TJRR 10080112311
CÂMARA ÚNICA
TURMA CÍVEL
APELAÇÃO CÍVEL Nº 01008011231-1
APELANTE: O ESTADO DE RORAIMA
APELADO: RAIMUNDA REBEIRO FERNANDES
RELATOR: DES. ALMIRO PADILHA
RELATÓRIO
O ESTADO DE RORAIMA interpôs Apelação Cível em face da sentença proferida pelo Juiz de Direito da 8ª Vara Cível da comarca de Boa Vista-RR, nos autos da AÇÃO ORDINÁRIA DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS nº 0010.06.147844-1.
Autora afirma, na inicial, que é irmã de JOSÉ ALMIR RIBEIRO, falecido em 26/09/02, aos 36 anos de idade, quando se encontrava preso na Penitenciária Agrícola monte Cristo, sendo assassinado por outros detentos depois de avisar ao Diretor da Penitenciária sobre a existência de entorpecentes nas dependências.
Aduz, ainda, que as autoridades competentes já haviam sido informadas das ameaças de morte que seu irmão recebera, o que não impediu o seu cruel assassinato.
O Magistrado julgou procedente o pedido condenando o Réu a pagar a quantia de R$75.000,00 (setenta e cinco mil reais), mais honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação.
Inconformado com o decisum, o Estado de Roraima interpôs este recurso alegando, preliminarmente, a ocorrência da prescrição, na forma do art. 206§ 3º, V, do CC, uma vez que o fato ocorreu em 26/09/2002 e a ação de reparação apenas foi ajuizada em 31/08/06, 3 (três) anos e 11 (onze) meses após o ocorrido.
No mérito, aduz, que:
a) o presente caso jamais poderia ter sido julgado à luz da Teoria da Responsabilidade Objetiva, mas sim Subjetiva, haja vista que a conduta imputada ao Estado é omissiva, sendo necessária, portanto, a demonstração de culpa dos agentes estatais;
b) analisando-se o caso pela ótica da Teoria Subjetiva, não houve culpa, nem mesmo omissão por parte dos agentes estatais, haja vista que a morte da vítima foi decorrente de uma rebelião que serviu como “acerto de contas” entre os envolvidos, tendo sido apurado que o de cujus, quando em vida, extorquia, espancava e sodomizava outros presos, o que gerou a revolta;
c) o Estado se desincumbiu do ônus de provar que não agiu com culpa, tanto é que tomou providências para proteger o preso, inclusive transferindo-o diversas vezes e colocando-o em alas e celas especiais;
d) a morte do irmão da Autora decorreu de um fato imprevisível, qual seja, uma rebelião, o que impossibilitou a Administração de atuar no sentido de evitá-lo;
e) a vítima concorreu para sua morte, na medida em que provocou outros presos, fomentando brigas e dificultando a ação do Estado em protegê-la;
f) os danos morais foram fixados em valor excessivo, impondo-se sua redução.
Ao final, pugna pelo conhecimento e provimento do recurso, julgando-se improcedente o pedido autoral.
Subsidiariamente, pleiteia a redução do quantum indenizatório em valor a ser arbitrado por este Tribunal.
O Apelado não apresentou contra-razões.
Subiram os autos a este tribunal e coube-me a relatoria.
O Representante do Ministério Público de 2º grau manifestou-se pelo não acolhimento da preliminar de prescrição, sob o argumento de que o prazo prescricional contra a Fazenda Pública é de 5 (cinco) anos, conforme Decreto nº 20.910-32.
No mérito, opina pela redução do valor da condenação para R$ 30.000,00 (trinta mil reais).
Voltaram-me conclusos.
É o relatório.
Encaminhem-se os autos ao Revisor.
Boa Vista – RR, 29 de janeiro de 2010.
Des. Almiro Padilha
Relator
CÂMARA ÚNICA
TURMA CÍVEL
APELAÇÃO CÍVEL Nº 001008011231-1
APELANTE: O ESTADO DE RORAIMA
APELADA: RAIMUNDA RIBEIRO FERNANDES
RELATOR: DES. ALMIRO PADILHA
VOTO
O recurso merece prosperar. Senão vejamos.
O Estado de Roraima suscita a preliminar de prescrição, com fulcro no art. 206, § 3º, V, do CC, que estabelece o prazo prescricional de 3 (três) anos para as ações de reparação civil.
Afirma, ainda, que o prazo de 5 (cinco) anos previsto no Decreto nº 20.910/32 não se aplica ao caso em exame, haja vista que é desfavorável à Fazenda Pública.
Com efeito, sabe-se que o prazo quinquenal previsto no referido Decreto foi criado para beneficiar as Fazendas Públicas, seja federal, estadual ou municipal.
Por essa razão é que, quando da vigência do Código Civil de 1916, que estipulava o prazo de 20 (vinte) anos para essas ações, aplicava-se à Fazenda Pública, o prazo de prescrição estabelecido no Decreto, já que menor e, portanto, mais benéfico.
Conclui-se, assim, que o Decreto somente deve prevalecer quando o prazo estipulado na lei geral for maior.
