TJPA 0013285-40.2016.8.14.0000
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ GAB. DESEMBARGADORA ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA AGRAVO DE INSTRUMENTO PROCESSO Nº: 0013285-40.2016.8.14.0000 AGRAVANTE: ESTADO DO PARÁ PROCURADORA DO ESTADO: RIBERTA HELENA DÓREA DACIER LOBATO AGRAVADO: FRANCISCO WALMIR DOS SANTOS SILVA ADVOGADA: IVONE MARIA LARA, OAB/PA 20.809-B RELATORA: DESEMBARGADORA ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA DECISÃO MONOCRÁTICA Tratam os presentes autos de AGRAVO DE INSTRUMENTO COM PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO, interposto pelo ESTADO DO PARÁ, contra decisão interlocutória proferida pelo M.M Juízo da 3ª Vara Cível e Empresarial da Comarca de Altamira, proferida nos autos da Ação de Obrigação de Fazer (proc. n. 0098854-28.2015.8.14.0005), tendo como agravado FRANCISCO WALMIR DOS SANTOS SILVA. Historiando os fatos, o autor relata que foi vítima de acidente de transito vindo a sofrer fratura exposta na perna e tornozelo. Ajuizou ação ordinária visando a realização de cirurgia com urgência, sendo deferida a antecipação dos efeitos da tutela, para que o Estado providenciasse, no prazo de 15 dias, o atendimento especializado de que necessitava o requerente. O Estado declara que vinha efetuando o cumprimento da decisão, disponibilizando a internação do paciente, que passou a receber toda a atenção necessária ao seu estado de saúde. Todavia, após nova manifestação do autor nos autos, foi surpreendido com decisão do juízo de piso, nos seguintes termos: ¿(...) Considerando a petição de fls. 26/27, e 54/57, a qual informa o descumprimento da liminar proferida nos presentes autos, determino a intimação do Município de Altamira e do Estado do Pará, a fim de que cumpram integralmente a decisão interlocutória de fls. 21/21-Verso, no prazo improrrogável de 05(cinco) dias, sob pena de aplicação de multa a impelir o seu cumprimento no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) diários até o limite de R$ 100.000,00 (cem mil reais) a ser revestido em favor do autor. Cumpra-se o que se fizer necessário. (...)¿ Em razões recursais (fls.02/05), o Estado do Pará assevera que colheu informações diretamente junto ao Hospital Regional Público da Transamazônica, que informou que o paciente se evadiu do local por não querer aguardar pelo procedimento cirúrgico. Alega que adotou todas as providencias para o integral cumprimento da ordem judicial deferida, sendo que esta foi obstada por ato do próprio interessado que se evadiu do Hospital em que se encontrava internado. Questiona de que modo poderia ter evitado a evasão do enfermo daquela Unidade de Saúde?! Insurge-se contra a exorbitância do valor da multa diária aplicada, invocando os princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Alega que o valor das astreintes deve ser limitado porque seu objetivo é o cumprimento da decisão e não o enriquecimento de uma parte em prejuízo da outra, e que no caso, a aplicação da multa impedirá diretamente, a utilização do recurso no atendimento de outros pacientes. Pugna pela concessão do efeito suspensivo ao agravo, e no mérito pelo provimento do recurso, com a reforma da decisão agravada. Subsidiariamente, requer a redução do valor das astreintes. Juntou documentos de fls. 06/113. Inicialmente os autos foram distribuídos a Exma. Desa. Célia Regina de Lima Pinheiro (fl.114), em seguida, me foram redistribuídos (fl.116), considerando-se o art. 2° da Portaria n° 3542/2016-GP e caput do art. 112 do RI deste Eg. TJ/PA (fl. 34). É o relatório. Decido. Preenchidos os requisitos de admissibilidade, recebo o presente Agravo de Instrumento, nos termos do art. 1.015 do Novo Código de Processo Civil. Primordialmente, e sem necessidade de qualquer outro argumento nesta análise prévia, convém destacar que estamos diante de uma ação que versa sobre o maior bem de todos: a vida, que prevalece sobre todas as outras questões trazidas pela parte agravante, visto que a saúde encontra-se em severo