE DA SENTENÇA
NÃO VERIFICA. DECLARADA EM PARTE A PRESCRIÇÃO PARCIAL DA PRETENSÃO PUNITIVA
ESTATAL. RECONHECIMENTO DE OFÍCIO. DOLO GENÉRICO COMPROVADO. INEXIGIBILIDADE
DE CONDUTA DIVERSA. DIFICULDADES FINANCEIRAS NÃO COMPROVADAS. DOSIMETRIA
DA PENA. MANTIDA. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
- Ante a rescisão do parcelamento noticiado nos autos, revoga-se a suspensão
do curso do processo, bem como do decurso d...
Data do Julgamento
:
23/10/2018
Data da Publicação
:
05/11/2018
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 48196
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
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