TJDF APC - 1055435-20160710071496APC
CIVIL. PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA. OPERADORA DE PLANO DE SAÚDE. RESCISÃO CONTRATUAL. REQUERIMENTO DE MANUTENÇÃO DO PLANO OU MIGRAÇÃO PARA UM INDIVIDUAL. PRELIMINAR DE (I)LEGITIMIDADE ATIVA. REJEIÇÃO. EFEITOS TRANSCENDENTES DA RESCISÃO CONTRATUAL ALCANÇANDO, ALÉM DAS PARTES, OS BENEFICIÁRIOS DOS PLANOS DE SAÚDE.PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA. ACOLHIMENTO. CARÁTER INSTRUMENTAL DA PROVA OBJETIVANDO A JUSTA TUTELA JURSDICIONAL. INVIABILIDADE DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE QUANDO EXISTENTES FATOS CONTROVERSOS. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. MAIOR APROFUNDAMENTO DA MATÉRIA. ART. 370 DO CPC. CABERÁ AO JUIZ, DE OFÍCIO OU A REQUERIMENTO, DETERMINAR AS PROVAS NECESSÁRIAS AO JULGAMENTO DO MÉRITO. PLANO DE SAÚDE COLETIVO EMPRESARIAL. NEGÓCIO JURÍDICO COMPLEXO (OPERADORA DE PLANO DE SAÚDE, ADMINISTRADORA DE PLANO DE SAÚDE, PESSOA JURÍDICA INTERESSADA E BENEFICIÁRIO VINCULADO À PESSOA JURÍDICA). RESCISÃO CONTRATUAL. IMPORTÂNCIA DA MANUTENÇÃO DA ASSISTÊNCIA À SAÚDE AOS CONSUMIDORES DE PLANOS COLETIVOS. MIGRAÇÃO. OFERECIMENTO DE OUTRAS OPÇÕES DE PLANOS DE SAÚDE EQUIVALENTES OU SIMILARES. RESPONSABILIDADE DA ENTIDADE INTERMEDIADORA (ADMINISTRADORA). VEDAÇÃO DE DENUNCIAÇÃO À LIDE PELO CDC. IMPRESCINDIBILIDADE DE COMPROVAÇÃO DE FALHA NA COMUNICAÇÃO ACERCA DA POSSIBILIDADE DE MIGRAÇÃO POR PARTE DA ADMINISTRADORA. PONTO CONTROVERSO. RESOLUÇÃO NORMATIVA N. 195, N. 196 E N. 124, TODAS DA ANS. RESOLUÇÃO CONSU N. 19 DA ANS. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA CASSADA. 1 - Tratando-se de plano de saúde coletivo, verifica-se a existência de uma relação jurídica complexa, com vários contratos entre as partes, que envolve uma estipulante/administradora de planos de saúde coletivos (que atua de forma intermediária entre a operadora de planos de saúde e a pessoa jurídica interessada), a operadora de planos de saúde (que oferece os produtos e serviços de assistência médica e hospitalar, por meio de rede própria ou credenciada), a pessoa jurídica interessada (que contrata os produtos e serviços da operadora para indivíduos a ela vinculados) e os beneficiários propriamente ditos, consumidores dos referidos produtos e serviços. 1.1 - Da rescisão de eventual contrato firmado entre a operadora de planos de saúde e a administradora/estipulante ou pessoa jurídica interessada repercutirão efeitos que irão transcender às referidas partes, considerando a participação de outros envolvidos. 1.2 - (...)O beneficiário de plano de saúde, ainda que dependente em plano coletivo, é parte legítima para propor ação cuja pretensão é relacionada à manutenção ou cobrança indevida atinente ao plano de saúde, porquanto o contrato coletivo de plano de saúde gera efeitos que transcendem as partes contratantes e atingem a esfera jurídica dos beneficiários. (...) (Acórdão n.878110, 20150110277042APC, Relator: ALFEU MACHADO, 3ª Turma Cível, Data de Julgamento: 02/07/2015, Publicado no DJE: 06/07/2015. Pág.: 413) 1.4 - Ainda que o plano de saúde seja contratado por intermédio de terceiro, sendo parte da relação contratual, o segurado tem legitimidade para figurar no pólo ativo da ação que tem como causa de pedir o cancelamento irregular da relação contratual pela operadora, derivado de encerramento do plano de saúde coletivo sem que fosse disponibilizado ao consumidor plano individual. Preliminar de ilegitimidade ativa rejeitada. 2 - Ao juiz, como destinatário da prova, cabe decidir quais são os elementos suficientes para formar seu convencimento, para que possa decidir motivadamente a questão controvertida e da maneira mais célere possível e justa (artigos 4º e 139, inciso II, do CPC/15). 2.1 - Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito, sendo que de acordo com o princípio da cooperação, todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão demérito justa e efetiva (art. 3º c/c art. 6º do CPC/2015). 2.2 - De regra, cabe essencialmente ao magistrado verificar se as provas contidas nos autos são suficientes para a formação do seu convencimento, indeferindo aquelas que entenda inúteis ou protelatórias, conforme preceituam os artigos 370 e 371, ambos do Código de Processo Civil de 2015. 