risco. Passo a análise do pedido de Efeito suspensivo formulado pelo ora agravante: Sabe-se que em sede de Agravo de Instrumento a abordagem deve ser restrita ao acerto ou não da decisão que concedeu a medida liminar, levando-se em conta a presença dos requisitos aptos a ensejarem o (in)deferimento ab initio do pleito excepcional e não do mérito da ação. Para a concessão do efeito suspensivo são necessários os preenchimentos dos requisitos autorizadores, quais sejam fumus boni iuris e periculum in mora. Sendo assim, faz-se necessário a presença simultânea da fumaça do bom direito, ou seja, que o agravante consiga demonstrar através das alegações aduzidas, em conjunto com as documentações acostadas, a possibilidade de que o direito pleiteado exista no caso concreto, e o reconhecimento de que a demora na definição do direito poderá causar dano grave e de difícil reparação ao demandante com um suposto direito violado ou ameaçado de lesão. A respeito de tais requisitos, José Miguel Garcia Medina assim preleciona: "Probabilidade do direito. Urgência e Sumariedade da cognição. Fumus boni iuris. Esse ¿ambiente¿ a que nos referimos acima, a exigir pronunciamento em espaço de tempo mais curto, impõe uma dupla Sumariedade: da cognição, razão pela qual contenta-se a lei processual com a demonstração da probabilidade do direito; e do procedimento (reduzindo-se um pouco, por exemplo, o prazo para resposta, cf. art. 306 do CPC/2015, em relação à tutela cautelar). Pode-se mesmo dizer que, mercê da urgência, contenta-se com a probabilidade do direito (ou - o que é dizer o mesmo - quanto maior a urgência, menos se exigirá, quanto à probabilidade de existência do direito, cf. se diz infra); sob outro ponto de vista, contudo, essa probabilidade é vista como requisito, no sentido de que a parte deve demonstrar, no mínimo, que o direito afirmado é provável ( e mais se exigirá, no sentido de se demonstrar que tal direito muito provavelmente existe, quanto o menor for o grau de periculum, cf. se procura demonstrar infra). A esse direito aparente ou muito provável costuma-se vincular a expressão fumus boni iuris." "Sumariedade da cognição sobre o periculum. Sentido de ¿urgência¿. A cognição, face a urgência, é sumária não apenas quanto à existência do direito que se visa proteger (cf. comentário supra), mas, também, quanto ao próprio perigo. Aqui, entram em jogo, dentre outros fatores, saber se é mesmo provável que o dano poderá vir a acontecer caso não concedida a medida, se sua ocorrência é iminente, se a lesão é pouco grave ou seus efeitos são irreversíveis, se o bem que o autor pretende proteger tem primazia sobre aquele defendido pelo réu (o que envolve a questão atinente à importância do bem jurídico, como se diz infra) etc. Ao analisar se há urgência, assim, não restringe-se o magistrado a verificar se algo pode vir acontecer muito em breve. Visto de outro modo, o termo ¿urgência¿ deve ser tomado em sentido amplo.¿ Estabelecidos, pois, os limites possíveis de apreciação judicial nesta fase de cognição sumária, passo ao exame dos requisitos mencionados. Inicialmente, registro que, conforme entendimento pacífico da jurisprudência dos tribunais superiores pátrios, os direitos fundamentais à vida e à saúde são direitos subjetivos inalienáveis, constitucionalmente consagrados, cujo primado, em um Estado Democrático de Direito, que reserva especial proteção à dignidade da pessoa humana, há de superar quaisquer espécies de restrições legais. Assim, agiu corretamente o Juízo de piso, ao antecipar os efeitos da tutela, uma vez que o bem protegido está dentre os mais preciosos para o ser humano - a saúde. Considerando que o presente recurso versa única e exclusivamente sobre a exorbitância da multa aplicada, vejamos: O ente estatal aduz que vem realizando incansável busca pelo agravado a fim de perquirir seu interesse na realização do tratamento médico postulado. Impugna a parte final da decisão agravada que fixou multa diária no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), até