TJRR 10080104853
CAMARA ÚNICA – TURMA CRIMINAL
Conflito Negativo de Competência nº 010.08.010485-3/Boa Vista
Suscitante: Juízo da 4ª Vara Criminal
Suscitado: Juízo da 5ª Vara Criminal
Relator: Des. Mauro Campello
RELATÓRIO
Trata-se de conflito negativo de competência, instaurado entre os Juízos de Direito da 4.ª e da 5.ª Varas Criminais, a fim de que seja determinada por esta Corte de Justiça a competência para processar e julgar a Ação Penal n.º 010.08.190200-8.
O juízo da 4ª Vara Criminal, ora suscitante, alega ser incompetente para processar e julgar o mencionado feito, pelo fato de haver outro processo, de nº 010.08.190196-8, em trâmite na 5ª Vara Criminal, o qual apresenta um dos denunciados em comum com o primeiro, e, também, por haver indicativo de continuidade delitiva entre ambos, argumentos com os quais não concorda o suscitado.
As informações das autoridades em conflito encontram-se às fls. 200/201 e 203/204.
Parecer Ministerial às fls. 210/216 pela fixação da competência do Juízo da 4ª Vara Criminal, para processar e julgar o feito, por inexistirem a conexão e a continuidade delitiva entre os processos.
É o sucinto relatório.
Feito independente de pauta, conforme art. 185 do RITJRR.
Boa Vista, 14 de outubro de 2008.
Des. Mauro Campello
Relator
CAMARA ÚNICA – TURMA CRIMINAL
Conflito Negativo de Competência nº 010.08.010485-3/Boa Vista
Suscitante: Juízo da 4ª Vara Criminal
Suscitado: Juízo da 5ª Vara Criminal
Relator: Des. Mauro Campello
VOTO
Conforme relatado, os autos de nº 010.08.190200-8 (objeto do presente conflito) foram distribuídos inicialmente ao juízo da 4ª Vara Criminal, ora suscitante, que os remeteu à 5ª Vara Criminal, ora suscitado, por entender que este seria o competente para processar e julgar o feito, uma vez que já existia uma outra Ação Penal (de nº 010.08.190196-8) em trâmite no juízo suscitado, envolvendo denunciado em comum, e possível hipótese de continuidade delitiva.
Todavia, o suscitado devolveu os autos argumentando que o feito em controvérsia não guardava relação com o que tramitava naquela Vara Criminal, salientando que a situação exposta não configura continuidade delitiva, tampouco configurava hipótese de crimes conexos.
Com efeito, para deslinde da questão, impende-se transcrever os fatos narrados nas Denúncias referentes aos feitos de nº 010.08.190200-8 (objeto do conflito) e também a concernente ao processo de nº 010.08.190196-8, que tramita na 5ª Vara Criminal para fins de comprovar-se a existência de continuidade delitiva entre os eventos.
Transcrição do primeiro evento (feito 010.08.190200-8 – objeto do presente conflito negativo de competência- fls. 152/154):
“Denúncia em face de Henwildo da Silva Mesquita, vulgo “Totó” ou “Sanfona”; Douglas Rodrigues Padilha, vulgo “Urso Branco” e Roni Almeida Viana:
Consta dos presentes autos que, no dia 27 de fevereiro de 2008, por volta das 18:30hs, na Av. Via das Flores, em um escritório de engenharia, 735, bairro Pricumã, os denunciados, mediante grave ameaça e uso de arma de fogo, roubaram a quantia de R$16.000,00 (dezesseis mil reais).
Segundo apurado, o denunciado Douglas trabalhava no escritório de engenharia supraindicado, razão pela qual informou ao denunciado Henwildo (“Totó”) acerca da existência de dinheiro no escritório da vítima.Diante da informação, “Totó” convidou o denunciado Roni para participarem do roubo, sendo que incumbiu a este seu transporte até o local indicado. Na data dos fatos, Totó invadiu o escritório de engenharia armado com um revólver, disparou dois tiros contra a vítima Edson Carlos atingindo-a duas vezes e subtraiu a quantia em dinheiro.
Ao praticar a conduta descrita acima, o denunciado incorreu nas penas do art. 157, § 3º do Código Penal. ”
Transcrição do segundo evento (feito nº 010.08.190196-8 em trâmite na 5ª Vara Criminal- fls. 183/184):
“Denúncia em face de Henwildo da Silva Mesquita, vulgo “Totó”, ou “Sanfona” e Husvel de tal, ainda não identificado:
No dia 11 de abril de 2008, por volta das 21:00hs, na distribuidora de Gás, de propriedade do Senhor Altemar, na Rua Rocha Leal, 40, bairro São Francisco, o denunciado, mediante grave ameaça e com emprego de arma de fogo, subtraiu da Loja Disque Gás a importância de R$ 1.690,50 (hum mil, seiscentos e noventa reais e cinqüenta centavos) e mais quatro aparelhos celulares, descritas no Relatório Parcial de Investigação Policial a fl. 03.