Pois bem. Analisemos, então, a hipótese em exame.
O evento danoso que ensejou o pedido de indenização ocorreu no dia 26/09/02. À época, vigorava, ainda, o Código Civil de 1916, já que o novo código somente entrou em 2003.
Ocorre que o art. 2.028, do CC/02, estabelece que:
Art. 2.028. Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.
O que esse dispositivo quer dizer é que nas ações propostas já na vigência do novo Código, só que relativas a fatos ocorridos antes de 2003, serão aplicados os prazos do Código Civil anterior se, quando da entrada em vigor do novo Código, já houver transcorrido mais da metade do prazo estabelecido no Código anterior.
Do contrário, isto é, se não houver transcorrido mais da metade do prazo, aplicam-se as disposições do novo Código.
O novo código entrou em vigor em janeiro de 2003. O fato ocorreu em setembro de 2002. Nota-se, portanto, que, quando da entrada em vigor do novo Código, não havia transcorrido mais da metade do prazo prescricional previsto na lei anterior, ou seja, não havia transcorrido mais de 10 (dez) anos.
Portanto, in casu, incide o prazo prescricional de 3 (três) anos, e não o de 5 (cinco) anos, estipulado no Decreto
Assim, uma vez que o prazo trazido pelo Código Civil de 2002 é menor (três anos) do que aquele previsto no Decreto 20.910/32.
No mesmo sentido, transcrevo alguns julgados:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DESAPROPRIAÇÃO DE TERRAS INDÍGENAS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS E MATERIAIS. PRAZO PRESCRICIONAL. DECRETO N. 20.910/32. CÓDIGO CIVIL. PREVALÊNCIA DO ÚLTIMO. O prazo prescricional de três anos previsto no Código Civil (art. 206, § 3º, V) para reparação civil prevalece sobre o estabelecido no art. 1º do Dec. n. 20.910/32. Orientação das câmaras de direito público do STJ. Interpretação teleológica das normas. Proteção da Fazenda Pública, que impõe prevalecer o prazo que melhor lhe aproveita. Previsão expressa no art. 10, Dec. n. 20.910/32. Apelação desprovida. Unânime. (Apelação Cível Nº 70030842132, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Tasso Caubi Soares Delabary, Julgado em 09/12/2009)
***
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA ENTRE OS ARESTOS CONFRONTADOS. NÃO-CONHECIMENTO.
1. Hipótese em que o acórdão da Primeira Turma solucionou a questão do prazo prescricional para o ajuizamento de ações indenizatórias contra a Fazenda Pública, segundo a regra de transição prevista no art. 2.028 do Novo Código Civil. Circunstância temporal inexistente nos arestos da Segunda Turma, que analisaram a matéria à luz apenas do Decreto 20.910/1932, pois ainda não vigorava o Novo Código Civil.
2. O prazo prescricional para pleitear indenização contra a Fazenda Pública foi reduzido para três anos, nos termos do art. 206, § 3º, V, do CC.
3. Embargos de Divergência não conhecidos.
(EREsp 1066063/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 23/09/2009, DJe 22/10/2009)
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ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRESCRIÇÃO.
DECRETO Nº 20.910/32. ADVENTO DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. REDUÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL PARA TRÊS ANOS.
1. O legislador estatuiu a prescrição de cinco anos em benefício do Fisco e, com o manifesto objetivo de favorecer ainda mais os entes públicos, estipulou que, no caso da eventual existência de prazo prescricional menor a incidir em situações específicas, o prazo quinquenal seria afastado nesse particular. Inteligência do art. 10 do Decreto nº 20.910/32.
2. O prazo prescricional de três anos relativo à pretensão de reparação civil – art. 206, § 3º, V, do Código Civil de 2002 – prevalece sobre o quinquênio previsto no art. 1º do Decreto nº 20.910/32.
3. Recurso especial provido.
(REsp 1137354/RJ, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 08/09/2009, DJe 18/09/2009)
A propósito dos Embargos de Divergência em REsp n° 1.066.063/RS, peço vênia para citar alguns trechos do voto do Min. Herman Benjamin:
Com efeito, a Primeira Turma, no acórdão embargado, decidiu controvérsia referente a qual prazo prescricional deve ser aplicado às demandas de reparação civil propostas contra a União: se o do Código Civil de 2002 ou aquele do Decreto 20.910/1932. [...]
No caso dos autos, por não ter transcorrido, na data da vigência do Novo Código Civil, mais da metade do prazo qüinqüenal previsto no Decreto 20.910/1932, atraiu-se a incidência da regra de transição listada no art. 2.028 daquele diploma. Vale dizer, pelo novo Estatuto Civil, a lei anterior só continuaria a reger o prazo prescricional se já houvesse passado mais da metade do prazo arrolado na Leo revogada, o que não se verifica in casu.
Assim, o acórdão embargado solucionou a questão à luz de circunstância temporal inexistente nos arrestos paradigmas.
Com efeito, os arestos da Segunda Turma analisaram a questão jurídica (indenização pleiteada da União) apenas quanto ao Decreto 20.910/1932, pois ainda não vigorava o Novo Código Civil. Daí a inexistência de similitude fática entre os julgados.
