TJPA 0000130-36.2015.8.14.0054
PODER JUDICIÁRIO 2ª TURMA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO Nº 0000130-36.2015.8.14.0054 COMARCA DE ORIGEM: SÃO JOÃO DO ARAGUAIA APELANTE: BANCO BRADESCO S.A. ADVOGADO: RUBENS GASPAR SERRA OAB 119859 APELADA: SEBASTIANA LIANDRA DA SILVA ADVOGADO: ANTÔNIO QUIRINO NETO OAB 10412 RELATORA: DESA. EDINÉA OLIVEIRA TAVARES EMENTA: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. POSSIBILIDADE. EMPRÉSTIMO INEXISTENTE. DESCONTOS INDEVIDOS EM VERBA DE NATUREZA ALIMENTAR. QUANTUM INDENIZATÓRIO. MANUTENÇÃO. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. OBSERVÂNCIA. 1. É objetiva a responsabilidade civil do prestador de serviços em ações que versam sobre cobranças e descontos efetuados indevidamente decorrente de empréstimo bancário, por se tratar de relação de consumo. 2. Hipótese em que o apelante não se desincumbiu do ônus da prova de demonstrar que o apelado de fato contraiu o empréstimo que ensejou os descontos em seu benefício previdenciário de aposentadoria, sendo correta a condenação do recorrente ao pagamento de indenização por danos morais. 3. Em observância aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade e considerando a extensão do dano e a capacidade econômica das partes, deve ser mantido o quantum indenizatório de danos morais fixado em R$ 11.820,00 (onze mil oitocentos e vinte reais). 4. Recurso conhecido desprovido. DECISÃO MONOCRÁTICA A EXMª. SRª DESEMBARGADORA EDINÉA OLIVEIRA TAVARES (RELATORA): Trata-se de apelação cível interposta por BANCO BRADESCO S.A., objetivando a reforma da sentença proferida pelo M.M. Juízo da Vara Única da Comarca de São João do Araguaia, que julgou procedente a Ação de Indenização Por Danos Morais e Materiais proposta por RAIMUNDO DE SOUZA REIS. Na origem, às fls. 02/09, a requerente narra que é analfabeta, lavradora aposentada e que recebe benefício de aposentadoria do INSS; narra que ao se dirigir à agencia bancária constatou a realização de um empréstimo em seu nome no valor de R$ 6.861,12, bem como que seu benefício de aposentadoria no valor de R$ 1.086,00 havia sido sacado. Informa que o requerido não forneceu cópia do suposto contrato tendo fornecido apenas extrato demonstrando a existência de descontos referentes ao suposto empréstimo contratado. Por tais razões ajuizou a presente demanda em que pretende a declaração de inexistência do débito e a condenação do requerido ao pagamento de indenização por danos morais e materiais correspondente aos valores descontados indevidamente. O requerido apresentou contestação às fls. 39/68 contrapondo a pretensão do autor, aduzindo a inexistência de ato ilícito e regularidade na celebração do contrato Realizou-se audiência com o depoimento pessoal da autora, tendo na mesma audiência sido prolatada sentença julgando procedente a ação para declarar a inexistência do débito; condenar à requerida ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 2.123,60 correspondente aos valores descontados indevidamente e indenização por danos morais no valor de R$ 11.820,00, além de custas processuais e honorários advocatícios fixados em 20% sobre o valor da condenação. Apelação interposta pelo requerido/apelante às fls. 94/105 em que sustenta a existência e validade do contrato de empréstimo; inexistência de comprovação de danos materiais e danos morais, ou, alternativamente a redução do quantum indenizatório. Recurso adesivo interposto pela requerente às fls. 201/213 em que requer a majoração do quantum indenizatório de danos morais e a aplicação de multa por descumprimento da decisão que deferiu o pedido de tutela antecipada. Contrarrazões apresentada às fls. 114/120 em que a requerente/apelada refuta a pretensão do apelante e requer o desprovimento do recurso. Coube-me a relatoria do feito após distribuição realizada em 2017 (fl. 123). Relatei. D E C I D O A EXMª. SRª DESEMBARGADORA EDINÉA OLIVEIRA TAVARES (RELATORA): Satisfeitos os pressupostos processuais viabilizadores de admissibilidade recursal, conheço do presente Recurso. Passo a apreciá-lo, procedendo ao julgamento na forma monocrática por se tratar de matéria cristalizada no âmbito