TJPA 0034666-40.2009.8.14.0301
D E C I S Ã O M O N O C R Á T I C A Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta pela AGÊNCIA DE DEFESA AGROPECUÁRIA DO ESTADO DO PARÁ, devidamente representada por procurador habilitado nos autos, com fulcro nos artigos 513 e seguintes do Código de Processo Civil, contra sentença (fls. 99/102) prolatada pelo douto juízo de direito da 1ª Vara de Fazenda de Belém que, nos autos da AÇÃO DE RITO ORDINÁRIO DE COBRANÇA Nº 0034666-40.2009.814.0301 ajuizada contra si pela apelada NAYARA BARBALHO DA CRUZ, julgou procedente os pedidos da exordial. Em suas razões recursais (fls. 103/119), a apelante fez um breve relato dos fatos que deram origem à demanda, pontuando que a apelada lhe prestou serviços na qualidade de temporária, por prazo determinado, no período de 20.07.2008 a 18.01.2009. Por essa razão, esta ajuizou a presente ação para cobrança de saldo de salário do mês de janeiro de 2009 e férias proporcionais mais 1/3 de todo o contrato. Preliminarmente, argumentou [1] nulidade da sentença, por error in procedendo, consistente na ausência de fundamento pertinente entre o dispositivo da sentença a as causas de pedir da demanda; [2] falta de interesse de agir diante da ausência de pretensão resistida da Administração anterior à presente ação judicial; [3] inexistência de obrigação do pagamento de férias proporcionais pela falta de previsão legal específica no âmbito do Estado do Pará anteriormente a 2010; [4] equívoca apreciação das provas, pois a sentença considerou como trabalhados 19 dias no mês de janeiro de 2009, sem que houvesse prova nos autos, quando, em verdade, foram apenas 18 dias. Por fim, requereu o conhecimento e provimento do seu recurso nos termos lançados. Apelo recebido no duplo efeito (fl. 111). Contrarrazões ao recurso ofertadas às fls. 123/132, em que se pugnou o improvimento do apelo. Coube-me a relatoria do feito por distribuição (fl. 133). O Ministério Público de 2º grau eximiu-se de apresentar parecer, por entender inexistir interesse público a justificar sua intervenção (fls. 136/138 ). Vieram-me conclusos os autos (fl. 138v). É o relatório. D E C I D O O recurso comporta julgamento monocrático, com espeque no art. 557, do CPC. Quanto à nulidade da sentença, por error in procedendo, consistente na ausência de fundamento pertinente entre o dispositivo da sentença a as causas de pedir da demanda, melhor sorte não assiste à apelante. Ora, o juízo de piso fez o relatório dos fatos, fundamentou a pretensão para deferimento do pedido de indenização por dano material, acatando o pleito de condenação da recorrente ao pagamento de saldo de salário e férias proporcionais. Como se sabe, o julgador não é obrigado a se manifestar sobre todos os argumentos esgrimidos pelas partes. O STF, ao julgar o MS 26163/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, em 24/04/2008, assim se posicionou: ¿(...) Da mesma forma, não se acolheu a alegação de negativa de prestação jurisdicional (CF, art. 93, IX e X) por não ter havido pronunciamento específico sobre cada uma das teses dos impetrantes, tendo em conta a jurisprudência do Supremo no sentido de que, quando a decisão é motivada, desnecessária a análise de todos os argumentos apresentados (...)¿. (grifo não consta do original) ¿A exigência do art. 93, IX, da Constituição, não impõe seja a decisão exaustivamente fundamentada. O que se busca é que o julgador informe de forma clara e concisa as razões de seu convencimento tal como ocorreu¿ (AI 838857 ED, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 31/05/2011, DJe-114 DIVULG 14-06-2011 PUBLIC 15-06-2011 EMENT VOL-02544-02 PP-00379). Vale ressaltar, ainda, que não é imprescindível que a decisão faça referência expressa a tal ou qual norma legal que utilize para a solução da causa. Dessa maneira, o julgamento da causa, desde que fundamentado, não precisa se reportar especificamente aos artigos indicados pelas partes, pois a