TRF5 2009.82.00.009426-3 200982000094263
Processual Penal e Penal. Recursos do demandante e de um dos acusados condenado, o primeiro a buscar a condenação de todos os acusados pela prática de conduta prevista no art. 89, da Lei 8.666, de 1993, e do inc. V, do art. 1º, da Decreto-lei 201, de
1967, e, também, do acusado-demandado, a perseguir a improcedência da presente ação.
Há sentença que condena apenas um acusado - Humberto Manoel de Freitas -, pela prática dos delitos alojados no art. 89, da Lei 8.666, de 1993, e art. 1º, inc. V, do Decreto-Lei 201, de 1967, absolvendo os demais acusados, ensejando recursos por parte do
1] demandante, f. 886-899, na busca de condenação dos acusados Humberto Manoel de Freitas, José Uchôa de Gusmão Neto, Alvino Domiciano da Cruz Filho e Ari Cavalcanti Pimentel pela prática do crime desenhado no art. 90, da referida Lei 8.666; e do 2]
condenado Humberto Manoel de Freitas, f. 933-950, para o fim de ser julgada improcedente a presente ação.
No centro dos fatos, as seguintes obras, e respectivos contratos de repasse e cartas convites: 1) executar serviços de mão de mão-de-obra e fornecimento de materiais de construção de 01 (um) ginásio poliesportivo, localizado na sede do Município de
Pirpirituba, contrato de repasse 0131953-89/2001, no valor de R$ 135.000,00, mais R$ 6.750,00 do Município, via da carta convite 14/2002, f. 6; 2) aquisição e instalação de 01 (uma) cobertura metálica, mediando 1.444 m2, com telha em alumínio para o
Ginásio Poliesportivo, localizado no mesmo Município, sem menção ao contrato de repasse, no valor de R$ 54.997,24, f. 9; 3) executar serviços de administração, técnica em engenharia e fornecimento de mão-de-obra qualificada na construção de 01 (uma)
quadra poliesportiva na Escola Municipal Nossa Senhora Aparecida, contrato de repasse 0133251-32/2001, valor R$ 40.000,00, mais R$ 2.000,00 do Município, via da carta convite 16/2003, f. 11-12; e, enfim, 4) executar serviços de mão-de-obra e
fornecimento de materiais necessários na construção de 01 (uma) quadra poliesportiva descoberta na Comunidade de Santa Laura, zona rural, contrato de repasse 0140251-81, no valor de R$ 50.000,00, mais R$ 1.500,00, f. 13-14.
As três obras apresentam algumas notas em comum: todas tiveram as contas aprovadas pelo ente concedente dos recursos, f. 28, 33 e 35 [do apenso I], e, em duas, a Municipalidade adotou a administração direta, f. 27 e 33, ou seja, ela mesma executando,
sendo apenas uma efetuada por empresa vencedora após procedimento licitatório via carta convite - no caso, Carta Convite 15/2002, f. 34.
Na análise dos autos, na busca de uma visão completa sobre as três obras, segundo as exposições fornecidas pelo Relatório de Fiscalização da Controladoria-Geral da União, datado de 24 de julho de 2007, f. 16 [idem], do qual se colhe, além dos dados já
destacados, algumas informações importantes.
A primeira, no que tange ao ginásio poliesportivo:
Em 31/12/01, a Prefeitura Municipal de Pirpirituba-PB celebrou com o Ministério do Esporte, por intermédio da Caixa Econômica Federal, o contrato de Repasse nº 0131953-89/2001 (Siafi nº 438366) - com recursos do Orçamento Geral da União, no montante de
R$ 135.000,00, e contrapartida municipal no aporte de R$ 6.750,00 - destinado à "Construção de ginásio poliesportivo coberto - 1ª Etapa".
De acordo com a documentação do projeto básico, contida no projeto básico, contida no processo de Contrato de Repasse, para a construção completa do referido ginásio, foi estimado o orçamento global de R$ 240.000,00, sendo a primeira etapa
correspondente ao valor de R$ 141.750,00.
Os recursos federais foram liberados para a conta específica do Contrato de Repasse, em 3/1/03, mediante parcela única de R$ 135.000,00.
Ressaltamos que, conforme documentação contida na Prestação de Contas Final dos recursos do Contrato nº 0131953-89/2001 - arquivada na Caixa Econômica Federal -, a Prefeitura declarou que a obra seria executada mediante regime de administração direta.