O denunciado foi ao caixa e anunciou o assalto de posse de uma arma de fogo, revólver calibre 38, enquanto seu companheiro“Rusvel” ficou esperando em uma moto Titan, de cor preta, com a mesma ligada. Após obter êxito em sua empreitada e de posse da res furtiva, montou na garupa da motocicleta empreendendo fuga.
Ao praticar a conduta descrita acima, o denunciado incorreu nas penas do art. 155, § 2º, inciso I e II do Código Penal.”
A respeito do tema, vejamos a posição da doutrina.
O festejado Julio Fabbrini Mirabete leciona que:
“A continuidade delitiva é apurada pelas circunstâncias de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes. O limite tolerado quanto ao lapso temporal entre um e outro delito é de 30 dias, conforme jurisprudência pacífica. Quanto ao lugar, tem-se admitido a prática de crimes inclusive em municípios diversos, se limítrofes, integrados na mesma região sociogeográfica e com facilidade de acesso. Quanto à maneira de execução, refere-se a lei ao “modus operandi”, uma homogeneidade de circunstâncias objetivas nos atos materiais praticados pelo agente nos crimes a serem considerados. Não se tem reconhecido, por exemplo, a continuidade quando há diversidade de comparsas (...). ” ( In Código Penal Interpretado, 6ª ed., São Paulo, Atlas, 2008, p.600)
Sobre as circunstâncias caracterizadoras do crime continuado, o Professor Celso Delmanto traz os seguintes ensinamentos:
“ A semelhança ou conexão temporal (período de tempo entre os crimes), espacial (igualdade de lugares), modal (identidade de métodos ou participantes) e outras devem ser vistas como circunstâncias cuja presença leva a concluir pela continuidade, embora a ausência de algumas delas não exclua a existência de crime continuado. Entendemos que se deve averiguar a existência ou não da continuidade delituosa pela apreciação daquelas circunstâncias como um todo, pois formam um conjunto, e não pelo exame separado de cada uma delas, porquanto, singularmente, não possuem valor decisivo.”
(In Código Penal Comentado, 5ªed., Renovar, 2000, p. 134)
Pelos elementos colhidos dos autos, passemos a analisar cada uma das circunstâncias acima mencionadas:
Em relação à semelhança temporal, verifica-se que os fatos ocorreram em momentos distintos: o primeiro evento narrado, que é o relativo ao feito pelo qual se suscitou o presente conflito, ocorreu por volta das 18:30hs de 27 de fevereiro de 2008. Já o segundo, deu-se em torno das 21:00hs de 11 de abril do corrente ano, apresentando, portanto, um interregno de 44 (quarenta e quatro) dias entre um e outro.
Quanto à circunstância espacial, tem-se que o primeiro evento foi praticado em um escritório de engenharia, no bairro Pricumã. O segundo, ocorreu em uma distribuidora de gás, localizada no bairro São Francisco.
A terceira circunstância a ser analisada diz respeito aos métodos utilizados. Verifico a similitude no modus operandi nos dois eventos delituosos. Cumpre assinalar que, embora a denúncia do segundo evento tenha capitulado o crime como furto, verifica-se pelos descrição dos fatos, que trata-se de roubo, tal qual o primeiro evento.
No que concerne aos agentes, há identidade parcial entre os crimes. Verifico que o primeiro crime foi praticado pelos acusados conhecidos por “Totó”, “Urso Branco” e Roni. No segundo, constatou-se a participação de “Totó”, porém dessa vez com a presença de co-autor diferente dos denunciados no primeiro crime, citado apenas como “Rusvel de Tal”.
Outrossim, pela predominância de circunstâncias, não vislumbro caracterizada a continuidade delitiva, pois além da ausência de nexo temporal e espacial nos eventos mencionados, verifico que apenas um dos agentes denunciados no primeiro crime, também teve participação do segundo. Assim também, embora nossa lei penal adote a teoria objetiva pura, não vislumbro a unidade de desígnios dos agentes, até porque conforme mencionado, só há um réu em comum nos dois eventos, qual seja Henwildo Mesquita, o “Totó”.
Deste modo, depreendo que os fatos ocorreram de forma autônoma e sem guardar liame entre si. O primeiro verificou-se em um escritório de engenharia, em 27 de fevereiro deste ano, supostamente praticado por três acusados. A segunda ocorreu mais de um mês depois, em uma distribuidora de gás, sendo praticado por Henwildo, o “Totó”, e um co-autor, citado como “Rusvel de tal”.
Neste sentido, para se caracterizar a continuidade delitiva, não basta apenas que a empreitada criminosa e a seguinte tenham ocorrido em condições similares, sendo necessária verdadeira homogeneidade de circunstâncias, de modo que o crime subseqüente pudesse ser tido como desdobramento do anterior, o que, salvo melhor juízo, não se verificou na presente hipótese.