obrigação do julgador é fundamentar a decisão (arts. 458, CPC e 93, IX, CF). Vale dizer, a matéria colocada à apreciação foi devidamente analisada, não estando o magistrado obrigado a esquadrinhar todos os argumentos esgrimidos pelas partes, mas, sim, a indicar os elementos suficientes a embasar seu convencimento, sem que para isso necessite transcrever expressamente o artigo de lei, a jurisprudência ou a súmula que lhe serve de sustentação. Lado outro, não há como se acolher a tese de falta de interesse de agir da apelada diante da ausência de pretensão resistida da Administração anterior à presente ação judicial. É certo que não há impedimento por parte da recorrida em pleitear diretamente , na via judicial, sem , antes , esgotar a via administrativa, segundo o princípio da inafastabili dade da jurisdição, sendo vedada qualquer forma de se limitar esse direito constitucional, veiculado no art. 5º, XXXV, da CF, in verbis : A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. A orientação doutrinária de NELSON NERY JÚNIOR , na obra ¿Princípios do Processo Civil na Constituição Federal¿, comentando o dispositivo acima, orienta que ¿em que pese o destinatário principal desta norma seja o legislador, o comando constitucional atinge a todos indistintamente, vale dizer, não pode o legislador e ninguém mais impedir que o jurisdicionado vá a juízo deduzir pretensão¿ . Cumpre , aqui , ressaltar que não é condição para a propositura da ação sub judice o esgotamento da sua busca na via adminis trativa, sob pena de violação ao princípio de livre acesso à justiça. Com efeito, o princípio da inafastabilidade da jurisdição, preconizado no artigo citado , assegura que a lei não criará restrições ao direito de se ingressar em juízo. A jurisprudência não destoa: APELAÇÃO - AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL - PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO E DE FALTA DE INTERESSE DE AGIR - REJEIÇÃO - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - MAJORAÇÃO - FIXAÇÃO SEGUNDO O ART. 20, §4º, DO CPC - RAZOABILIDADE - INOVAÇÃO RECURSAL - NÃO CONHECIMENTO - PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA, POR VÍCIO "ULTRA PETITA", SUSCITADA DE OFÍCIO, ACOLHIDA, EFETUANDO-SE O DECOTE; PRELIMINAR DE FALTA DE INTERESSE DE AGIR E PREJUDICIAL DE PRESCRIÇÃO REJEITADAS. NO MÉRITO, RECURSO PRINCIPAL NÃO PROVIDO E RECURSO ADESIVO PARCIALMENTE PROVIDO. (...) Após o advento da Constituição da República de 1988, que adotou o princípio da inafastabilidade da jurisdição, consagrado no art. 5º, inciso XXXV, da Carta Magna, o esgotamento da via administrativa não é mais condição para ajuizamento de ação. (...) (TJMG - Apelação Cível 1.0672.11.024167-2/001, Relator(a): Des.(a) Eduardo Mariné da Cunha , 17ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 13/03/2014, publicação da súmula em 25/03/2014) AGRAVO DE INSTRUMENTO. SEGURO OBRIGATÓRIO DPVAT. REJEIÇÃO DA PRELIMINAR DE FALTA DE INTERESSE DE AGIR. 1. Não é preciso que o indivíduo esgote as vias administrativas para ingressar com qualquer pedido perante o poder judiciário, diante do princípio da inafastabilidade da jurisdição, previsto no artigo 5º, inciso XXXV, da CF. 2. Negativa de seguimento ao recurso, nos termos do art. 557, caput, do CPC. (TJ-RJ - AI: 191374620128190000 RJ 0019137-46.2012.8.19.0000, Relator: DES. BENEDICTO ABICAIR, Data de Julgamento: 11/04/2012, SEXTA CAMARA CIVEL, Data de Publicação: 14/05/2012) SEGURO OBRIGATÓRIO (DPVAT). AÇÃO DE COBRANÇA. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL POR FALTA DE INTERESSE DE AGIR. NÃO PREVALECIMENTO. DESNECESSIDADE DE DEMONSTRAR O PRÉVIO ESGOTAMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA. EXTINÇÃO AFASTADA. RECURSO PROVIDO. A ausência de comprovação de pedido administrativo de pagamento de indenização e a recusa por parte da seguradora não constituem requisitos de admissibilidade para a propositura da ação, não sendo possível, de pronto, falar em falta de interesse de agir. (TJ-SP - APL: 2027498520098260100 SP 0202749-85.2009.8.26.0100, Relator: Antonio Rigolin, Data de Julgamento: 22/11/2011, 31ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 22/11/2011) Outro ponto de insurgência diz respeito à inexistência de obrigação do pagamento de férias proporcionais diante da ausência de previsão legal específica no âmbito do Estado do Pará anteriormente a 2010 . Em essência, é bom assentar que o caso em apreço difere daquele veiculado no RE 705.140/RS, julgado, pelo STF, em sede de repercussão geral, relatoria do Ministro Teori Zavascki, em 28/08/2014, publicado no DJE de 05/11/2014, em que se assentou o cabimento apenas à percepção dos salários referentes ao período trabalhado e, nos termos do art. 19-A da Lei 8.036/90, ao levantamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço ¿ FGTS. Isso porque esse RE se refere apenas a casos de contratações temporárias declaradas nulas pelo Poder Judiciário, por ausência de concurso público, o que não é a realidade dos autos. Esse RE fora ementado nos seguintes termos: CONSTITUCIONAL E TRABALHO. CONTRATAÇÃO DE PESSOAL PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA SEM CONCURSO. NULIDADE. EFEITOS JURÍDICOS ADMISSÍVEIS EM RELAÇÃO A EMPREGADOS: PAGAMENTO DE SALDO SALARIAL E LEVANTAMENTO DE FGTS (RE 596.478 - REPERCUSSÃO GERAL). INEXIGIBILIDADE DE OUTRAS VERBAS, MESMO A TÍTULO INDENIZATÓRIO. 1. Conforme reiteradamente afirmado pelo Supremo Tribunal Federal, a Constituição de 1988 reprova severamente as contratações de pessoal pela Administração Pública sem a observância das normas referentes à indispensabilidade da prévia aprovação em concurso público, cominando a sua nulidade e impondo sanções à autoridade responsável (CF, art. 37, § 2º). 2. No que se refere a empregados, essas contratações ilegítimas não geram quaisquer efeitos jurídicos válidos, a não ser o direito à percepção dos salários referentes ao período trabalhado e, nos termos do art. 19-A da Lei 8.036/90, ao levantamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS. 3. Recurso extraordinário desprovido. (RE 705140, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 28/08/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-217 DIVULG 04-11-2014 PUBLIC 05-11-2014) Ressalto que o motivo justificador dessa diferença é que, neste caso, não houve declaração de nulidade do contrato de trabalho, em que a apelada trabalhou para a Administração Pública pelo lapso de tempo legal permitido para esses tipos de contrato (6 meses), sem desobediência à lei de regência. Assento que, curvando-me ao atual entendimento do STF, ao apreciar demandas nas quais veiculados pedidos de cobrança por servidores temporários admitidos após a Constituição da República de 1988, tenho entendido que somente a prorrogação do vínculo, atendido os demais requisitos legais, para além do prazo previsto na legislação de regência resulta na nulidade da contratação e, por conseguinte, torna devido ao contratado apenas os direitos existentes com relação às horas trabalhadas durante o pacto laboral e o FGTS. Destarte , a sentença re corrida está em har monia com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal , que assentou ser devida a extensão do direito previsto no art. 7º , da Constituição da República aos servidores contratados temporariamente com base em legislação estadual ou local, que regulamenta o inc . IX do art. 37 da Constituição. É firme a jurisprudência da Corte Suprema , segundo a qual o servidor contratado temporariamente faz jus aos direitos sociais previstos no art. 7º da Constituição Federal, nos termos do art. 37, IX, da CF, principalmente quando o contr ato é sucessivamente prorrogado, que dirá quando sequer há prorrogação como no caso em apreço. Confiram-se, a propósito, os seguintes pr ecedentes de ambas as Turmas d a Corte Suprema : AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITOS SOCIAIS PREVISTOS NO ART. 7º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. FÉRIAS E DÉCIMO TERCEIRO. EXTENSÃO AO SERVIDOR CONTRATADO TEMPORARIAMENTE. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 1. Conforme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, os servidores contratados em caráter temporário têm direito à extensão de direitos sociais constantes do art. 7º do Magno Texto, nos moldes do inciso IX do art. 37 da Carta Magna. 2. Agravo regimental desprovido. (ARE-AgR 663.104, Rel. Min. AYRES BRITTO, Segunda Turma, DJe 19.3.2012) AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. SERVIDOR TEMPORÁRIO. CONTRATO PRORROGADO SUCESSIVAMENTE. GRATIFICAÇÃO NATALINA E FÉRIAS. PERCEPÇÃO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 1. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que é devida a extensão dos diretos sociais previstos no art. 7º da Constituição Federal a servidor contratado temporariamente, nos moldes do art. 37, inciso IX, da referida Carta da República, notadamente quando o contrato é sucessivamente renovado. 2. Agravo regimental não provido. (AI-AgR 767.024, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, DJe 24.4.2012) Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. 2. Direito Administrativo. 2. Servidor público contratado em caráter temporário. Renovações sucessivas do contrato. Aplicabilidade dos direitos sociais previstos no art. 7º da CF, nos termos do art. 37, IX, da CF. Direito ao décimo-terceiro salário e ao adicional de férias. 3. Discussão acerca do pagamento dobrado das férias. Questão de índole infraconstitucional. 4. Ausência de argumentos capazes de infirmar a decisão agravada. 5. Agravo regim ental a que se nega provimento. ( ARE-AgR 681.356, Rel. Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, DJe 17.9.2012) Inequívoco, pois, o direito à percepção das férias proporcionais. Ao cabo, reformo o capítulo da sentença referente ao pagamento de saldo de salá rio d o mês de janeiro de 2009 para fixá-lo em 18 dias. Explico. Com efeito, as provas dos autos apontam que o contrato de trabalho temporário operou efeito até o dia 18.01.2009. Tanto que o termo de distrato (fl. 80) passou a emanar efeitos a partir do dia 19.01.2009. Em igual sentido, é a ficha de frequência da apelada acostada à fl. 22 dos autos. ANTE O EXPOSTO, com base no art. 557, do CPC e de tudo mais que nos autos consta, CONHEÇO DA APELAÇÃO CÍVEL E DOU -LHE PARCIAL PROVIMENTO para modificar o capítulo de sentença referente ao saldo salarial de janeiro de 2009, fixando-o em 18 (dezoito) dias, mantendo-se os demais termos sentenciais , tudo nos moldes e limites da fundamentação lançada, que passa a integrar o presente dispositivo como se nele estivesse totalmente transcrita. P.R.I. Belém (PA), 19 de janeiro de 2015. DRª. EZILDA PASTANA MUTRAN Relatora/Juíza Convocada 1
(2015.00142400-97, Não Informado, Rel. EZILDA PASTANA MUTRAN - JUIZA CONVOCADA, Órgão Julgador 2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2015-01-23, Publicado em 2015-01-23)
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D E C I S Ã O M O N O C R Á T I C A Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta pela AGÊNCIA DE DEFESA AGROPECUÁRIA DO ESTADO DO PARÁ, devidamente representada por procurador habilitado nos autos, com fulcro nos artigos 513 e seguintes do Código de Processo Civil, contra sentença (fls. 99/102) prolatada pelo douto juízo de direito da 1ª Vara de Fazenda de Belém que, nos autos da AÇÃO DE RITO ORDINÁRIO DE COBRANÇA Nº 0034666-40.2009.814.0301 ajuizada contra si pela apelada NAYARA BARBALHO DA CRUZ, julgou procedente os pedidos da exordial. Em suas razões recursais (fls. 103/119), a ape...
Data do Julgamento
:
23/01/2015
Data da Publicação
:
23/01/2015
Órgão Julgador
:
2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
Relator(a)
:
EZILDA PASTANA MUTRAN - JUIZA CONVOCADA
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