O próprio trecho do acórdão da Segunda Turma transcrito pela embargante à fl. 212 comprova que o período julgado no aresto paradigmático refere-se a 1997 – cinco anos antes do Novo Código Civil. Naquela época, encontrava-se em plena vigência o prazo do Decreto 20.910/1932.
Ademais, ainda que superado esse óbice, a alegada divergência está superada, pois a Segunda Turma recentemente reconheceu que o prazo prescricional para o ajuizamento de ações indenizatórias contra a Fazenda Pública foi reduzido para três anos, no termos do art. 206, § 3°, V, do CC.
Como se vê, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que nas ações de reparação civil em face da Fazenda Pública deve prevalecer o prazo prescricional do art. 206, § 3°, do CC, desde que possível a aplicação da regra de transição insculpida no art. 2.028 do mesmo diploma, como no caso dos autos.
A esse propósito, vale mencionar também recente julgado deste Egrégio Tribunal de Justiça, de relatoria do dês. Robério Nunes:
APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PRELIMINAR DE. PRESCRIÇÃO – ACOLHIMENTO – DECRETO Nº 20.910/32 – INAPLICABILIDADE – ADVENTO DO
NOVO CÓDIGO CIVIL –ART. 206 – PRAZO PRESCRICIONAL DE TRÊS ANOS – RECURSO IMPROVIDO.
Deve-se aplicar o prazo prescricional de três anos previsto no artigo 206, § 3º, inciso V, do Código Civil,
quando se tratar de pretensão de reparação civil em face da fazenda pública. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. (AC 010.09012306-7, Rel. Des. Robério Nunes, j. 27/10/09, DJ 02/02/2010, p. 05/06).
Por essas razões, conheço o recurso e dou-lhe provimento para declarar prescrita a pretensão da Autora.
Assim, inverto o ônus sucumbencial e condeno a Autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, esses fixados em R$1.000,00 (um mil reais), levando-se em conta os parâmetros insculpidos nas alíneas a, b e c do § 3º do art. 20 do CPC.
As despesas deverão ser pagas na forma do art. 12 da Lei Federal nº 1.060/50.
É como voto.
Após as providências devidas, baixem-se os autos ao juízo de origem e arquivem-nos.
Boa Vista – RR, 16 de março de 2010.
Des. Almiro Padilha
Relator
CÂMARA ÚNICA
TURMA CÍVEL
APELAÇÃO CÍVEL Nº 001008011231-1
APELANTE: O ESTADO DE RORAIMA
APELADA: RAIMUNDA RIBEIRO FERNANDES
RELATOR: DES. ALMIRO PADILHA
EMENTA
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. MORTE DE PRESIDIÁRIO NA PENITENCIÁRIA AGRÍCOLA. PRESCRIÇÃO DA AÇÃO DE RESSARCIMENTO MOVIDA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. PREVALÊNCIA DO PRAZO PREVISTO NO ART. 206, § 3º, V, DO CC EM DETRIMENTO DO PRAZO QUINQUENAL ESTABELECIDO NO DECRETO 20.910/32. PRAZO MAIS FAVORÁVEL AO ESTADO. HIPÓTESE QUE SE SUBSUME À REGRA DE TRANSIÇÃO INSCULPIDA NO ART. 2.028 DO CC/02. PRECEDENTES DO STJ. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARA DECLARAR A PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO AUTORAL.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os membros da Colenda Câmara Única, integrantes da Turma Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade de votos, em conhecer o recurso e dar-lhe provimento, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante do presente julgado.
Sala das Sessões da Câmara Única do E. TJRR, em Boa Vista - RR, 16 de março de 2010.
Des. Mauro Campello
Presidente e julgador
Des. Robério Nunes
Julgador
Des. Almiro Padilha
Relator
Esteve presente: ___________________________________
Publicado no Diário da Justiça Eletrônico, ANO XIII - EDIÇÃO 4296, Boa Vista, 16 de abril de 2010, p. 023.
( : 16/03/2010 ,
: XIII ,
: 23 ,
Ementa
CÂMARA ÚNICA
TURMA CÍVEL
APELAÇÃO CÍVEL Nº 01008011231-1
APELANTE: O ESTADO DE RORAIMA
APELADO: RAIMUNDA REBEIRO FERNANDES
RELATOR: DES. ALMIRO PADILHA
RELATÓRIO
O ESTADO DE RORAIMA interpôs Apelação Cível em face da sentença proferida pelo Juiz de Direito da 8ª Vara Cível da comarca de Boa Vista-RR, nos autos da AÇÃO ORDINÁRIA DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS nº 0010.06.147844-1.
Autora afirma, na inicial, que é irmã de JOSÉ ALMIR RIBEIRO, falecido em 26/09/02, aos 36 anos de idade, quando se encontrava preso na Penitenciária Agrícola monte Cristo, sendo assassinado por outros detentos depois...
Data do Julgamento
:
16/03/2010
Data da Publicação
:
16/04/2010
Classe/Assunto
:
Apelação Cível )
Relator(a)
:
DES. ALMIRO PADILHA
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