TJAC 0003258-02.2009.8.01.0001
Acórdão n. 8928
Feito : Apelação Cível n.º 0003258-02.2009.8.01.0001
Origem : Rio Branco / 1ª Vara Cível
Órgão : Câmara Cível
Relatora : Desembargadora Izaura Maia
Revisora : Desembargadora Eva Evangelista
Apelante : Francimar da Cunha Mota
Advogado : Antonio Batista de Sousa
Advogada : Luena Paula Castro de Souza
Apelado : Panamericana de Seguros S/A.
Advogado : Walter Airam Naimaier Duarte Junior
Assunto : Contratos Bancários
APELAÇÃO CÍVEL. MÚTUO BANCÁRIO. REVISÃO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICABILIDADE. JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE NÃO CONFIGURADA. TAXA MÉDIA DE MERCADO. OBSERVÂNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. FIXAÇÃO.
1. Caracterizada relação de consumo (ADI n. 2591 e Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça), cabível a aplicação da legislação consumerista às instituições financeiras.
2. Versando a demanda sobre revisão de mútuo bancário, os juros remuneratórios não sofrem a limitação imposta pelo Decreto n. 22.626/33 (Lei de Usura), a teor da Súmula 596/STF. Com efeito, eventual abusividade deve restar demonstrada quando comparada com a taxa média de mercado à época da contratação.
3. No caso concreto, não reconhecida a abusividade, mantém-se a taxa de juros contratada.
4. Correta a fixação dos honorários advocatícios, vez que estabelecidos em conformidade com o disposto no artigo 20, § 4º, do Código de Processo Civil.
5. Apelo desprovido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0003258-02.2009.8.01.0001, acordam os membros que compõem a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Acre, à unanimidade de votos, em desprover o recurso, tudo nos termos do Voto da Relatora, que faz parte integrante do presente aresto e notas taquigráficas arquivadas. Custas pelo Apelante, observado o disposto no artigo 12 da Lei n. 1.060/50.
Rio Branco, 14 de dezembro de 2010.
Desembargadora Miracele Lopes
Presidente
Desembargadora Izaura Maia
Relatora
Relatório
A Desembargadora Izaura Maia (Relatora):
Trata-se de Apelação Cível interposta por Francimar da Cunha Mota, no intuito de reformar Sentença proferida pelo Juiz de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Rio Branco que, julgando os autos da Ação Ordinária n. 001.09.003258-7, assim concluiu:
"Isto posto, julgo procedente em parte o pedido revisional do contrato de financiamento descrito nos autos, para estabelecer o seguinte:
a) declarar a manutenção da taxa de juros remuneratórios convencionada pelas partes no contrato de mútuo;
b) declarar nula a cláusula de capitalização mensal de juros remuneratórios, fixando a capitalização exclusivamente anual, nos termos do art. 4º do Decreto nº 22.626/33; c.c. o art. 406 e 591, do Código Civil.
c) declarar a nulidade da estipulação da comissão de permanência, como fator de atualização monetária, que deveria ser expurgada, deduzindo-se os valores em que houve pagamento de prestação do financiamento, eventualmente existentes, com a restituição/compensação dos valores pagos a maior;
d) declarar a não configuração da mora debendi, determinando, em consequência, a não incidência, sobre o saldo devedor do contrato pactuado;
e) em caso de mora, até aqui não configurada, admite-se a cobrança de juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês, multa moratória de 2% (dois por cento) e correção monetária pela variação mensal do índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC);
f) Determinar a apuração do saldo devedor com base nos parâmetros insculpidos neste julgado, partindo-se do valor nominal do empréstimo, com a dedução dos valores pagos a título de amortização pela parte autora, nas datas em que ocorreram ditas amortizações, desprezando-se eventuais renegociações da dívida originária.
Em face da sucumbência, condeno a parte ré a pagar as custas processuais, além de honorários advocatícios ao patrono da parte autora, os quais fixo em R$ 500,00 (quinhentos reais), tudo com base no art. 20, § 4º, do CPC.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.? fls. 136/137
Insurge-se o Apelante/Francimar da Cunha Mota contra a manutenção dos juros remuneratórios pactuados, asseverando que o contrato firmado deve ser analisado a luz da legislação consumerista, e ainda, argumentando que a Lei de Usura deve ser observada nos mútuos bancários (fls. 142/165).
Requer ao final a reforma da sentença, decretando-se a nulidade da cláusula contratual que prevê a incidência de juros remuneratórios acima de 1% (um por cento) ao mês; a apuração do saldo devedor, partindo-se do valor nominal do empréstimo, com dedução, nas respectivas datas, dos valores pagos a título de amortização, e ainda a condenação do Apelado ao pagamento de honorários advocatícios no percentual de 10% (dez por cento) fls. 165/166.