Consta, ainda, que foram efetuados pagamentos a diversos fornecedores, no montante de R$ 155.696,48, ocorridos no período de 6/2/03 a 4/11/04, f. 27 [idem].
Todavia, quanto à execução do contrato decorrente do Convite nº 014/2002, observamos - nas prestações de contas parciais - que não foi realizado nenhum pagamento à firma Conart Construtora (CNPJ nº 04.634.449/00001-62), sendo os pagamentos referentes a
serviços de mão-de-obra efetuados para a firma Roque & Gusmão Ltda. (CNPJ nº 01.770.198/0001-55). Nesse caso, não ficou claro se houve uma nova licitação - não disponibilizada pela Prefeitura -, ou se os pagamentos fracionados das despesas
correspondentes ocorreram com dispensa indevida de licitação, por extrapolar o valor-limite de R$ 15.000,00, permitido pelo inciso I do art. 24 da Lei nº 8.666/1993, f. 28 [idem].
Na fiscalização empreendida, cinco anos depois, a Controladoria-Geral da União constatou a necessidade de serviços de manutenção [f. 29] do referido ginásio, discriminando os locais, destacando ter a Caixa Econômica Federal, dentro do acompanhamento da
obra, considerado concluída, f. 29, inclusive com relação ao total despendido pela União para tanto - R$ 155.696,48 -, e, igualmente, no que se refere a primeira etapa. Falta a segunda etapa, que ainda não foi iniciada, ..., orçada em torno de R$
100.000,00, f. 29 [idem].
Em suma, o ginásio poliesportivo foi construído, em sua primeira etapa, dentro do convênio celebrado pelo Município de Pirpirituba.
No que se refere à segunda obra, na Escola Municipal Nossa Senhora Aparecida, o Relatório de Fiscalização anota:
Em 31/12/01, a Prefeitura Municipal de Pirpirituba-PB celebrou com o Ministério do Esporte, por intermédio da Caixa Econômica Federal, o contrato de Repasse nº 0133251-31/2001 (Siafi nº 437809) - com recursos do Orçamento Geral da União, no montante de
R$ 40.000,00, e contrapartida municipal no aporte de R$ 2.000,00 -, destinado à "construção de quadra de esportes descoberta".
Os recursos federais foram liberados para a conta específica do Contrato de Repasse, em 21/6/02, mediante parcela única de R$ 40.000,00.
Para a execução do objeto conveniado, a Prefeitura realizou, em 8/10/02, o Convite nº 016/2002 - cujo objeto foi a "execução de serviços de administração, técnica em engenharia e fornecimento de mão-de-obra qualificada" - convidando três empresas que
apresentam as seguintes propostas: (...).
(...)
A licitante vencedora foi a firma Roque & Gusmão Ltda., que celebrou, em 30/10/02, com a Prefeitura, o Contrato de Empreitada nº 124/2002.
Ressaltamos que, conforme documentação contida na Prestação de Contas Final dos recursos do Contrato de Repasse nº 0133251-31/2001 - arquivada na Caixa Econômica Federal -, a Prefeitura declarou que seria executada mediante regime de administração
direta. Consta, ainda, que foram efetuados pagamentos a diversos fornecedores, no montante de R$ 44.801,64, ocorridos no período de 9/8/02 a 8/9/02, sendo que apenas o importe de R$ 13.182,22 teve como beneficiária a firma contratada - Roque & Gusmão
Ltda, f. 28 [idem].
Não há alusões a qualquer problema na execução da obra aqui realizada, mesmo porque não se apontou o local desta, apenas ser construção de quadra de esportes descoberta, sobrando o ginásio poliesportivo na Escola Municipal Nossa Senhora Aparecida,
quadra que foi construída com 35,60 m de comprimento, porque o terreno não comportava uma quadra com 41,60 m, cf. f. 628, figurando nas fotos de f. 629, 632, 634, 637 [anexo III], atestada como concluída em 100%, f. 638, registrando a Caixa Econômica
Federal que o empreendimento em tela foi executado com as alterações propostas pela P. M. de Pirpirituba aprovadas por esta Caixa e está beneficiando a população alvo, f. 667 [anexo III].
Por fim, a última obra, implantação de infraestrutura esportiva em escolas/construção de quadra de esporte na Escola Municipal Josinete de Freitas - Comunidade Santa Laura, f. 725-726 [idem].
