TJPA 0016449-55.2005.8.14.0301
GABINETE DA DESEMBARGADORA GLEIDE PEREIRA DE MOURA SECRETARIA DA 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA EMBARGOS DE DECLARAÇÃO AO ACÓRDÃO N° 108.754 NA APELAÇÃO Nº 2011.3.027.595-7 EMBARGANTE: ESTADO DO PARÁ EMBARGADO: PORTELA COMÉRCIO DE MODAS LTDA EMBARGADO: ACÓRDÃO N° 108.754, DE 12 DE JUNHO DE 2012 RELATORA: DESA. GLEIDE PEREIRA DE MOURA DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de AGRAVO oposto em face do acórdão n° 108.754, de 12.06.12, que negou provimento à apelação interposta pelo ESTADO DO PARÁ para manter a sentença do Juízo de Direito da 6ª Vara de Fazenda da Capital que extinguiu sem resolução de mérito, nos termos do art. 598 c/c 580 e 267, IV e VI, todos do CPC, em virtude de remissão do débito tributário, o qual recebo como EMBARGOS DE DECLARAÇÃO, em aplicação ao Princípio da Fungibilidade. No julgamento da apelação, a Turma julgadora reformou a sentença, porém declarou a prescrição do crédito tributário. Irresignado, o apelante, ora embargante, interpôs o presente recurso de embargos de declaração, alegando a existência de contradição no acórdão recorrido em virtude da sentença haver declarado a remissão do débito e o acórdão haver decretado a prescrição do crédito tributário, que não poderia ter sido declarada ante a existência de parcelamento e, portanto, da suspensão do prazo prescricional. É o relatório. Presentes todos os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço do recurso. Assiste razão ao embargante. Senão vejamos. Estabelece o art. 535 do Código de Processo Civil: Cabem embargos de declaração quando: I houver, na sentença ou no acórdão, obscuridade ou contradição; II foi omitido ponto sobre o qual devia pronunciar-se o juiz ou Tribunal. Insurgiu-se o apelante contra a retro sentença mencionada que extinguiu a execução fiscal, em virtude de remissão da dívida concedida pelo Decreto nº 1.194/08. Alega o embargante a existência de contradição no acórdão recorrido em virtude da sentença haver declarado a remissão do débito e o acórdão haver decretado a prescrição do crédito tributário, que não poderia ter sido declarada ante a existência de parcelamento e, portanto, da suspensão do prazo prescricional. Assiste razão ao embargante. Senão vejamos: Em Direito Tributário, a prescrição, que é uma das causas de extinção do crédito tributário, à luz do Art. 156, V, do CTN, é a penalidade atribuída à Fazenda Pública em virtude dela não haver proposto, em tempo hábil, a ação para cobrança de seu crédito tributário definitivamente constituído. Segundo preceitua o Art. 174 do CTN, a ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em 5 (cinco) anos, contados da data da sua constituição definitiva. Sabendo-se que a lei concede à Fazenda Pública o prazo de cinco anos para que ela proponha a execução fiscal para cobrança de seu crédito, é importante que se saiba a partir de quando começa a correr referido prazo prescricional, isto é, qual é o termo a quo do prazo, para que se saiba quando terá ele expirado. Esclarecedora é a lição da doutrina a respeito do assunto: O prazo prescricional só se inicia com a violação do direito do fisco, que marca o início da exigibilidade do crédito tributário: no primeiro dia seguinte ao vencimento do prazo dado ao sujeito passivo para adimplir o crédito tributário definitivamente constituído. Normalmente, depois de efetuado um lançamento, as leis tributárias concedem um prazo para que o notificado efetive o pagamento ou impetre impugnação. Durante esse prazo, e durante o prazo em que estiver pendente a impugnação ou qualquer causa de suspensão de exigibilidade, não corre a prescrição, pois o crédito ainda não é exigível. Cabe ressaltar, por oportuno, que embora o termo prescrição reflita um único significado - perda do direito de ação pelo decurso do tempo - as formas, prazos e condições para sua alegação configuram as várias faces de seus diversos regimes, que se caracterizam de acordo com o ramo do direito ao qual se vincula. No Direito Tributário, a prescrição tem uma faceta especial, pois diferentemente dos demais ramos, ela extingue o direito de ação e também a pretensão do autor, que se materializa no crédito tributário, conforme Art. 156, V, do CTN. Em virtude de especialidades como essa, alguns equívocos podem acontecer na disciplina da prescrição. É o que ocorre, no caso sub judici, onde