TJSC 2010.081576-3 (Acórdão)
REINTEGRAÇÃO E MANUTENÇÃO DE POSSE RECÍPROCA E CONCOMITANTEMENTE PROPOSTAS PELO COMODANTE E COMODATÁRIO. PROCEDÊNCIA DAQUELA, IMPROCEDÊNCIA DESTA. AGRAVOS RETIDOS NÃO CONHECIDOS. Não se conhece do agravo retido se as partes não manifestarem interesse em razões ou contrarrazões de apelação - art. 523 do CPC. SENTENÇAS DISTINTAS. LIDES CONEXAS. JULGAMENTO SIMULTANEO. APELO ÚNICO. POSSIBILIDADE. "Nos casos de conexão de ações, com julgamento simultâneo, proferida sentença única, pode a parte interpor apenas um recurso abrangendo todas as ações, pois o que se ataca é a decisão que é una" (STJ. REsp nº 230732-MT, rel. Min. Castro Filho, julgado em 16.06.2005). CERCEAMENTO DE DEFESA. LIMITAÇÃO DE PROVA TESTEMUNHAL EM AUDIÊNCIA. COMODATÁRIO QUE É INTIMADO PARA EXIBIR O ROL DE TESTEMUNHAS NO PRAZO DE 30 (TRINTA) DIAS ANTES DA DATA DA REALIZAÇÃO DE TAL SOLENIDADE. INÉRCIA. PRECLUSÃO TEMPORAL - ART. 183 DO CPC. É preclusivo o prazo fixado pelo magistrado para a apresentação do rol de testemunhas - art. 407 do CPC. Se a parte é intimada para a exibição do rol de testemunhas por ocasião da decisão que designa a audiência de instrução e é negligente, ocorre a preclusão temporal (art. 183 do CPC), de modo que o julgamento, sem a confecção de prova oral por ela pretendida em grau de recurso, não causa nulidade por cerceamento de defesa. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO DO MAGISTRADO A QUO SOBRE DOCUMENTOS QUE SUPOSTAMENTE DEMONSTRARIAM QUE A PROPRIEDADE DO IMÓVEL SUB JUDICE NÃO PERTENCERIA AO COMODANTE. IRRELEVÂNCIA. JULGADO QUE DEIXA CLARO QUE A EXCEÇÃO DE DOMÍNIO NÃO PODE SER ARGUIDA. DISCUSSÃO EXCLUSIVA ACERCA DO JUS POSSESSIONIS. REJEIÇÃO QUE DEFLUI LÓGICA E IMPLICITAMENTE DA FUNDAMENTAÇÃO DO JULGADO. NULIDADE AFASTADA. Ainda que o julgador não tenha exposto na sua sentença, de modo expresso, que documentos que supostamente demonstram a propriedade seriam imprestáveis à resolução do litígio cuja apreciação lhe foi submetida, tal omissão não enseja nulidade por cerceamento de defesa se a fundamentação técnica e fática do julgado não leva a outra conclusão senão a que, em ações possessórias recíproca e concomitantemente propostas pelos litigantes, a discussão acerca da propriedade não alcança tais casos. MÉRITO. AUTOR DA REINTEGRAÇÃO DE POSSE QUE ENTREGA EM COMODATO APENAS UMA RESIDÊNCIA LOCALIZADA NA CHÁCARA CUJA POSSE JÁ MANTINHA E CUJO DOMÍNIO ADQUIRIU DO ANTERIOR POSSUIDOR USUCAPIENTE. CAUSA DE PEDIR FUNDADA NA POSSE, MERA MENÇÃO À PROPRIEDADE. COMODATÁRIO QUE INGRESSA COM MANUTENÇÃO DE POSSE À ALEGAÇÃO QUE, A DESPEITO DO AJUSTE FIRMADO COM O COMODANTE, ESTE NÃO SERIA O VERDADEIRO PROPRIETÁRIO DO BEM MAS, ANTES, UM ESTRANGEIRO RESIDENTE NA ALEMANHA QUE, INCLUSIVE, POR TELEFONE E COM A AJUDA DE INTÉRPRETE, FINDO O PRIMEIRO COMODATO PACTUADO, LHE TERIA REPASSADO A POSSE DIRETA DA TOTALIDADE DO IMÓVEL POR (NOVO) COMODATO VERBAL. JUS POSSESSIONIS PURO. IMPOSSIBILIDADE DE DISCUSSÃO ACERCA DA EXCEÇÃO DE DOMÍNIO. A exceção trazida ao ordenamento jurídico pelo enunciado da Súmula nº 487 do STF ("será deferida a posse a quem, evidentemente, tiver o domínio, se com base