No aspecto, narra o Relatório de Fiscalização que em 5/7/02, a Prefeitura Municipal de Pirpirituba-PB celebrou com o Ministério do Esporte, por intermédio da Caixa Econômica Federal, o Contrato de Repasse nº 01402561-81/2002 (Siafi nº 460276) - com
recursos do Orçamento Geral da União, no montante de R$ 50.000,00, e contrapartida municipal no aporte de R$ 1.500,00 - destinado à "construção de quadra de esportes na Escola Municipal Josinete Freitas - Comunidade Santa Laura".
Para a execução do objeto conveniado, a Prefeitura realizou, em 7/10/92, o Convite nº 015/2002 - cujo objeto foi a "execução de serviços de mão-de-obra e fornecimento de materiais" - convidando três empresas, que apresentaram as seguintes propostas de
preços: (...)
A licitante vencedora foi a firma Roque & Gusmão Ltda., que celebrou, em 24/10/02, com Prefeitura, o Contrato de Empreitada nº 123/2002.
Os recursos federais foram liberados para a conta específica do Contrato de Repasse, em 2/1/04, mediante parcela única de R$ 50.000,00.
Ressaltamos que, conforme documentação contida na Prestação de Contas Final dos recursos do Contrato de Repasse nº 0140251-81/2002, arquivada na Caixa Econômica Federal -, a firma contratada - Roque & Gusmão Ltda. - foi beneficiária de vários
pagamentos. No montante de R$ 53.272,72, efetuados no período de 18/5/04 a 29/12/04, f. 35 [anexo I].
A quadra construída é a de f. 755, 760, 762, 765 [anexo IV], com algumas alterações, f. 756 [anexo IV].
O Tribunal de Contas da Paraíba alevantou alguns questionamentos relativos aos valores das três obras, tendo a Caixa Econômica Federal justificado devidamente, f. 118 (anexo IV).
Não há qualquer senão na execução das três obras, não se arvorando nenhum ranço que possa comprometê-las.
A r. sentença foi, então objeto, de dois recursos.
O primeiro é do demandante, perseguindo a condenação dos demandados pela prática de conduta alinhada no art. 90, da Lei 8.666.
Nesse sentido, o registro de ter o ora recorrente, nas alegações finais, pedido a condenação do réu Humberto Manoel de Freitas como incurso nas sanções do art. 89, da Lei 8.666, e art. 1º, inc. V, do Decreto-Lei 201, e a absolvição do mesmo Humberto
Manoel de Freitas da prática do crime previsto no art. 90 da Lei nº 9.666/93, assim como a absolvição dos demais réus de todos os crimes a eles imputados pela inicial acusatória, f. 719.
A r. decisão recorrida assim contemplou, f. 878-879, e, no entanto, o demandante, via de outro e ilustre componente, recorre, f. 886-899, pedindo a reforma da r. sentença para condenar os recorridos Humberto Manoel de Freitas e José Uchôa de Gusmão Neto
pela prática de crime tipificado no art. 90 da Lei nº 8.666/96, em relação aos fatos relacionados à Carta Convite nº 014/2002, assim como os apelados Humberto Manoel de Freitas, Alvino Domiciano da Cruz Filho e Ari Cavalcanti Pimentel pela prática do
crime tipificado no art. 90 da Lei nº 8.666/96, em relação aos fatos relacionados à Carta Convite nº 007/2003, f. 899.
Então, nas alegações finais, o demandante pede absolvição de todos pela prática do delito embrenhado no art. 90, da Lei 8.666, f. 719. No momento do apelo, sem se fazer a menor alusão ao pedido contido nas alegações finais, se busca a condenação pela
prática de delito que, anteriormente, se pleiteou, embora a peça aludida tenha citado: Alegações finais apresentadas pelo MPF às fls. 707/719, f. 888.
É certo que cerca o Ministério Público o princípio institucional da independência funcional [§ 1º, do art. 127, da Constituição; art. 4º, da Lei Complementar 75, de 1993], que deve ser entendida como o direito de agir em qualquer circunstância, dentro
da competência que a legislação - constitucional e ordinária - lhe atribui, sem se curvar a nenhuma determinação superior de autoridade administrativa. Contudo, há, antes de tudo, o princípio da unidade, que simboliza no feito o mesmo comportamento, na
defesa dos pedidos encartados na inicial, de modo a evitar que o pensamento individual de um dos seus ilustres membros, dentro do mesmo feito, se volte contra o pedido formulado, anteriormente, por um dos seus colegas, num vai e vem intolerável.