da jurisprudência pátria e, deste E. Tribunal. Não havendo preliminares a serem analisadas, passo a análise do mérito recursal. Cinge-se a controvérsia recursal em definir se os descontos efetuados pelo requerido no benefício previdenciário de aposentadoria da requerente ocorreram de forma ilícita de forma a ensejar o deferimento do pleito de indenização por danos morais e materiais na forma arbitrada pelo Juízo de 1º grau. O requerido/apelante sustenta que o empréstimo que ensejou os descontos no benefício de aposentadoria do requerente/apelado existiu, pelo que entende não ser cabível o deferimento do pedido de indenização por danos morais. O argumento do apelante deve ser rejeitado de plano, já que, não trouxe aos autos a comprovação de que o empréstimo que ensejou os descontos, na aposentadoria da apelada de fato foi concretizado. Nesse sentido, o recorrente não apresentou qualquer documento apto a demonstrar que existiu o contrato que ensejou os descontos realizados no benefício de aposentadoria da apelada. Ressalte-se que no caso em análise são plenamente aplicáveis as normas previstas na Lei 8.078/90 - Código de Defesa do Consumidor - que trata das relações de consumo, considerando a condição de consumidor do apelado, sendo este o destinatário final do serviço e do apelante de fornecedor, conforme artigos 2º e 3º da referida Lei, in verbis: Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. Destaquei. Assim, cumpre destacar que a prova da regularidade nos procedimentos administrativos do apelante compete a si mesmo e não a apelada, sobretudo, por se tratar de relação de consumo, em que deve ser aplicada a inversão do ônus da prova nos termos do art. 6º, VIII do CDC, por ser a apelada a parte hipossuficiente na relação de consumo. Contudo, apesar de o apelado negar a existência do contrato de empréstimo, o apelante não produziu provas em sentido contrário, que desse ensejo aos descontos realizados no benefício de aposentadoria, estando, portanto configurada a falha na prestação de serviços e por consequência, o ato ilícito praticado pelo apelante. Registro por oportuno que não pairam dúvidas de que se trata de relação de consumo, devendo incidir a regra de responsabilidade objetiva do prestador de serviços nos termos do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, in verbis: Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Grifei. Destarte, sendo objetiva a responsabilidade do apelante, é prescindível a comprovação de culpa, restando perquirir se houve a demonstração do dano e nexo de causalidade, para que possa se atribuir o dever de indenizar na forma dos artigos 186 e 927 do Código Civil e art. 6º, Inc. VI do CDC. No caso dos autos, o dano e o nexo de causalidade restaram plenamente demonstrados, diante da conduta ilícita do apelante ao efetuar cobranças indevidas referentes a empréstimo não contratado pela requerente, o que ocasionou danos em sua esfera personalíssima, já que, passou a ter descontos indevidos em verba de natureza alimentar, mostrando-se escorreita a sentença de condenação ao pagamento da repetição de indébito e indenização por danos morais. Nesse sentido: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL E MORAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. TESE RECURSAL DE INEXISTÊNCIA DO DEVER DE INDENIZAR. EXERCÍCIO REGULAR DO DIREITO CREDITÍCIO. IMPROCEDÊNCIA. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. DESCONHECIMENTO DA CONTRATAÇÃO EFETUADO POR TERCEIRO EM NOME DO AUTOR. FRAUDE NA CONTRATAÇÃO. DESCONTOS ILEGAIS EM PROVENTOS. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. COBRANÇA INDEVIDA. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. RESTITUIÇÃO EM DOBRO. DEVER DE VERIFICAÇÃO DOS DADOS. DANOS MORAIS. CONFIGURAÇÃO. DANO ¿IN RE IPSA¿. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA "OPE LEGIS". FORTUITO INTERNO. TEORIA DO RISCO DO EMPREENDIMENTO. QUANTUM FIXADO EM OBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. UNÂNIME. (Apelação nº 0002326-11.2009.8.14.0040. Rel. MARIA DO CEO MACIEL COUTINHO, Órgão Julgador 1ª TURMA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 08.05.2017. Publicado em 09.05.2017). Grifei. EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO - PRELIMINAR DE DESERÇÃO SUSCITADA EM CONTRRAZÕES. REJEITADA. MÉRITO. COBRANÇA INDEVIDA - EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NÃO CONTRATADO - CONTRATO NULO - DANO MORAL CARACTERIZADO - RESTITUIÇÃO EM DOBRO DA PARCELA COBRADA INDEVIDAMENTE - DECISÃO MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. 1. Merece rejeição a preliminar de deserção suscitada em sede de contrarrazões pela apelada, uma vez que o preparo do recurso de apelação observou o valor estipulado pelo sistema de arrecadação deste Tribunal. 2. A fraude, ao integrar o risco da atividade exercida pelo banco, não possui o condão de configurar a excludente de responsabilidade civil por culpa de terceiro, estabelecida no artigo 14, § 3º, II, do CDC. 3. Desconto indevido realizado em contracheque de aposentada, por empréstimo consignado não contratado, atinge verba de natureza alimentar, comprometendo, portanto, o sustento do consumidor, o que, por si só, ultrapassa o mero aborrecimento decorrente dos embates da vida cotidiana, configurando os danos morais reclamados. 4. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à restituição dobrada do que pagou, ressalvados os casos de engano justificável, conforme disposto no art. 42, parágrafo único, do CDC. 5. À unanimidade, nos termos do voto do Desembargador Relator, recurso conhecido e desprovido. (Apelação nº 0001262-22.2013.8.14.0015. Rel. LEONARDO DE NORONHA TAVARES, Órgão Julgador 1ª TURMA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 2017-04-17, Publicado em 2017-04-26). Grifei No que tange ao valor da indenização por danos morais fixados pelo Juízo a quo em R$ 11.820,00 (onze mil oitocentos e vinte reais), não há razões para redução. A indenização por danos morais possui como finalidade compensar a vítima pelos dissabores decorrentes da ação ilícita do ofensor, servindo como medida educativa para que este se sinta inibido em relação a novas condutas lesivas. Ademais, para a fixação do valor indenizatório, a teor do que dispõe o art. 944 do Código Civil de 2002, deve-se levar em conta a extensão do dano, o que no caso dos autos se mostra agravado, considerando que os descontos indevidos incidiram sobre verba de caráter alimentar, consistente no benefício previdenciário do apelado, pessoa idosa que utiliza referida verba para sobrevivência. Com efeito, no caso dos autos, o quantum indenizatório fixado em R$ 11.820,00 (onze mil oitocentos e vinte reais) atende aos critérios descritos alhures, bem como, se encontra dentro dos parâmetros da razoabilidade e proporcionalidades, pelo que descabe o pedido de redução. ISTO POSTO, CONHEÇO DESPROVEJO o recurso de apelação mantendo in totum a sentença objurgada. P.R.I.C. Serve esta decisão como Mandado/Intimação/Ofício, para os fins de direito. Após o trânsito em julgado promova-se a respectiva baixa nos registros de pendência referente a esta Relatora e, remetam-se os autos ao Juízo de origem. Em tudo certifique. À Secretaria para as devidas providências. Belém, (PA), 19 de julho de 2018. Desa. EDINÉA OLIVEIRA TAVARES Desembargadora Relatora Assinatura Eletrônica
(2018.02916778-95, Não Informado, Rel. EDINEA OLIVEIRA TAVARES, Órgão Julgador 2ª TURMA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 2018-07-24, Publicado em 2018-07-24)
Ementa
PODER JUDICIÁRIO 2ª TURMA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO Nº 0000130-36.2015.8.14.0054 COMARCA DE ORIGEM: SÃO JOÃO DO ARAGUAIA APELANTE: BANCO BRADESCO S.A. ADVOGADO: RUBENS GASPAR SERRA OAB 119859 APELADA: SEBASTIANA LIANDRA DA SILVA ADVOGADO: ANTÔNIO QUIRINO NETO OAB 10412 RELATORA: DESA. EDINÉA OLIVEIRA TAVARES DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. POSSIBILIDADE. EMPRÉSTIMO INEXISTENTE. DESCONTOS INDEVIDOS EM VERBA DE NATUREZA ALIMENTAR. QUANTUM INDENIZATÓRIO. MANUTENÇÃO. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. O...
Data do Julgamento
:
24/07/2018
Data da Publicação
:
24/07/2018
Órgão Julgador
:
2ª TURMA DE DIREITO PRIVADO
Relator(a)
:
EDINEA OLIVEIRA TAVARES
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