neste for disputada") para apaziguar a incongruência prevista no art. 505 do CC de 1916 só pode ser arguida quando a disputa possessória se fundar, única e exclusivamente, no título de domínio, e não no jus possessiones. AJUSTE DE COMODATO VERBAL SUPOSTAMENTE FIRMADO ENTRE O JÁ COMODATÁRIO, QUE PRETENDE A MANUTENÇÃO DE POSSE SOBRE A TOTALIDADE DO IMÓVEL, E O SUPOSTO PROPRIETÁRIO ESTRANGEIRO QUE, DE TODO MODO, NÃO SURTE EFEITOS, POIS O COMODANTE, AUTOR DA REINTEGRAÇÃO DE POSSE, COMPROVOU QUE DESDE SEMPRE OCUPOU O BEM CUJO DOMÍNIO, QUE TAMBÉM LHE FOI TRANSMITIDO, FOI RECONHECIDO POR USUCAPIÃO CONFERIDA AO POSSUIDOR ANTERIOR. CONTRATO DE COMODATO, DE NATUREZA REAL, QUE SÓ SE PERFAZ COM A EFETIVA TRADIÇÃO DA COISA. EXEGESE DO CONTIDO NO ART. 579 DO CC/2002 E ART. 1.248 DO CC/1916. No comodato, a posse direta só pode ser transmitida a título provisório por quem efetivamente a detenha no mundo dos fatos (art. 1.248 do CC/1916 e art. 579 do CC/2002). Não se pode falar em contrato de comodato verbal válido se o suposto proprietário do bem reside em outro país por décadas, perde o domínio em razão de usucapião e, por telefone, transfere a "posse direita" do bem que antes lhe pertencia para aquele que já a detinha em razão de comodato firmado com o efetivo possuidor da coisa, cujo domínio lhe foi reconhecido por usucapião, visto que tal espécie de contrato é real, de modo que só se perfaz com a efetiva tradição. DUPLICIDADE DE MATRÍCULAS SOBRE O BEM, EM NOME DO "PROPRIETÁRIO" ESTRANGEIRO E OUTRA DO PROPRIETÁRIO QUE EFETIVAMENTE POSSUÍA A COISA. HIPÓTESE EM QUE, ACASO SE POSSIBILITASSE A DISCUSSÃO ACERCA DA PROPRIEDADE, SERIA, DE TODO JEITO, JULGADA EM FAVOR DO COMODATÁRIO-AUTOR DA REINTEGRAÇÃO, POIS, ALÉM DE COMPROVAR O USO PLENO DA COISA E QUE PERMITIU QUE O COMODATÁRIO-AUTOR DA MANUTENÇÃO APENAS RESIDISSE EM UMA DAS CASAS DA CHÁCARA EM TROCA DA CONSERVAÇÃO DA ÁREA, TEVE O DOMÍNIO RECONHECIDO PELA USUCAPIÃO. TEOR DA MATRÍCULA NOVA QUE, EM VERDADE, DEVERIA COMPOR, EM RAZÃO DO PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DOS REGISTROS PÚBLICOS, A MATRÍCULA JÁ PREEXISTENTE EM NOME DO ANTIGO PROPRIETÁRIO ESTRANGEIRO QUE, POR SUA VEZ, NECESSITA DE AÇÃO AUTÔNOMA PARA REVERTER A PROPRIEDADE RECONHECIDA ÀQUELE. O imóvel deve possuir matrícula e registros em histórico único e ininterrupto, de forma a se garantir a transmissão da propriedade ao novo titular do domínio sem quaisquer lacunas ou incoerências, consoante apregoa o princípio da continuidade dos registros públicos. Porque a matrícula do bem deve obedecer o trato sucessivo dos seus registros e averbações em razão da segurança jurídica dela esperada, ainda que sobre determinado bem co-existam duas matrículas, de se reconhecer que, a despeito da imperiosidade de correção no cartório de registro de imóveis de tal circunstância fática, é proprietário aquele que, em razão da usucapião, obteve o reconhecimento do domínio, gravado equivocadamente em nova matrícula, e não aquele cujo nome consta na matrícula velha, cuja citação é imperiosa na usucapião e cuja ausência enseja a propositura de demanda autônoma - querela nullitatis insanabilis. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. ELEMENTOS DO ART. 927 DO CPC COMPROVADOS. MANUTENÇÃO DE POSSE. ELEMENTOS NÃO COMPROVADOS. MERO COMODATO. SENTENÇAS DE PROCEDÊNCIA DAQUELA E IMPROCEDÊNCIA DESTA MANTIDAS. Incumbe ao interessado demonstrar, para que lhe seja concedida a reintegração de posse, os elementos do art. 927 do CPC, a saber, a posse, o esbulho e a perda da posse. Comprovado o jus possessiones, a reintegração de posse prevalece sobre o jus possiendi. Ato de mera tolerância ou permissão não induz posse. COMODATO MODAL CARACTERIZADO. MERA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE LIMPEZA E CONSERVAÇÃO EM TROCA DA FRUIÇÃO DE PARTE DA COISA. LOCAÇÃO POR PRAZO DETERMINADO NÃO CONFIGURADA. PERDAS E DANOS DEVIDOS. O comodato é um empréstimo gratuito de coisa não fungível para ser utilizada, de acordo com o fim a que se destina, e depois devolvida. O comodato, portanto, é considerado um contrato gratuito, benéfico e sem interesse financeiro, pois, se houvesse retribuição, a figura seria locação. Tanto quanto o comodato é um contrato gratuito, pois o comodante entrega ao comodatário o uso da coisa sem expectativa financeira alguma, é possível que em tal espécie de contratação, de modo excepcional, se estipulem vantagens comuns ou exclusivas para o comodante, caso em que o contrato será modal. Não descaracteriza o contrato de comodato a estipulação contratual que, mediante consenso entre os envolvidos, impõe àquele que usufruirá gratuitamente parte do imóvel para residência a prestação de serviço de limpeza e conservação de todo o bem, pois tal encargo/ônus não se equipara a uma contraprestação financeira, tal qual aquela atinente a um contrato de aluguel, pois relativamente ínfimo e insuficiente, portanto, para que se pense em pura intenção de lucro por parte do proprietário. Findo o prazo alinhavado e não restituída a coisa, "o comodatário, constituído em mora, além de por ela responder, pagará, até restituí-la, o aluguel da coisa que for arbitrado pelo comodante" (art. 582, segunda parte, do CC/2002 e art. 1.252 do CC/1916). AGRAVOS RETIDOS NÃO CONHECIDOS. APELAÇÃO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. (TJSC, Apelação Cível n. 2010.081576-3, de Balneário Camboriú, rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 25-09-2014).
Ementa
REINTEGRAÇÃO E MANUTENÇÃO DE POSSE RECÍPROCA E CONCOMITANTEMENTE PROPOSTAS PELO COMODANTE E COMODATÁRIO. PROCEDÊNCIA DAQUELA, IMPROCEDÊNCIA DESTA. AGRAVOS RETIDOS NÃO CONHECIDOS. Não se conhece do agravo retido se as partes não manifestarem interesse em razões ou contrarrazões de apelação - art. 523 do CPC. SENTENÇAS DISTINTAS. LIDES CONEXAS. JULGAMENTO SIMULTANEO. APELO ÚNICO. POSSIBILIDADE. "Nos casos de conexão de ações, com julgamento simultâneo, proferida sentença única, pode a parte interpor apenas um recurso abrangendo todas as ações, pois o que se ataca é a decisão que é una"...
Data do Julgamento
:
25/09/2014
Classe/Assunto
:
Segunda Câmara de Direito Civil
Órgão Julgador
:
Segunda Câmara de Direito Civil
Relator(a)
:
Gilberto Gomes de Oliveira
Comarca
:
Balneário Camboriú
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