Neste mesmo sentido:
“Impossível o reconhecimento da continuidade na hipótese em que os roubos foram praticados em datas diversas, em locais e contra vítimas diferentes objetivando bens desiguais, com formas de execução variadas, ainda que com alguma similitude pela presença das mesmas qualificadoras, pois inexistem os requisitos necessários para que as situações sejam consideradas como entrelaçadas entre si – Trata-se, portanto, de mera habitualidade criminosa – Ademais, é insuficiente para a caracterização do crime continuado a simples semelhança quanto ao eventual modo de execução ou quanto ao tipo penal” (RJTACRIM 64/32).
“(...) Crime continuado – Delitos praticados em datas, e locais diversos, contra vítimas e formas de execução diferentes, visando bens desiguais – Crime continuado – Inocorrência – Se os delitos foram praticados em datas diversas, em locais e vítimas também, objetivando bens desiguais, com formas de execução variadas, inexiste continuidade delitiva, mas mera habitualidade criminosa, que impede a unificação das penas” (RJTACRIM 53/21)
ISTO POSTO, em consonância com o parecer ministerial, considerando não se tratar de hipótese de conexão ou continuidade delitiva, julgo improcedente o conflito, declarando a competência do Juízo de Direito da 4.ª Vara Criminal (suscitante), para processar e julgar o feito.
Boa Vista, 14 de outubro de 2008.
Des. Mauro Campello
Relator
CAMARA ÚNICA – TURMA CRIMINAL
Conflito Negativo de Competência nº 010.08.010485-3/Boa Vista
Suscitante: Juízo da 4ª Vara Criminal
Suscitado: Juízo da 5ª Vara Criminal
Relator: Des. Mauro Campello
EMENTA
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. ALEGAÇÃO PELO SUSCITANTE DE CONEXÃO E CONTINUIDADE DELITIVA EM RELAÇÃO A FEITO EM TRÂMITE NO JUÍZO SUSCITADO. DELITOS PRATICADOS EM DATAS, LOCAIS E VÍTIMAS DIVERSOS. AUSÊNCIA DE LIAMES OBJETIVO E SUBJETIVO. CONEXÃO E CONTINUIDADE DELITIVAS NÃO CONFIGURADAS. CONFLITO JULGADO IMPROCEDENTE. COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITANTE PARA APRECIAR E JULGAR O FEITO.
1. Impossível o reconhecimento da continuidade na hipótese em que os crimes foram praticados em datas diversas, em locais e contra vítimas diferentes, ainda que guardando similitude no “modus operandi”, pois inexistem os requisitos necessários para que as situações sejam consideradas como entrelaçadas entre si.
2. É insuficiente para a caracterização do crime continuado a simples semelhança quanto ao eventual modo de execução ou quanto ao tipo penal.
3. Conflito julgado improcedente, declarando-se a competência do Juízo da 4ª Vara Criminal (Suscitante) para processar e julgar o feito.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores da Câmara Única – Turma Criminal - por unanimidade, e em consonância com o parecer ministerial, em julgar improcedente o presente conflito negativo de competência, declarando a competência do Juízo da 4ª Vara Criminal (suscitante) para processar e julgar o feito em conflito, nos termos do voto do relator.
Boa Vista (RR), 14 de outubro de 2008.
DES. CARLOS HENRIQUES
Presidente
DES. MAURO CAMPELLO
Relator
DES. RICARDO OLIVEIRA
Julgador
PROCURADORIA DE JUSTIÇA ESTADUAL
Publicado no Diário do Poder Judiciário, ANO X - EDIÇÃO 3954, Boa Vista-RR, 24 de Outubro de 2008, p. 02.
( : 14/10/2008 ,
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Ementa
CAMARA ÚNICA – TURMA CRIMINAL
Conflito Negativo de Competência nº 010.08.010485-3/Boa Vista
Suscitante: Juízo da 4ª Vara Criminal
Suscitado: Juízo da 5ª Vara Criminal
Relator: Des. Mauro Campello
RELATÓRIO
Trata-se de conflito negativo de competência, instaurado entre os Juízos de Direito da 4.ª e da 5.ª Varas Criminais, a fim de que seja determinada por esta Corte de Justiça a competência para processar e julgar a Ação Penal n.º 010.08.190200-8.
O juízo da 4ª Vara Criminal, ora suscitante, alega ser incompetente para processar e julgar o mencionado feito, pelo fato de haver outro processo, d...
Data do Julgamento
:
14/10/2008
Data da Publicação
:
24/10/2008
Classe/Assunto
:
Conflito de Competência )
Relator(a)
:
DES. MAURO JOSE DO NASCIMENTO CAMPELO
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