2.3 - In casu, o negócio jurídico apresentado é complexo, envolvendo vários contratos, contratantes e contratados. Oautor/apelado era beneficiário de plano de saúde coletivo empresarial oferecido pela operadora ré/apelante por meio de contrato celebrado entre a administradora de planos de saúde e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento - MAPA (fls. 17/18 e 20/21). 2.3.1 - A atuação da administradora do plano de saúde é estabelecida pela Resolução Normativa n. 196/2009, da ANS, e, acerca dos planos de saúde coletivos empresariais, o art. 5º da Resolução Normativa n. 195/20019, da ANS, os define como aquele que oferece cobertura da atenção prestada à população delimitada e vinculada à pessoa jurídica por relação empregatícia ou estatutária, podendo abranger, desde que previsto contratualmente, os aposentados que tenham sido vinculados anteriormente à pessoa jurídica contratante (inciso III), situação à qual se adéqua o apelado. Estabelece, também, a RN n. 195, em seu art. 17, parágrafo único, sobre as condições de rescisão do contrato ou suspensão da cobertura, dispondo que os contratos de planos privados de assistência à saúde coletivos por adesão ou empresarial somente poderão ser rescindidos imotivadamente após a vigência do período de doze meses e mediante prévia notificação da outra parte com antecedência mínima de sessenta dias. 2.3.2 - É cediço que ninguém pode permanecer eternamente vinculado a um contrato que não mais deseja, arcando com ônus e responsabilidades que podem, inclusive, causar-lhe prejuízos incomensuráveis, porém, diante dos efeitos transcendentais às partes desse tipo de negócio jurídico, o Conselho Suplementar de Saúde Suplementar da ANS levou em consideração a importância da manutenção da assistência à saúde aos consumidores de planos coletivos e editou a Resolução CONSU n. 19/1999, que dispõe sobre a absorção do universo de consumidores pelas operadoras de planos ou seguros de assistência à saúde que operam ou administram planos coletivos que vierem a ser liquidados ou encerrados. 2.3.2.1 - Estabelece o art. 1º da Resolução CONSU n. 19 que as operadoras de planos ou seguros de assistência à saúde, que administram ou operam planos coletivos empresariais ou por adesão para empresas que concedem esse benefício a seus empregados, ou ex-empregados, deverão disponibilizar plano ou seguro de assistência à saúde na modalidade individual ou familiar ao universo de beneficiários, no caso de cancelamento desse benefício, sem necessidade de cumprimento de novos prazos de carência, considerando-se na contagem de prazos de carência para essas modalidades de planos, o período de permanência do beneficiário no plano coletivo cancelado. 2.3.2.2 - Nos termos do art. 2º da Resolução CONSU 19/1999, os beneficiários dos planos coletivos cancelados deverão fazer opção pelo produto individual ou familiar da operadora no prazo máximo de trinta dias após o cancelamento, devendo o empregador informar aos empregados beneficiários sobre o cancelamento do benefício, em tempo hábil ao cumprimento do prazo de opção retrocitado. 2.3.3 - Se o plano coletivo vier a ser encerrado, desde que não seja por inadimplência ou desistência por parte do beneficiário, a este deve ser assegurada a opção pela continuidade da prestação dos serviços, em planos coletivos semelhantes ou, em sua impossibilidade, em planos individuais, devendo o empregador (ou a estipulante) informar aos seus empregados ou beneficiários acerca da possibilidade de migração para que possa exercer essa opção. 2.3.4 - Em que pese a necessidade de manutenção dos serviços de assistência à saúde por parte da operadora, conforme exposto alhures, esse tipo de negócio jurídico é complexo e, em observância aos incisos III e IV do art. 2º da RN 196/2009, tendo em vista que a administradora desenvolve as atividades de oferecimento de planos para associados ou empregados das pessoas jurídicas contratantes e de apoio técnico na discussão de aspectos operacionais, é certo que ela assume a responsabilidade pela intermediação das informações veiculadas pela operadora de forma que cheguem ao conhecimento dos beneficiários, inclusive quanto à eventual migração de planos. 