o limite de R$ 100.000,00 (cem mil reais), na hipótese de descumprimento pelo Estado, da ordem de internação e tratamento do paciente. Importa ressaltar que a adoção da multa, nos casos de prestação de fazer ou de não fazer, tem em vista conferir efetividade às decisões que decorrem desses feitos, encontrando respaldo nos artigos 497 e 498 do NCPC, que tratou da chamada tutela específica da obrigação e a tutela pelo equivalente. Eis o que dizem as normas referidas: ¿Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente. Parágrafo único. Para a concessão da tutela específica destinada a inibir a prática, a reiteração ou a continuação de um ilícito, ou a sua remoção, é irrelevante a demonstração da ocorrência de dano ou da existência de culpa ou dolo. Art. 498. Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao conceder a tutela específica, fixará o prazo para o cumprimento da obrigação. Parágrafo único. Tratando-se de entrega de coisa determinada pelo gênero e pela quantidade, o autor individualizá-la-á na petição inicial, se lhe couber a escolha, ou, se a escolha couber ao réu, este a entregará individualizada, no prazo fixado pelo juiz.¿ Portanto, previstas as possibilidades de concessão da tutela específica e da tutela pelo equivalente, a norma adjetiva dispôs ao julgador uma série de medidas coercitivas, descritas pela lei como ¿medidas necessárias¿, as quais tem por finalidade viabilizar o cumprimento daquelas tutelas, dentre elas a imposição de multa mesmo que seja contra a Fazenda Pública. Quanto à insurgência do agravante no que concerne à fixação de astreintes pelo juízo a quo, ressalta-se que o objetivo preponderante do valor da multa é a coerção, razão pela qual não tenho por abusivo o valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) de multa diária imposta pelo magistrado singular. Todavia, entendo que o limite estabelecido de R$ 100.000,00 (cem mil reais), este sim, mostra-se excessivo, representando fonte de enriquecimento sem causa, já que estabelecido sem observância dos parâmetros de razoabilidade e proporcionalidade, em que pese o fato da multa somente ser aplicada em hipótese de descumprimento da decisão. Sobre essa questão dispõe o art. 537 do NCPC, ¿verbis¿: ¿Art. 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito.¿ § 1o O juiz poderá, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa vincenda ou excluí-la, caso verifique que: I - se tornou insuficiente ou excessiva; II - o obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o descumprimento. § 2o O valor da multa será devido ao exequente. § 3º A decisão que fixa a multa é passível de cumprimento provisório, devendo ser depositada em juízo, permitido o levantamento do valor após o trânsito em julgado da sentença favorável à parte. § 4o A multa será devida desde o dia em que se configurar o descumprimento da decisão e incidirá enquanto não for cumprida a decisão que a tiver cominado. § 5o O disposto neste artigo aplica-se, no que couber, ao cumprimento de sentença que reconheça deveres de fazer e de não fazer de natureza não obrigacional. (grifei) Pelo exposto, as astreintes podem ser alteradas a qualquer tempo, podendo ser majoradas ou reduzidas em relação ao seu valor. Assim, entendo assistir razão ao agravante quanto à exorbitância apenas do limite estabelecido pelo juiz singular. A limite aplicado originalmente no importe de R$ 100.000,00 (cem mil reais), mostra-se excessivo. Diante dessa circunstância, tem pertinência a sua redução, principalmente quando se tem em vista que a multa tem o propósito de compelir a parte ao cumprimento da determinação judicial e não ao enriquecimento de uma delas. A partir do momento em que a multa arbitrada deixa de ter o caráter coercitivo e passa a ensejar o locupletamento da parte, deve ter seu valor controlado pelo Judiciário, na forma como recomendada pelo art. 537, § 1º, inciso I do CPC/2015, anteriormente citado. Sobre o tema, colaciono jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ASTREINTES. REDUÇÃO. POSSIBILIDADE. VALOR ARBITRADO. REVISÃO. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA N. 7/STJ. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. INEXISTÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA. 1. É possível a redução das astreintes a qualquer tempo, quando fixadas fora dos parâmetros da razoabilidade. 2. A revisão do valor fixado a título de astreintes encontra óbice na Súmula n. 7/STJ. O valor somente comporta alteração nos casos em que for irrisório ou exorbitante. 3. Não se conhece da divergência jurisprudencial quando os julgados dissidentes tratam de situações fáticas diversas. 4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no AREsp 335.969/MG, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/03/2015, DJe 27/03/2015) No mesmo sentido, cito precedentes oriundos deste TJ/PA: ¿AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO AGRAVADA MAJOROU A MULTA PELO NÃO CUMPRIMENTO DE DECISÃO PARA R$ 100.000,00 (CEM MIL REAIS) POR DIA. VALOR FIXADO DEVE SER REDUZIDO, A FIM DE NÃO ONERAR DEMASIADAMENTE O ORÇAMENTO PÚBLICO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO, APENAS PARA REDUZIR A MULTA DIÁRIA PARA O VALOR DE R$40.000,00 (QUARENTA MIL REAIS), À UNANIMIDADE (2016.02892729-75, 162.329, Rel. RICARDO FERREIRA NUNES, Órgão Julgador 4ª CAMARA CIVEL ISOLADA, Julgado em 2016-07-18, Publicado em 2016-07-21)¿ (grifei) Pelo exposto, considerando-se presentes os requisitos legais da relevância da fundamentação e do perigo da demora, bem como constatada a excessividade do limite da multa fixada, admite-se a sua redução em atendimento ao princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, devendo ser mantido os demais termos da tutela deferida pelo Juízo de piso. Desse modo, entendo que o valor da multa diária deve permanecer em R$ 2.000,00 (dois mil reais), todavia, limito ao montante de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), com o fim de evitar o enriquecimento sem causa e a penalização em excesso do ente público estadual. Nos moldes do art. 1.019 do Novo Código de Processo Civil, determino: 1) Comunique-se o Juízo da 3ª Vara Cível e Empresarial da Comarca de Altamira, acerca desta decisão, para fins de direito. 2) Intime-se o agravado, na forma prescrita no inciso II do art. 1.019 do Novo Código de Processo Civil para que, em querendo, responda no prazo de 15 (quinze) dias, sendo-lhe facultado juntar cópias das peças que entender conveniente. 3) Encaminhem-se os autos ao Ministério Público de 2º grau para exame e pronunciamento, na forma legal. Servirá a presente decisão, por cópia digitalizada, como OFÍCIO/INTIMAÇÃO, nos termos do artigo 4º, parágrafo único c/c artigo 6º da Portaria nº 3731/2015-GP. Cumpra-se na forma e sob as penas da lei. Após, retornem os autos conclusos. Publique-se. Intime-se. Belém, ____ de fevereiro de 2017. ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA Desembargadora Relatora 08
(2017.00569946-89, Não Informado, Rel. ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA, Órgão Julgador 2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2017-04-04, Publicado em 2017-04-04)
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ GAB. DESEMBARGADORA ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA AGRAVO DE INSTRUMENTO PROCESSO Nº: 0013285-40.2016.8.14.0000 AGRAVANTE: ESTADO DO PARÁ PROCURADORA DO ESTADO: RIBERTA HELENA DÓREA DACIER LOBATO AGRAVADO: FRANCISCO WALMIR DOS SANTOS SILVA ADVOGADA: IVONE MARIA LARA, OAB/PA 20.809-B RELATORA: DESEMBARGADORA ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA DECISÃO MONOCRÁTICA Tratam os presentes autos de AGRAVO DE INSTRUMENTO COM PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO, interposto pelo...
Data do Julgamento
:
04/04/2017
Data da Publicação
:
04/04/2017
Órgão Julgador
:
2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
Relator(a)
:
ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA
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