TRF3 0003342-41.2001.4.03.6183 00033424120014036183
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA
TESTEMUNHAL. RECONHECIMENTO. IDADE MÍNIMA DO RURAL. ATIVIDADE
ESPECIAL. RUÍDO. LAUDO PERICIAL. ENQUADRAMENTO. DECRETO
Nº 53.831/64. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. BENEFÍCIO
CONCEDIDO. APOSENTADORIA COM PROVENTOS INTEGRAIS. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº
20/98. OPÇÃO PELO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO. EXECUÇÃO DAS PARCELAS EM
ATRASO. VOTO VENCIDO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. APELAÇÃO DO INSS
DESPROVIDA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA.
1 - No caso, a r. sentença condenou o INSS tão somente à averbação
dos períodos de trabalho de natureza rural e especial nela reconhecidos,
tendo indeferido a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de
serviço e reconhecido a ocorrência de sucumbência recíproca. Constata-se,
portanto, que a condenação é desprovida de conteúdo econômico. Remessa
necessária não conhecida, nos termos do artigo 475, § 2º, do CPC/73.
2 - Pretende a parte autora a concessão de aposentadoria por tempo de
contribuição, mediante o reconhecimento de labor rural, no período
compreendido entre 01/01/1970 e 31/01/1975. Além disso, pretende ver
reconhecida a especialidade do trabalho desempenhado nos períodos de
23/01/1979 a 09/05/1979, 01/08/1979 a 24/01/1984, 07/03/1984 a 08/07/1984
e 09/07/1984 a 10/03/1997.
3 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação
do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de
prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Súmula
nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
4 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos
os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim,
a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com
potencial para estender a aplicabilidade daquela. Precedentes da 7ª Turma
desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais documentos devem
ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de
que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
5 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP
nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de
Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento
de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado
no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material,
desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
6 - Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de
economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91
em seu artigo 11, inciso VII.
7 - É pacífico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento
das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário,
desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei
nº 8.213/91. Precedentes jurisprudenciais.
8 - A pretensa prova material juntada aos autos, a respeito do labor no
campo do autor, é a Certidão emitida pelo Delegado da 4ª Delegacia de
Serviço Militar (Ministério do Exército) atestando que "consta na Ficha de
Alistamento Militar (FAM)" do autor a informação de exercia a profissão de
"lavrador" em 09/05/1974.
9 - A prova oral reforça o labor no campo, e amplia a eficácia probatória
dos documentos carreados aos autos, sendo possível reconhecer o trabalho
campesino desde 01/01/1970 (quando o autor possuía 13 anos de idade, conforme
requerido na exordial), até 31/01/1975, quando então passou a desempenhar
atividade urbana, conforme consta de sua CTPS acostada às fls. 259/304.
10 - A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, é histórica
a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967,
a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida
evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores,
as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
11 - Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade
incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina,
via de regra ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, se
encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67,
época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950
e 55% na década de 1960).
12 - Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e
eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável
supor pudesse o menor exercer plenamente a atividade rural, inclusive por
não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
13 - Reconhecido o labor rural no período de 01/01/1970 a 31/01/1975.
14 - Em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria
especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram
concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação
inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos
I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo
art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo
técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído
e calor.
15 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da
Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir
a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos,
químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo
suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade
do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional
considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do
tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
16 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade
laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a
agente nocivo, por qualquer modalidade de prova; (b) a partir de 29/04/1995,
é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação profissional,
sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c)
a partir de 10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe
a existência de laudo técnico de condições ambientais, elaborado por
profissional apto ou por perfil profissiográfico previdenciário (PPP),
preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação dos
profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração
biológica, que constitui instrumento hábil para a avaliação das condições
laborais.
17 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente
nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo
de condições ambientais.
18 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB,
até 05/03/1997; acima de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003;
e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
19 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei
nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao
responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos,
o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em
condições especiais.
20 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo
ao período em que exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF
3º Região.
21 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova
da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos
e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo
diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF
excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda
que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
22 - Para comprovar que o trabalho exercido na empresa "Inbrac S.A - Condutores
Elétricos", no período de 23/01/1979 a 09/05/1979, ocorreu em condições
prejudiciais à saúde e à integridade física, o autor coligiu aos autos
o formulário de fl. 144 e o Laudo Técnico Pericial de fls. 145/147, os
quais apontam a submissão a ruído de 83 dB(A), ao exercer a função de
"ajudante de extrusor".
23 - Quanto ao período de 01/08/1979 a 31/01/1983, laborado na empresa
"Pirelli Cabos S/A", o formulário de fl. 148 e o Laudo Técnico Pericial
de fls. 249/250 informam que o autor, então no exercício da função de
"montador de acessórios", esteve exposto ao agente agressivo ruído, na
intensidade de 81 dB (A), cabendo ressaltar que o laudo pericial em questão
"foi baseado no laudo pericial coletivo solicitado pela PIRELLI CABOS S.A
(...), homologado pela DSMT em 14/05/1985, conforme ofício DSMT 327/85 e
cuja cópia encontra-se na agência do INSS de Santo André" (informações
fornecidas no corpo do laudo - fls. 250), evidenciando que o ente autárquico
já tinha acesso a tal documento por ocasião do pedido administrativo do
autor.