É o caso, aqui, já exposto, quando um pede a absolvição de todos os acusados no que tange à infração exibida no art. 90, da Lei 8.666, e, com o pedido proclamado na r. sentença, o mesmo demandante, agora sob a óptica de outro membro, recorre da sentença
que consagrou o pleito anterior.
O princípio da independência funcional não se sobrepõe ao da unidade, nem com ele conflita, de modo que, num feito, buscando-se, nas alegações finais, a absolvição de todos os acusados pela prática do delito cravado no art. 90, da Lei 8.666, não há como
se admitir, uma vez atendido dito pedido, que outro membro venha da r. sentença recorrer a fim de buscar o contrário do que foi anteriormente perseguido, sem que, ao menos, se dignasse mostrar, de forma expressa, um extraordinário erro grosseiro daquele
que subscreveu as alegações finais, ou que o mesmo, via de prova técnica, estava completamente com a cabeça fora do lugar. Não se pode admitir que, ante os mesmos fatos, aqui se peça um bem de vida e, ali, adiante, bem totalmente diferente do primeiro,
na manutenção de um ambiente de instabilidade, visto que, a cada passo, o demandante altera seu pedido, sobretudo quando, pela sua posição, as alegações do Ministério Público Federal, quaisquer que sejam, merecem o mais acurado exame e respeito. Enfim,
o processo é um caminhar para a frente, não se admitindo alteração de roteiro porque um membro do Ministério Público Federal tem entendimento diferente do que, anteriormente, numa peça sumamente importante, como a das alegações finais, ostenta um pedido
- o de absolvição - e, adiante, outro membro discorda e parte para o recurso. Como justificar que o demandante, que é uno e indivisível, recorra do bem de vida que pediu?! Ademais, quando um membro do Ministério Público Federal pede a absolvição nas
razões finais e, concedida, outro membro recorre da decisão absolutória, cria-se um forte clima de dúvida, dúvida, que, assim se constituindo, beneficia o acusado.
Independentemente dessa inconstância, o art. 90, da Lei 8.666, exige a presença de três elementos, para a sua concretização, como, v. g., 1) frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, 2) o caráter competitivo do
procedimento licitatório, 3) com o intuito de obter, para si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação.
Mergulha-se, assim, nos autos, na análise das ocorrências que cercam a Carta Convite 14, de 2002, e a Carta Convite 7, de 2003, na busca de captar e apreender os três elementos que, entrelaçados, formam o delito em apreço.
No caso do primeiro elemento, e, nesse sentido, o mais importante, por ser o que desencadeia a ação dos sujeitos ativos, materializada na conduta de frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, fundamental ressaltar que
se cuida de conduta que antecede a realização do procedimento licitatório. No aspecto, nas razões recursais atinentes, f. 889-894, nada faz menção a qualquer encontro das três empresas que dele participaram - Conart Construtora Ltda., Construtora
Esplanada Ltda. e Multi - Obras Construtoras Ltda., f. 889 -, a fim de transformar a primeira em vencedora.
O argumento estampado na peça recursal centraliza-se, no que pode ser denominado de essência, no fato de não ter constado da Prestação de Contas Final apresentada pelo Município os procedimentos licitatórios desencadeados pelas Cartas Convites 3, 6, 7 e
12, de 2003, acentuando o apelante que a ausência de tais peças levanta dúvida acerca da existência do procedimento licitatório à época, f. 891. Ora, os procedimentos licitatórios aludidos ocorreram depois de fracassado o início da obra decorrente do
procedimento licitatório atinente à Carta Convite 14. Só com o desinteresse manifestado pela empresa vencedora é que se parte para os quatro outros procedimentos licitatórios, sob os rótulos das Cartas Convites 3, 6, 7 e 12, de 2003. Fato posterior não
pode ser entendido como maneira de frustrar ou fraudar procedimento licitatório já ocorrido, nem a falta de apresentação da documentação atinente aos quatro procedimentos licitatórios aludidos carrega a força de, por si só, se constituir em fato
passado, porque só no passado é que a conduta de frustrar ou de fraudar o procedimento licitatório pode se concretizar. Ademais, o fato de não se ter guardado a documentação atinente a procedimentos licitatórios futuros (os decorrentes das Cartas
Convites 2, 6, 7 e 12) pode se constituir em conduta alojada pelo aludido art. 90, da Lei 8.666.