ressoa inequívoca a confusão entre prescrição originária - que se inicia a partir da constituição definitiva do crédito tributário e prescrição intercorrente, cujo lapso temporal começa a correr após a decisão de arquivamento dos autos, em decorrência da não localização do devedor ou de bens penhoráveis, nos termos do Art. 40, §§ 2° e 3°, da Lei n° 6.830/80. Trata-se, portanto, do mesmo instituto sob regimes distintos. Prescrição intercorrente é aquela que ocorre no intervalo posterior a um momento interruptivo. Portanto, podemos dizer que prescrição intercorrente refere-se à prescrição interrompida que recomeçou a correr, extinguindo o direito de ação.(...) A Prescrição intercorrente começa a correr, instantaneamente, logo após o fato ou o momento em que ocorreu a causa determinante da interrupção. (...) Porém, não há que se falar em prescrição intercorrente quando não surgir a causa interruptiva da prescrição ou não se considerar válido o ato que tornou a prescrição interrompida ou quando o feito judicial permanece paralisado, por tempo igual ou superior a cinco anos, sem que o exeqüente tenha concorrido com culpa. No caso presente, o crédito foi definitivamente constituído em 31/01/02, data da lavratura da Certidão de Dívida Ativa. A partir daí começou a correr o lapso prescricional de 5 (cinco) anos, que só seria interrompido com o despacho de citação da executada, já que a ação, iniciada em 21/07/05, está regida pelo art. 174, I, do CTN, em sua nova redação, ou seja, depois da vigência da LC nº 118/2005. Sendo o despacho, portanto, o fato apto a interromper o curso do prazo prescricional e tendo ele ocorrido em 09/08/05, considera-se interrompida nesta data a prescrição, tratando-se, portanto, de hipótese de prescrição intercorrente. A oitiva da Fazenda Pública da qual se ressente a recorrente é compulsória para o regime da prescrição intercorrente, por expressa disposição legal, e facultativa para o regime comum, após a alteração introduzida no Art. 219, § 5°, do CPC pela Lei n° 11.280/06, que passou a garantir ao juiz da causa a possibilidade de conhecer de ofício da prescrição em qualquer momento e grau de jurisdição, ao revogar o Art. 194 do CCB, que preceituava: O juiz não pode suprir, de ofício, a alegação de prescrição, salvo se favorecer a absolutamente incapaz. Com relação à prescrição intercorrente, assim estabelece o art. 40 da Lei nº 6.830/80: Art. 40 - O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de prescrição. § 1º - Suspenso o curso da execução, será aberta vista dos autos ao representante judicial da Fazenda Pública. § 2º - Decorrido o prazo máximo de 1 (um) ano, sem que seja localizado o devedor ou encontrados bens penhoráveis, o Juiz ordenará o arquivamento dos autos. § 3º - Encontrados que sejam, a qualquer tempo, o devedor ou os bens, serão desarquivados os autos para prosseguimento da execução. § 4o Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato. Portanto, nas hipóteses de não localização do devedor ou de bens passíveis de penhora, que é o caso dos presentes autos, o juiz deve suspender a execução, pelo prazo máximo de 1 (um) ano, período em que não correrá o prazo de prescrição, findos os quais, permanecendo a situação no estágio em que se encontrava antes da suspensão, os autos deverão ser arquivados. Decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato. Portanto, em caso de prescrição intercorrente, é necessário o prévio arquivamento dos autos e, também, a prévia intimação da Fazenda Pública antes da decretação da prescrição, o que não ocorreu no presente caso. Tal entendimento já está consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp repetitivo nº 1.100.156-RJ, assim ementado: TRIBUTÁRIO E PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. IPTU. PRESCRIÇÃO. DECLARAÇÃO DE OFÍCIO. VIABILIDADE. 1. Em execução fiscal, a prescrição ocorrida antes da propositura da ação pode ser decretada de ofício, com base no art. 219, § 5º, do CPC (redação da Lei nº 11.051/04), independentemente da prévia ouvida da Fazenda Pública. O regime do § 4º do art. 40 da Lei 6.830/80, que exige essa providência prévia, somente se aplica às hipóteses de prescrição intercorrente nele indicadas. Precedentes de ambas as Turmas da 1ª Seção. 