24 - No tocante ao período de 01/02/1983 a 24/01/1984, trabalhado na
mesma empresa acima referida, o autor instruiu a presente demanda com o
formulário de fl. 149, o qual revela que, no exercício da função de
"auxiliar instalação cabos telefônicos", desempenhava suas atividades "em
locais enclausurados denominados caixas ou galerias subterrâneas", nas quais
"passam tubulações de gás (GLP), exalando em várias seções das galerias
forte odor do produto, encontram-se com frequência gases hidrocarbonetados
e forte concentração de monóxido de carbono, gerado nas vias públicas
pelo tráfego de veículos", de modo que as atividades desenvolvidas pelo
requerente, tal como descritas, são passíveis de reconhecimento do caráter
especial pelo mero enquadramento no rol constante do Decreto nº 53.831/64
(código 1.2.11 do Quadro Anexo).
25 - A respeito do período de 07/03/1984 a 08/07/1984, laborado na empresa
"Nordon Indústrias Metalúrgicas S/A", o formulário de fl. 150 e o Laudo
Técnico Pericial de fls. 151/153 demonstram que o autor desempenhou a
função de "servente", no setor de "obras de montagens", exposto ao agente
agressivo ruído, nas intensidades de 96 e 97 dB(A).
26 - Por fim, quanto ao período de 09/07/1984 a 10/03/1997, laborado
nas funções de "operador máquinas têxteis", "responsável máquina",
"controlador qualidade" e "líder controle qualidade" junto à empresa
"Fairway Fábrica de Filamentos Ltda" (sucessora da empresa Rhodia S/A Divisão
Têxtil), o formulário de fl. 154 e o Laudo Técnico Pericial de fl. 155
apontam que o autor esteve exposto a pressão sonora da ordem de 97 dB(A),
acima, portanto, do limite de tolerância vigente à época da prestação
dos serviços.
27 - Enquadrados como especiais os períodos questionados na inicial,
quais sejam: 23/01/1979 a 09/05/1979, 01/08/1979 a 24/01/1984, 07/03/1984
a 08/07/1984 e 09/07/1984 a 10/03/1997.
28 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma
extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se
supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de
redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído
acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora,
forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
29 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente
da data do exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28
da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
30 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70
do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior
Tribunal de Justiça.
31 - Somando-se o labor rural (01/01/1970 a 31/01/1975) e a atividade especial
(23/01/1979 a 09/05/1979, 01/08/1979 a 24/01/1984, 07/03/1984 a 08/07/1984
e 09/07/1984 a 10/03/1997), reconhecidos nesta demanda, aos períodos de
atividade comum constantes da CTPS de fls. 259/304 e do CNIS (no qual já se
encontra registrado o período de recolhimento como contribuinte facultativo
questionado no apelo do autor - 01/06/1997 a 31/10/1998), verifica-se que
na data do requerimento administrativo (07/12/1998) - antes, portanto, da
data de publicação da Emenda Constitucional 20/98 (16/12/1998) - o autor
contava com 35 anos, 03 meses e 20 dias de serviço, o que lhe assegura o
direito ao benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição,
com base na legislação pretérita à Emenda Constitucional nº 20/98.
32 - O termo inicial do benefício deverá ser fixado na data do requerimento
administrativo (07/12/1998).
33 - Verifica-se, pelo Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS
e pelas informações apresentadas às fls. 494/501, que a parte autora
recebe o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição. Sendo
assim, faculta-se ao demandante a opção pela percepção do benefício
que se lhe afigurar mais vantajoso, vedado o recebimento em conjunto de duas
aposentadorias, nos termos do art. 124, II, da Lei nº 8.213/91. Vencedora
a tese - não adotada por este Relator - que possibilita a execução das
parcelas em atraso, decorrentes do benefício concedido judicialmente, até o
dia anterior à implantação do benefício concedido na via administrativa,
caso este seja mais vantajoso.
34 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal
até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada,
conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão
geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do
IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
35 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório,
fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os
Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a
jurisprudência dominante.
36 - Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações
pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade,
razão pela qual a referida verba deve, por imposição legal, ser fixada
moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do art. 20 do CPC/73,
vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente
atendido com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir
sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença,
consoante o verbete da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
37 - Isenção da Autarquia Securitária do pagamento de custas processuais.
38 - Remessa necessária não conhecida. Apelação do INSS
desprovida. Apelação da parte autora parcialmente provida.
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA
TESTEMUNHAL. RECONHECIMENTO. IDADE MÍNIMA DO RURAL. ATIVIDADE
ESPECIAL. RUÍDO. LAUDO PERICIAL. ENQUADRAMENTO. DECRETO
Nº 53.831/64. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. BENEFÍCIO
CONCEDIDO. APOSENTADORIA COM PROVENTOS INTEGRAIS. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº
20/98. OPÇÃO PELO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO. EXECUÇÃO DAS PARCELAS EM
ATRASO. VOTO VENCIDO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. APELAÇÃO DO INSS
DESPROVIDA. APELAÇÃO DA P...
Data do Julgamento
:
26/03/2018
Data da Publicação
:
11/04/2018
Classe/Assunto
:
ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1319114
Órgão Julgador
:
SÉTIMA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
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