TRF3 0000051-33.2011.4.03.6102 00000513320114036102
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ART. 52 E SEGUINTES DA LEI Nº 8.213/91. GUARDA
MIRIM. CARÁTER SOCIOEDUCATIVO DA ATIVIDADE. NÃO RECONHECIMENTO COMO TEMPO DE
SERVIÇO. ATIVIDADE ESPECIAL. ATENDENTE DE ENFERMAGEM. EXPOSIÇÃO A AGENTE
BIOLÓGICO. RUÍDO. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. BENEFÍCIO PROPORCIONAL
CONCEDIDO. DATA DO INÍCIO. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CORREÇÃO
MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO DO INSS E
REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDAS.
1 - No tocante ao reconhecimento do trabalho exercido na qualidade de guarda
mirim, esta E. Sétima Turma tem posicionamento consolidado no sentido de que,
devido ao caráter socioeducativo da atividade, bem como da ausência dos
elementos ensejadores da relação de emprego, não há como ser considerado
como tempo de serviço, para fins de obtenção de aposentadoria.
2 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e
em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço
sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à
contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho
na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial
(STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR;
artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).
3 - Em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria
especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram
concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação
inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos
I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo
art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo
técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído
e calor.
4 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da
Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir
a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos,
químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo
suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade
do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional
considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do
tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
5 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades
especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade
profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos. Já o Decreto
nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes
físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins
de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de
acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação
das atividades segundo os grupos profissionais.
6 - Com o advento da Lei nº 6.887/1980, ficou claramente explicitado na
legislação a hipótese da conversão do tempo laborado em condições
especiais em tempo comum, de forma a harmonizar a adoção de dois sistemas
de aposentadoria díspares, um comum e outro especial, o que não significa
que a atividade especial, antes disso, deva ser desconsiderada para fins
de conversão, eis que tal circunstância decorreria da própria lógica do
sistema.
7 - Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996,
sucessivamente reeditada até a Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997,
convalidada e revogada pela Medida Provisória nº 1.596-14, de 10/11/1997,
e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997, modificou o artigo
58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras
veio com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir
de sua publicação, em 06/03/1997, que passou a exigir laudo técnico das
condições ambientais de trabalho, expedido por médico do trabalho ou
engenheiro de segurança do trabalho.
8 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade
laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a
agente nocivo, por qualquer modalidade de prova; (b) a partir de 29/04/1995,
é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação profissional,
sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c)
a partir de 10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe
a existência de laudo técnico de condições ambientais, elaborado por
profissional apto ou por perfil profissiográfico previdenciário (PPP),
preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação dos
profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração
biológica, que constitui instrumento hábil para a avaliação das condições
laborais.
9 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo
ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de
condições ambientais.
10 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB,
até 05/03/1997; acima de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003;
e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
11 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei
nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao
responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos,
o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em
condições especiais.
12 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo
ao período em que exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF
3º Região.
13 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova
da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos
e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo
diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF
excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda
que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
14 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma
extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se
supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de
redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído
acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora,
forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
15 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente
da data do exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28
da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
16 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70
do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior
Tribunal de Justiça.
17 - Quanto ao período laborado no "Hospital das Clínicas da Faculdade de
Medicina de Ribeirão Preto" entre 22/05/1978 a 01/05/1983, o formulário
de fl. 37 e o laudo pericial de fl. 38, este assinado por engenheiro de
segurança, demonstram que o requerente, no exercício do cargo de "atendente
de enfermagem", estava exposto a "agentes biológicos como vírus, bactérias,
protozoários, e fungos, causadores de doenças infecto-contagiosas", cabendo,
portanto, o enquadramento no código 1.3.2 do Anexo do Decreto 53.831/64 e
código 1.3.4 do Anexo I do Decreto 83.080/79.