Por outro lado, no que tange ao procedimento licitatório oriundo da Carta Convite 7, de 2003, a peça recursal se limita a apontar fatos posteriores, como, v. g., a execução do contrato por outra empresa que não a vencedora, pagamento das verbas à
empresa vencedora que o repassava àquela que, de fato, executava o serviço licitado, a combater a ocorrência de sub-rogação ou de subcontratação, sem que uma coisa ou outra tivesse sido levado a termo formal. Nada, enfim, se eleva à condição de fato que
pudesse frustrar ou fraudar o procedimento licitatório, dentro da moldura traçada pelo referido art. 90, da Lei 8.666, embora revele algo de estranho, que pode apresentar outro contorno penal, mas nunca o embrenhado no supramencionado art. 90.
O apelo do demandante não adentra na construção das duas quadras de esporte nas Escolas Municipais Nossa Senhora Aparecida e Josinete Freitas - Comunidade Santa Laura, limitando-se somente à quadra poliesportiva.
Não há como prosperar, desta forma, o inconformismo do demandante.
Por fim, no que tange ao apelo do acusado Humberto Manoel de Freitas, condenado pela prática dos delitos desenhados no art. 89, da Lei 8.666, e, ainda, no art. 1º, inc. V, do Decreto-Lei 201, é de se observar, inicialmente, que, a partir do momento em
que a empresa vencedora da licitação, anunciada pela Carta Convite 14, de 2001, se desinteressou, a municipalidade deu partida a uma tomada de posição diferente, resolvendo ela própria, via de projeto por administração direta, f. 939, proceder à
execução direta, f. 940, da primeira obra, ou seja, do ginásio poliesportivo, obra que, afinal, não apresentou em seu contexto nenhuma irregularidade.
Vem a segunda obra, atinente à Carta Convite 16, de 2002, ou seja, a construção de quadra de esportes descoberta na Escola Municipal Nossa Senhora Aparecida.
Nesse caso, há o procedimento licitatório, sagrando-se vencedora a empresa Roque & Gusmão Ltda., f. 32 [apenso I], e, pelo que o Relatório em apreço deixa claro, uma parte da obra foi efetuada pela empresa vencedora, no importe de R$ 13.182,22, f. 33
[apenso I] e os demais serviços com pessoas físicas e jurídicas, de acordo com a relação de f. 642-643 [apenso III], no total de R$ 44.801,64, f. 643.
Já na terceira e última obra, alusiva à Carta Convite 15, tendo por objeto a construção de uma quadra de esportes na Escola Municipal Josinete Freitas - Comunidade Santa Laura, f. 34, tornou-se vencedora a empresa Roque & Gusmão Ltda., que, no final,
recebeu, no todo, a quantia de R$ 53.272,72, f. 34 e 35 [anexo I], execução que foi atestada pela chefe da Municipalidade de Pirpirituba, Josivalda Matias de Souza, em 4 de julho de 2006, cf. documento de f. 769 [anexo IV], ou seja, já depois de
encerrada a administração do apelante Humberto Manoel de Freitas, estando, portanto, fora do alcance da presente demanda.
No aspecto, cotejando-se a r. sentença, observa-se, no que tange ao delito capitulado no art. 89, da Lei 8.666, e ao crime hospedado no art. 1º, inc. V, do Decreto-Lei 201, que a douta decisão atacada se sustenta nas Cartas Convite 6, 7, 12 e 16 [f. 861
e 862], sob os seguintes fundamentos:
1) ... resultando insuficiente sua mera alegação, no exercício da autodefesa, de que, com a prévia concordância da CEF, executou a diretamente a obra, realizando licitação somente para aquisição dos materiais que o município não detinha e para a
contratação de mão de obra específica, f. 865;
2) Nesse contexto, resta indene de dúvida de que ao proceder de tal maneira, dispensou indevidamente a realização do devido processo licitatório, pois o somatório dos valores pagos a terceiros por materiais e serviços atrelados às obras do Contrato de
repasse, demonstram que restou ultrapassado o limite legal para a dispensa de tal formalidade. Nesse passo, ao realizar tais pagamentos, o acusado infringiu, ainda, as normas financeiras pertinentes, ou seja, as disposições dos arts. 62 e 63 da Lei nº
4.320/64, f. 866;
3) Com efeito, os fatos narrados na denúncia e comprovados na instrução se subsumem às descrições típicas em comento, nos seguintes moldes: a) em relação ao crime de licitação, especificamente, no tipo objetivo Dispensar que deixar de realizar o
procedimento licitatório fora das hipóteses previstas no art. 24 da Lei nº 8.666/93; b) quanto ao crime de responsabilidade, especificamente, se subsume ao tipo Realizar despesas em desacordo com as normas financeiras que regulamentam os controles para
a efetivação do gasto público, f. 866.