O Juiz a quo recebeu a Apelação em ambos os efeitos (fl. 169).
Embora intimada, a parte Apelada não apresentou contrarrazões ao recurso de Apelação.
Deixei de encaminhar os autos à Procuradoria Geral de Justiça, por não vislumbrar quaisquer das hipóteses legais previstas.
É o relatório que encaminhei à douta revisão.
Voto
Desembargadora Izaura Maia (Relatora):
Inicialmente, registre-se que entendo cabível a aplicação da legislação consumerista às instituições financeiras, por restar caracterizada relação de consumo (ADI n.º 2.591 e Súmula n. 297, do Superior Tribunal de Justiça). O parágrafo 2º do art. 3º do CDC expressa que entre as atividades consideradas como serviço encontram-se as de natureza bancária, financeira e creditícia. Dessa forma, os serviços prestados pelos bancos a seus clientes estão garantidos pela lei de defesa do consumidor.
Sendo esse o entendimento deste Egrégio Tribunal de Justiça, por seu Órgão Fracionário Cível:
?CONTRATO BANCÁRIO. AÇÃO REVISIONAL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICAÇÃO. CLÁUSULAS ABUSIVAS. NULIDADE. JUROS. REDUÇÃO. POSSIBILIDADE. CAPITALIZAÇÃO. PERIODICIDADE. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA.
- De acordo com a jurisprudência pacificada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, o Código de Defesa do Consumidor é aplicável aos contratos bancários (...).?
(TJAC, Apelação Cível n.º 2007.002680-9, Câmara Cível, Relator Desembargador Samoel Evangelista, Acórdão n.º 5.001, j. em 13.11.2007, DJ de 29.05.2008)
É cediço que o contrato faz lei entre as partes; todavia, quando demonstrado o desequilíbrio na relação contratual, mediante cláusulas abusivas, estas podem ser declaradas nulas de pleno direito, ex vi do artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor. A legislação consumerista visa equilibrar essa relação, preservando a relativização dos princípios da boa-fé objetiva, da função social do contrato e do pacta sunt servanda.
Não é outro o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
?RECURSO ESPECIAL. CIVIL. CONTRATO BANCÁRIO. REVISÃO CONTRATUAL. RELATIVIZAÇÃO DO PACTA SUNT SERVANDA. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA AFASTADA. CUMULATIVIDADE. OUTROS ENCARGOS MORATÓRIOS. RECURSO IMPROVIDO.
1. A revisão dos contratos é possível em razão da relativização do princípio pacta sunt servanda, para afastar eventuais ilegalidades, ainda que tenha havido quitação ou novação.
2. É imperioso o afastamento da comissão de permanência, porquanto cumulada com juros moratórios e multa, haja vista a existência de cláusulas referentes a esses encargos moratórios.
3. Agravo regimental improvido.?
(STJ, AgRg no REsp 790348/RS, Relator Ministro Hélio Quaglia Barbosa, j. em 05.10.2006, DJ 30.10.2006, p. 323)
Prosseguindo, em se tratando dos juros remuneratórios, após reiteradas decisões acerca da matéria, no âmbito desta Corte e dos Tribunais Superiores, quedo-me à orientação adotada. Seguindo este entendimento, a limitação da taxa de juros no percentual de 12% ao ano, Lei de Usura (Decreto n. 22.626/33), restou afastada por força da Súmula n. 596, do Supremo Tribunal Federal. Ainda, a taxa pactuada acima do referido percentual, por si só, não indica abusividade (Súmula n. 382, STJ).
Nessa senda, há que se ponderar, no caso concreto, a existência ou não de abusividade da taxa de juros remuneratórios cobrada pela instituição financeira, de modo a não deixar os contratantes em posição desigual, consoante preconiza a legislação consumerista. Tal medida é a observância da taxa média de mercado, à época da contratação.
Colaciono do Superior Tribunal de Justiça:
"AGRAVO REGIMENTAL. CONTRATO BANCÁRIO. JUROS REMUNERATÓRIOS. TAXA MÉDIA DE MERCADO. [...].
I - Os juros pactuados em taxa superior a 12% ao ano não são considerados abusivos.
[...]
Agravo Regimental improvido."
(STJ, AgRg no Ag 1266124 / SC, Terceira Turma, Rel. Min. Sidnei Beneti, j. em 15.04.2010, DJe de 07.05.2010)
"CONTRATOS BANCÁRIOS. JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE RECONHECIDA. LIMITAÇÃO A 12% AO ANO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N.º 382/STJ.