18 - Por outro lado, no interregno subsequente, de 02/05/1983 a 08/09/1985,
trabalhado no mesmo hospital, no entanto, exercendo o cargo de "técnico
de documentação", não há razão justificadora para o acolhimento da
especialidade, dada a ausência da comprovação da insalubridade, o que
fica evidente pelos já citados documentos de fls. 37 e 38, e também pela
própria descrição das atribuições desempenhadas pela parte autora:
"entrevistar pacientes ou acompanhantes para a confecção de folha de
atendimento ambulatorial; confecção de prontuário médico; manipulação
arquivamento de prontuários médicos; recebimento, ordenação e arquivamento
de folhas de atendimento e resultados de exames laboratoriais; coletar dados
dos pacientes em ambulatórios e enfermarias". Assim sendo, aludido período
somente pode ser considerado como tempo comum.
19 - Durante as atividades realizadas na empresa "Refrescos Ipiranga S/A"
entre 15/09/1986 a 16/03/1989, o Perfil Profissiográfico Previdenciário
de fls. 40/41, com indicação do responsável pelos registros ambientais,
comprova que o autor estava exposto a ruído superior a 88dB.
20 - Por fim, quanto às atividades desenvolvidas na empresa "Hochtief do
Brasil SA" entre 18/05/1995 a 05/03/1997, na função de técnico de segurança
do trabalho, não há prova da especialidade do labor do requerente, eis
que, nos termos do que informa o formulário de fl. 23 e o laudo pericial
de fls. 24/25, o ruído e a poeira respirável identificados estão abaixo
do limite de tolerância legal à época da prestação dos serviços. Além
disso, a iluminação natural e a postura inadequada não foram contempladas
pela legislação como causas para o reconhecimento da atividade insalubre.
21 - Cumpre ainda reiterar que, ao contrário do decidido na r. sentença,
não é possível o enquadramento profissional a partir de 29/04/1995, o
que impede, por qualquer ângulo de análise, o reconhecimento do trabalho
especial entre 18/05/1995 a 05/03/1997.
22 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório, enquadrados como especiais
os períodos de 22/05/1978 a 01/05/1983 e 15/09/1986 a 16/03/1989.
23 - Aposentadoria proporcional por tempo de contribuição. Requisitos
etário e contributivo estabelecidos pela EC nº 20/98.
24 - A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente
prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal.
25 - Somando-se a atividade especial reconhecida nesta demanda aos períodos de
atividade comum constantes das fls. 135/138 e do CNIS, que passa a integrar
a presente decisão, verifica-se que a parte autora contava com 32 anos, 01
mês e 28 dias de tempo de serviço na data do requerimento administrativo
(19/04/2010), fazendo jus, portanto, ao benefício de aposentadoria
proporcional por tempo de contribuição, uma vez cumpridos os requisitos
referentes ao "pedágio" e idade mínima.
26 - O requisito carência restou também completado.
27 - O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento
administrativo (19/04/2010), momento em que a autarquia teve conhecimento da
pretensão resistida, oportunidade em que restou comprovada a especialidade
ora reconhecida (fls. 37/38 e 40/41).
28 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal
vigente quando da elaboração da conta, com aplicação do IPCA-E nos moldes
do julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral
(Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE) e com efeitos prospectivos.
29 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório,
fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os
Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a
jurisprudência dominante.
30 - Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações
pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade,
razão pela qual a referida verba deve, por imposição legal, ser fixada
moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do art. 20 do CPC/73,
vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente
atendido com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir
sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença,
consoante o verbete da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
31 - Apelação do INSS e remessa necessária parcialmente providas.
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ART. 52 E SEGUINTES DA LEI Nº 8.213/91. GUARDA
MIRIM. CARÁTER SOCIOEDUCATIVO DA ATIVIDADE. NÃO RECONHECIMENTO COMO TEMPO DE
SERVIÇO. ATIVIDADE ESPECIAL. ATENDENTE DE ENFERMAGEM. EXPOSIÇÃO A AGENTE
BIOLÓGICO. RUÍDO. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. BENEFÍCIO PROPORCIONAL
CONCEDIDO. DATA DO INÍCIO. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CORREÇÃO
MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO DO INSS E
REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDAS.
1 - No tocante ao reconhecimento do trabalho exercido na qualidade de guarda
m...
Data do Julgamento
:
25/02/2019
Data da Publicação
:
08/03/2019
Classe/Assunto
:
ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1847035
Órgão Julgador
:
SÉTIMA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
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