Das quatro cartas convites - 6, 7, 12 e 16 -, o Relatório da Fiscalização da Controladoria-Geral da União referiu-se apenas a 7, 12 e 16, deixando a 6 fora de seu texto. A 7 tem por objeto aquisição e instalação de uma cobertura em estrutura metálica; a
12, aquisição de materiais de construção, f. 27 [apenso I] e f. 364-407 [apenso II], e, enfim, a 16 é a atinente à construção da quadra de esporte descoberta da Escola Municipal Nossa Senhora Aparecida, f. 32 [apenso I] e f. 668-749 [apenso II].
Não se vê a presença da dispensa, porque convite existiu, e, assim se verificando, ocorreu procedimento licitatório, ainda que a Carta Convite 12 tenha se limitado à aquisição de materiais de construção, f. 27 [apenso I], e, na 16, alguma quantia ter
sido paga a vencedora, f. 33 [apenso I]. No que se refere à Carta de Convite 6, não há documento nos autos a respeito.
Afasta-se, assim, a presença do delito residente no art. 89, da Lei 8.666, porque o procedimento licitatório existiu, ainda que não totalmente. Ora, a dispensa, a que se refere o aludido art. 89, exige ato da autoridade, em processo regular, declarando
dispensa à licitação, diferentemente de não fazer a licitação, despojado de qualquer ato ou o que o valha. Se a autoridade administrativa silencia e, sem ter qualquer processo, não faz a licitação, não simboliza para a dispensa formal e expressa, mas
sim para uma tomada de posição outra, em direção a caminho totalmente diferente, embora não coloque no papel a aclamação da dispensa, de modo a desburocratizar sua posição. Depois, quando o apelante-demandado decidiu pela administração direta, não
procurou camuflar qualquer procedimento, partindo para a comunicação expressa à Caixa Econômica Federal, f. 318 [apenso I], o que bem demonstra a ausência do dolo, a simbolizar sempre o ato de navegar contra a maré da lei, o que, aqui, com a comunicação
aludida, anunciando sua posição de proceder a execução direta, não se perfaz, e, em assim sendo, derruba, de uma vez por todas, qualquer laivo de dolo na sua conduta. A autoridade, que quer ferir a norma, não efetua nenhuma comunicação nesse sentido,
circunstância que a despe, cada vez, do dolo, e, sem o dolo, sem a vontade imensa de burlar a lei, não se verifica a presença dos delitos pendurados no art. 89, da Lei 8.666, tampouco no art. 1º, inc. V, do Decreto-lei 201.
Acrescente-se que o delito do art. 89, da Lei 8.666, para a sua formatação, reclama o benefício do agente que comete o ato, e, no caso, nenhuma linha a respeito foi atroada, tendo, inclusive, as contas sido prestadas e aprovadas, da mesma forma que, no
caso do crime do art. 1º, inc. V, do Decreto-Lei 201, os pagamentos feitos foram sedimentados pela presença do material adquirido, não tendo sido, nem ao menos, arguido qualquer pagamento fictício, de modo a, aqui também, faltar a presença do elemento
dolo.
Provimento ao recurso do demandado e improvimento ao apelo do demandante.
Ementa
Processual Penal e Penal. Recursos do demandante e de um dos acusados condenado, o primeiro a buscar a condenação de todos os acusados pela prática de conduta prevista no art. 89, da Lei 8.666, de 1993, e do inc. V, do art. 1º, da Decreto-lei 201, de
1967, e, também, do acusado-demandado, a perseguir a improcedência da presente ação.
Há sentença que condena apenas um acusado - Humberto Manoel de Freitas -, pela prática dos delitos alojados no art. 89, da Lei 8.666, de 1993, e art. 1º, inc. V, do Decreto-Lei 201, de 1967, absolvendo os demais acusados, ensejando recursos por parte do
1] demanda...
Data do Julgamento
:
15/01/2019
Data da Publicação
:
25/01/2019
Classe/Assunto
:
ACR - Apelação Criminal - 12980
Órgão Julgador
:
Segunda Turma
Relator(a)
:
Desembargador Federal Vladimir Carvalho
Comarca
:
TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
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