2. Recurso especial desprovido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/08. Resta claro, portanto, que não pode ser reconhecida a prescrição intercorrente, em virtude de não haverem sido cumpridas as formalidades previstas no art. 40 da Lei nº 6.830/80. Passo ao exame da remissão: Tendo em vista a mudança de meu entendimento anterior acerca da matéria, passo a registrá-lo: Estabelece a Constituição Federal de 1988, em seu art. 150, § 6º: Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2º, XII, g. Vige em matéria tributária, e mais especificamente em matéria de benefício tributário, no qual se inclui a remissão tributária, o princípio da estrita legalidade, segundo o qual o benefício só pode ser concedido mediante lei específica, ou seja, lei que trate especificamente daquele benefício. A remissão sobre a qual ora se discute, autorizada pelos Convênios ICMS nº 30/2008 e nº 67/2008, celebrados pelo Conselho Nacional de Política Fazendária CONFAZ, foi, equivocadamente, concedida pelo Decreto Governamental nº 1.194/2008, em violação ao que determina a Constituição Federal, que impõe que a remissão será concedida por lei específica, não se admitindo, portanto, sua concessão mediante decreto. Assim preleciona Ricardo Alexandre, em sua obra Direito Tributário Esquematizado, 1ª ed., 2007, Editora Método, P. 412: Remissão é a dispensa gratuita da dívida, feita pelo credor em benefício do devedor. Tratando-se de crédito tributário, devido ao princípio da indisponibilidade do patrimônio público, a remissão somente pode ser concedida com fundamento em lei específica (CF, art. 150, § 6º). Não há dúvida, portanto, de que a sentença incorreu em erro ao extinguir o processo com fundamento na remissão concedida pelo Decreto nº 1.194/08. Além disso, já está pacificado no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que não pode o magistrado, de ofício, declarar a remissão. Nesse sentido, precedente dessa Corte de Justiça: TRIBUTÁRIO. LEI 11.941/09. REMISSÃO. IMPOSSIBILIDADE DE PRONUNCIAMENTO DE OFÍCIO PELO MAGISTRADO. LIMITE DE R$ 10.000,00 CONSIDERADO POR SUJEITO PASSIVO E NÃO POR DÉBITO ISOLADO. ENTENDIMENTO FIRMADO PELA PRIMEIRA SEÇÃO NO JULGAMENTO DO RESP 1.208.395/AM, MEDIANTE UTILIZAÇÃO DA SISTEMÁTICA PREVISTA NO ART. 543-C DO CPC E NA RESOLUÇÃO 08/2008 DO STJ. 1. A lei 11.941/2008 remite os débitos com a Fazenda Nacional vencidos há cinco anos ou mais cujo valor total consolidado seja igual ou inferior a 10 mil reais. 2. O valor-limite acima referido deve ser considerado por sujeito passivo e separadamente apenas em relação à natureza dos créditos, nos termos dos incisos I a IV do art. 14. 3. Não pode o magistrado, de ofício, pronunciar a remissão, analisando isoladamente o valor cobrado em uma Execução Fiscal, sem questionar a Fazenda sobre a existência de outros débitos que impediriam o contribuinte de gozar do benefício. 4. Orientação reafirmada no julgamento do REsp 1.208.935/AM, pela Primeira Seção, submetido à sistemática do art. 543-C do CPC. 5. Recurso Especial provido. (REsp nº 1333703/MT. Rel. Min. Herman Benjamin. 2ª Turma. Julgado em 04/09/2012) Vê-se, portanto, que não há como se admitir uma remissão que foi concedida mediante decreto, em franca violação ao que determina a Constituição federal, razão pela qual acolho os presentes embargos de declaração, dando-lhes efeito modificativo, para anular a sentença recorrida, para que prossiga a execução. Belém(PA), 05 de maio de 2014. DESA. GLEIDE PEREIRA DE MOURA Relatora
(2014.04529399-12, Não Informado, Rel. GLEIDE PEREIRA DE MOURA, Órgão Julgador 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2014-05-09, Publicado em 2014-05-09)
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GABINETE DA DESEMBARGADORA GLEIDE PEREIRA DE MOURA SECRETARIA DA 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA EMBARGOS DE DECLARAÇÃO AO ACÓRDÃO N° 108.754 NA APELAÇÃO Nº 2011.3.027.595-7 EMBARGANTE: ESTADO DO PARÁ EMBARGADO: PORTELA COMÉRCIO DE MODAS LTDA EMBARGADO: ACÓRDÃO N° 108.754, DE 12 DE JUNHO DE 2012 RELATORA: DESA. GLEIDE PEREIRA DE MOURA DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de AGRAVO oposto em face do acórdão n° 108.754, de 12.06.12, que negou provimento à apelação interposta pelo ESTADO DO PARÁ para manter a sentença...
Data do Julgamento
:
09/05/2014
Data da Publicação
:
09/05/2014
Órgão Julgador
:
1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
Relator(a)
:
GLEIDE PEREIRA DE MOURA
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