1. A estipulação de juros remuneratórios acima de 12% ao ano, por si só, não configura abusividade (Súmula 382/STJ). Isso porque os juros remuneratórios cobrados pelas instituições financeiras não sofrem a limitação imposta pelo Decreto n.º 22.626/33 (Lei de Usura), nos termos da Súmula 596/STF. Com efeito, eventual abusividade na cobrança de juros remuneratórios deve ser episodicamente demonstrada, sempre levando-se em consideração a taxa média cobrada no mercado.
2. Reconhecida a abusividade no caso concreto, os juros remuneratórios devem ser fixados à taxa média do mercado.
3. Recurso especial parcialmente provido."
(STJ, REsp 618918 / RS, Quarta Turma, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. em 20.05.2010, DJe de 27.05.2010)
Transcrevo desta Corte:
"DIREITO DO CONSUMIDOR E BANCÁRIO. APELAÇÃO. AGRAVO INTERNO. CONTRATO DE MÚTUO. REVISÃO CONTRATUAL. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO. IMPERTINÊNCIA. TAXA MÉDIA DE MERCADO. OBSERVÂNCIA. RAZOABILIDADE.. ABUSIVIDADE INDEMONSTRADA. AGRAVO IMPROVIDO.
Não mais aplicável à espécie a Lei de Usura a limitar a taxa de juros Súmula 596, do Supremo Tribunal Federal adequada a redução tão-somente quando exorbitante a ponto de ultrapassar a taxa média praticada no mercado e demonstrada a abusividade, situação que refoge à espécie, com juros convencionados em 2,29% a.m ao mês.
Agravo interno improvido."
(TJAC, Apelação Cível n. 2009.002184-3, Câmara Cível, Relatora Desembargadora Eva Evangelista, j. em 15.09.2009, DJe de 02.10.2009)
No caso em exame, pela simulação de financiamento (fls. 63/64), pode-se aferir a taxa de juros remuneratórios estipulada, conforme demonstrativo a seguir:
Período/ Contratação
Taxa de Juros
Taxa Média ? BCB (*)
30.11.07
1,18438%
3,89583%
Fonte (*): Banco Central do Brasil BCB.Site: HTTP://www.bcb.gov.br/?INDECO
Nessa senda, observo que a taxa de juros não encontra-se superior em relação à taxa média de mercado no período da contratação, conforme demonstrado no quadro supra, devendo ser mantida, consoante decidido na r. Sentença do Juiz a quo.
No tocante à apuração do saldo devedor do empréstimo, que entende o Apelante ser devida a partir do valor nominal do empréstimo, com dedução, nas respectivas datas, dos valores pagos a título de amortização, entendo que inexiste interesse recursal, vez que assim decidido pelo Juiz a quo.
Por fim, quanto aos honorários advocatícios, nada há a ser reparado, eis que fixados em atendimento ao disposto no § 4º do artigo 20 do Código de Processo Civil.
Isto posto, voto pelo desprovimento do recurso, mantendo-se inalterada a r. Sentença do Juiz a quo. Custas pelo Apelante, suspensas a teor do artigo 12 da Lei n. 1.060/50, vez que beneficiário da justiça gratuita (fl. 54)
É como voto.
Extrato da Ata
Como consta da Certidão de Julgamento, a decisão foi a seguinte:
"Decide a Câmara Cível, à unanimidade de votos, desprover o Apelo"
O julgamento foi presidido pela Desembargadora Miracele Lopes, com voto. Da votação participaram, também, as Desembargadoras Eva Evangelista e Izaura Maia, Relatora. Presente o Procurador de Justiça Carlos Roberto da Silva Maia.
Francisca das Chagas Cordeiro de Vasconcelos
Secretária da Câmara Cível
Ementa
Acórdão n. 8928
Feito : Apelação Cível n.º 0003258-02.2009.8.01.0001
Origem : Rio Branco / 1ª Vara Cível
Órgão : Câmara Cível
Relatora : Desembargadora Izaura Maia
Revisora : Desembargadora Eva Evangelista
Apelante : Francimar da Cunha Mota
Advogado : Antonio Batista de Sousa
Advogada : Luena Paula Castro de Souza
Apelado : Panamericana de Seguros S/A.
Advogado : Walter Airam Naimaier Duarte Junior
Assunto : Contratos Bancários
APELAÇÃO CÍVEL. MÚTUO BANCÁRIO. REVISÃO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICABILIDADE. JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE NÃO CONFIGURADA. TAXA MÉDIA DE MERCADO. OB...
Data do Julgamento
:
14/12/2010
Data da Publicação
:
30/03/2011
Classe/Assunto
:
Apelação / Contratos Bancários
Órgão Julgador
:
Primeira Câmara Cível
Relator(a)
:
Izaura Maria Maia de Lima
Comarca
:
Rio Branco
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