2.3.5 - Na espécie, o apelado ajuizou a demanda tão somente em desfavor da operadora do plano de saúde e, considerando que ao caso em análise aplicam-se as disposições do Código de Defesa do Consumidor, que veda a denunciação à lide nos casos que envolvem direito consumerista, a composição do polo passivo pela administradora restou obstaculizada e, diante disso, significativas informações não foram apresentadas. 2.3.5.1 - Aplicando-se as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece, a regra é de que, em negócios jurídicos dessa espécie, não desejando a operadora de plano de saúde dar continuidade ao contrato entabulado, a administradora procura outras operadoras que ofereçam os mesmos serviços ou similares, com o mesmo valor ou valo aproximado, a fim de migração dos beneficiários, de forma que não fiquem prejudicados. 2.3.5.2 - Ademais, caso haja descumprimento das normas da ANS, as operadoras e administradoras de planos de saúde ficam sujeitas a penalidades, como por exemplo a prevista nos arts. 67 e 67-A da RN n. 124/2006, da ANS, que estabelecem multa de R$ 50.000,00 para a operadora ou administradora que deixar de proceder à migração ou à adaptação dos contratos à Lei nº 9.656, de 1998, quando solicitado pelo beneficiário, nas hipóteses em que esta seja obrigatória pela legislação em vigor, ou quando a operadora ou administradora impedir, dificultar ou restringir o exercício do direito à adaptação ou à migração de contrato. 2.3.5.3 - Por consectário, restou controverso o fato de a operadora ter simplesmente rescindido o contrato e sem que a administradora tenha buscado qualquer outra alternativa de plano de saúde para fins de efetivação da migração, ante sua responsabilidade para com os beneficiários do MAPA, mostrando-se insuficientes as provas acostadas aos autos para o deslinde da questão. 2.3.5.4 - Nesse descortino, nos termos do art. 370, caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito. Sob essa ótica, ainda que o direito à prova não ostente caráter absoluto, não se pode olvidar do seu caráter instrumental, cujo intuito é o alcance da tutela jurisdicional justa. 2.3.5.5 - Afigurando-se imprescindível para o escorreito deslinde da lide a dilação probatória consubstanciada na juntada de documentos em posse da administradora de plano de saúde, necessária à exata apreensão da matéria de fato apresentada nos autos, de forma a permitir seu adequado enquadramento, não se mostrou viável o julgamento antecipado do processo, à luz do que dispõe o art. 355 do CPC, porquanto para tanto, o acervo probatório dos autos deveria estar pronto. 3 - Recurso conhecido e provido para, acolhendo a preliminar de cerceamento de defesa, cassar a r. sentença impugnada e determinar o retorno dos autos à Vara de origem para a realização da devida instrução processual a fim de que sejam prestadas informações acerca de eventual comunicação por parte da administradora de plano de saúde ao apelado no tocante à possibilidade de migração de seu plano diante da rescisão contratual informada pela apelante (diretamente pelo Juízo, por meio de expedição de ofício, ou pelas partes, mediante abertura de prazo para juntada de documentos).
Ementa
CIVIL. PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA. OPERADORA DE PLANO DE SAÚDE. RESCISÃO CONTRATUAL. REQUERIMENTO DE MANUTENÇÃO DO PLANO OU MIGRAÇÃO PARA UM INDIVIDUAL. PRELIMINAR DE (I)LEGITIMIDADE ATIVA. REJEIÇÃO. EFEITOS TRANSCENDENTES DA RESCISÃO CONTRATUAL ALCANÇANDO, ALÉM DAS PARTES, OS BENEFICIÁRIOS DOS PLANOS DE SAÚDE.PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA. ACOLHIMENTO. CARÁTER INSTRUMENTAL DA PROVA OBJETIVANDO A JUSTA TUTELA JURSDICIONAL. INVIABILIDADE DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE QUANDO EXISTENTES FATOS CONTROVERSOS. NECESSIDADE DE DILAÇÃO...
Data do Julgamento
:
18/10/2017
Data da Publicação
:
24/10/2017
Órgão Julgador
:
6ª TURMA CÍVEL
Relator(a)
:
ALFEU MACHADO
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